Entre milho e soja, onde vai parar o Brasil? – I, por Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva

Já vivemos num par de países sobrepostos somente em território: o exportador de commodities e o importador de industrializados, como no fim da II Guerra.

Entre milho e soja, onde vai parar o Brasil? (/4)

Explicando as commodities

por Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva

                Uma matéria recente dá conta de que um modelo de utilitário de luxo seria negociado em sacas de milho ou soja, visando a atender o agronegócio. Como acontecia nos anos 1980, só se usava a moeda local em último caso. Os índices setoriais como o do Sinduscom para imóveis eram moedas setoriais. Hoje, dá-se curso livre às commodities, relegando o real à última opção, prenúncio de inflação galopante, em que só ganham exportadores. O mundo clama por uma solução para preservar a biodiversidade. Já vivemos num par de países sobrepostos somente em território: o exportador de commodities e o importador de industrializados, como no fim da II Guerra. Esta série de quatro matérias pretende esclarecer o que são commodities, primeiro capítulo;  como elas contribuem para a miséria de nosso povo, segundo capítulo;  a degradação do planeta, e como sair dessa enrascada.

                Commodities precisam ter quatro características conceituais: consumo universal, divisibilidade, imperecibilidade e homogeneidade. São conceituais porque dependem de artifícios para determinar o preço à vista. O minério de ferro, por exemplo, varia consoante a geologia de suas jazidas, atribuindo-lhe diferentes concentrações de ferrita que, depois de reduzido, fornece o ferro gusa. O padrão é 50% de ferrita, pagando-se ágio ou deságio pelo excesso ou falta, depois de medidos seus teores. Para o petróleo, usa-se o peso API (American Petrol Institute), em que se atribuem valores conforme ele tenda ao asfáltico (mais pesado) ou  à nafta (mais leve). O API 40 é a referência. O preço sobe quando API cai.

                Outras commodities têm algoritmos mais complexo, como é o caso do algodão, para que se medem maturidade, comprimento da fibra, cor, impurezas e contaminação com açúcares, tudo contribuindo para a qualidade do fio. O preço de referência é o do tipo 41,4. Para o café, verificam-se os quebrados, o tamanho do grão, se Arábica ou Conilone a bebida. Um café é tão bom quanto mais dura for a bebida. Não deve ser adstringente e o fundo de boca deve ser agradável e duradouro, entre outras qualidades. O padrão é o 6,8 e alguns compradores estipulam os seus, como é o caso da Illy Café. O açúcar usa Icunsa (International Commission for Uniform Methods of Sugar Analysis) como método de análise e é mais ligado à cor, enquanto o tamanho dos cristais é medido em fração de milímetros. O preço é calculado sobre o Icunsa 150, pois é o tamanho que mais facilita a movimentação e minimiza a aglutinação por umidade nos navios. Internamente, usamos o Icunsa 45, muito mais fino.

                Os grãos são classificados mais ou menos da mesma forma, contando-se os quebrados, também conhecidos como quirera, os ardidos (fermentados), impurezas e cor, especialmente para o milho. Medem-se também os grãos xoxos e vazios. Os transgênicos são considerados como outras commodities. O arroz não é negociado em bolsa no Brasil. Mesmo assim, conta com o sistema de pontos para transações de balcão. Quanto maior o número de pontos, menor será seu preço.

                O problema de indivisibilidade e perecibilidade do boi se resolve com a venda em arrobas do boi em pé, sendo a entrega futura garantida pela constância do fornecimento.

                Graças à possibilidade de entrega futura, as commodities gozam de financiamento nacional e internacional  constante, impedindo que produtos de consumo local e não universal se desenvolvam, por mais  produtivos que sejam. Commodities, ao contrário do que se propala, pode contribuir para aumentar a fome no mundo.

Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva é economista, estudou mestrado na PUC-SP, é pós-graduado em Economia Internacional pela Columbia University (NY) e doutor em História Econômica pela USP. No terceiro setor, sendo o mais antigo usuário vivo de cão-guia, foi o autor da primeira lei de livre acesso do Brasil (lei municipal de São Paulo 12492/1997), tem grande protagonismo na defesa dos direitos da pessoa com deficiência, sendo o presidente do Instituto Meus Olhos Têm Quatro Patas (MO4P). Nos esportes, foi, por mais de 20 anos, o único cavaleiro cego federado no mundo, o que o levou a representar o Brasil nos Emirados Árabes Unidos, a convite de seu presidente Khalifa bin Zayed al Nahyan, por 2 vezes.

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva

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