Empresas fazem doações para até oito partidos na mesma eleição

A equação mostra a intrincada relação entre financiamento privado de campanhas, administrações públicas e interesses privados. Mas nem por isso tem sensibilizado governantes e legisladores, salvo exceções. De acordo com o site Política Aberta, lançado recentemente, com dados comparativos sobre financiamentos feitos pela iniciativa privada a partidos e candidatos em 2012, a maioria das empresas que fizeram doações beneficiou em média três partidos ao mesmo tempo.

Os dados oficiais sobre as doações de 2012 já estão no site do Tribunal Superior Eleitoral. E o trabalho do site aponta em que medida muitas das empresas doadoras prestam serviços governamentais no mesmo ano da doação (em projetos que já estavam em fase de execução), tendo continuidade nessa prestação na administração pública durante os anos subsequentes.

De um total de 55.744 empresas que fizeram contribuições eleitorais, 53.454 doaram para três partidos, 913 preferiram destinar recursos para quatro partidos e 519, a cinco. Mas houve até quem extrapolou: 294 empresas se destacaram por doar para seis legendas e 119 chegaram a financiar oito numa mesma eleição. A conduta é uma evidência de que as empresas não investem em programas de governo em sintonia com suas crenças e negócios, mas apostam em futuros contratos.

E o volume de doações pode ter sido maior, porque segundo o organizador do site, Gustavo Oliveira, muitos grupos da iniciativa privada utilizam várias pessoas jurídicas para fazer as doações, dentro da contabilidade do grupo. O que faz com que, algumas vezes, as contribuições não sejam identificadas de imediato como provenientes de determinado grupo empresarial.
 

Em reportagem da edição de setembro do ano passado, a Revista do Brasil já mostrava exemplos disso, como o Bradesco, que além de ter feito doações pelo Banco Alvorada, também distribuiu recursos para os partidos por meio do Bankpar e pela da Tempo Serviços – empresas pertencentes ao grupo. Também são observadas doações do mesmo estilo pela Vale e pelo grupo Braskem. Esse tipo de doação não é ilegal e é feito, muitas vezes, de acordo com a contabilidade de tais grupos empresariais, mas dificulta uma comparação mais detalhada sobre procedência e destino dos recursos.

Dentre as 100 pessoas jurídicas que mais doaram para campanhas nas eleições de 2012, destaca-se a Construtora Andrade Gutierrez, responsável pela distribuição de R$ 81,1 milhões. A centésima da lista, a Construtora Colares Linhares, doou R$ 2,1 milhões. As cem maiores financiadoras foram responsáveis pela destinação de R$ 769,1 milhões para campanhas diversas, 41% do total (R$ 1,8 bilhão).

Dentre as dez empresas que mais doaram figuram, depois da Andrade Guiterrez, a Construtora Queiroz Galvão (R$ 52,1 milhões), Construtora OAS (R$ 44 milhões), Camargo Correa (R$ 32,9 milhões), Vale Fertilizantes (R$ 30,4 milhões), E.V.Teixeira (R$ 28,5 milhões), Banco BMG (R$ 24 milhões), Praiamar Indústria Comércio e Distribuição (R$ 22,4 milhões), JBS (R$ 20,2 milhões) e Construtora Norberto Odebrecht (R$ 19,4 milhões).

No mesmo ano, foram contratadas 135.963 empresas, tanto pelo governo Federal como por governos estaduais. Boa parte destas – em muitos casos – são as tais ramificações destes grupos empresariais responsáveis pelas contribuições. “Isso evidencia a relação existente entre patrocinar campanhas e receber benefícios”, afirmou Gustavo Oliveira.

Mais transparência

Advogado formado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Oliveira faz doutorado em Administração Pública na Universidade de Illinois, em Chicago, e é pesquisador associado ao Centro de Ética de Harvard (Massachusetts). O site compila dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), da Controladoria Geral da União (CGU) e demais órgãos públicos. O objetivo, como diz Oliveira, é permitir às pessoas tirar suas próprias conclusões.

O pesquisador diz que tomou como estímulo para desenvolver a ferramenta a declaração feita no ano passado pelo ministro Luis Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), quando, numa das sessões de julgamento da Ação Penal 470, afirmara: “É legitimo que uma empresa financie um candidato ou partido por representar seus ideais. Mas muitos doam para dois partidos. Que ideologia é essa em que você apoia de um lado e apoia do outro? Faz-se isso por medo ou por interesse?”

Interface com cidadãos

Gustavo Oliveira considera difícil chegar a uma solução para essa contradição ética sem pressão da sociedade. E se diz favorável à centena de entidades da sociedade civil que defende o fim das doações de empresas privadas como ponto de partida de uma reforma política. “Ainda vigora a impressão junto à população de que basta eleger um salvador da pátria e, de cima a baixo, o governo passará a ser bom. Isso não é verdade e tem sido constatado. É preciso que as pessoas se organizem para pedir por uma mudança, mas o governo também tem sua responsabilidade”, observa.

Em seu relatório sobre a pesquisa, Oliveira enfatiza que o site Política Aberta, que entrou no ar em dezembro e ainda está em fase experimental, em vez de prover análise acadêmica de dados fornece uma interface de fácil utilização.“Esperamos que este site ajudar os cidadãos brasileiros a entender a influência indevida de dinheiro privado na política brasileira – e os estimule a batalhar para uma mudança”, destaca.

Desde que a reforma política e o financiamento privado de campanhas passou a ser discutido de forma mais abrangente pelo Congresso Nacional e entidades organizadas, empresários têm evitado falar sobre o tema, inclusive parlamentares que representam a bancada empresarial. Ontem (16), a RBA procurou três empresas: a OAS, o Bradesco e a Construtora Andrade Gutierrez para falar sobre seus critério para fazer contribuições e como analisam as críticas ao modelo. Apenas a última retornou, limitando-se a responder que faz doações de acordo com o que a legislação permite.

30 Maiores doadores de campanha (2012, em R$)

1. CONSTRUTORA ANDRADE GUTIERREZ – 81.165.800,00
2. CONSTRUTORA QUEIROZ GALVAO – 52.135.000,00
3. CONSTRUTORA OAS – 44.090.000,00
4. CONSTRUCOES E COMERCIO CAMARGO CORREA – 32.990.000,00
5. VALE FERTILIZANTES – 30.470.000,00
6. E.V. TEIXEIRA – 28.500.009,08
7. BANCO BMG – 24.008.000,00
8. PRAIAMAR INDUSTRIA COMERCIO & DISTRIBUICAO – 22.410.000,00
9. JBS – 20.210.000,00
10. CONSTRUTORA NORBERTO ODEBRECHT – 19.450.000,00
11. U T C ENGENHARIA – 17.973.149,00
12. CARIOCA CHRISTIANI NIELSEN ENGENHARIA – 15.282.000,00
13. GALVAO ENGENHARIA – 11.697.000,08
14. CONTAX – 11.495.000,00
15. BANCO ALVORADA – 10.250.000,02
16. ITAU UNIBANCO – 10.198.222,50
17. BRASKEM – 9.800.000,00
18. COIMBRA IMPORTACAO E EXPORTACAO – 9.260.187,23
19. TEMPO SERVICOS – 8.880.000,00
20. BANCO BANKPAR – 8.740.000,00
21. LEYROZ DE CAXIAS INDUSTRIA COMERCIO & LOGIS – 7.910.000,00
22. JBS CONFINAMENTO – 7.600.000,00
23. CONSTRUTORA BARBOSA MELLO – 6.994.000,00
24. JSL – 6.950.000,00
25. OAS – 6.750.000,00
26. BANCO SANTANDER (BRASIL) – 6.500.600,00
27. SERVENG CIVILSAN S A EMPRESAS ASSOCIADAS – 6.480.000,00
28. CONSTRUTORA NORBERTO ODEBRECHT BRASIL – 6.090.000,00
29. CASCAVEL COUROS – 5.600.000,00
30. GERDAU COMERCIAL DE ACOS – 5.346.400,00

Fonte: site Politica Aberta

Redação

2 Comentários

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  1. Façam as suas apostas!!!

    O croupier fala para os apostadores e as fichas rolam na mesa. Vermelhos ou pretos; maiores ou menores, ou até o “zero” é motivo de aposta.

    João Alves (dos anões do orçamento, 25 anos atrás), dizia “Deus me Ajudou!!”, depois de ganhar(?) mais de 20 vezes na loteria mais expressiva da época (não lembro qual).

    Constituinte especial para a reforma política é o caminho!

  2. Um dos vetores que

    Um dos vetores que impulsionam os desvios morais e as disfunções administrativas na democracia brasileira é a contribuição de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais. 

    Vou mais além: qualquer esforço de melhoria no processo político pátrio será em vão se não elidirmos essa verdadeira imoralidade da legislação pertinente. 

    Diz a sabedoria popular que para se saber se uma causa é boa ou não, basta saber quem a defende, ou, como é o caso,  quem a ataca. Quem são os mais ferrenhos críticos de uma eventual reforma política que extinga essa modalidade de custeio de campanhas? 

    Resposta: são os partidos conservadores e seus áulicos na imprensa, e por óbvio, parte do mundo empresarial que se vale dessa prática para angariar vantagens econômicas e políticas. Mas por que? Não são eles que posam de vestais e vivemclamando aos quatro ventos por ética na política? 

    São contra por ânimo ideológico, mas, e principalmente, financeiro. Ideológico porque são democratas de fachada. Não aceitam que seu principal apanágio – eleições – se realize unica e exclusivamente dentro de parâmetros livres de qualquer influência. Ou seja, que o povo se manifeste soberanamente e que os eleitos sejam efetivamente seus representantes, e não de estamentos do capitalismo. 

    Financeiro porque  numa primeira fase os beneficiários maior dessa montanha de recursos serão as estruturas midiáticas contratadas para promoverem campanhas caríssimas e recheadas de efeitos especiais com consequente ofuscamento do que mais interessa: as idéias e propostas de candidatos e partidos. Numa segunda fase ter nas mãos congressistas para defenderem os interesses do Capital nos seus mais diversos aspectos. 

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