Qualquer semelhança não é mera coincidência:
1. Até final dos anos 80 a Coreia do Sul implementou um projeto de desenvolvimento bem sucedido, comandado pelo general Park Chung-hee, que governou o país ditatorialmente dos anos 60 até 1979, quando foi assassinado.
2. O país ultrapassou a armadilha da renda média. Mas, a partir dos anos 90, foi submetido a uma série de reformas liberais que desmontaram o mercado de trabalho, jogando 40% da força de trabalho na informalidade. Houve um aumento substancial da pobreza e da concentração de renda, retratados no filme “Parasita’, vencedor do último Oscar. O desfecho foi a grande crise de 1996 e 1997 e uma perda brutal do dinamismo da economia.
3. Em 2012, novas eleições foram vencidas pela presidente Park Geun-hye.
4. Historicamente sempre houve uma convivência estreita entre grandes grupos coreanos, denominados de Chaebol, e governo federal. Sua criação foi uma parceria entre Estado e família coreanas. Dai resultaram sucessos globais como a Samsung, Hyundai Motor Company, LG, SK, Hanjin, Hyundai Heavy Industries, Lotte, Doosan, Hanhwa, e Kumho Asiana. Em 2016, surpreendentemente, o Ministério Público passou a investir agressivamente contra a presidente e o grupo Samsung. Executivos da Samsung foram presos fora da Coreia, houve uma parceria radical com a mídia que acabou levando à queda da presidente da República, e sua posterior condenação. Em 2017, o MPF conseguiu a prisão do vice-presidente e herdeiro da Samsung, Lee Jan-Yong. A acusação foi a de ter sido apoiado por um fundo de pensão estatal em uma fusão com a empresa Cheil Industries em 2015. O Lawfare prosseguiu com indiciamento de 31 diretores da Samsung por supostamente violarem leis trabalhistas. Toda a operação foi diretamente coordenada pelo Procurador Geral.
5. Parênteses breve: Em 2017, o PGR Janot encontrou-se com o PGR da Coreia do Sul na reunião do Comitê Executivo da Associação Internacional de Procuradores, na cidade de Busan, Coreia do Sul. O comitê é formado por membros de Ministérios Públicos da Coreia do Sul, Estados Unidos, Bélgica, Rússia, África do Sul, Emirados Árabes Unidos, Canadá, Azerbaijão, França e Argentina. No site da IAP, a frase de abertura é: “Elevando os padrões para promotores em todo o mundo; melhorando a cooperação internacional para combater o crime”. Entre seus objetivos, estão temas como “promover e aprimorar os padrões e princípios geralmente reconhecidos internacionalmente como necessários para o julgamento adequado e independente de crimes”, e todo um decálogo.
6. Foram providenciadas novas eleições em 2017 mas ocorreu o ponto fora da curva, a eleição do de Moon Jae-in, candidato derrotado em 2012, e com forte viés desenvolvimentista. Ele foi eleito prometendo devolver os direitos trabalhistas, retomar políticas desenvolvimentistas, lutar pela unificação com a Coreia da Noite e implantar uma pauta moral mais moderna, com a descriminalização do aborto.
7. Aí sobreveio a crise do Covid-19. Com a economia fortemente dependendo das exportações – elas representam 40% do PIB -, houve uma queda do PIB. A mídia sul-coreana imediatamente tratou de relacionar a queda do PIB com as mudanças nas leis trabalhistas.
8. No início da pandemia, a taxa de desemprego era de 4,1%. Surpreendendo a muitos, Moon lança o New Deal Sul Coreano, de 10% do PIB de investimento em 4 anos, US$ 160 milhões para dinamizar economia digital, desenvolvimento sustentável, fortalecer as cadeias produtivas internas e gerar 1,9 milhão de empregos, 1,5 milhão dos quais no setor público. No segundo semestre, o PIB caiu 2,3%, mas ainda assim a taxa de desemprego caiu para 3,7%. Mais que isso, Moon providenciou um aumento no salário mínimo, de 2% acima da inflação e decidiu tributar ganhos de capital e ganhos imobiliários. Seu programa foi apresentado como modelar pela OCDE. Graças a assim, o PIB da Coreia do Sul saltou de 12o para 9o lugar, ocupando a classificação do Brasil. E aparentemente estava garantida a eleição de 2022 para seu partido.
9. Como consequência, ampliou-se a perseguição penal por parte do Procurador Geral da República e a mídia coreana passou a dar cobertura diária às denúncias de corrupção e de investimento na imagem do PGR. Ao mesmo tempo, com 35% da população coreana professando a fé evangélica, a mídia passou a explorar pesadamente a pauta moral – investindo contra a decisão de descriminalizar o aborto e boicotando o isolamento social.
10. Para completar o quadro, Moon divulgou uma carta aberta contra o boicote americano à Huawei, acirrando a disputa com os EUA.
11.Na sequencia, o PGR ampliou a ofensiva contra o governo. Descobriu-se que ele estava levantando informações pessoais sobre juízes, para pressioná-los a apoiar as ações dos procuradores contra o presidente Moon. Resultou em suspensão do PGR por dois meses, contra a qual ele reagiu com apoio da imprensa.
10. Agora, há uma contagem regressiva para as eleições de 2022. A suspensão do PGR e o carnaval da mídia colocam o Sérgio Moro coreano na frente nas pesquisas de opinião. Candidato ligados a Moon vêm longo atrás. Nas 51% da população diz que votará em candidatos de pautas conservadoras.
Tudo dependerá do comportamento da economia em 2021.
Esse belo relato – em entrevista com o economista Ualace Moreira, da Universidade Federal da Bahia, autor de uma tese de doutorado na Unicamp sobre a Coreia do Sul – mostra situações muitíssimo parecidas com a brasileira, o uso da religião, das pautas morais, o Lawfare de procuradores, reunidos em associações internacionais, a parceria mídia-mercado-procuradores, as parcerias com procuradores de outros países, especialmente com o Departamento de Estado norte-americano, a campanha negativa contra qualquer pauta social.
Mas, como diriam os idiotas da objetividade, trata-se apenas da confluência de tendências globais, a chamada mão invisível da sociologia.
Celso Rocha de Barros, colunista da Folha
Haddad ficou aquele tempo todo na USP lendo Habermas para mandarem ele agora ir lá na frente de todo mundo dizer que o Moro é agente da CIA?
Sergio Fausto, diretor do Instituto Fernando Henrique Cardoso
Então, para ele (Haddad), é uma situação muito difícil, porque ele não pode ser candidato de um partido que quer fazer um discurso a favor da Venezuela, dizendo que o que há no Brasil é o controle do governo brasileiro pelos Estados Unidos, que a Lava Jato é uma emanação da CIA que visa desnacionalizar a Petrobras. Isso é um discurso delirante, retrógrado.
O chamado ativismo judicial provoca rusgas institucionais desde o tempo do mensalão, antecedendo os ataques…
Denúncias de alienação descredibilizam acusações de violência contra menores e podem expor a criança aos…
Os dois conversaram sobre o combate à desigualdade e à fome. Para Dilma, o papa…
Os pesquisadores constataram que pessoas que sofrem de hipertensão sofrem ainda mais riscos, especialmente as…
Caso ganhou repercussão no interior de SP; jovem faleceu após ser baleado na região do…
É papel do Banco Central administrar as expectativas de mercado, mas o que o presidente…
View Comments
Isso me lembra este comentário de ontem. Trata-se de uma objeção a uma comparação entre as peças do xadrez e as partes da sociedade.
Acabei por não fazer réplica, por achar que seria óbvia.
https://jornalggn.com.br/noticia/fora-de-pauta-3395-4-2-2-2-2-4-2-2-2-2-2-3-2-2-2-2-2-3-2-2-2-2-5-2-2-2-4-2-2-2-2-4-2-2-6-2-2-2-2-2-3-2-2-2-2-4-2-2-2-2-2-3-2-2-2-2-4-2-2-2-2-4-2-2-2-2-4-2-2-2-2-4-3-5-2-7/#comment-1284615
Curioso que o PGR sul-coreano somente tenha sido freado quando começou a atacar os juízes (muito parecido com o que ocorre no Brasil).
Infelizmente, há esse xadrez envolvendo mídia, juízes, religião e corporações. Enquanto isso, peãs e peões (nós), ficamos no meio desse fogo cerrado.
Muito interessante esse "New Deal coreano". E surpreende que o evangelismo tenha tanta força por lá.
Jornalismo sério e independente é tudo que o Brasil necessita. Parte considerável da mídia brasileira anda a reboque das redações estrangeiras.
É por estas e outras que penso que este tal de ministério público deveria ser extinto sem reaproveitamento de seus integrantes em qualquer órgão público.
Seria per´na bunda mesmo.
Achei que só o judiciário brasileiro era um partido vitalício de direita. Errei. Vamos precisar de muita guilhotina.
Essa é a grande disputa, entre o neoliberalismo ultrapassado, mas que gera grandes lucros para o 0,1% contra o desenvolvimentismo que beneficia a nação, mas que exige um controle muito rígido das instituições por causa da grande quantidade de negócios feitos. O inimigo não é um Bolsonaro da vida, mas os paulos Guedes