A expressão que dá título a este artigo é comumente usada para representar coisas que são totalmente previsíveis ou quase certas de ocorrer. Nas ciências sociais, dificilmente temos condições de propor leis científicas assim tão poderosas. Contudo, há algumas proposições que têm grande respaldo empírico. Uma que é bem conhecida é a chamada “Lei de Ferro das Oligarquias” de Robert Michels. Outra é o que costumo chamar de hipótese de Przeworski, em referência ao famoso cientista social polonês radicado nos EUA.
Adam Przeworski propôs a hipótese de que a esquerda só tem duas opções factíveis de ação política. A primeira seria a via leninista, através de um processo revolucionário e a desapropriação dos meios de produção e do capital em geral. A segunda seria a via socialdemocrata, com a busca de pactos sociopolíticos entre os diferentes estratos sociais.
Em 2016, quando eu me encontrava como pesquisador visitante da Universidade do Texas-Austin, nos EUA, assisti a uma conferência do Prof. Carlos de la Torre, da Universidade de Kentucky, sobre o que ele chama de “neopopulismo latino-americano”. Ele falou sobre os casos da Bolívia, Equador e Venezuela. Ao final, lhe perguntei como ele via o caso dos governos petistas no Brasil, pois parte da mídia conservadora costumava colocar esses governos sob uma categoria única junto com aqueles que ele havia acabado de analisar chamando-os de “bolivarianos”. Ele me respondeu que via tal afirmação como algo totalmente sem sentido, pois identificava os governos petistas como muito mais próximos do “tipo ideal” da socialdemocracia do que do “neopopulismo” (que também, obviamente, é um “tipo ideal”, no sentido weberiano).
De fato, eu diria que a maior parte dos analistas em ciências sociais teria entendimento semelhante (1). A famosa “Carta aos Brasileiros” de Lula, formulada para as eleições de 2002, é amplamente classificada justamente como uma iniciativa para a busca de um pacto socialdemocrata. A formação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social por Lula também é evidência da busca desse pacto.
Durante os oito anos de governo de Lula, de fato o pacto socialdemocrata pareceu funcionar bastante bem. Basta reunir os indicadores socioeconômicos e políticos do período. Todavia, claramente, parte relevante das elites brasileiras “cansou da brincadeira”, não quis aceitar a possibilidade de prolongamento do referido pacto. Para destruí-lo, foi necessário atacar a própria democracia e o estado de direito. O ponto crítico desse processo foi o golpe estamental iniciado pelo então juiz Sérgio Moro, no dia 16 de março de 2016, que terminou por levar tanto à deposição arbitrária da então presidenta Dilma Roussef quanto à prisão ilegal do ex-presidente Lula.
Agora, vejo vários atores políticos e pessoas minhas conhecidas que apoiaram o referido golpe estamental e seus dois lances decisivos (a deposição de Dilma e a prisão de Lula), mas que agora estão desesperados ao ver o que a cadeia causal do golpe nos legou (como eu disse na minha última coluna, já perceberam que “deu ruim”), indignadas com a falta de disposição de Lula e do PT de participarem de um amplo pacto pela democracia (2). Realmente, tenho muitas dúvidas se esse pacto ocorrerá e, penso que, para ocorrer, ele precisará surgir do centro do espectro político e terá que demonstrar muita generosidade com Lula e o PT para atrair para dentro essa força política que reúne cerca de 30% do eleitorado do país e que – nunca é demais ressaltar – foi o único dos grandes partidos tradicionais a sair ainda bastante forte da eleição de 2018 (3).
Isso será necessário porque, embora não seja algo totalmente inexorável como o título desse artigo sugere, a “tendência natural” de Lula e do PT hoje é uma maior radicalização. O golpe estamental iniciado por Sérgio Moro em 2016, com a consequente deposição de Dilma e prisão de Lula, empurraram o PT para essa radicalização. Afinal, se Lula e o PT fizeram tudo dentro das regras do jogo moderado do pacto socialdemocrata (4), mas ainda assim foram vítimas de um golpe estamental, por que deveriam agir da mesma forma outra vez? Nessa hora devemos nos lembrar da máxima de Albert Einstein “loucura é esperar resultados diferentes fazendo tudo exatamente igual”. De um ponto de vista puramente racional, não há hoje incentivos para que Lula e o PT busquem, outra vez, a moderação de um pacto socialdemocrata. Como afirmei em outras colunas, acho que, com a continuidade do golpe estamental e a manutenção da prisão ilegal de Lula, o mais provável é que o lulismo se transforme em algo mais próximo do peronismo argentino do que do modelo socialdemocrata ao qual o PT aderiu anteriormente. Acho que isso não será bom para o Brasil, basta ver o que aconteceu com a Argentina nas últimas sete décadas. Todavia, infelizmente, as condições estão dadas, água de morro abaixo, fogo de morro acima…
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Se um amplo pacto depende de uma iniciativa generosa do centro para acontecer, talvez seja melhor esquecer, pois foi justamente o centro que praticamente se desintegrou desde o golpe. Surfando a onda do anti-petismo na última campanha eleitoral, acabaram por dar no canto direito da praia, a tal ponto que o suposto presidente pode agora se dizer de centro-direita e Ciro disputando espaço com o eremita da Virgínia.
Esse talvez tenha sido o maior erro no cálculo eleitoral da campanha cirista: se ao invés de voltar toda sua artilharia, de maneira tão vil (repercutindo acriticamente o discurso anti-petista reverberado pela grande midia), para o PT e seu(s) candidato(s) na última eleição presidencial, Ciro tivesse se concentrado em cabalar os votos órfãos do centro e centro-direita, talvez hoje estivesse em condições de negociar ou mesmo liderar as articulações desse amplo pacto. Ou, melhor ainda, sua candidatura poderia ter servido como uma espécie de dique de contenção à radicalização a direita na última eleição e, quem sabe, talvez até tivesse chegado ao segundo turno, com Haddad (não teria sido ótimo um segundo turno assim?) ou com o suposto presidente, e realizado aquela profecia que ele e seus apoiadores gostam tanto de repetir desde as eleições, que só ele venceria no segundo turno. Esse poderia ter sido o papel de verdadeiro democrata que o flâneur pindo-cearense se recusou a assumir naquele momento.
Comentando sobre o assassinato de uma menina de 8 anos, no Rio de Janeiro, desabafei contra autoridades assassinas, policiais assassinos, juizes e procuradores assassinos que nada fazem para mandar o governador Witzel assassino para a cadeia Já, aquele desabafo cabe também aqui. Afinal, fazer acordo com crápulas como FHC e seu bando golpísta, com crápulas do MDB golpista, com gente preconceituosa, gente pseudo-religiosa ideologicamente nefastas, não dá né. Nosso ódio tem explicação sim, pelo menos enquanto Lula não estiver livre e podendo concorrer na próxima eleição, que também precisa vir já, desde que os canalhas do TSE tomem vergonha na cara e cassem a chapa de corruptos dos laranjais do PSL. Negociar com vermes como Ciro? com fezes ambulantes como FHC? Com generais que deviam estar na cadeia, inclusive aquele nefasto vilaruins que infelizmente o capeta está demorando muito para levar? Só que nós, à esquerda desse centro hipócrita, temosqueter vergonha na cara e partir pro pau.......pra rua.......chega de sonhar com soluções democrático-republicanas.......