Cidadania

60 anos do golpe, 60 anos de lutas, 60 anos de impunidade, por Francisco Celso Calmon

60 anos do golpe, 60 anos de lutas, 60 anos de impunidade

por Francisco Celso Calmon

Quem é o comandante-em-chefe das Forças Armadas? Quem é o primeiro mandatário do Estado democrático de direito?  Quem é o presidente do país?  

O Chefe de Estado e de Governo no Brasil é o presidente da República, que é também o comandante maior das Forças Armadas – Aeronáutica, Exército, Marinha.

Quais são os três poderes da República segundo a Constituição? 

Será que essa lógica indagativa nos leva a letras mortas?

Será que vivemos num país subvertido e a sociedade não se deu conta e os dirigentes fingem que não reconhecem a realidade e vivem num mundo de Alice?

Executivo, Legislativo e o Judiciário são os únicos poderes constitucionais da nação brasileira. Sendo que o chefe do Executivo é também o chefe de Estado, de governo e comandante-em-chefe das FFAA. 

Portanto, o Presidente da República é o mandatário maior do Brasil!

Esta é a lógica institucional, que não é a mesma da realidade factual.

Na realidade concreta as Forças Armadas se constituem num poder paralelo de fato, ao ponto de negociar e acordar com o Presidente, que os membros do primeiro escalão do governo não realizem manifestações de lembrança e repúdio ao golpe de 64 e eles, os militares da ativa, não comemorem o golpe.   

Resumo do acordo: arranquem as páginas da história e as levemos à fogueira da conciliação. E diante da fogueira fumemos o cachimbo da boa vontade, na vã esperança de que o passado não assombre mais.

A História amedronta os tiranos e covardes em todos os tempos, e quando não se apreende e é passada a limpo, ressurge até com aqueles antes tiranizados pelo nazismo e hoje tiranos neonazistas dos palestinos.

A justiça de transição no Brasil até o presente foi um malogro. Não houve a criminalização daqueles que golpearam a democracia e cometeram crimes imprescritíveis de lesa-humanidade e lesa-pátria; e os mesmos tipos de golpistas de antes, civis, militares, religiosos, ressurgiram no golpe de 2016 e na intentona bolsonarista de 8 de janeiro de 2023.

Suas digitais estão visíveis e mesmo com os indiciamentos, ainda que lentos, estão a sabotar o Estado democrático de direito. A prova mais recente e inconteste foi a armadilha da delação do ex-ajudante de ordem do Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid.

Trate bem os adversários da democracia e verão que enquanto isso preparam o seu túmulo!

Como a espada de Dâmocles estamos à sombra da tirania dos militares, mesmo que enxovalhados por suas participações no golpismo recente e nas delações dos pares fardados. 

A democracia atual tem estado a depender dos ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes do STF, pois, ao que está parecendo, mesmo com as fardas borradas e desfalecidas pelo medo, ainda botam temor ao governo, que prefere o conchavo de acordos a estimular a organização e as manifestações populares em estado continuado. 

Há traumas de infância que marcam para sempre, há fetichismo de juventude que marcam para sempre, entre esses o temor e a admiração pela indumentária das fardas impecáveis, branca, cinza e verde-oliva.

O governo Lula está prenhe desses traumas e fetiches. 

Todas as indagações acima levam a um só endereço de reposta: Luiz Inácio Lula da Silva, eleito em sufrágio universal pela maioria do povo brasileiro.

Lula conta com ministros tão bonzinhos que até a área desprestigiada e desprovida de recursos é compreensiva em relação ao erro tático de consequências estratégicas como a de proibir os seus auxiliares de organizarem eventos de lembrar para não repetir o golpe militar de 64.

Se como disse o presidente, os generais do presente nada têm com o passado, então, estão aptos a, em nome da história, reconhecerem o golpe ao governo João Goulart, as atrocidades da ditadura, e pedirem, em nome da instituição, perdão à nação brasileira, em especial, mas não só, às famílias dos mortos e desparecidos pelo Estado terrorista que implantaram no passado. 

Feito isso, o início da harmonia começará a existir. Digo início, porque, outrossim, caberá o compromisso de não participarem da política e cumprirem suas obrigações em defesa da pátria.

Lula com os posicionamentos em relação ao passado recente e ao passado remoto, traçou a tática do caminho da justiça reversa – criminalizar os militares atuais e demais responsáveis pela intentona de 8/01/2023, abrir o flanco das forças armadas, e, quem sabe, talvez, um dia, retomar a justiça de transição. Por outro lado, mostrou o quanto precisa da mobilização popular e da atuação mais assertiva da esquerda partidária para romper o cerco dos três êmes – mídia, militares, mercado.

Lula não fugiu da luta, ajustou a sua estratégica com uma tática que parece recuo, porém, todavia, contudo, oxalá, seja um momento para novo avanço em direção à justiça de transição; pois a refrega de 60 anos das gerações em lutas, resistindo, demandando a cicatrização de uma chaga aberta, a reparação aos mortos/desparecidos e aos sobreviventes dos cárceres e torturas, sobretudo, justiça como a responsabilização institucional dos autores do golpe de 64 e dos crimes imprescritíveis que cometeram em nome do Estado.

A impunidade é chocadeira de novos golpes e intentonas, a punição aos golpistas de ontem e de hoje pode assegurar ao país uma democracia sólida. Porém, enquanto houver temor dos fardados, o exercício da cidadania será o de republiqueta.

Ditadura nunca mais, tortura jamais, ousar lutar, ousar vencer, sempre!

Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral – E o PT com isso?, Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula. Coordenador do canal Pororoca e um dos organizadores da RBMVJ.

OS. Aproveito para convidar a todas e todos para o lançamento do livro “60 anos do golpe: gerações em luta” no dia 1º de abril às 19:00 hs nas principais capitais e DF do Brasil. Detalhes com as jornalistas Mariluce Moura, 1199638-1947,  Roberto Junquilho, 2798839-9523, Laurenice Noleto,6281830-2546.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para dicasdepautaggn@gmail.com. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.

Francisco Celso Calmon

Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral - E o PT com isso?; Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula.

Francisco Celso Calmon

Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral - E o PT com isso?; Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula.

Recent Posts

Mandato de Sergio Moro no Senado nas mãos do TSE

Relator libera processo para julgamento de recursos movidos por PT e PL em plenário; cabe…

4 horas ago

Uma “Escola para Anormais” no Recife, em Água Fria, por Urariano Mota

Diante disso, quando respiramos fundo, notamos que a escola seria uma inovação. Diria, quase até…

5 horas ago

Praticante da cartilha bolsonarista, Pablo Marçal mente sobre proibição de pouso de avião com doações

Coach precisava ter passado informações básicas à base com 3h de antecedência; base militar tem…

5 horas ago

Enchentes comprometem produção de arroz orgânico do MST no RS

Prognósticos mostram que perda pode chegar a 10 mil toneladas; cheia começa a se deslocar…

5 horas ago

Nova Economia debate o poder da indústria alimentícia

Com o cofundador do site O Joio e o Trigo, João Peres; a pesquisadora da…

6 horas ago

Processos da Operação Calvário seguem para Justiça Eleitoral

Decisão do Superior Tribunal de Justiça segue STF e beneficia ex-governador Ricardo Coutinho, entre outros…

6 horas ago