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Descaminhos do Lawfare na realidade recente do Brasil, por Maria Luiza A. M. Feitosa

Descaminhos do Lawfare na realidade recente do Brasil

O que acontece conosco?

Maria Luiza Pereira de Alencar Mayer Feitosa1

  1. INTRODUÇÃO

Quando os professores Helena Esser dos Reis e Osmar Pires Martins Júnior me convidaram para ministrar uma aula na disciplina ‘Tópicos Avançados em Direito Humanos”, em edição dedicada ao tema do lawfare como ameaça aos direitos humanos, do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Goiás, fiquei na dúvida se deveria discorrer sobre o livro Lawfare: o Calvário da Democracia Brasileira, que organizei juntamente com os professores Giselle Cittadino e Leonam Liziero, em 2020, ou se deveria arrazoar sobre essa temática de um modo geral. Então tentei contemporizar as duas coisas, avisando, de antemão, que minha formação não era de processualista ou criminalista, mas que o assunto lawfare me desperta o interesse por seus impactos nas democracias periféricas assim como sobre as políticas socioeconômicas nesses mesmos espaços. É o que trago a este capítulo.

Tenho participado de diversos eventos on line sobre a temática, no Brasil e fora dele. Em maio deste ano de 2021, palestrei no colóquio anual da Law and Society Association cujo título foi Lawfare in Brazil: the reasons behind proeminent cases. Em outubro e em dezembro próximos haverá novos eventos no âmbito da América Latina, em áreas que transcendem o campo do direito, dada a transversalidade desse tema, que abrange política, economia, direito, jornalismo, história, gestão pública, linguagem e linguística, entre outras. Cientistas sociais e humanos, preocupados com o momento punitivista e com o estado de permanente exceção que atravessa o Brasil na atualidade, nomeadamente depois da Operação Lava Jato e das crises provocadas pelo governo Bolsonaro, procuram compreender o contexto amplo desse processo de modo a lançar luzes sobre sombras e lacunas.

No Brasil, os últimos meses de março e abril foram especialmente importantes no debate sobre lawfare. Em 23 de março, a segunda turma do Supremo Tribunal Federal, por três votos a dois, firmou entendimento em favor da suspeição do ex-Juiz Sérgio Moro no processo do tríplex do Guarujá, que havia resultado na dupla condenação do ex-presidente Lula, em primeira e segunda instâncias. Em seguida, nos dias 15 e 22 de abril, o plenário do STF formou maioria para manter a decisão de suspeição do juiz assim como para declarar a incompetência do juízo (vara da Justiça Federal, comarca de Curitiba), por fim, como resultado, ordenou que os quatro processos contra Lula da Operação Lava Jato (um do tríplex, outro do sítio de Atibaia e dois do Instituto Lula) fossem remetidos para a vara da Justiça Federal em Brasília. Destes, o segundo processo, relativo à alegação de propriedade de um sítio em Atibaia, São Paulo, em novo foro, a despeito da confirmação de nova denúncia pelo Ministério Público Federal em Brasília, foi encerrado pela Juíza da 12ª vara, por falta de provas.

Desconfigurada a farsa judicial que representou a Lava Jato, ao menos no que toca ao ex- presidente Lula, a contra narrativa sobre o lawfare ganhou força e visibilidade ainda maior. Finalmente, o STF rejeitou o “vale tudo do judiciário” para perseguir e prender inimigos políticos, ao tempo em que apontou excessos de Moro cometidos mesmo antes da entrada em cena do hacker e do site The Intercept, como foram as conduções coercitivas e as prisões preventivas abusivas (em quantidade e pelo tempo de duração), censurando a interceptação telefônica de advogados de defesa e o vazamento do grampo ilegal de conversas entre os ex-presidentes Lula e Dilma, entre outros abusos, ao tempo em que deixava evidente, todavia, que as críticas ao modus operandi do ex-juiz Moro não poderiam ser confundidas com defesa da corrupção, interpretação distorcida que servia unicamente para desqualificar a pauta em julgamento. Tratava-se, pois, para os Ministros que se posicionaram favoravelmente ao pedido da defesa do ex-presidente, de reposicionar a crença e a confiança na prevalência do devido processo legal.

Os processos contra Lula na Operação Lava Jato têm sido apontados como um leading case amplo em termos de lawfare no Brasil e no mundo. Em 2014, uma investigação aparentemente normal de desvios na Petrobras foi ganhando notoriedade a partir do espaço dado pela grande mídia e logo depois passou a pautar os principais noticiários, os tribunais superiores, o parlamento brasileiro e a opinião pública nacional. A Lava Jato foi transformada num rolo compressor e espetáculo midiático que demonizava os réus enquanto distinguia e heroificava o juiz condutor, Sergio Moro.

Algum tempo depois, em 2021, a desconfiguração desse esquema pela Suprema Corte de Justiça do país confirmou o discurso de que o ex-presidente Lula era, na verdade, vítima de lawfare. Mas não foi o único caso. Além do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e suas peculiaridades de processo político-jurídico, outras ações penais eivadas de vícios semelhantes podem ser apontadas antes, durante e depois dos processos contra Lula, em Estados da federação, algumas ainda ativas e danosas, fato que torna imperiosa a vigília democrática e a manutenção do campo de pesquisa relativo a esse assunto, vertentes que representam, ao fim e ao cabo, a defesa do Estado Democrático de Direito.

II. BREVE CONCEITO E CONTEXTUALIZAÇÃO DO LAWFARE NO BRASIL

Ao longo da história, a instrumentalização do sistema de justiça para o cometimento de abusos foi algo que aconteceu de maneira reiterada. Basta verificar-se, por exemplo, o julgamento do filósofo Sócrates e os julgamentos autoritários pela via do “Direito do Estado de Exceção”, como era a justiça nazista, de Hitler, e casos assemelhados. O direito é como uma vestimenta, cujo valor vai depender do seu conteúdo – podendo ser autoritário ou democrático, basta que, para tanto, se maneje constitucionalmente (ou não) a substância.

Perseguições sempre aconteceram na história, todavia, a sistematização da caçada criminal, por agentes públicos dos poderes do Estado, a grupos e pessoas, em face de objetivos estranhos ao processo sub judice, geralmente para manietar lideranças progressistas em países periféricos, é algo relativamente novo. Teria iniciado, no mundo, após o fatídico 11 de setembro de 2001, através da chamada “guerra híbrida”, expressão que estudiosos atribuem similaridade ao termo lawfare.

Na verdade, a palavra lawfare é um neologismo – resulta da junção de law, que significa “direito” e warfare, “guerra”. Seria assim uma guerra provocada por meio do direito, mais do que abuso de poder, é abuso do direito pelo(s) poder(es), em contexto de judicialização da política, no sentido pejorativo do termo, visto que o lawfare representa a instrumentalização do sistema de justiça para preservar aparência de legalidade e mudar profundamente o conteúdo das contendas, necessitando, pois, da ação aparentemente neutra da burocracia estatal, em nível interno e internacional, quando for o caso (ZANIN et alli, 2019).

Nesse sentido, foi depois da queda das Torres Gêmeas que os Estados Unidos resolveram avançar sobre os países do Oriente Médio com uma proposta diferente de guerra, manipulando em primeiro lugar os organismos das Nações Unidas. Bush chegou a denominar a nova intervenção armada de “guerra humanitária”, falaciosamente utilizada para “restabelecer a democracia” e “combater o terrorismo”. Neste ponto se encontra o primeiro elemento do lawfare, que é a escolha de um inimigo, que não precisa ser uma pessoa – pode ser, por exemplo, uma ideia. Foi com esse propósito que um coronel do exército norte-americano projetou a expressão como substitutiva da guerra. Ao cabo de vinte anos, tome-se como sequela nociva a guerra na Síria e agora a funesta retirada dos EUA do Afeganistão, tragédias humanas, que mostram a falácia do argumento de invadir para humanizar.

No Brasil, o lawfare se projetou com expressiva força e coordenação contra os governos populares e desenvolvimentistas de Lula e Dilma. O embrião pode ter sido o caso Mensalão, aplaudido à época como um “momento simbólico” para a busca de transparência e combate à corrupção. Esse movimento teria iniciado mediante a pressão da sociedade brasileira pelo impeachment do ex-presidente Collor, em 1992, que representaria, lá atrás, o marco zero de um processo de “aperfeiçoamento democrático”, assinalado pelo ativismo político dos órgãos de controle do Estado, de onde se destacam as ações do Ministério Público, dos Tribunais de Contas e da Corregedoria Geral da União (CGU), com forte ressonância no Poder Judiciário, que passara a adjudicar penas pesadas nas ações de improbidade administrativa, ao cumular multas, perda do cargo público, suspensão de direitos políticos e prisões.

Certamente, esses agentes públicos tiveram reforço legítimo de funções de fiscalização e de controle a partir do novo texto constitucional. O problema posterior é que se engajaram pessoalmente, como  “combatentes  anticorrupção”, com aberto, apreciável  e invejável respaldo midiático, perdendo, com isso, muitos deles, a sobriedade necessária para a condução legal e legítima dos processos sob sua alçada e competência. Não se conseguiu, no Brasil, alcançar a temperança e o equilíbrio entre as medidas de combate à corrupção – contexto endêmico, sistêmico e até epidêmico no país, desde sempre – e a preservação das pautas econômicas de desenvolvimento e de incremento ao mercado interno levadas a efeito pelos governos populares.

Na sequência do reforço do Estado, muitas leis foram sendo editadas, em ratificação a tratados internacionais, como a lei da ficha limpa, a lei de combate à lavagem de dinheiro e a lei das organizações criminosas. Foram igualmente discutidas no Congresso Nacional medidas para a responsabilização penal da pessoa jurídica e empreendidas atuações para o cumprimento da lei de responsabilidade fiscal, execução da legislação do pregão eletrônico (2000), instalação do portal da transparência (2004), Cadastro de Empresas Inidôneas (2008), visibilidade aos sites da copa e dos jogos olímpicos (2014 e 2016), entre diversas outras. Essa relevante agenda (e medidas assemelhadas) precisa ser conduzida dentro dos parâmetros normativos e executórios de abstração, generalidade, imperatividade, uniformidade, heteronomia e regularidade.

III. CASOS DE LAWFARE NO BRASIL

3.1 O processo geopolítico e econômico a partir de 2001 e a interlocução com o lawfare.

No conjunto, o primeiro processo que mobilizou o Judiciário como poder, inclusive o seu órgão máximo, e encarnou uma espécie de crítica abrangente ao sistema político brasileiro, foi o Mensalão (aberto em 2004). Depois disso, em projeção crescente, os clamores populares contra a impunidade foram aportando aos Tribunais, que, não raras vezes, se convenciam a priori do desfecho do caso, julgando o processo e os processados por “atos jurídicos indeterminados”, como aconteceu no caso do tríplex atribuído a Lula. É da ministra Rosa Weber a frase “não há provas, mas a literatura me permite”, usada para condenar o ex-ministro José Dirceu, apontado como o “líder” da suposta organização criminosa no caso Mensalão. O germe dessa atuação política, de cores fortes, que afrontava o devido processo legal, esteve presente nesse julgamento, mesmo no âmbito do Supremo, e tudo se agudizou a partir da aprovação da Lei das Organizações Criminosas, em 2013.

A suposta causa do lawfare no Brasil foi, pois, a “luta anticorrupção”, tipo de “guerra santa” contra essa condição endêmica da sociedade brasileira, estranhamente atribuída ao Partido dos Trabalhadores (PT), cujo chefe, para todos os efeitos, era Lula. Alçada ao patamar de controle estatal através da ideia de responsividade, que tem suas raízes na teoria da accountability, a meta de controle administrativo de excessos cometidos por agentes públicos foi sendo extrapolada, pelos agentes públicos, até se tornar ela própria abusiva, ao ponto de hoje, muitos deles, diante da comprovação de lawfare, necessitarem ser investigados e punidos exemplarmente.

Do ponto de vista da política econômica, tudo começou quando Lula, recém-eleito, foi aos EUA a convite do ex-presidente Bush, que estava então envolvido com os preparativos para a guerra ao Iraque, iniciada em março de 2003. Lula disse “não” ao pedido de adesão feito por Bush, afirmando que a guerra do Brasil era contra a fome. Em paralelo, o governo Lula foi fortalecendo a presença das empresas brasileiras no exterior, especialmente em áreas como construção civil e minérios – para se ter uma ideia, à época, a Odebrecht era a maior empresa da América Latina e construiu o aeroporto de Miami; a Petrobras descobrira o pré-sal e sua tecnologia de exploração; o BNDES financiava projetos de crescimento aqui e em outros países. O Brasil se atrevia a ser grande e este é um componente importante do lawfare, qual seja o avanço da política econômica autônoma dos países periféricos, como o nosso, quando suas corporações começaram a interferir na geopolítica mundial de forma diferente.

À época, inflamada pelo terrorismo e pela luta anticorrupção, a geopolítica internacional se desequilibrava diante da consolidação de linhas transversais de comércio internacional e da criação do Brics, por exemplo, bloco econômico formado pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Para os Estados Unidos, o foco da cruzada no caso brasileiro abrangia as questões da associação colateral com outros países, do crescimento de empresas especialmente fomentado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), assim como do avanço da Petrobras no mercado internacional de petróleo, para citar os principais motivos. Acreditava-se (e divulgava-se) que o BNDES seria a maior caixa-preta da história, pronta a escandalizar o país, tanto que, quando Temer assumiu, consumado o Golpe, foi feita minuciosa auditoria no Banco que concluiu pela lisura e adequação dos seus procedimentos, mas, como era o BNDES que incentivava as empresas, o foco das denúncias passava também por ele. A investigação da Petrobras, por sua vez, estava a cargo da Operação Lava Jato.

Em 2015, Julian Assange divulgou que o governo Dilma estava sendo espionado pelos Estados Unidos há algum tempo, durante o governo Obama. Não se estranhe porque, no contexto da política externa americana, tanto faz um governo como outro – como dizia um diplomata brasileiro, países não têm sentimentos, têm interesses. Por exemplo, vemos agora, com relação a Cuba, que Biden pode ser até pior do que Trump. Internamente, embora Biden realize um governo mais humano do que Trump, quanto às relações internacionais, entretanto, não há muita diferença, posto que o presidente dos EUA será sempre um predador – essa é a natureza do império.

Em paralelo, desde o infausto 2001, o mote da cruzada contra o inimigo (no caso, eram dois inimigos – o terrorismo no Oriente Médio e a corrupção em outras áreas periféricas) levou ao fortalecimento da lei anticorrupção nos Estados Unidos, através de ações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade supostamente criada para os objetivos de cooperação e desenvolvimento econômico, mas que, na verdade, defende interesses dos Estados Unidos sobre o resto do mundo. No campo econômico, o combate à corrupção de empresas estrangeiras é feito pela Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), lei anticorrupção americana, de 1977, que antes somente punia empresas americanas, mas excepcionalmente passou a exercer jurisdição mundial, e pela Foreign Intelligence Surveillance Act (FISA), lei de vigilância, ambas ampliadas, em 2001, depois do 11 de setembro, pela Patriotic Act, decreto-lei assinado por Bush em 26 de outubro, norma casuística instituída diante da situação extraordinária.

Nesse sentido, com o aval da Patriotic Act, grupos especializados em anticorrupção da OCDE passaram a exigir de outros países a edição e a aprovação de leis internas semelhantes à FCPA, com similares mecanismos. Esses procedimentos já apresentavam a cara do lawfare, a começar por escolher um inimigo e tê-lo como o agente a ser destruído, mediante a flexibilização de diversas garantias legais. Eles passaram, então, a treinar grupos de trabalho e agentes pelo mundo, inclusive no Brasil, com esse objetivo. Segundo se comprovou, o ex-juiz Moro, por exemplo, era um agente treinado2.

Em 2009, a Conferência Anual dos Agentes Federais brasileiros, realizada na cidade de Fortaleza, contou com a participação e o treinamento de agentes americanos. Em inglês, os palestrantes da OCDE recomendavam que era necessário pegar o rei: “It’s necessary to go after the king”, em desdobramento, a regra seguinte ali pedagogicamente ensinada dizia ser imprescindível que as pessoas odiassem esse rei. Em suma, a fórmula indicava que todo esquema de corrupção tem um comando e, para desbaratá-lo, a solução seria usar o sistema de justiça criminal, aliado ao poder da mídia, caso se tratasse de liderança política, nesse sentido, para alcançar o propósito maior, não seria excessivo pensar que os fins justificariam os meios.

Os fatos aqui relatados são esmiuçados aos detalhes em matéria do jornal francês Le Monde, do dia 10 de abril de 2021, assinada por Nicolas Bourcier e Gaspard Estrada, diretor-executivo do Observatório Político da América Latina e do Caribe (Opalc) da Universidade Sciences Po de Paris3. Segundo esse texto, o que começou como a “maior operação contra a corrupção do mundo” acabou degenerando no maior escândalo de corrupção judicial do planeta e não passava, na verdade, de uma estratégia bem-sucedida dos Estados Unidos para minar a autonomia geopolítica brasileira, acabando com a ameaça representada pelo crescimento de empresas que colocariam em risco seus próprios interesses.

3.2. A campanha contra a corrupção e a criminalização da política no Brasil

No Brasil, acusar políticos de corruptos é uma prática antiga, frequentemente utilizada como arma da oposição, para desgastar a imagem de uma liderança ou de um governo. Na sequência do segundo governo Lula, mais ou menos a partir de 20104, a configuração sociocultural e política brasileira vai se tornando crescentemente dramática, mediante a aplicação da fórmula indicada no treinamento da Polícia Federal (PF), processo que foi gerando a convicção da existência de um “mar de lama de corrupção”, narrativa adotada pela oposição e pela mídia, especialmente contra o partido do governo, qual seja o PT. Esse mesmo processo havia sido utilizado, em 1954, para atacar Getúlio Vargas, levando-o ao suicídio, no entanto, o ineditismo do cenário nacional recente era a acusação generalizada de que os políticos e suas instituições formaram quadrilhas, nos moldes do crime organizado, um tipo de deslocamento semântico que aportou ao processo jurídico-criminal através de alcunhas como “Mensalão”, “Petrolão”, “Quadrilhão do PT”5 6, dadas pela PF ou mesmo pela mídia, fato que retira a corrupção do terreno do embate político levando-a para a esfera criminal, em fenômeno de clara criminalização da política.

Em agosto de 2013, pressionada pelas “jornadas de junho”, a então presidente Dilma Rousseff sancionou apressadamente as leis 12.846 e 12.850, respectivamente apelidadas de “lei anticorrupção” e “lei do crime organizado”. A primeira dispunha sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, no objetivo declarado de criar mecanismos para tornar mais efetiva a punição dos corruptores, com especial atenção para as fraudes em licitações, permitindo o chamado “acordo de leniência”, que consiste em pactos firmados entre infratores e os respectivos órgãos responsáveis pelos processos de investigações criminais. A segunda lei redefiniu o conceito de crime organizado, estendendo seu alcance ao funcionalismo público, no objetivo declarado de atingir, entre outros, os crimes de colarinho branco, estabelecendo, para tanto, a chamada “colaboração premiada” como instrumento de investigação e de produção de provas, entronizado como recurso processual.

As consequências políticas dessas duas leis foram inesperadas, fugindo ao cálculo do legislador e da própria presidente Dilma, porque abriram caminho para um perigoso processo de criminalização da política, substrato de inédito ativismo judicial midiático. Em março de 2014, dois meses depois da vigência da lei do crime organizado ou das organizações criminosas (ORCRIM), foi aberta a operação Lava Jato, a partir de investigações deflagradas pela Polícia Federal sobre supostos esquemas de corrupção envolvendo a Petrobrás, mediante a participação ativa de membros do Ministério Público Federal e da Justiça Federal, na comarca liderada por Sérgio Moro, na cidade de Curitiba.

Ocorre que em outubro de 2014, para surpresa de muitos, Dilma Rousseff foi reeleita. Iniciou o segundo mandato, em janeiro de 2015, com enormes dificuldades para governar, visto perder a liderança da Câmara Federal para Eduardo Cunha, deputado ligado ao vice-presidente, Michel Temer. Com o apoio da grande mídia, em pouco tempo, a Lava Jato foi-se tornando o principal foco de desagaste do governo, convulsionando o país e criando as condições para o impedimento da presidente, mediante um invulgar golpe de Estado, com os atributos do então desconhecido fenômeno chamado lawfare, tipo de ativismo judicial engajado, célere e incomum, que lançou mão de estratégias criativas sobre a lei de responsabilidade fiscal, mantendo as aparências da lei do impeachment, de modo a usar o processo como elemento de intromissão no jogo da política7.

Atente-se que, no terreno da justiça criminal, acordo de leniência e delação premiada são instrumentos usados pelas leis americanas mencionadas e que o ex-juiz Sérgio Moro foi treinado para aplicação de seu uso de forma parcial e empenhada, no âmbito da operação que comandava. O pior, no Brasil, é que houve uma mistura de papeis – em nome do combate à corrupção, a lei anticorrupção foi sendo substituída pela crescente utilização da lei de combate ao crime organizado e, desse modo, a empresários e empresas era oferecido o benefício da delação premiada (não do acordo de leniência), no objetivo (dissimulado ou não) de alcançar o rei (the king), que seria(m) o(s) político(s) e as máquinas partidárias, redefinidos como chefes de quadrilhas organizadas.

Especialistas e estudiosos apontam aí o abuso do uso da lei do crime organizado como remédio para atacar o que o MP considerava como esquema de corrupção. É como aplicar um antibiótico geral de ação potente para qualquer arranhão, em movimento que passou a criminalizar práticas até então toleradas como normais ao jogo político  ou mesmo à gestão pública, esmaecendo a fronteira entre o que é próprio da política e o que é um ilícito criminal. Para Burgos (2018, cit.), além deste, teria havido a sequela colateral da criminalização das lideranças políticas progressistas, efeito que permitiu à grande mídia descortinar um lance muito mais ousado, qual seja o de “deslocar o eixo da política no país”, abrindo passagem para a pauta neoliberal que vivemos hoje. Este  é realmente o ápice da finalidade do lawfare.

IV. A OPERAÇÃO LAVA JATO ALCANÇOU DILMA E LULA

Foi assim que a Lava Jato alcançou Lula e o prendeu, em 2018, ano da eleição presidencial, mas já havia acertado Dilma, no impeachment. Explico. Os dois principais casos de lawfare político no Brasil envolvem o impeachment sem causa da ex-presidente Dilma Rousseff (2016) e os processos sem provas contra o ex-presidente Lula, culminando no julgamento em segunda instância do processo do tríplex do Guarujá, anteriormente mencionado. Esse primeiro desfecho somente foi possível porque o Supremo Tribunal Federal, embalado pela narrativa midiática de apoio à Operação Lava Jato, adotara interpretação anticonstitucional de que a letra explícita do art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, poderia ser reinterpretada de modo a permitir a prisão depois da condenação em segunda instância, ou seja, antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Sabe-se que esses processos são distintos – um de natureza político-jurídica (impeachment) e o outro de natureza jurídico-criminal (tipos delituosos atribuídos a Lula). Então como a Lava Jato chegou a afetar o impeachment de Dilma? A chamada Força Tarefa trabalhou duramente para incendiar a cena política ao longo dos anos de 2015 a 2018. Ao fim e ao cabo, ambos os processos se igualam nas seguintes características: politização da justiça; intervenção judicial no realinhamento das forças políticas no país; acasalamento de interesses geopolíticos com poderes que formam a burocracia estatal e com a grande mídia; ruptura institucional que afastou e descredibilizou forças do campo político progressista através da ação de agentes do Estado. Atente-se que esta descrição é típica de lawfare (2020).

Na verdade, a mesma Operação Lava Jato que alcançou Lula, tinha tentado antes chegar até Dilma através das delações premiadas de empresários, mas suspendeu este caminho quando o então Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, lavajatista orgulhoso, informou não haver encontrado parâmetros legais para enquadrar a Presidenta reeleita em crimes de responsabilidade, assinalando que as referências a ela não eram substanciais. Diante disso, restou a Eduardo Cunho, presidente da Câmara dos Deputados, a alternativa de dar o passo inicial no sentido do impedimento, pondo-se à espreita da melhor oportunidade.

Contra Dilma, não havia provas. No entanto, desde a reeleição, a presidente enfrentou a implícita decisão tomada pelo Parlamento nacional de não lhe permitir governar até encontrar um motivo apto para abrir o processo de impedimento, fato que ocorreu com as chamadas “pedaladas fiscais” e a abertura de créditos suplementares sem autorização legislativa (mas sequencialmente repostos). Essas práticas eram comuns na gestão pública e foram cometidas por ela própria no mandato anterior, mas também por Lula e Fernando Henrique Cardoso, assim, a rigor, embora não houvesse claramente um ilícito típico, o pedido de impeachment foi apressadamente acatado, pretexto que somente valeu contra ela, nem antes, nem depois, visto que, no dia seguinte à decisão do Senado que a alijou do mandato popular, foi aprovada, pelo mesmo Senado, a Lei 13.332/2016, publicada no Diário Oficial da União do dia 02 de setembro de 20168, autorizando e permitindo as tais pedaladas.

Cumprido o impeachment contra Dilma, Temer assumiu interinamente até as eleições presidenciais de 2018 e cuidou de avançar com a pauta das contrarreformas neoliberais. Em paralelo, no âmbito da Operação Lava Jato, foi efetivada uma manobra processual para atrair para a Comarca federal de Curitiba, uma acusação que se passava no foro comum ordinário do Estado de São Paulo e Lula foi acusado pelos crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro, em face de uma suposta reforma realizada pela construtora OAS na cozinha de um apartamento na praia do Guarujá, São Paulo, que não era de sua propriedade, mas, segundo a acusação, em processo carente de provas documentais, deveria vir a beneficiar o ex-Presidente, caso não tivesse sido obstada pela ação judicial, no ano de 2016. Lembre-se que a Lava Jato tinha competência para processos envolvendo desvios da Petrobras, assim, a contorção aqui abrange o lugar e a matéria.

Na sequência, muitos óbices legais e constitucionais ainda precisariam ser “removidos” para garantir a retirada de Lula da disputa eleitoral. Ele precisava ser condenado em duas instâncias e o Supremo precisava alterar o entendimento sobre o artigo 5º, LXII, da CF para ocorrer a prisão e a consequente inelegibilidade. Às pressas, tudo foi garantido conforme o script. Desse modo, ambos os processos (contra Dilma e contra Lula) são exemplos claros de prática de lawfare, a despeito de suas diferenças, depois, há evidentes interesses geopolíticos internacionais e estratégicos por trás dos dois casos e o modus operandi foi, de certa forma, bastante similar, tendo provocado, afinal, dois impedimentos.

V. A    VAZA     JATO     E    O     SUPREMO     TRIBUNAL    FEDERAL DESMONTAM ACABAM POR DESMONTAR A FARSA

No total, Lula respondeu a dezessete processos9 e foi condenado em duas ações penais, no âmbito da Operação Lava Jato, ambas pela denúncia de recebimento de propinas disfarçadas de reformas feitas em imóveis (um apartamento e um sítio) que, comprovadamente, não são (jamais foram) de sua propriedade. No entanto, os processos da Lava Jato sofreram revezes importantes. O primeiro e mais expressivo foi a divulgação paulatina, a partir de meados de 2019, por agentes da grande imprensa brasileira, liderada pelo periódico virtual The Intercept Brazil, capitaneado pelo jornalista Glenn Greenwald, do vazamento de conversas, realizadas através do aplicativo telegrama, entre o ex-juiz Moro e o Procurador Deltan Dallagnol, além de outros integrantes da força-tarefa da Lava Jato.

As transcrições, depois de conferidas e constatadas como verdadeiras pelo grupo de jornalistas (e depois pela PF), indicaram que Moro cedia rotineiramente informações privilegiadas à acusação, auxiliava o Ministério Público Federal (MPF) a construir os casos, sugeria modificação nas fases da operação Lava Jato, cobrava agilidade em novas operações e fornecia pistas, entre outras irregularidades. Através da chamada Operação Spoofing, que prendeu os hackers, essas gravações ilegais chegaram ao Supremo, que as liberou à defesa do ex-presidente, que, por sua vez, reativou o julgamento do caso de incompetência do ex-juiz Moro, no Habeas Corpus nº 193.726 impetrado em abril de 2020. As condenações impostas no âmbito da Lava Jato foram anuladas e a instância foi (um tanto inexplicavelmente) alterada para Brasília, no entanto, o reconhecimento da suspeição do juiz contaminou todo o restante.

Outro revés sofrido pela Lava Jato foi a revogação pelo Congresso Nacional de parte do pacote legal proposto pelo Ministério Público Federal, nomeadamente, através do procurador Deltan Dallagnol, que reunia o conjunto das chamadas “Dez Medidas de Combate à Corrupção”, ação político-legislativa do MPF, avalizada por mais de 2 milhões de assinaturas, em caríssima campanha nacional midiática. Das dez medidas originais, somente quatro passaram (e parcialmente), como as medidas de transparência a serem adotadas por tribunais, a criminalização do caixa dois, o agravamento de penas para corrupção e a limitação do uso de recursos com o fim de atrasar processos.

Desse modo, o caminho político iniciado com o projeto das Dez Medidas, nas quais o juiz Sergio Moro e os membros da força-tarefa da Lava Jato defendiam claras violações constitucionais, foi interrompido. Entre outras inomináveis transgressões à Constituição e a tratados internacionais, estavam pontos como restrição ao Habeas Corpus, utilização de prova ilícita, supressão de recursos e execução das penas antes do trânsito em julgado, que, no conjunto, representavam a tentativa de criminalização da política e a politização da justiça criminal, instrumentalizadas mediante agressiva campanha de marketing e trabalho massivo de grupos obscuros nas redes sociais.

Uma terceira vicissitude nas intenções políticas dos agentes da Lava Jato foi a recusa, em abril de 2019, pelo Supremo Tribunal, de um acordo absurdamente firmado entre os procuradores federais de Curitiba e a Petrobras, depois da vinda de agentes do Departamento de Justiça e do FBI norte-americanos a Curitiba, em outubro de 2015. Esse pacto previa o depósito de R$ 2,5 bilhões da Petrobras em uma conta vinculada à 13ª Vara Federal de Curitiba, a serem geridos por fundação controlada pelo MPF, além de garantir que a Lava Jato se tornasse um canal para o governo dos Estados Unidos ter acesso a informações estratégicas de negócios da Petrobras, como cláusula para que o dinheiro não ficasse nos EUA. Atendendo a recurso impetrado, ainda em 2018, pela Procuradoria- Geral da República, o Supremo Tribunal Federal decretou a nulidade do acordo, no mesmo dia em que o MPF anunciou a suspensão da criação desse fundo10.

Diante de tudo isso, em novembro de 2019, Lula foi solto e entre março e abril de 2021, a comarca de Curitiba foi reconhecida como foro incompetente e o ex-juiz Moro declarado parcial e suspeito nos casos contra o ex-presidente. Por disposição do Código de Processo Penal (art. 96 do CPP), entre a exceção de suspeição do juiz e a exceção de incompetência do juízo, em face do direito subjetivo do acusado de ser processado e julgado por um julgador imparcial, prioriza-se a suspeição. Diante da anulação dos processos, o ex-presidente recuperou os seus direitos políticos e, certamente, sua dignidade pessoal.

VI. A OPERAÇÃO CALVÁRIO NA PARAÍBA

A Lava Jato fez escola e treinou agentes. Na Paraíba, em dezembro de 2019, dezessete pessoas, ligadas ao ex-governador Ricardo Coutinho (inclusive ele próprio) foram presas, às vésperas do Natal e  do  recesso  forense  de  final  de  ano.  A  chamada Operação Calvário fora deflagrada em dezembro de 2018 e o modus operandi despertou a atenção pela similaridade com a Lava Jato. No dia seguinte, um texto importante do jurista e membro do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Lenio Streck, foi nacionalmente divulgado apontando a repetição do fenômeno, ao tempo em que alertava para a indevida apropriação moral e política do direito por agentes do Estado (no caso, MP e Judiciário), em ação que degradava o Estado de Direito.

Segundo Lenio Streck, após um ano de investigações sigilosas, o Ministério Público estadual, através do GAECO (grupo especial de combate à corrupção e ao crime organizado), aguardou estrategicamente o final do ano-judiciário para ajuizar medida cautelar inominada, requerendo ao Tribunal de Justiça da Paraíba a decretação da prisão preventiva de dezessete pessoas, além do deferimento de diversos mandados de busca e apreensão. O jurista denunciou um manifesto agir estratégico do MP, em parceira com o Tribunal de Justiça do Estado, às vésperas do recesso forense, fato que dificultava o exercício da defesa e interferia no princípio da paridade de armas.

O jurista ainda detalhou a falta de coincidência nos prazos e o pedido de prisão preventiva baseado, exclusivamente, no teor de delações premiadas realizadas, todas elas, por pessoas presas preventivamente e cujos acordos resultaram na liberdade provisória dos colaboradores. Para o jurista, esse fato era gravíssimo, em primeiro lugar, por ignorar solenemente a deliberação do STF de que a simples palavra do delator não servia para subsidiar, plenipotenciariamente, o oferecimento de denúncia, muito menos para a decretação de prisão preventiva. Em segundo lugar, a Lei nº 13.964 (Pacote Anticrime), aprovada antes da denúncia, estabelece no §16 do artigo 4º que “medidas cautelares pessoais” e “recebimento de denúncia” não serão decretadas com fundamento apenas nas declarações do colaborador. Significa que a nova lei repetiu o entendimento pacífico da jurisprudência do STF, mas o sistema de justiça da Paraíba desconheceu a ambos.

A partir daí, uma sequência de fatos (aqui não detalhados, por não serem objeto do ensaio) indica a presença de lawfare nos procedimentos empreendidos pelo MP da Paraíba. O texto de Lenio Streck, colacionado ao livro Lawfare: o calvário da democracia brasileira, representa uma belíssima ode a um Ministério Público imparcial e não estrategista, como agente político que possui as mesmas garantias da magistratura para não se comportar como advogado, exatamente para ser imparcial, conforme exige o Estatuto de Roma (art. 54 — incorporado ao Brasil em 2002) nas mais desenvolvidas democracias do mundo.

CONCLUSÕES

Em sede de conclusão, é preciso enaltecer a importante e necessária reação jurídica de advogados, defensores, instituições e associações acadêmicas que buscaram no Supremo Tribunal Federal a reafirmação da força normativa da constituição, embora esse tribunal tenha se esquivado diversas vezes de cumprir o seu mister para dar ouvidos às chamadas “vozes das ruas” no contexto desse processo de exercício abusivo do sistema de justiça aqui detalhado e conhecido como lawfare. O STF poderia, por exemplo, não ter admitido a legalidade de um impeachment sem crime de responsabilidade; poderia ter respeitado o texto literal do art. 5º, LVII da Constituição e evitado a prisão de Lula em segunda instância, mantendo sua elegibilidade; poderia ter colocado a Lava Jato sob suspeição quando Moro foi nomeado ministro de Bolsonaro. Na verdade, o STF somente despertou depois de ouvir os áudios da Vaza Jato, quando finalmente deu-se contas, como maioria, de que as intenções por detrás das ações igualmente o atingiam.

A insistência dos juristas comprometidos com a democracia e com o Estado de Direito foi especialmente relevante para formar o contraponto, ao abalizar versões que reinterpretavam os fatos à luz da Constituição. Muitas vezes, ao longo desse processo, foi preciso exibir provas fora dos autos, publicamente, por serem inadmitidas pelo juiz Moro e negadas à defesa; não raras vezes foi igualmente preciso reiterar que as garantias processuais não representavam um problema nos processos criminais, ao contrário, significavam décadas de avanço civilizatório.

Hoje, o Supremo Tribunal Federal voltou ao prumo constitucional, mas vem sendo mordido no calcanhar pelas mesmas vozes das ruas que outrora resolveu considerar. O governo Bolsonaro, acuado, tem forçado uma permanente crise institucional e jurídica, de magnitude nunca vista, principalmente contra o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional, ironicamente as duas instituições que permitiram o uso abusivo do processo como via de perseguição política. Neste momento, é preciso prudência aliada a uma firme reação em defesa do Estado Democrático de Direito. É necessário principalmente aprender com a história e admitir que não se pode abrir mão um milímetro das garantias civilizatórias expressas no texto constitucional em nome de qualquer fim provisório levado a cabo por falsos heróis, arautos de uma superficial moralidade, estranha ao direito e à realidade social e institucional da República. Não há finalidade melhor do que a garantia das regras, na estrita justificação do Estado de Direito.

***

1 Doutorado em Direito Econômico, pela Universidade Coimbra, concluído em 2005; pós-doutorado em Estado e Sociedade pela UFSC (Universidade Federal da Santa Catarina), concluído em 2011; ex- Diretora da Faculdade de Direito da UFPB (2013 a 2016); ex-Pró-Reitora de Pós-Graduação da Universidade Federal da Paraíba (2017-2020); professora titular aposentada e docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas da UFPB; bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq.

2 Disponível em: https://csalignac.jusbrasil.com.br/noticias/362318528/wikileaks-revela-treinamento-de- moro-nos-eua Acesso em: 8 de set./2021

3 O Mal em Nome do Bem. Paris, Le Monde, abril de 2021. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-abr-10/jornal-frances-mostra-eua-usaram-moro-lava-jato Acesso em: 08 de set./2021.

4 De 252 operações em 2010, a PF saltou para 550 em 2016, voltando a 229 em 2018 e 242 em 2019, saindo do foco preponderante midiático das ações envolvendo políticos. É o que se apura a partir dos Resumos das Operações           da              PF.                                                    Disponível                  em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_opera%C3%A7%C3%B5es_da_Pol%C3%ADcia_Federal_do_Bra sil#2009 Acesso em: 08 de set./2021

5 Eliara Santana (2020) destaca que, na narrativa midiática, a construção designativa que remete à corrupção foi recebendo a desinência nominal “ão”, utilizada nos substantivos e adjetivos indica uma dimensão exagerada, algo muito grande.

6 Matéria do G1. “MP afirmou que não havia ‘elementos configuradores da dita organização criminosa’. Juiz federal disse que denúncia tentou ‘criminalizar a atividade política’”. O juiz Marcus Vinicius Reis Bastos, da 12ª Vara Federal em Brasília, em dezembro de 2019, absolveu os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, os ex-ministros Antônio Palocci e Guido Mantega, além do ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, na ação penal apelidada de “quadrilhão do PT”. O grupo respondia pelo crime de “organização criminosa”, por suspeita de formarem grupo para desviar dinheiro público da Petrobras e de outras estatais. Disponível em:

https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/12/04/justica-do-df-absolve-lula-dilma-palocci-mantega-e- vaccari-no-quadrilhao-do-pt.ghtml Acesso em: 08 de set./2021.

7 Marcelo Baumann Burgos, em “Criminalização da política e criminalidade violenta”. Disponível em: https://diplomatique.org.br/criminalizacao-da-politica-e-criminalidade-violenta/ Acesso em: 08 de set./2021.

8 Disponível em: Economia – iG @ https://economia.ig.com.br/2016-09-02/lei-orcamento.html. Acesso em: 25 de mai/2020.

9 Decisão proferida pela Juíza Federal Pollyanna Kelly Maciel Martins Alves, da 12ª. Vara Federal de  Brasília, no dia 21 de agosto de 2021, rejeitou o pedido do procurador da República, Frederico Paiva, para reinício da ação penal no caso do “sítio de Atibaia”, processo originariamente instaurado em Curitiba, mas anteriormente anulado pelo Supremo Tribunal Federal ao reconhecer a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba e a suspeição do ex-juiz Sergio Moro. Lula foi acusado em 17 processos diferentes geralmente envolvendo tráfico de influência, corrupção ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Foi inocentado em todos eles. Disponível em: https://pt.org.br/lula-17-vezes-acusado-17-vezes-inocentado- veja-em-imagens/ e https://www.conjur.com.br/2021-jun-21/restam-lula-tres-acoes-tramitacao-justica- federal Acesso em: 07 de set./2021.

10 Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-dez-25/fundo-mpf-dinheiro-petrobras-foi-descoberto- marco Acesso em: 07 de set./2021.

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