Qual é o tamanho do agronegócio brasileiro? (1/3), por Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva

No Brasil, o PIB começou a ser calculado em 1946, em resposta à institucionalização das relações internacionais.

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Qual é o tamanho do agronegócio brasileiro? (1/3)

por Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva

Desvendando o PIB

Os jornalistas insistem, ao compararem países, em divulgar o PIB nominal. Além disso, a linguagem corrente usa termos como PIB negativo, denotando desconhecimento de como se comparam períodos. Para começar, não existe PIB negativo porque, sendo a soma de tudo o que se produz num dado local, num dado período, é impossível “desproduzir”, ou seja, não existe produção negativa. Mesmo que se quisesse desmontar todos os carros produzidos em um ano, por exemplo, seria preciso pagar alguém para fazer isso e, consequentemente, o desmonte entraria positivamente no cálculo do produto interno bruto. Nem mesmo uma bomba atômica seria capaz de tamanha incoerência. É que, até o momento da explosão, algo teria sido produzido. Aliás, não havendo o que destruir, não haveria por que usar uma bomba atômica. O que há é variação positiva ou negativa do PIB, jamais um PIB negativo.

Nas faculdades de economia, isso é visto numa matéria chamada de Contabilidade Nacional. A ideia de usar os ditames contábeis para medir a atividade econômica surgiu como resposta a tudo o que se discutia acerca da crise de 1929. Havia quem dissesse que a renda americana tivesse caído pela metade entre 1930 e 1932, enquanto outros dizia ter-se reduzido em menos de 30%. Falava-se em renda, mas que renda? Como medir isso? Muita gente se perguntava como seria possível afirmar que sim ou que não, rumando às cegas pelo emaranhado de atividades que compõem a vida material da população. Muitos trabalharam, mas somente Simon Kuznets ganhou o prêmio Nobel, em 1971, por sua colaboração na introdução do cálculo do PIB nos Estados Unidos, a partir de 1936. No Brasil, o PIB começou a ser calculado em 1946, em resposta à institucionalização das relações internacionais.

Esse cálculo trazia dificuldades em seu bojo, muitas delas ainda não sanadas. Um grande salto foi dado por Wassily Leontief, vencedor do Nobel de 1973, ao estudar a interrelação entre setores, o que resultou na matriz input-output, mais tarde, nas matrizes de dupla entrada e aplicação das partidas dobradas de Richard Stone, Nobel de 1984, à contabilidade nacional.

O maior problema para o cálculo do PIB chama-se dupla contagem. Para produzir cana-de-açúcar, por exemplo, consomem-se recursos; para produzir açúcar, por sua vez, usa-se a cana e mais outros recursos. Assim, não se pode contar com a soma da produção de cana com a produção de açúcar porque o açúcar já embute os custos com a cana. Assim, deve-se considerar somente o valor da produção de açúcar para não contar duas vezes o valor da cana. Dessa forma, o PIB precisa contemplar o intrincado da cadeia produtiva distorcendo o mínimo possível os resultados.

Sim, jamais se poderá estar livre de distorções porque o PIB é uma estimativa e o seria mesmo que não houvesse informalidade alguma no país e todos emitissem notas-fiscais e recolhessem religiosamente seus impostos. Para facilitar o trabalho, dividiu-se a economia em três setores: primário, que corresponde à produção de matéria-prima, seja ela advinda da mineração ou da lavoura; secundário, que corresponde à transformação das matérias-primas em bens consumíveis, basicamente a indústria; e o terciário, que faz com que as mercadorias cheguem ao consumidor, seja em bens, seja em serviços. A lavoura, quando compra minerais como calcário, promove transações circunscritas ao setor primário. O lavrador de algodão, ao vender para o cotonifício, promove uma transação do primário para o secundário; quando o cotonifício vende o fio de algodão para a tecelagem e a tecelagem para a confecção, promovem transações circunscritas ao setor secundário. Da mesma forma, quando uma empresa de geologia prospecta ferro, promove transação do setor terciário para o primário. Já um distribuidor de medicamentos, que compra da indústria farmacêutica e fornece às farmácias, está gerando transações que vão do setor primário ao terciário e, ao mesmo tempo, entre entidades circunscritas ao setor terciário. A figura a seguir mostra a matriz intersetorial:

O problema dessa matriz é que muitas atividades têm um pé num setor e outro em outro. O café é um bom exemplo disso porque há produtores que vendem seus grãos somente secos, no que se costuma chamar de café em coco, enquanto outros só beneficiam seus grãos, descascando e retirando-lhes o pergaminho. Outros ainda classificam seus grãos e os destinam para muitos compradores. Por outro lado, há empresas que se especializaram em beneficiar e classificar grãos de café, trabalhando para os produtores em troca de parte do produto. Fica muito difícil determinar quem pertence a que setor. Há combinações até bizarras como os restaurantes com produção própria. Tendo em vista que não se comem alimentos sem preparo, onde coloca-los? A tendência é usar a atividade predominante, como se faz no Cadastro Nacional de Atividades (CNAE).

Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva é economista, estudou mestrado na PUC-SP, é pós-graduado em Economia Internacional pela Columbia University (NY) e doutor em História Econômica pela USP. No terceiro setor, sendo o mais antigo usuário vivo de cão-guia, foi o autor da primeira lei de livre acesso do Brasil (lei municipal de São Paulo 12492/1997), tem grande protagonismo na defesa dos direitos da pessoa com deficiência, sendo o presidente do Instituto Meus Olhos Têm Quatro Patas (MO4P). Nos esportes, foi, por mais de 20 anos, o único cavaleiro cego federado no mundo, o que o levou a representar o Brasil nos Emirados Árabes Unidos, a convite de seu presidente Khalifa bin Zayed al Nahyan, por 2 vezes.

Luiz Alberto Melchert de Carvalho e Silva

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