Os holofotes se voltaram para o Japão

Jornal GGN – O jogo de luzes e as atenções se voltaram para o vizinho incômodo: muito se especula sobre o quanto a China conseguirá crescer com suas novas medidas econômicas, recente e nebulosamente anunciadas. No entanto, um outro grande “tigre asiático” ainda sofre com as sombras deixadas pela crise, recolhe os “cacos” de 15 anos de recessão e, de forma geral, pouco se fala no assunto.

A economia do Japão expandiu somente 0,3% no período entre julho e setembro, em comparação com o trimestre anterior, de acordo com dados do governo divulgados na última segunda-feira (9). O número, aliás, foi revisado para baixo: 0,5% era o índice inicialmente divulgado, e 0,4% o esperado por analistas.
 
O dado revisado do Produto Interno Bruto se traduz em um crescimento anualizado de 1,1%, ante leitura inicial de 1,9%. A expectativa era de revisão para 1,6%. O resultado destacou ao mundo a fragilidade da recuperação econômica japonesa, que agora passa por um impulso temporário da demanda, enquanto a população aguarda, temerosa, o aumento no imposto sobre vendas em abril.
 
Como se não fosse suficiente, na quinta anterior, o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, aprovou um pacote econômico de US$ 182 bilhões. O objetivo, segundo ele, era tirar a economia da deflação. No entanto, o cenário no país ainda é de dúvidas sobre o impacto econômico desta medida: de acordo com especialistas, é um número exagerado, já que inclui empréstimos de credores apoiados ao governo e gastos de governos locais já planejados.
 
Para Celso Grisi, da consultoria Fractal e professor de marketing da FEA/USP, o problema japonês, além de financeiro, tem fundos absolutamente culturais.“O Japão atravessa uma crise particular: oferta muito grande de mão de obra barata, e uma migração poucas vezes vista. Além disso, o país está com preços em queda devido à falta de consume e à poupança excessive, que é quase uma tradição local. O plano do governo está tentando reverter isso, dando liquidez ao mercado de forma semelhante à compra de papeis nos Estados Unidos. Mas é complicado mexer em algo que já está irraigado”, explica.
 
Uma situação pouco trivial
 
O pacote aprovado inclui medidas para impulsionar a competitividade; auxiliar mulheres, jovens e os mais velhos; acelerar a reconstrução após terremoto e tsunami de março de 2011; e construir infraestrutura para a Olimpíada de Tóquio de 2020.
 
O anúncio, cuja expectativa das autoridades é a de aumentar 1 ponto percentual ao Produto Interno Bruto e criar cerca de 250 mil empregos, levantou as preocupações de que o governo do Japão não se afastou de medidas paliativas e decisões de políticas fragmentadas – que alguns dizem terem afetado o crescimento de longo prazo.
 
Parece o plano perfeito, mas o professor de MBA em Gestão de Riscos da Escola Trevisan de Negócios, Claudio Gonçalves, alerta para o que pode ser um perigo ainda maior. “A dívida japonesa atual equivale a US$ 14 trilhões, cerca de 245% do PIB. É uma economia que depende da saúde de outras economias do mundo para se manter em pé. Mas aí, quando damos um giro rápido, vemos os Estados Unidos ainda de joelhos e a Europa crescendo minimamente, com países ainda em situação delicadíssima. O que fazer para colocar uma economia globalizada nos trilhos em um mundo que não está alinhado?”, analisa.
 
O especialista diz que os japoneses realmente tendem a poupar em seu país para gastar fora. No entanto, uma solução encontrada tem afetado outra ainda não consolidada, criando uma espécie de roda viva difícil de ser contida. “A desvalorização do iene em 15% foi positiva para tornar o produto japonês mais barato no mercado internacional, buscando aumentar a exportação desses produtos para ganhar competitividade. Porém, quem está comprando lá fora? Praticamente ninguém. Além disso,  o governo precisou aumentar impostos para arrecadar mais, aumentando custos – o que automaticamente tornaria os produtos mais caros. Ou seja, se você aumenta a carga tributária, neutraliza o ganho de competitividade. Em resumo, o desafio de Abe, e do Japão como um todo, é enorme”, exemplifica.
 
Todos concordam: o problema não é único: é um contexto que extrapola a economia japonesa, que depende de outras nações para se reeguer. Como isso ainda não aconteceu, estão previstas outras medidas mais duras a serem adotadas nos próximos meses, especialmente nas relações fiscais – até para evitar que o PIB fique ainda mais comprometido.
 
Suspiros nada aliviados
 
Na sexta-feira (13), o governo local anunciou um respiro positivo na indústria, que subiu 1,0% em outubro ante o mês anterior – o segundo seguido de crescimento, tentando demonstrar uma recuperação estável da economia. O dado foi comparado, inclusive, à leitura inicial de alta de 0,5%. A utilização da capacidade também teve alta de 1,2%, para 99,6, em comparação a setembro.
No entanto, os problemas práticos japoneses ainda estão longe de serem resolvidos. “É um momento de ponto morto. O pacote de dezembro chegou para novamente estimular o consumo interno e facilitar as exportações. Mas as reações estão aquém do esperado, até o momento. O Japão ainda não conseguiu ganhar uma expressiva participação de mercado, e só o aumento da dinâmica do consumo é que poderá salvar o país da degradação de renda, da mão de obra barata e excessiva, entre outros fatores. Por essas e outras razões, duvida-se da sustentabilidade deste plano”, completa Grisi.
 
E, proporcionalmente, o projeto é bastante agressivo, se comparado por exemplo, a medidas econômicas tomadas nos Estados Unidos pós-crise em 2008, dizem os analistas. Entretanto, falta confiança, investimento e consumo no país. Famílias e empresários também não acreditam nas medidas governistas e ninguém está certo do grau de eficiência desse pacote econômico.
 
“O imposto sobre vendas pode trazer um pouco de inflação, o que é inclusive um dos objetivos do governo. Mas a vida das pessoas, por outro lado, também ficará mais cara. O imposto sobre grandes fortunas, uma das saídas que o governo pode adotar, também é uma medida impopular. O Japão de hoje só não vai à bancarrota porque ainda possui credibilidade no mercado. Tem o mérito de ser uma economia inovadora e que pensa no futuro. Mas vai precisar de medidas realmente impactantes e severas para fugir de uma crise ainda mais latente”, conclui Gonçalves.
 
 
 
Redação

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