Tania Maria de Oliveira
Tânia M. S. Oliveira é advogada, historiadora, pesquisadora e membra da ABJD. Secretaria-executiva adjunta da Secretaria Geral da Presidência da República.
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O Congresso se impõe a Bolsonaro: temos uma lei de abuso de autoridade, por Tania Maria de Oliveira

Como afirmou na tribuna o líder do PT no Senado, Humberto Costa, foi uma “derrota do discurso farisaico”

O Congresso se impõe a Bolsonaro: temos uma lei de abuso de autoridade

por Tania Maria de Oliveira

O Congresso Nacional votou nesta terça-feira (24) os vetos à Lei de Abuso de Autoridade. Dos 33 textos vetados, 18 foram restituídos, e 15 foram retirados da norma. O resultado simbolizou uma derrota para o governo Bolsonaro e o ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro, não apenas numérica, mas de conteúdo.

Na essência do projeto, foi preservado o texto quanto à possibilidade de ação penal privada subsidiária da pública (art. 3º), a criminalização da decretação  e manutenção de prisões ilegais (art. 9º), do constrangimento ao preso de produzir prova contra si mesmo (art. 13), da coação de pessoa para depoimento (art. 15), da obrigatoriedade do agente que identifica o preso (art. 16), da ausência de justa causa para persecução penal (art. 30), da obrigatoriedade de acesso pelo interessado ou seu advogado de qualquer peça de investigação ou diligência (art. 32), da antecipação de conteúdo em mídias de investigação não concluída (art. 38) e da violação de prerrogativa de advogado (art. 43).

O governo conseguiu remover da nova lei o crime por não retirada, pelo agente público, de erro relevante de que tenha conhecimento em processo ou procedimento (art. 34) e o de coibir, dificultar ou impedir o direito de reunião ou de associação (art. 35). Mas o saldo foi positivo, no ponto em que garante ao país uma legislação atual, que indica como crimes condutas de agentes que atuam impunemente de forma abusiva, ao arrepio das normas, em ações espetaculosas e midiáticas.

Como afirmou na tribuna o líder do PT no Senado, Humberto Costa, foi uma “derrota do discurso farisaico”, que fala de corrupção sem qualquer compromisso real com seu combate, sem passar jamais da retórica para o mundo real, negando a defesa integral do Estado de Direito, da liberdade, da democracia, das garantias individuais, dos direitos fundamentais da população brasileira, conquistas civilizatórias dos últimos séculos.

Temos uma lei. Longe de ser perfeita, mas com capacidade de se conformar em instrumento de auxílio ao enfrentamento de desvios exercidos por autoridades, e como esteio das garantias dos direitos dos cidadãos frente ao Estado, sempre que os arbítrios e desmandos se apresentarem. Uma mistura entre regulamentação de preceitos democráticos vigentes e difusos em diversas normas, com padronização de outros que necessitavam de melhor formatação.

Como toda norma, sua implementação será objeto de disputa social. Por ora houve a derrota dos que intentavam manter o atual estado de coisas, onde contrariar a Constituição, ignorar deveres, pautar-se por interesses meramente ideológicos, negar direitos elementares em busca de aprovação social, holofotes e ascensão política, são a praxe do comportamento. A vitória virá quando a sociedade utilizar o conteúdo da lei como ferramenta para enfrentar o autoritarismo.

Tania Maria de Oliveira é da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD

Tania Maria de Oliveira

Tânia M. S. Oliveira é advogada, historiadora, pesquisadora e membra da ABJD. Secretaria-executiva adjunta da Secretaria Geral da Presidência da República.

3 Comentários

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  1. Existiu a necessidade de se criar uma Lei de Abuso de Autoridade apenas porque, de 2014 para cá, quem deveria zelar pelos direitos constitucionais os ignorou. E o que foi mais escroto; apenas visavam atingir seus objetivos pessoais.
    Aí, se incha a legislação de penduricalhos, que apenas irão enriquecer escritórios de advocacia, os cursinhos e os “palestrantes” de complience, além de sobrecarregar as cortes maiores.

  2. Se é verdade que agora temos uma lei contra o abuso de autoridade, é bem verdade que nunca tivemos uma lei a favor do abuso de autoridade, ou seja,a tendência ê nula.
    Todo abuso de autoridade cometido,notadamente na operação comandada pelo camisa preta do Paraná e seus filhotes amestrados simplesmente foram fruto de ilegalidades que em momento algum foram contestadas pelas instâncias superiores.
    A lei agora aprovada tem a função de explicitar está irregularidade mas não tem o poder de saná -la,ou alguém acredita que as mesmas instâncias que permitiram esses abusos colocarão-se contra eles?
    Essa lei vai ser boa mesmo contra os governos de esquerda.
    Se com uma “pedalada” derrubaram uma presidenta da república imaginem o que não poderão fazer utilizando-se desta lei.

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