“Faca na caveira”: Pós Moro, abusos na Lava Jato persistiram, mostram mensagens

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Não mais juiz, Moro ministro ajudou Lava Jato e força-tarefa articulou com Gabriela Hardt, que atuaria "por trás" de Bonat, mostram mensagens

Jornal GGN – A saída de Sérgio Moro da 13ª Vara Federal de Curitiba, em novembro de 2018, para então se tornar ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro, não impediu que os abusos da Operação Lava Jato continuassem. É o que mostram as mensagens divulgadas da Operação Spoofing.

Conforme o GGN revelou, já afastado do cargo de juiz e empossado ministro de Bolsonaro, Sergio Moro seguiu atuando em colaboração com os procuradores para avançar na Operação.
No dia 20 janeiro de 2019, Moro contatou o então coordenador Deltan Dallagnol, informando que estava em Davos, Suíça, para o Fórum Econômico Mundial, e perguntando “com quais países ainda temos dificuldade com cooperação”. “Hong Kong por exemplo forneceu aquelas provas?”, questionou, na ocasião, o ex-juiz, buscando auxiliar a força-tarefa de Curitiba nas cooperações internacionais da Lava Jato.

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E além da equipe de Deltan ter opinado e atuado para a escolha dos juízes que iriam suceder Sérgio Moro [abaixo], como já amplamente havia divulgado pelo The Intercept Brasil, os procuradores também mantiveram laços com a juíza Gabriela Hardt.

Ainda como substituta de Moro e sem notícias de que o então juiz se afastaria do cargo para assumir no governo, os procuradores explicitaram que mantinham a mesma relação de confiança com Gabriela Hardt. Em mensagem de abril de 2018, o procurador Diogo Castor expressou que detinha “boa relação” com a magistrada.

Naquela ocasião, eles queriam a extradição do empresário Raul Schmidt e buscavam um ofício da Vara de Curitiba. Apesar deste tipo de esforços competir à Procuradoria-Geral da República (PGR), a força-tarefa atuou para que a própria Justiça do Paraná enviasse um ofício, assegurando os desejos do grupo.

As mensagens mostram que, em minutos, Castor conversou com Gabriela Hardt, que garantiu a ele “um novo ofício alinhado ao que decidirmos”:

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Já com meses de ofícios e despachos para a Lava Jato, no dia 18 de novembro, o procurador Athayde Costa elogia a magistrada substituta, chamando-a de “faca na caveira”:

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Já com a oficialização de Moro no governo Bolsonaro, Deltan Dallagnol chegou a admitir, no dia 19 de dezembro, que “combinava” -em suas próprias palavras- com a juíza os desejos da Força Tarefa para prosseguir na Lava Jato, após a saída do juiz.

“Gabriela não sabe o que é prioridade. Há 500 processos com despacho pendentes e não sabe o que olhar. Combinei de criarmos uma planilha google e colocarmos o que é prioridade pra gente”, escreveu.

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“Diz para ela aproveitar o dia de hoje para fazer as compras de Natal, porque no resto da semana ela vai ter muito que fazer”, satirizou outro procurador, em resposta.

De maneira informal e sem seguir os protocolos judiciais, os procuradores “combinaram”, ainda, encaminhar à Hardt “minuta no estado atual” de petições e recursos para ela “já ir apreciando”.

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As mensagens entre os procuradores e a juíza substituta de Moro seguiam informais até mesmo para tratar de denúncias – a fase final da tarefa dos procuradores:

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Mesmo após a saída de Moro e Hardt assumindo a Comarca enquanto Luiz Antônio Bonat ainda não era escolhido, os procuradores mantiveram as articulações com figuras do Judiciário que já haviam dado explícito apoio às contraditoriedades de Moro, em outras instâncias.

É o caso do então presidente do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), o desembargador federal Thompson Flores. Em dezembro de 2018, Deltan pediu uma audiência com ele para “explicar o que tem por vir”, que a Lava Jato estava “de vento em popa” e que precisavam de seu apoio, para manter pessoal dentro da Vara Federal para o seguimento dos casos.

Nas mensagens, Dallagnol afirma ter receio de que Gabriela Hardt saísse do cargo e queria o apoio de Thompson Flores:

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Já em janeiro de 2019, enquanto articulavam a escolha do sucessor de Moro e o juiz que assumiria a Vara Federal de Curitiba, Dallagnol encontrou entre o lado positivo de Luiz Antônio Bonat que pessoas poderiam “trabalhar por trás” dele, como “Gabriela [Hardt]”:

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—– O documentário “Sérgio Moro: A Construção de um Juiz Acima da Lei” traz os apoios de juízes de outras instâncias, além de Moro, que propagaram as irregularidades da Lava Jato. Reveja:


https://www.youtube.com/watch?v=tBc6AnRZfjo

Leia mais:
https://jornalggn.com.br/justica/as-trocas-de-favores-da-lava-jato-por-cooperacoes-internacionais/

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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