Super Terça nos EUA surpreende e garante vitória a Joe Biden

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Fenômeno de transferência de votos em curto tempo garantiu a maior quantidade de delegados ontem ao ex-vice-presidente de Barack Obama

Foto: Reuters/Patrick Fallon

Jornal GGN – Apesar de angariar a maior porcentagem de delegados da Califórnia, estado que sozinho carrega 415 do total de 1.357 definidos na jornada desta Super Terça-Feira, o social-democrata Bernie Sanders sofreu as consequências do rápido fenômeno de transferência de votos do setor mais conservador do partido, que garantiu a vitória do ex-vice-presidente Joe Biden nos 15 estados e territórios que foram às urnas ontem (03).

Logo no início desta manhã, as estimativas da Associated Press (aqui) calculavam 453 delegados para Joe Biden versus a apertada conta de 382 para Bernie Sanders. O The News York Times (aqui) também contou a vitória ao ex-presidente de Barack Obama, com as apurações parciais de 390 delegados contra 330 a Sanders, até as 10h desta quarta.

O resultado não era esperado até uma semana atrás. Porque na corrida interna para definir o democrata que disputará, em novembro, as eleições contra o republicano Donald Trump, outras cartas conservadoras dividiam o eleitorado estadunidense. Mas a saída de dois deles – Pete Buttigieg e Amy Klobuchar, que anunciaram o apoio a Biden – virou o jogo ainda neste sábado, quando o ex-vice-presidente obteve uma vitória massiva na primária na Carolina do Sul.

Naquele momento, a boa parcela de eleitores democratas indecisos que não estava completamente satisfeita com a proposta outsider de Bernie Sanders decidiu, muitos deles minutos antes de votar, por Biden. Foi o que mostrou a cobertura ao vivo dos jornais dos Estados Unidos, durante todo o dia desta terça e manhã desta quarta (04).

Como resultado, faltando apenas poucas porcentagens para a verificação completa de votos, o ex-vice-presidente de Barack Obama garantia uma diferença de 60 delegados a mais do que seu concorrente interno, o senador por Vermont.

Infográfico do NYT com a apuração em tempo real da Super Terça-Feira. Resultado captado às 10h40, desta quarta.

Enquanto Sanders realmente garantiu a maior porcentagem (33%) na Califórnia, estado massivo, contra 24% de Biden, a opção mais conservadora dos democratas obteve vitórias em quase todos os demais estados, incluindo o também representativo Texas, com uma pequena diferença de 33% contra 30% de Sanders.

Alabama, Arkansas, Massachusetts, Minnesota, Carolina do Norte, Oklahoma, Tennessee e Virginia, além do Texas deram a maioria a Joe Biden, apesar de muitas vezes a diferença ser estreita. O estado de Maine, com ainda 73% dos votos contabilizados, também caminhava a vitória a Biden.

Já Sanders conquistou 33% de toda a Califórnia, contra 24% de Biden, e 36% do Colorado, contra 23% do concorrente. Em Utah, 35% para o senador, em uma grande diferença dos 17% de Biden, e Vermont, o estado do qual se elegeu senador também garantiu a ele massivo (51%) eleitorado.

Assim, a votação interna dos Democratas nesta Super Terça-Feira garantiu a vitória do ex-vice-presidente de Barack Obama para disputar, no final deste ano, as eleições contra Donald Trump.

Há, ainda, contudo, outro passo a seguir: apesar da maior parte dos delegados terem sido definidos ontem (1.357), mais de 600 delegados ainda precisam ser escolhidos, o que ocorrerá até a Convenção Nacional do partido, no final de julho. Para obter a indicação à disputa eleitoral, o candidato precisa obter a metade dos 3.979 delegados no primeiro turno.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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  1. Eleições Livres, Diretas e Facultativas. E isto apenas para escolher o Candidato do Partido. Voto em cédula de papel em urnas de papelão ou plástico reciclável a custo irrisório. E isto apenas para Candidato a Candidato. E isto na Nação mais rica do Planeta. Eleições Livres, Diretas e Facultativas em Cédulas de papel (às vezes do tamanho de uma folha de jornal) para escolher de Diretor da Escola do bairro ao Presidente da República. Nós temos TSE. Voto Obrigatório. Urna Eletrônica. Biometria Fascista e este excelente exemplo de Redemocracia Tupiniquim. Pobre do Mundo. Pobre dos Americanos. Não sabem o que estão perdendo. Nós, sim !! Sorte a deles !! Pobre país rico. Porém temos Urna Eletrônica, 100.000 assassinatos por ano e IDH’s animalescos. Mas de muito fácil explicação.

  2. Não dá para enfrentar o establishment e todo seu poderio de pre$$ão e chantagens.
    Vitórias como a do presidente Lula e outros nos anos 2000 foram pontos fora da curva que trataram de consertar rapidamente.

  3. Biden pode ser um tiro no pé dos Democratas

    por Marcelo Zero*, no Viomundo

    Os resultados da Super Tuesday, ocorrida neste último dia 3, mostram que a poderosa máquina do Partido Democrata foi colocada a serviço do pré-candidato Joe Biden.

    Biden, que tinha ido muito mal nas prévias anteriores, à exceção da Carolina do Sul, ressurgiu das cinzas para ganhar em 9 estados: Arkansas, Alabama, Massachusetts, Minnesota, North Carolina, Oklahoma, Tennessee, Texas e Virginia.

    Em alguns desses estados, como Minnesota e Massachusetts, lugares nos quais se esperava a vitória de Sanders, Biden ganhou sem sequer fazer campanha.

    Já Sanders assegurou a vitória no maior colégio eleitoral (Califórnia) e em Vermont, Utah e Nevada.

    O resultado do Maine continua indefinido.

    As projeções indicam que Biden deverá ter algo em torno de 670 delegados e Sanders ao redor de 590.

    São necessários 1.991 para assegurar a nomeação como candidato oficial do partido.

    Assim, Sanders continua no páreo, mas consideravelmente enfraquecido.

    Biden emerge como favorito e os outros candidatos, como Warren e Bloomberg já não têm mais nenhuma chance.

    A ascensão de Biden foi conseguida graças ao apoio dos eleitores afro-americanos, dado o apoio de Obama ao seu antigo vice, e à afluência, de última hora, de eleitores democratas conservadores aos locais de votação para apoiar Biden, convocados que foram pela máquina partidária.

    Há uma grande campanha dos democratas conservadores, da plutocracia norte-americana e da imprensa convencional contra a candidatura independente de Sanders, exclusivamente financiada por doações de pessoas físicas.

    Essa campanha se baseia, fundamentalmente, em três argumentos falaciosos.

    O primeiro é o de que Sanders seria muito velho (78 anos), além de ter sofrido recentemente um ataque cardíaco. Portanto, não teria condições físicas de assumir plenamente a presidência.

    Ora, Biden é apenas um ano mais novo que Sanders (tem 77 anos). Além disso, o ataque cardíaco sofrido por Sanders não foi grave e ele está plenamente recuperado. Sanders é incansável.

    O segundo argumento é o de que Sanders não teria condições de derrotar Trump.

    Apenas Biden, que é mais moderado, seria capaz de derrotar o candidato republicano. Essa falácia foi decisiva, nesse resultado da Super Tuesday. Ora, não é o que dizem as pesquisas.

    A pesquisa mais recente, feita pela Fox News, indica que Sanders ganharia, hoje, de Trump, no voto popular, por 49% a 42%.

    Segundo a mesma pesquisa, Biden também ganharia de Trump por 49% a 41%. A vantagem de Biden sobre Sanders seria, desse modo, de apenas 1%.

    Outras pesquisas, como a da Yahoo News, dão uma vantagem maior para Biden (3%), mas mantêm a previsão de que Sanders poderia derrotar Trump.

    Há de se considerar que Biden é mais forte nos estados conservadores, onde se espera a vitória de Trump. Biden deverá perder a disputa do voto conservador para Trump.

    Já o afastamento de Sanders da disputa poderá afugentar o voto dos jovens e do eleitorado mais progressista, pois nos EUA o voto é facultativo.

    Foi esse tipo de voto, associado a uma grande afluência às urnas, que conduziu o Partido Democrata à grande vitória de Obama, em 2008.

    Na época, também diziam que Obama não teria muitas chances. Contudo, Obama ganhou o pleito por esmagadora maioria, a maior diferença em meio século, justamente por ser um candidato “diferente”.

    O terceiro argumento, vinculado ao segundo, tange à suposta “radicalidade” do senador de Vermont.

    Sanders é constantemente caracterizado como um candidato “muito radical”, “populista” e “socialista”, cujas propostas são “perigosas” e “inexequíveis”.

    Uma análise mais acurada, porém, mostra que a agenda econômica de Sanders, que ele chama de “21st Century Economic Bill of Rights” (Declaração de Direitos Econômicos do Século XXI), nada mais é que a agenda que a socialdemocracia europeia implantou no pós-guerra do século XX.

    Sanders afirma, com razão, que é não é normal que o país mais rico do mundo tenha 40 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza, 34 milhões de cidadãos sem nenhuma assistência à saúde e metade de sua população mal tendo o suficiente para sobreviver.

    Ele quer que todo cidadão norte-americano tenha acesso à educação pública gratuita em todos os níveis (inclusive o universitário), a um sistema de saúde gratuito e de qualidade, à habitação a preços acessíveis e a uma aposentadoria decente.

    Ressalte-se que, hoje em dia, os cidadãos dos EUA estão afogados em dívidas com hipotecas de habitação (US$ 9,44 trilhões), financiamentos de estudos universitários (US$ 1,6 trilhão) e saúde (US$ 82 bilhões).

    Bernie quer acabar com essas dívidas ou reduzi-las e financiar sistemas públicos e gratuitos, em saúde e educação, taxando a especulação financeira e os muito ricos.

    Além disso, Sanders propõe aumentar o salário mínimo para US$ 15 a hora e incrementar a taxa de afiliação a sindicatos, com o objetivo de ampliar a poder de barganha dos trabalhadores.

    Enfim, Sanders quer salvar o capitalismo norte-americano do beco sem saída da desigualdade, da pobreza e das dívidas impagáveis dos trabalhadores e das classes médias.

    Quer construir, com décadas de atraso, um Estado de Bem-Estar digno da nação mais rica do mundo.

    Quer fazer o que a maior parte dos países europeus importantes e o vizinho Canadá já fizeram. E quer reconstruir a outrora pujante e afluente classe média dos EUA.

    É por isso que ele vem empolgando os eleitores mais jovens e progressistas, assim como os hispânicos, que historicamente comparecem muito pouco às urnas, mas que estão bastante comprometidos com Bernie.

    Sanders, do alto de seus 78 anos, representa um sopro de verdadeira renovação na mesmice conservadora da política dos EUA.

    Portanto, a aposta no conservador Biden para enfrentar o também conservador Trump pode ser equivocada.

    Biden deve perder a disputa do voto conservador para Trump e, por outro lado, não motivar o eleitorado jovem, o eleitorado mais progressista, o eleitorado hispânico e o eleitorado mais pobre. Este último, frise-se, também comparece pouco às urnas.

    Considere-se que a questão do comparecimento, num país com voto facultativo, é fundamental.

    Com o carismático Obama, em 2008, o comparecimento foi de quase 59%. Com o conservador e apático Gore, em 2000, o comparecimento foi de 50%.

    Gore perdeu para Bush, mesmo ganhando no voto popular. Já Obama ganhou fácil, tanto no voto popular quanto no Colégio Eleitoral (365 contra 173).

    A polarização e o consequente estímulo ao comparecimento às urnas poderiam favorecer os democratas, na disputa de novembro. A mesmice tende a favorecer os respublicanos.

    Com o morno e conservador Biden, a coisa pode se complicar. Pode ocorrer o que normalmente ocorre: só sairão em grande número para votar os brancos conservadores. Os que poderiam fazer a diferença ficariam em casa, sem estímulos para votar.

    A aposta em Biden e a demonização de Sanders e de suas propostas podem ser um tiro no pé dos democratas.

    *Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.

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