O terror das panelas cheias e silenciosas na periferia, por Fábio de Oliveira Ribeiro

 

Por Fábio de Oliveira Ribeiro

Ontem assisti o Gazeta Esportiva e desliguei a TV às 19 horas. Um pouco antes disto vi o programa do PT através de uma matéria no GGN. Após jantar lavei a louça, escovei os dentes, fiz a barba e naveguei algum tempo na internet. Por volta das 20 horas assisti um documentário sobre Pompéia. Por volta das 21 comecei a rever filme “12 homens e uma sentença” (1957). Ao fim do filme fui dormir. Não notei nada de excepcional. Só fiquei sabendo do suposto panelaço ao ligar o computador quando acordei http://www.cartacapital.com.br/blogs/parlatorio/programa-do-pt-em-rede-nacional-gera-2018panelaco2019-em-cidades-brasileiras-5840.html.

Moro na periferia Osasco, num condomínio residencial que poderia ser descrito como sendo de “classe C”. Onde estou há dezenas de torres de 7 andares com 4 apartamentos por andar. Ontem ninguém bateu panela no prédio onde moro. Silêncio absoluto nos prédios vizinhos. Muitos dos habitantes do condomínio não são petistas, nem votaram no PT. Mas me parece óbvio que eles sabem que suas vidas melhoraram nos últimos anos. O golpe de estado não é uma prioridade política no meio em que vivo.

O panelaço só despertou meu interesse como um fenômeno antropológico. O valor político do movimento é nulo por três motivos: os descontentes perderam eleições que foram limpas e homologadas pelo TSE; os votos deles não tem mais valor jurídico que os votos dos demais brasileiros; apesar de serem inteligentes, as novas TVs não transmitem o barulho das panelas às pessoas que aparecem nos programas políticos que, aliás, foram previamente gravados. O comportamento dos neo-paneleiros é ridículo e sem sentido. A esmagadora maioria da população não aderiu ao movimento. Portanto, o panelaço foi um panelacinho e só se tornou notícia porque foi divulgado pelas empresas de comunicação. Porque as revistas, jornais, telejornais e portais de internet não fizeram a cobertura do silêncio nos “outros” bairros? O que os “outros brasileiros” fazem ou deixam de fazer é indigno de ser noticiado?

Os cidadãos que bateram panelas parecem não estar satisfeitos. Eles estão passando fome? Não. Foram maltratados por uma polícia política? Não. O candidato deles foi preso ou impedido de participar da eleição presidencial? Não. Aécio Neves ganhou a eleição e foi impedido de tomar posse? Não. As economias dos neo-paneleiros foram bloqueadas, sequestradas ou confiscadas pelo governo federal? Não. Nos últimos anos eles ficaram mais ricos? Sim. Por mais que tente, não consigo encontrar motivos racionais para o panelacinho de ontem.

A única resposta que me ocorre é a seguinte: os neo-paneleiros estão tristes, deprimidos e perderam o contato com a realidade. Não convivo com eles, portanto, só posso fazer algumas suposições. Suponho que os manifestantes sempre se sentiram inferiores aos europeus e norte-americanos e compensaram este sentimento alimentando um complexo de superioridade sobre os “outros brasileiros”. Eles se distinguiam do povo pelo consumo. Agora que o povo pode consumir as mesmas coisas eles (imóveis, carros, passagens de avião, TVs de tela plana, celulares 4G, livros, etc…) os eleitores do PSDB ficaram completamente perdidos.

Durante séculos os brasileiros ricos viveram cercados de escravos, mucamas e agregados. Os descendentes deles não conseguem suportar a igualdade civil e acham intolerável a democratização do consumo. Suponho que vem daí os shows de depressão na frente da TV. Os neo-paneleiros estão formando uma nova elite: a elite dos medíocres que batem panelas que raramente usam, que nunca lavam e que, principalmente, nunca ficaram ou ficarão vazias.

A discórdia civil neste momento é evidente e potencialmente perigosa. Ano que vem o Brasil sediará as Olimpíadas. Em razão disto e do panelacinho, creio que as Forças Armadas precisam começar a rever seus procedimentos e manuais. Novos cenários de violência política devem ser estudados. Se o terrorismo panelizado ficar confinado aos apartamentos de luxo o problema será privado. Se a nova elite dos medíocres resolver explodir “panelas bombas” durante as provas de atletismo ou de natação a segurança dos atletas e dos turistas será comprometido e a imagem do Brasil no exterior ficará abalada.

Fábio de Oliveira Ribeiro

Fábio de Oliveira Ribeiro

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  • Panelaço

    Também achei ridícula a apresentação, nos noticiários da Globo, do "panelaço". Nos prédios com dezenas e dezenas de apartamentos apareciam uma ou duas janelas com os paneleiros (os portugueses que me desculpem...) Mostraram até uma "manifestação pública" com não mais de meia dúzia de pessoas. Acho que o PT poderia usar essas imagens para demonstrar que o índice de desaprovação não é verdadeiro, pois a esmagadora maioria nem deu bola para a convocação dos oposicionistas.

  • Acertou em cheio!

    Parabéns pelas excelentes constatações e reflexões, Fábio!

    Concordo em tudo com você. A sociedade brasileira continua escravocrata, como no século XIX. Eles NUNCA quiseram igualdade de direitos! Os seus representantes no congresso estão aí lutando desesperadamente para deformar mais ainda a constituição cidadã, que já não era grande coisa. Tudo para reduzir ao máximo a participação do povo nas questões políticas. Para eles, democracia é apenas quando a elite está no poder!

    E, quanto ao povo, que está com sua panela cheia, só faz batucada em dia de festa com muito samba!

    Viva o Brasil do Povo Brasileiro!

     

     

     

    • Excelente artigo. Vou

      Excelente artigo. Vou recortar e usar daqui pra frente em diversas situações (com a devida atribuição de autoria).

  • Por enquanto, não há.
    Nos

    Por enquanto, não há.

    Nos primeiros panelaços, também não se ouvia nada nem nos bairros nobres das capitais do Nordeste. Ontem já houve.

    A crise está apenas começando. Os efeitos da desvalorização do real ainda não foram sentidos. Mas vão. Importamos trigo, por exemplo. Preço do pão vai aumentar. 

     

  • Fábio!

    Aqui na Vila Mariana no epicentro do suposto panelaço não ouvi uma panela, nenhum grito e nenhum apito. 

    Em março no pronunciamento da Presidenta Dilma na TV em horário nobre o barulho e o panelaço foram absurdos.

    Na propaganda do PT em maio diminuiu 90%. Ontem, foi imperceptível. Tive que checar de que tinha o programa na TV para acreditar que o programa existiu. 

    A população está cansada desta briga interminável dos políticos, esta é a constatação que chego. 

    Nenhum Político da turma oposicionista anda se destacando em nada. E essa briga só está fazendo mal para a Economia e quase todos percebem. 

    O limite está se esgotando para todo mundo, penso eu. Nós precisamos dar menos atenção ao que a Mídia tenta passar como um fato impressionante!

    Foi um traque o panelaço de ontem por aqui. Repetindo: não ouvi uma panela sequer. (claro que a constatação é de um local específico, pode ter sido diferente em outras partes da cidade de São Paulo e do Brasil).

    Nós precisamos sair do mundo paralelo da velha mídia um pouco, ter um tanto de respiro e seguir a caminhada. 

    Abraço,

    Alexandre!

    • No Itaim Bibi o panelaço foi

      No Itaim Bibi o panelaço foi mais fraco que os anteriores. Mas, do mesmo moso, irritante.

  • Não se pode simplesmente desqualificar o panelaço

    Acho terrivelmente equivocada a tentativas de desqualificar completamente o panelaço. Até entendo quando pessoas "desabafam" assim nas suas redes sociais, mas isso como análise, seja de um portal como este ou nas declarações do partido, é algo, desculpe, estúpido. É claro que existe uma série de fatores a ser levada em consideração, é claro que o movimento é insuflado por um setor reacionário, mas bater panelas TAMBÉM expressa uma insatisfação legítima.

    Se o voto da classe C, mencionada pelo autor, vale o mesmo que o voto da classe média alta, o contrário também é verdadeiro -  a classe média alta tem também o direito de manifestar a sua insatisfação, e de reclamar por fatores como aumento de impostos e de juros.

    Insisto - não se trata de fechar os olhos para o golpismo infestando a sociedade e o Congresso Nacional. Mas simplesmente declarar que quem se manifesta assim "perdeu o contato com a realidade" é de uma superficialidade terrível...

  • Movimento insuportável esse chamado panelaço

    Eu ontem senti um panelaço mais forte do que os anteriores, pelo menos na minha vizinhança rsrs.

    Bater panela como forma de protestar contra um governo, máxime durante os pronunciamentos oficiais, é notoriamente anti-democrático, autoritário, coisa de gente que não quer ouvir os outros, que não respeita ninguém quando se trata de impor a sua vontade e os seus interesses, quase sempre divorciados dos interesses público e nacional. Além de ser patético e um tanto lunático. "Você não fala, eu não deixo. Inclusive tento fazer os outros nao ouvirem o que você diz, só o barulho da minha panela pei pei pei, tá tá tá tá." Bater panela, do jeito que estão fazendo, uma verdadeira sinfonia, é autoritário. Um barulho absurdo. Coisa de gente sem vergonha. Só podia ter sido na Argentina que criaram isso rsrs. Bater panela. Qual o sentido? Coisa mais anti-democrática. E pior, são os responsáveis pelo atraso do Brasil que batem panela, a classe média tradicional e classe média alta tradicional. Coisa ridícula.

    Vem o barulho da panela em coro e gritinhos de mulheres histéricas, as que mais pedem a saída de Dilma nessas horas. É que mulher, na média, não conhece solidariedade de gênero. Elas se consideram inimigas, principalmente as alienadas brasileiras de classe média e média alta, mal criadas como sempre foram (essas meninas nem lavar a própria calcinha lavam rsrs).

    Não é apenas irritante. Irritante é apelido. É insuportável. Além do barulho das pancadas na panela (pein pein pein pein, tá tá tá tá), terríveis mesmo são os "gritinhos" histéricos, desgoelados, finos, das mulheres: "ééééééé, Dilma, sai, sai, mulher, Dilmaaaa". Na minha vizinhança, o campo é minado. Aliás, que me desculpem a franqueza, mas mulher brasileira geralmente é despolitizada, com as exceções de sempre. Neste país, as mulheres são muito responsáveis pelo atraso. São elas que ensinam o machismo às crianças etc. Mulher, no Brasil, tem o dedinho "pintado" no atraso. São as que mais pedem "fora Dilma". E pode perceber: São as que mais atacam Dilma de forma baixa, mal educada (esculhambam mesmo, é de "bruxa", "feia", "vaca" para baixo, isso sendo mulheres).

    Esse bater de panelas da classe média, média alta brasileiras, lembra-me a tresloucada participante do BBB 2, Tina, que chocou o país ao ter um surto psicótico durante o confinamento promovido pelo programa da Rede Globo, numa fase em que o programa era mais real e menos roteirizado para a televisão, e se notabilizou por bater panelas pela casa para acordar os outros participantes. Uma insanidade completa. Bial chegou a perguntar a ela se ela estava dormindo bem, um claro sinal de psicose (loucos, principalmente em surto, não conseguem dormir). Os batedores de panela brasileiros, a maioria composta pelos mesmos manjados e alienados de sempre, me lembram a participante Tina, do BBB 2.

    [video:https://youtu.be/HE9hlolgWT8%5D

    • Bater panela é

      Bater panela é antidemocrático??

      E vc acha que autoritários são os outros????

      Vaiar, bater panelar, apitar etc são ações essencialmente democráticas. Assim como aplaudir, gritar apoio etc.

      Enfim, a democracia é baseada exatamente no direito de se manifestar, seja a favor seja contra.

  •  
    ... Na noite alvissareira

     

    ... Na noite alvissareira de ontem, aqui, no condomínio onde eu moro, 'nois' fizemos uma buchada de bode coletiva, "e as panelas que estavam cheias foram devoradas"!...
    No dia anterior, foi feita uma enquete:
    buchada de boi [servida à noite (risos)] ou ensopado de coxinhas?
    O prato que foi servido na noite de ontem foi escolhido por "unanimidade absoluta"!
    Risos

    Viva o [verdadeiro] Brasil!

    Messias Macedo - "até agora sentindo o gosto do bode da buchada"!
    Feira de Santana, Bahia
    Brasil - em homenagem ao sapiente, leal, generoso e honesto povo trabalhador brasileiro!

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