Ao contrário do que diz Giannetti, o Brasil cabe em seu PIB, afirma André P. Cordeiro

Enviado por Luiz Mello

do Sul 21

Mais uma turma criadora de dificuldades inexistentes na economia (para vender facilidades que só eles têm)

André Passos Cordeiro*

Recentemente, em um evento da consultoria Empiricus (olha a turma aí novamente…), um famoso economista brasileiro, também filósofo, atualmente assessor da campanha do PSB (Eduardo Campos e depois Marina Silva) à presidência da República, de nome Eduardo Giannetti da Fonseca, afirmou que o “Estado Brasileiro não cabe no PIB” (declaração ao Jornal Valor Econômico, de 18/08/2014). Frase boa, daquelas que parece comprovar-se pela própria força. Só que não. Por que não?

O Brasil terá em 2014, segundo as projeções do FMI, um PIB de 2,2 trilhões de dólares e um gasto público que corresponde a 40% deste. Vejamos o quanto gastam os Estados Nacionais com PIB semelhante ao Brasil, para ver se estamos no desvio do padrão. Os dados que serão apresentados a seguir são todos resultantes de projeções para 2014 do FMI. Comecemos com os países de PIB mais próximo ao nosso. Digamos no máximo módicos cem bilhõezinhos de dólares abaixo (não há países com a mesma diferença para cima):

Grupo 1

País                 PIB                       Despesa Pública/PIB (%)

Brasil             2.215.953                          40

Itália              2.171.482                           51

Rússia           2.092.205                           38

Alguma conclusão? Sim, ou gastam bem mais ou estão bem pertinho do Brasil. Bem, não vamos nos apressar, afinal a amostra é pequena. Embora já maior do que a do professor Giannetti, pois ele não apresentou nenhuma. E as companhias talvez possam ter seu caráter questionado: Rússia, Itália; governos, assim, meio “complicados”… Não acho que isto os desqualifique, mas sempre pode ser uma alegação, não é mesmo? Mas sejamos generosos, ou cuidadosos (sei lá…): aumentemos mais uma camada no círculo de proximidade, para expandir a amostra e dar mais uma chance à “tese” do “fat brazilian state”. Fat, not fast. Vamos considerar os países com PIB um “pouco” mais abaixo ou “levemente” acima da faixa brasileira. Ponho assim entre aspas porque, depois de Itália e Rússia, os países mais próximos estão a uma distância não tão pequena em relação ao Brasil: coisa de 450 a 800 bilhões de dólares abaixo e 600 bilhões de dólares acima. Comecemos pelos acima:

Grupo 2

País                           PIB                  Despesa Pública/PIB (%)

França                   2.885.692                  57

Reino Unido           2.827.514                 42

Agora os abaixo:

Grupo 3

País                 PIB                  Despesa Pública/PIB (%)

Índia              1.995.776                       27

Canadá         1.768.968                       44

Austrália        1.435.830                       37

Espanha        1.415.304                       45

Pronto, agora temos Estados Nacionais mais “respeitáveis”, “pretinhos básicos” por assim dizer. Afinal nesta amostra temos Canadá e Austrália, por exemplo. Acho que ninguém vai dizer que os corpos estatais destes países são maiores que suas roupas… Mas embora os corpos sejam de tamanho semelhante, as roupas são de números distintos. Pois é, não tem um número só. Então vamos tentar outra estratégia: trazer de volta à cena o grupo 1, juntá-lo aos grupos 2 e 3, e tentar de estabelecer uma faixa “normal”. Acho que poderíamos dizer, sem desconforto (não resisti…), que à exceção de Austrália, Rússia e Índia, todos gastam acima de 40% do PIB com suas máquinas públicas. E, ainda, que Rússia e Austrália não estão nada distantes desta marca. Então, tirando os grandes desvios para baixo e para cima (Índia e França), com tranquilidade poderíamos dizer que países com PIB entre US$ 1,4 trilhões e US$ 2,9 trilhões destinam, atualmente, entre 40% e 50% do seu PIB para despesas públicas. Eis a faixa. Segunda conclusão: em termos comparativos ainda não conseguimos ver um Brasil desajustado, com seu Estado sofrendo de “obesidade mórbida”, a necessitar urgentemente de uma cirurgia que diminua suas possibilidades de ingestão calórica desmedida. A menos que consideremos todos estes países como sofredores desta mesma síndrome. A França do “socialista” Hollande talvez, mas o Reino Unido do Partido Consevador? Não dá pra forçar a barra, né não?

Bem, mas vamos espancar a realidade mais um pouquinho… Perguntemos a ela, a um oráculo imaginário, se toda esta turma com produto interno bruto próximo ao Brasil, inclusive ele, poderia ser mais elegante, mais magra e mais eficiente. Vejamos nossos vizinhos de planeta Terra mais ricos, a suposta “gente fina, elegante e sincera”. Entre eles há um claro degrau, a formar dois grupos: Alemanha e Japão, com PIB de 4 a 5 bilhões de dólares; China e Estados Unidos, com PIB duas ou mais vezes maior.

Grupo 4

País                   PIB                  Despesa Pública/PIB (%)

Japão             4.846.327                    40

Alemanha       3.875.755                    45

Grupo 5

País                              PIB                  Despesa Pública/PIB (%)

Estados Unidos        17.528.382               37

China                        10.027.558               24

Comecemos isolando o caso extremo, a China. Entre as 10 maiores economias do mundo, só a China tem gasto público inferior a 30%. O que resta dos grupos 4 e 5? Todas dedicam a seus Estados algo em torno de 40% do PIB.

E para finalizar… Os dados das 20 maiores economias do mundo (o Brasil é a sétima) apontam que as que possuem Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) na faixa “muito alto”, na qual infelizmente o Brasil ainda não está, apresentam: 1) relação despesa pública/PIB maior que o Brasil ou 2) despesa pública per capita maior que a brasileira. E mais, 10 das 12 economias com IDH muito alto apresentam Despesa Pública per capita de 4 a 6 vezes maior que a brasileira. O caminho para o desenvolvimento é reduzir os recursos à disposição do Estado brasileiro? Não é o que dizem os números.

IDH (2013) e Despesa Pública (2014)


Fonte: IDH – ONU e Despesa Púplica – FMI projeção para 2014

Terceira, e última, conclusão final: os dados mostram que o Estado brasileiro, ao contrário do que diz Giannetti, cabe em seu PIB. A afirmação feita pelo assessor econômico da campanha do PSB (que tinha antes Eduardo Campos como candidato e agora tem Marina Silva) não se sustenta, não é comprovável e representa o risco de um retrocesso: voltar ao tempo do desmonte do Estado; tempo este iniciado por Collor e concluído por Fernando Henrique. A discussão que cabe atualmente no Brasil não é mais a da redução do tamanho do Estado. De resto, como demonstramos aqui, o volume do Estado brasileiro está ajustado aos padrões internacionais para uma economia de seu porte. O debate que cabe é sobre como aumentar a eficiência e a eficácia na aplicação dos recursos à disposição do Estado brasileiro. Aumentar o efeito de cada Real aplicado em termos de elevação de bem estar para a população do país. E simplificar a estrutura tributária brasileira, diminuído custos derivados de sua aplicação e aumentando a justiça fiscal diminuindo sua regressividade. Torná-lo cada vez mais republicano e universalista, menos sujeito aos interesses fisiológicos ou corporativistas. Enfim, aumentar sua agilidade na resposta às demandas sociais imensas de um país que ainda possui grandes desigualdades. Ou seja, já temos dificuldades verdadeiras de montão, não precisamos inventar outras…

* Economista e Mestre em Ciência Política

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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  • A campanha de Marina repete

    A campanha de Marina repete mantras neoliberais

    A sua ligação ao neoliberalismo já ficou clara  e cristalina.

    Desmoronaram as suas mentiras.

  • Mais dinheiro pro povão!

    Dinheiro é pro povão mesmo, em forma de Prouni, Ciência Sem Fronteiras, Bolsa Familia, Amparo ao Idoso, Aposentadoria Rural e Créditos Variados. É isso o que Marina e sua equipe não aceitam. Que pastem noutras bandas, que tal na Espanha que, no momento, está no fundo do poço por causa dessa política que o Itaú e CIA defende para nosso pais. Não passarão.

  • Uma mentira cuidadosamente

    Uma mentira cuidadosamente desmontada com extensa documentacao.

    Os feios que me perdoem, Guiannetti...

  • Eu só não consigo entender


    Eu só não consigo entender porque o governo levou  tantas "cacetadas" durante os 3 últimos anos e só agora se defende e apresenta dados consistentes.

  • Faltou falar que desses 40%

    Sem contar que quase a metade dos gastos orçamentários, orçamentários anuais é destinada ao estamennto financeiro, em nome do qual esse "filósofo" gianetti e outros acometidos pela mesma moléstia proferem essas superstições.

    Poderia o autor fazer também mais essa comparaçao, mas acho que ou ficou com pena ou teve receio de parecer estar chutando cachorro morto. E poderia também comparar as taxas de juros praticadas nesses países e deixar mais claro o por quê da necessisdade de acreditar nessas fábulas.

    Antes de qualquer coisa, essa dívida financeira foi legada pelos mesmos políííticos que negligenciaram dívida social em nome de um desenvolvimento concentrador de renda. Basta olhada para os os países que gastam o tantão que o Brasil  em termos de dívida pública para observar o sufoco que passam por lá ao levar a sério essas crendices neoliberais.

  • Quando é para encher suas burras ela não é burra

    Gente, ninguém apóia assim explicitamente, a Marina antes era a Neca agora é o banco Itaú instituição agora Itaú será que está vendo a possibilidade e abocanhar a Caixa Economica Federal e o Banco do Brasil, perderam os pruridos. Dizem que o Btg tdo Esteves também está crescendo o olho. O Itaú se fez com ajuda do Delfim Neto, e da maioria dos governos. É mais um filhote da ditadura igual á Globo.

     

     

     

    Setubal, Marina e a mediocridade

    Setubal: murmúrios na plateia

    Os convidados para a festa dos 90 anos do Itaú, realizada ontem à noite na Sala São Paulo,  ainda não se refizeram do choque e ouvir Roberto Setubal dizer em seu discurso:

    - O Brasil está prestes a tomar um novo rumo com a eleição de Marina Silva para a presidência.

    Mais: disse que  o Brasil não aguenta mais a mediocridade.

    Numa tacada, descartou Aécio Neves, inicialmente o candidato natural do sistema financeiro, e decretou a eleição terminada.

    Falta ainda, no entanto, muito chão pela frente. De qualquer maneira, é fato raro, raríssimo, um empresário de grande porte se posicionar em público tão enfaticamente.

    Na plateia, boa parte da elite brasileira, além de petistas como Eduardo Suplicy.

    Por Lauro Jardim

  • Pedro Bastos: Neoliberais jogam culpa da inflação nas costas do

    "Vivemos no Brasil, hoje, uma disputa entre aqueles que querem continuar expandindo salários reais, direitos sociais e bens públicos e aqueles que consideram que a sobrecarga democrática gera irracionalidades econômicas que acabam prejudicando os próprios cidadãos apaixonados. Os primeiros estavam nas ruas em junho de 2013, os segundos estão em gabinetes propondo isolar a política econômica da pressão das ruas.

    É possível conciliar as duas forças? Existe uma Terceira Via que concilie essas visões e interesses? Na atual conjuntura brasileira, nada é mais irreal que uma nova política que prometa conciliar os interesses daqueles que lutam pela expansão dos direitos de cidadania e os que defendem um Banco Central Independente. Estes, como aqueles, não vão se contentar com vinte centavos."

  • A moça que ajuda com a

    A moça que ajuda com a arrumação aqui em casa, em conversa, lembrou-me de algo que não mais ocorre lá na periferia onde ela mora e que eu percebo que aqui no meu bairro tambem não: Já há muito tempo que não batem no portão oferecendo um pão ou pão doce feito em casa, um conhecido vendendo trufas ou pano de prato bordado pra ajudar no orçamento, nem tampouco um vizinho que perdeu o emprego vem se oferecer para limpar a caixa d'água. Arrematou ela, que hoje, emprego não falta e só não trabalha quem não quer.

  • O que não cabe no PIB é o "jurão".

    O que não cabe no PIB é o "jurão", quanto se gasta o orçamento da União pra rolar/amortizar a dívida. Esse "jurão" é imoral. Isso representa mais de 42% do Orçamento da União para 2014, enquanto Previdência Social é 20%; Transferências Constitucionais a Estados e Municípios, 10%; Saúde 4% e Educação 3,5%.

    Quando Florestan Fernandes e outros trabalharam - e conseguiram - para limitar o "jurão" em 12% ao ano na Constituição Federal, o pessoal de FFHH correu e rapidinho - logo depois - apresentou uma Emenda Constitucional e extirpou o todo o Capítulo relativo ao Sistema Financeiro da Constituição Federal, dizendo que o lá descrito seria inexequível.

    Inexequível é impor à sociedade brasileira aos caprichos das instituições bancárias - nacionais e internacionais.

     

     

    • Erro recorrente esse seu!

      Luciano,

      Não gastamos 42% do orçamento com juros; isso é um erro que sempre acontece quando as pessoas olham apenas o orçamento de despesas da União. Procure na internet, é fácil, o orçamento da União e veja o orçamento de despesas e o de receitas também. Você verá que cerca de 30% do orçamento é REFINANCIAMENTO DA DÍVIDA, e este valor, cerca de 650bi, aparece tanto no orçamento de receita como no de despesas. Na verdade, atualmente, gastamos com juros algo em torno de 10% do orçamento, o que também não é pouco não, mas se o refinanciamento for bem feito essa parcela (juros da dívida) vai diminuindo cada vez mais.

      Abraço.

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