Famílias são despejadas com violência da PM em Piracicaba (SP); deputada é ameaçada

 

A deputada estadual Professora Bebel (PT) esteve no local do despejo e criticou a ação policial e o governador João Doria (PSDB) por permitir a operação. “Doria aparece educadíssimo na TV para pedir para ficarem em casa e lavarem as mãos, mas nos becos e favelas ele age diferente. Cinquenta famílias foram tiradas de suas casas a bala. Sem perspectivas de resolver para onde iam e sem ao menos poder retirar seus pertences”, postou em sua rede social.

A parlamentar argumentou que o despejo em Piracicaba exporia os moradores e outras pessoas ao risco de contágio pelo coronavírus, “contrariando, assim, todas as recomendações das autoridades sanitárias”.

Bebel teve seu acesso ao local impedido por policiais e conta ter recebido ameaças, inclusive de prisão. “Estou em pleno exercício de meu mandato parlamentar. Não me intimido e não me intimidarei”, afirmou a deputada. Por pressão da comunidade, a prisão não foi efetuada. “Um policial a pegou a força, machucou o braço dela e me deu voz de prisão”, relatou o advogado Nilcio Costa à Rádio Brasil Atual.

Em nota, a Apeoesp, sindicato estadual dos professores da rede pública, presidido pela deputada, repudiou a operação. “É absurdo que uma ordem como essa seja executada neste momento de pandemia e isolamento social, obrigando as famílias desalojadas a deslocar-se para casas de amigos e familiares, abrigos coletivos ou até mesmo perambular pelas ruas da cidade.”

Arbitraridade

reintegração foi feita após a decisão judicial assinada pela juíza Fabíola Giovanna Barrea Moretti, do Tribunal de Justiça de São Paulo. O terreno está abandonado há 40 anos e as famílias ocuparam o local em janeiro. Entretanto, a magistrada considerou que o coproprietário tem posse indireta da área.

Na véspera, as famílias e entidades sociais pediram intervenção da prefeitura e da Defensoria Pública para paralisar a ação. O argumento central era o risco do despejo em meio à pandemia do novo coronavírus. Entretanto, sem base científica, a juíza interpretou que a ocupação possivelmente ampliaria a propagação da contaminação.

Ao jornal Gazeta de Piracibaca, a advogada Marcela Bragaia, da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (Renap), explicou que a liminar de despejo aconteceu de maneira ilegal. “Não houve intimação do Ministério Público e da Defensoria Pública, sem intimação das famílias pelo oficial de Justiça, ou seja, com inúmeras nulidades e ilegalidades o despejo de mais de 50 famílias em plena pandemia do coronavírus.”

O advogado Nilcio Costa informou que a deputada Professora Bebel está articulando a obtenção de abrigos em Piracicaba para acomodar, durante a pandemia, os moradores despejados.

Ação desumana

Após a reintegração, retroescavadeiras começaram a derrubar as moradias, muitas delas construídas de maneira improvisada. A Justiça diz que no terreno há apenas oito moradores, mas as lideranças da comunidade informa que há, no mínimo, 50 famílias no local.

Em entrevista à Ponte, a diarista Roseli Felix teve a casa atingida por bombas de gás lacrimogêneo. Seu filho de 7 anos passou mal. Ela vive na comunidade vizinha ao terreno onde estava a ocupação.

“Meu filho estava dormindo e acordou sufocado. Eles (PM) não respeitam ninguém. O pessoal aqui é tranquilo, estamos aqui por não temos onde morar. Tem mulher com um monte de criança pequena, foi demitida por causa da pandemia e não tem mais um teto. E agora? A gente só queria um pouco de dignidade”, relatou.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) emitiu uma nota contra o despejo. De acordo com eles, a área pertence à vários herdeiros de um advogado e estava abandonada, servindo apenas para especulação imobiliária, sem nenhum uso.

O movimento afirma que a decisão da juíza coloca em risco a vida de muitas pessoas. “Os sem teto ocupam a área desde janeiro, na luta pelo direito a moradia. A assessoria jurídica tentou impedir o despejo, alegando questão humanitária e apelando ao bom senso diante diante da maior pandemia dos últimos tempos, mas ignoraram o risco de morte que estão impondo à essas famílias”, lamentou.

Redação

Redação

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  • A polícia militar não consegue dialogar. São monstros, treinados para o terror e a morte.
    Não perderiam a oportunidade de prática de terrorismo, ainda mais nesses tempos sem futebol. As imediações dos estádios são o palco preferido para treinamento.

  • Nada mais causa indignação neste país. O mal foi banalizado até o limite. O sofrimento destas pessoas sem destino num momento crítico como este é algo que deveria motivar grande reação social. Não esperemos isto.
    Nem dos próximos. A vida é assim mesmo. E daí? Não bastassem os governantes com esta postura desconcertante, infelizmente temos que admitir que, muito antes de Bolsonaro, tal ideologia já se sedimentava nos rincões acostumados com a própria impotência e educados a tomar por referência ética as relações com as estruturas de poder extra-constitucionais. Foram elas que mandaram e ditaram as regras do jogo social desde a implementação da famosa "Pax Tucana". Em nada diferem as posturas assumidas pelo presidente miliciano da de seus apoiadores mais "aguerridos" - PM's e chefes do crime organizado - que naturalizaram expedientes bastante semelhantes aos adotados hoje na esfera federal.
    Acabei de ver um trecho da entrevista da Regina Duarte na CNN. "Todo mundo morre na humanidade"; "Tortura sempre existiu"; "O povo fica vendo gente morrendo e ohhhhh!!!"... Acreditem, cansei de escutar coisa semelhante aqui nas quebradas de Itaquera. Só que quem desferia tais impropérios não poderiam me causar surpresa: bandidos peixinhos de policiais corruptos e os próprios policiais. Assaltantes, traficantes, assassinos... Quem diria que a namoradinha do Brasil... Meu Deus, vivemos mesmo num país surtado e bestializado. Se me falassem isto em, sei lá, 2001, que o Brasil ficaria deste jeito, não sei não. Pra ser bem sincero, eu poderia até dar algum crédito a quem me fizesse tal previsão. A despeito da tal da esperança, a rua já dava sinais de que, caso a maldade não fosse contida, perderíamos totalmente as referências.
    Hoje, moro num bairro onde a maior felicidade que tivemos foi ver recentemente o chefão - Jagunço - ser preso e a imprensa falar de seu cemitério com mais de 100 corpos enterrados (a população fala em mais de 300, no mínimo!). Fizeram um show com a prisão do cara e - pasmem! - deixaram até hoje o cemitério intacto. Se é que já não sumiram com os corpos.
    Talvez, estas centenas de desaparecidos entrem pra conta do coronavírus, mesmo tendo sido mortos de uns cinco anos atrás pra cá. Ganham seus atestados, como se tivessem sido encontrados mortos e tivessem sido enterrados ou cremados sem nome. Tudo é possível.
    Teremos mais uma década de desaparecidos e quem sabe, no futuro, mais uma comissão da verdade chocha. O "e daí?" de Bolsonaro só choca aos que nunca conviveram com o fascismo.

  • Qual o interesse da "juiza" em desalojar as famílias, numa época de crise como essa ? Falta-lhe humanidade... não têm condições de exercer a função... Ou então podem existir outros "fatores envolvidos"...

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