Um banco central contra o povo e pela especulação, por J. Carlos de Assis

Um banco central contra o povo e pela especulação, por J. Carlos de Assis

Semelhante à mulher de César, que não basta ser honesta mas tem que parecer honesta, ao Banco Central do Brasil não basta ser uma espécie de vampiro da sociedade brasileira, sugando-lhe o sangue em favor de especuladores financeiros. Ele se vê no direito de  confessar publicamente essa condição quando defende sua política como  direito divino, o que transparece, mensalmente, ao anunciar as taxas de juros sempre crescentes nas reuniões do Copom (diretores), num sentido que invariavelmente desagrada 99,9% dos brasileiros.

Qual seria a fonte de poder dos diretores do BC, reunidos no Copom, para promoverem, sem dó nem piedade, com total autonomia e discricionariedade, a transferência centenas de bilhões de dólares anuais de ricos para pobres através de um verdadeiro assalto ao Tesouro? Não é poder político parlamentar, pois o BC neutralizou os políticos dizendo que são populistas. Infelizmente é o Executivo. Mas não pelo que o Executivo o manda fazer, mas pelo que o Executivo faz questão de que ele não  faça, ou seja, defender o interesse público.

O BC tem um código de honra, similar aos das máfias italiana e americana, pelo qual seus membros atuais e anteriores se cercam de segredos para evitar o escrutínio da sociedade em suas decisões na sombra. Nos anos mais recentes, a senha de acesso a esses arcanos tem sido o modelo de metas de inflação  – o qual desmontamos peça por peça, o matemático Francisco Antônio Dória e eu, no livro “O universo neoliberal em desencanto” (ed. Civilização Brasileira). Não esperávamos um sucesso do livro, por motivos óbvios. E não aconteceu.

O problema que temos com o BC brasileiro é que se tornou, ao longo do tempo, uma caricatura ideológica neoliberal. Não há nenhuma inocência nisso. Um BC neoliberal rouba dinheiro do povo e transfere para os ricos. Não temos sequer um BC capitalista. O BC americano, FED, tem três objetivos legais: manter a estabilidade da moeda, garantir o crescimento da economia e promover o pleno emprego. No caso do BC brasileiro, estabelecido por FHC, o objetivo único do BC é o suposto controle da inflação.

É necessário muito pouco para demonstrar que a atuação do BC é um escândalo de incompetência e de má fé. No modelo de metas com que opera, a inflação deve cair quando o desemprego aumenta. Vejam o que aconteceu em 2014: a inflação estava estabilizada em torno de 6,5%, enquanto a taxa de desemprego caiu ao nível histórico mais baixo. Ao aumentar as taxas de juros, o BC mandou para o espaço a chamada curva de Phillips, uma das bases de seu modelo de metas: a inflação aumentou e a taxa de desemprego também aumentou, ao contrário do que preveria a curva.

Até quando vamos tolerar esse câncer incrustrado na economia brasileira, que alimenta simultaneamente a inflação e o desemprego? Esta, seguramente, é uma questão política. Já dei notícia da Aliança pelo Brasil, um movimento parlamentar e social que iremos promover com o duplo objetivo de combater a irresponsabilidade do impeachment e promover uma nova política econômica. Pois bem, em termos de macroeconomia o foco de nossos objetivos é uma mudança radical do BC. Num país em desenvolvimento, não podemos  nos dar o luxo de ter um BC contracionista. Temos que ter um BC progressista.

P.S. O Governo fez bem em admitir mudança na MP dos acordos de leniência, a despeito da impertinência do TCU que resolveu meter a colher de chá onde não era chamado. Vigiado pela Procuradoria da República, pela AGU e pela CGU, o TCU não terá muita margem para atrapalhar ou viciar os acordos, que defendi desde o início do ano passado quando a classe dominante ainda se mostrava acovardada em tocar no assunto.

J. Carlos de Assis – Economista, doutor  pela Coppe/UFRJ, autor de “Os Sete Mandamentos do Jornalismo Investigativo”, Ed. Textonovo, SP, 2015.

 

Redação

17 Comentários

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  1. Correção

    Assis,

    no segundo parágrafo (terceira linha) você inverte o sentido do destino da acumulação: “de ricos para os pobres”.

    Velhos vícios robinhoodianos?

    1. ausência de controles do BC

      Muitíssima oportuna essa reflexão sobre o discricionarismo do BC. A Direita finge não perceber tal liberdade do BC quando maneja dezenas de bilhões de reais, sem dar satisfação a quem quer que seja, sem explicitar suas razões, dentro de um hermetismo e mutismo arrogantes.

      Desgraçadamente, a Esquerda não faz diferente.

      Não conheço nenhum manual de Direito Administrativo que registre esta imunidade do BC a quaisquer controles. Não conheço nenhuma tentativa de provocar o Poder Judiciário para, ao menos, ordenar ao BC que se explique em uma dessas medidas bilionárias que ele costuma tomar.

      Nem mesmo Celso Antônio Bandeira de Mello toca, ao menos de leve, neste limbo do BC.

      Bom exemplo deste limbo está na narrativa da reunião em que o BC decidiu premiar os Bancos Marka e Fontecindam, em episódio célebre e talvez esquecido. A reunião foi a altas horas da noite. É muito interessante examinar o papel da Procuradora do BC, então.

      Mas a Direita anda resmungando contra a independência do Ministério Público. Não sabe ou finge não saber que o MP se move dentro de padrões legais e constitucionais, e que esta limitação é controlada pelo Poder Judiciário. Quando se trata das medidas de coerção usadas na chamada operação ‘Lava Jato’, o Ministério Público apenas postula, é mera parte, em igualdade com os advogados. A responsabilidade por tais medidas é da autoridade judicial, é da Jurisdição.

      Distorções na atuação do MP, como aquelas que Nassif costuma apontar, sobretudo os deprimentes vazamentos de declarações constantes de inquéritos, igualmente devem ser submetidas ao Judiciário, para responsabilizar civil e criminalmente os membros do MP.

      Outra coisa seria atrelar o MP ao Executivo (experiência já vivida, por exemplo, durante a ditadura). Aí, um membro do MP somente poderia iniciar ou prosseguir numa investigação/acusação, se tivesse permissão do político de plantão. No plano policial-judidiário é assim. Na AGU, também.

       

       

       

      fabiano

  2. Um banco central contra o povo e pela especulação

    O que se pode dizer ?

    Só desenhando !

    E mesmo assim duvido que os financistas do BC, turma extremamente republicana, concordem.

    A política econômica reconhece a estagnação, fala em destravar o crédito dos bancos oficiais, mas não deixa de garantir o filezinho dos endinheirados nacionais e estrangeiros.

    É a festa com o nosso dinheiro. Saúde, educação, infraestrutura, tudo o mais pode parar MENOS a brutal transferência de recfursos do Tesouro para os mamadores ricos.

    É outra ação eminentemente republicana.

    A REPÚBLICA DOS E PARA OS RICOS !

    Os pobres ?

    Fiquem com o MCMV e outras migalhas.

  3. O lucro fantástico do banco

    O lucro fantástico do banco garante o sucesso da empresa de telefonia e o processo de exclusão social.

    É isto o que esta foto me diz. O que ela disse a você?

    1. O que mostra a foto é o

      O que mostra a foto é o fracasso do governo em aplicar de forma justa e efetiva os impostos pagos pelos bancos, pelas empresas de telefonia e pela sociedade.

       

    1. malandrinho…

      É fácil usar de simplificação e generalização barata quando não se tem conhecimento técnico para discutir um problema a sério…

      1. “Não. Seja mais direto. O

        “Não. Seja mais direto. O objetivo deles é roubar sem trazer nada de positivo ao País. “

        Eu ainda vou chegar ao seu nivel de conhecimento técnico e a sua seriedade e profundidade.

        Explica para nós os ignorantes, o conceito de inflação, juros, preços, ciclos econômicos, SELIC. 

         

        1. brincalhão

          “Explica para nós os ignorantes, o conceito de inflação, juros, preços, ciclos econômicos, SELIC.”

          Se dos meus “trocentos” posts você não tirou nada, não há o que se fazer.

          Que você é ignorante no assunto já demonstrou soberbamente. E parece que não tem humildade para reconhecer essa (crassa) ignorância. O problema é que gente como você, surpreendentemente, consegue enganar alguns incautos. Então nossa (e minha) missão é desmascarar as falácias que supostos “liberais” como você espalham (gastar com swap e juro na lua pode, aí o gasto é “kosher”, como se isso respeitasse os canônes do liberalismo)

          Aliás, não vi colocação alguma de NINGUÉM rebatendo tecnicamente o que eu disse, muito menos o Sr. espertalhão tergiversador aí… 

          1. Você não é registrado não vou

            Você não é registrado não vou me dar ao trabalho, se registra pelo menos.ou da o link das respostas das perguntas.

            Ate lá não respondeu nada fora “Argumentum ad hominem”.

    2. Verdade, assinou embaixo! O
      Verdade, assinou embaixo! O curioso é que os EUA fazem isso num mundo onde o dólar passou a ocupar o lugar do ouro. Mas eles podem aplicar essa piada na prática que os liberais não reclamam. Idiotas como o AL ainda batem palma. Aí não é malandragem, é esperteza

  4. a fraude demonstrada

    Esses malandros do Banco Central adoram usar o Milton Friedman para justificar sua política de juros a qualquer preço.

    Num vídeo no youtube (procurar Milton Friedman – cost push inflation), o fraudador se desnuda. Numa certa altura mostra um gráfico com duas linhas que praticamente se prolongam em paralelo, a do índice de inflação e a correspondente ao volume de meios de pagamento por unidade do produto. Usa isso para dizer que a inflação é sempre causada por expansão dos meios de pagamento.

    É verdade que nos anos 70 houve a concomitância de uma expansão dos meios de pagamento (inflação de demanda) com inflação de custo. Mas fica claro que o gráfico é um embuste, porque a inflação de custo resulta no mesmo paralelismo entre o aumento do índice de preços e o volume de meios de pagamento por produto, porque na inflação de custo o produto real cai (logo, sem aumento no volume de meios de pagamento, ocorre o mesmo aumento no volume de dinheiro por unidade produzida – disponível no mercado interno).

  5. roubo

    “o objetivo único do BC é o suposto controle da inflação.”

    Não. Seja mais direto.

    O objetivo deles é roubar sem trazer nada de positivo ao País. 

  6. Inflação é maior nos estados governados pelo PSDB

    Com aumento de ICMS, luz, água, IPVA, etc. a alta da inflação foi maior nos estados governados pelo PSDB. Segundo IBGE o Paraná de Beto Richa teve a maior inflação do país, 12,24%. Depois vem Goiás de Perillo com 11,44%, RS de Sartori, e em 4º lugar São Paulo de Alckmin com 10,87%. Dos 4 estados citados, 3 estão nas mãos do PSDB. A velha mídia não noticia isso, pois tenta convencer a população que inflação deve ser combatida apenas pelo governo federal com a alta dos juros, o que já sabemos não ser a solução do problema. Na minha opinião, o governo federal deveria exigir dos estados a redução de impostos e tarifas regionais, e não apenas o congelamento de salários eleitoreiro de Alckmin.

  7. Qual a relação que uma taxa

    Qual a relação que uma taxa básica de juros do BC da ordem de 14,25% guarda com os juros praticados por bancos, financeiras, operadoras de cartões e demais instituições creditícias? Nenhuma, respondo. Os 14,25% correspondem à metade do que Lula recebeu de FHC. Metade. Já foi metade da metade, é verdade. Mas achar que aumentos pontuais dessa taxa possam responder pelo lucro realmente absurdo dos rentistas que autodefinem suas taxas astronômicas é irreal. Quanto ao TCU participar previamente dos acordos de leniência, discordo. TCU é órgão de controle de contas a posteriori, órgão do Legislativo. Não tem que ter ingerência em qalquer acordo autorizado por lei. Pode, se quiser, questionar tais acordos a posteriori, já que sua atuação é sempre assim. Daqui a pouco o Congresso vai querer participar também, diretamente, da homologação ou não dos acordos. E depois a mídia, que diz falar por nós. ? ::-) 

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