Nos EUA, o culto às armas, à violência e, de quebra, ao desrespeito

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

Enviado por Tamára Baranov

da Revista Samuel

BRINCANDO COM FOGO: ATIRE NO PRESIDENTE-ZUMBI (OU NA SUA EX)

Nos EUA, empresa fabrica e vende alvos para tiros: um boneco zumbi de Obama e uma versão machista da sua ex-namorada: decotada, indefesa e pronta para ser baleada
 

 


Alexa, ou simplesmente “a ex” é o único exemplar feminino na lista de produtos da Zombie Industries

por Felipe Amorim

A indústria de armas dos Estados Unidos também resolveu entrar na onda da febre por artigos zumbi. Depois do sucesso mundial da série The Walking Dead — que, além de ter inspirado games e incentivado Hollywood a levar um affair de mortos-vivos para as telas do cinema, também deu motivos para crimes banais —, uma empresa californiana encontrou uma maneira, não muito ortodoxa, de capitalizar sobre o fetiche hype pelo “apocalipse zumbi”. Para dar vida à experiência, a Zombie Industries vende alvos tridimensionais em tamanho real que podem sangrar, ser mutilados e até explodir em pedaços. Entre os bonecos “infectados com o vírus zumbi”, dois deles têm causado grande polêmica no país: Rocky (pela sua mórbida semelhança com o presidente Barack Obama) e Alexa (único exemplar feminino entre os manequins, a ex-namorada em que você pode atirar).

Durante esta semana, o encontro anual da maior organização pró-armas dos EUA, aNRA (National Rifle Association), reuniu mais de 70 mil visitantes em Houston, no Texas. Em um dos estandes da feira, a Zombie Industries expôs todos seus alvos para tiros: alienígenas, palhaços, alguns animais, soldados nazistas e um árabe barbudo (terrorista muçulmano, obviamente) que muito se parece com Osama Bin Laden. No entanto, somente o boneco com traços que lembram o presidente democrata dos Estados Unidos incomodou os organizadores. Incomodou tanto, que a NRA, entidade que se apresenta como guardiã da 2ª Emenda Constitucional do país e defensora dos direitos dos proprietários de armas, pediu para que fossem retirados da exposição os exemplares do boneco “Bleeding Rocky Zombie” — mas que ainda pode ser adquirido online pelo preço de US$ 89,95 (R$ 180).


“Qualquer semelhança é mera coincidência?”: NRA obrigou empresa a retirar produto dos estandes

Em seu site, a empresa afirma que tudo o que vende é fictício. “Nomes, personagens, histórias, lugares e incidentes são produtos da imaginação do autor, usados com propósitos ficcionais”, adverte a companhia, que disponibiliza uma espécie de releasesobre cada boneco; todos têm nome e uma “historinha” para situar os personagens. “Qualquer semelhança é mera coincidência”. Será? Perguntados pelo site BuzzFeedsobre o fato de a familiaridade ser ou não intencional, funcionários da empresa presentes no evento da NRA desconversaram. “Vamos apenas dizer que eu dei um desses de presente de Natal ao meu pai, um republicano.”


Feitos de plástico biodegradável, os modelos da Zombie Industries simulam sangue e mutilação; alguns até explodem

No site da empresa, a descrição do produto vem recheada de referências sutis a conteúdo político. “Fique alerta, Rocky é ALTAMENTE perigoso em função da sua ágil perspicácia e força. Ele foi visto pela última vez gritando algo como: ‘Zombie Industries acreditam na América!’. E nós acreditamos.” O slogan da campanha do republicano Mitt Romney, adversário de Obama em 2012, era “Believe In America”.

Favorável a políticas restritivas a armas, Obama subiu o tom do discurso após os ataques na escola de Newtown, em Connecticut em dezembro de 2012. Após o Senado rejeitar uma proposta bipartidária para o controle de armamentos, o presidente manifestou seu desapontamento. “Um dia vergonhoso. Como uma medida desejada por 90% da população é rejeitada por uma minoria no Senado?”, questionou.

“A ex”

Além do “exemplar presidencial”, a empresa também vende um boneco chamado simplesmente de “a ex” — uma modelo peituda, com um generoso decote, que sangra quando é alvejada. Dos cerca de 15 produtos disponíveis, Alexa é o único manequim feminino.

“Discriminar as mulheres excluindo elas de estarem representadas na nossa lista de produtos seria apenas algo sexista”, diz a empresa, que não vê contradição entre o seu discurso e os estereótipos machistas — fatalmente, perigosos — reforçados pela maneira como a única personagem feminina foi construída.

Muitos críticos da linha de produtos da Zombie Industries insistem que a violência contra a mulher está longe de ser apenas um contratempo qualquer, na verdade, é um problemão. De acordo com o site PolicyMic, a violência doméstica é a maior causa de danos às mulheres; mais do que acidentes de carros, assaltos e estupros. Um terço das mulheres vítimas de homicídio nos EUA são mortas pelo parceiro.

Obama-zumbi na TV

Comercializados pela empresa californiana desde o ano passado, os modelos obamanescos de Rocky já chegaram até a aparecer em dois seriados da rede Discovery Channel. Os programas são uma espécie de mistura pró-armas entre as séries de sucesso Myth Busters e American Choppers — em vez de motocicletas ou mitos do senso comum, o elenco testa e produz armamentos.

Em Sons Of Guns, o reality-show sobre uma pequena fábrica de armas na Louisiana, os bonecos zumbis apareceram no episódio final da 3ª temporada, que foi ao ar em abril de 2012. No programa, os protagonistas foram desafiados a produzir “A” arma anti-zumbi. Para testar a peça, vários modelos da Zombie Industries foram usados, entre os quais alguns exemplares de Rocky.

O segundo seriado, American Guns, não teve tanto sucesso, e foi cancelado pela Discovery após o massacre na escola de Newtown. Em um episódio chamado “Zombie Takedown”, alguns modelos Rocky também serviram de alvos para tiros, explosões e esfaqueamentos.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

8 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Texto é propaganda anti

    Texto é propaganda anti americana, quando nosso país mostrar uma redução da violência e ter niveis próximos dos EUA e europa poderemos criticar outros paises.

     

    1. Causas e efeitos

      Nossa grande  violência ainda é de outro patamar: o de Casa Grande e Senzala.

      E seus capatazes e capitães de mato.

      Fora isso, os EUA (pretensamente o mais “avançado”) têm os maiores índices de violência do chamado mundo desenvolvido.

       

    2. É diferente

      Nos EUA, a violência é cultural, no Brasil, a violência é consequência da desigualdade. Tem que criticar a cultura norte-americana sim, porque ela influencia a brasileira, uma vez que o mundo é globalizado e os EUA são o país mais rico do mundo.

  2. Cada louco com sua mania.

    Prezados e prezadas,

    A beleza da Democracia e do debate livre é que um dia, quando você menos espera, você pode concordar com alguém que nunca imaginou fazê-lo, ainda que por motivos ideológicos díspares.

    O texto é ingênuo, por onde quer que se olhe, seja do ponto de vista simbólico (discurso da violência ou cultura da violência), seja pelo aspecto pragmático, ou em outras palavras, da realidade.

    Daí que o AL tem certa razão em reclamar.

    Não faz sentido nenhum questionarmos o uso da violência pela sociedade estadunidense ou outra qualquer, na medida que ostentamos níveis de uso desta faceta humana (violência) bem menos “eficazes”.

    Quem pode imaginar que poderá ser construída a maior nação do planeta (para o bem e para o mal) sem o uso de armas em todas as escalas, e que a convivência com este instrumento poderá gerar uma socidade 100% saudável, do ponto de vista das fantasias sobre o uso da força?

    Mas por outro lado, quem nos garante que sociedade consideradas mais pacíficas não carreguem os mesmos germes violentos, mas que se manifestem de forma distinta.

    É ultrajante assistirmos as manifestaões de racismo dos estadunidenses, mas em quê as nossas manifestações são melhores?

    Eles dizimam países e vizinhos para benefício próprio? É verdade, mas nsão será pior termos feito o que fizemos com o Pararguay sem benefício algum, senão cumprir ordens da Inglaterra?

    Só tem sentido olharmos para os exemplos de outros países com o viés de aprendizado, isto é, sabermos o que devemos evitar.

    E enfim, se permitir a compra de um boneco que represente a ex, ou qualquer outra simbolização de repulsa, consiga confinar a violência no campo ficção ou da “terapia”, e prevenir que mulheres sejam mortas ou espancadas, eu me dou por satisfeito.

    Afinal, qual sociedade não tem o seu ritual de “judas” para malhar?

    Saudações a todos.

  3. Vernon Walters ressucitado.

    Esse agente dos interesses americanos, que insiste em se manifestar aqui no blog com o codinome aliancalibera,l só pode ser o Vernon Walters ressucitado.

  4. Não há semana em que não

    Não há semana em que não temos notícia de tiroteio nos EUA. Ontem, 25 de janeiro, um jovem de 19 anos, que tinha uma mochila cheia de explosivos, matou duas pessoas em um shopping em Maryland e depois de abrir fogo se suicidou. Essa é a sociedade norte-americana civilizada.

    Que o brasileiro, que tanto adora copiar os gringos, apenas consuma os seus lanches horrorosos e seus refrigerantes, as idéia de girico que fique por lá mesmo. 

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador