Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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O professor sabe que vai ser demitido quando…, por Wilson Ferreira

por Wilson Ferreira

Esse humilde blogueiro resolveu dar uma pequena contribuição à Antropologia Corporativa. No momento em que escolas e faculdades estão sendo rapidamente adquiridas por grupos educacionais nacionais e internacionais, oligopolizando o setor, a cultura organizacional escolar cada vez mais se assemelha à cultura corporativa. Principalmente naqueles sinais que indicam que o professor vai ser demitido como um mal necessário na implantação das novas e revolucionárias ferramentas organizacionais e educacionais trazidas por messiânicos gestores e CEOs. Fique atento a esses sete sinais. Eles podem também ser estendidos ao mundo corporativo em geral.

1. Sua escola/faculdade foi adquirida por algum grupo educacional estrangeiro ou nacional

A instituição onde leciona é a mais nova unidade dentro de um grupo educacional. Como primeiro passo, certamente terá sua estrutura organizacional rapidamente hierarquizada e verticalizada. Isso requer muito atrito e desgaste político e pessoal dos gestores. Principalmente porque a instituição escolar vai adquirir o cacoete corporativo (mudanças culturais e organizacionais) e se chocará com uma tradicional cultura acadêmica.

Por isso, o comportamento dos gestores e CEOs se assemelha muito ao dos leões machos recém-chegados: quando entram em cena e desposam a leoa, matam os filhotes da cria anterior em um chocante infanticídio. Dentro da lógica evolutiva, tem a ver com a sobrevivência da espécie para que os novos pais não gastem energia cuidando da cria anterior.

Gestores verão professores mais antigos, ou pelo menos anteriores ao “desposamento”, como ameaças em potencial de atritos. Às favas experiência, títulos, proficiência etc. Sistemas corporativos tornam-se tão hierarquizados e repletos de gestores, controllers, diretores (sob deliciosos eufemismos como “reitor”, “pro-reitoria” etc.) que fecham-se em si mesmos. Pouco importa o insumo (in put) ou o produto (out put):  o sistema de auto-reproduz simplificando o que entra (professores) e o que sai (educação).

2. Você leciona há muito tempo na escola/faculdade

Se o professor estiver há pelo menos uma década na instituição adquirida, será visto pelos gestores como alguém frustrado, desmotivado e  com benefícios e prerrogativas que poderão se tornar uma pedra no sapato para as novas “revoluções” organizacionais, trabalhistas e pedagógicas. 

Gestores educacionais veem a si mesmos como orgulhosos messias dos novos tempos. Por isso, tornam-se seres perigosamente impulsivos, acima do bem e do mal, imbuídos de um emergencial espírito de justiça. 

Certamente essas revoluções messiânicas organizacionais (terceirizações, contratos de curto prazo etc.) e pedagógicas (metodologias ativas, educação por competências) entrarão em choque com os saberes da trajetória acadêmica tradicional – mestrado, doutorado, pós-doc.

O psicólogo Alberto Merani em seu livro clássico de crítica à Human Engineering, Psicologia e Alienação (Paz e Terra, 1977) já demonstrou como a alta capacitação educacional entra em choque com a moderna organização do trabalho: profissionais com formação elevada têm muita expectativa de realização no trabalho. Muitas vezes frustram-se ao se verem num cargo/função com uma atividade tão simplificada e com pouco espaço de criação que não exigiria, a princípio, a formação que possuem.

Por isso, a organização muda o foco da formação para competências técnicas, comunicacionais e de inteligência emocional. 

A escola/faculdade transformada em unidade em uma rede educacional criará um “plano de carreira” particular, onde os cursos internos de atualização de novas estratégias didáticas, pedagógicas e capacitação docente (na verdade cursos de adestramento para as novas “revoluções” trazidas pelos gestores) serão mais importantes do que o mestrado e doutorado. 

Aliás, mestres e doutores partirão do zero nesse suposto plano de carreira, partindo do princípio que são ignorantes sobre as revoluções dos novos tempos. 

Por isso, professores com muito tempo de casa são seres potencialmente frustrados e ressentidos: seu investimento de tempo e dinheiro na titulação não serviu para nada.

3. Notas do alunos não serão mais arredondadas

Professores tendem a uma avaliação mais qualitativa do aluno. Para muitos, o sistema de avaliação por notas é um estorvo: como se quantifica conhecimento? O professor tenderá a arredondamentos ou, no mínimo, avaliar de meio em meio ponto.

Ao contrário, gestores são cabeças de planilha Excel… e de data-show. São quantitativos. E quantidade, números ou dados devem obrigatoriamente gerar tabelas, gráficos com elegantes curvas para serem projetadas em data-show em reuniões com CEOs. Devem milimetrizar o progresso, tendências, padrões. 

 Portanto, tenha cuidado se de uma hora para outra for baixado um novo sistema de avaliação por décimos, sem mais arredondamentos. Por trás disso estão gestores cabeças de planilha, impulsivos e com um perigoso senso de justiça.

4. Seu plano de aulas/ensino deve ser convertido para uma planilha Excel

Para a cabeça qualitativa de um professor, um software editor de texto é o suficiente para criar planos de aulas e de ensino. Aula e ensino é como fossem res extensa: a realidade, a matéria no sentido extensivo e qualitativo.

Mas para um gestor, coisas extensas são difíceis de serem monitoradas, controladas e avaliadas por uma espécie de “controle de qualidade acadêmico” que começa a ser implantado.

Se colocar câmeras em sala de aula para monitorar o professor em tempo real tem lá ainda seus impedimentos éticos (cujas “revoluções futuras” certamente darão conta), um plano de aula e ensino convertido em planilha Excel ajuda a prever aquilo que o professor fará – principalmente nas estratégias das chamadas “metodologias ativas”.

Cuidado! Isso poderá ser a última coisa que o professor fará antes de ser demitido: com muito esforço, tempo e paciência, converter a res extensa em res minimum, isto é, do editor de texto para uma planilha onde em cada célula esteja prevista cada ação futura em sala de aula.  

Pode parecer uma metáfora cruel, mas é como se o condenado à morte fosse obrigado a cavar sua própria sepultura antes da execução.

5. O Coordenador fala que “dispara” e-mails

Em geral coordenadores de curso foram ou ainda são professores. Mas no meio dessa “revolução” gerencial e educacional seu coordenador estranhamente começa a adotar jargões corporativos. No meio de reunião ele fala que vai “disparar” e-mails para os professores com os slides da reunião, ao invés de falar “enviar”.

Estranho linguajar corporativo agressivo que denota performance, rapidez, eficiência, emergência etc. 

Mais além, a sala de professores e a sala das coordenações sofrem mudanças arquitetônicas radicais: divisões em baias, mesas imensas e monocromáticas. Tudo se assemelhando aos escritórios corporativos.

A antiga sala do coordenador (um local apinhado de antigas memórias e glórias do curso com posters, quadros com fotos de turmas e alunos notáveis etc.) cede lugar a espaços amplos com divisórias baixas e baias onde coordenadores ficam contidos, olhando-se uns para os outros, como se vigiassem comportamentos e reações mútuas.

Você quer ter uma conversa mais pessoal? Dirija-se a uma sala fechada, o que vai apenas despertar os olhares interrogativos e paranoicos dos demais: o que estará acontecendo!..

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3 Comentários

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  1. O PROFESSOR

    Bastante clara a matéria, senti na pele tudo o que foi descrito acima, fui membro de uma universidade potiguar encampada por um grupo americano, só acrescento um item aos apresentados, a redução gradativa de carga horária.

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