Wikileaks: DOJ preparou a Lava Jato e cooptou a Justiça brasileira, por Luis Nassif

O próximo evento da AJUFE (Associação dos Juízes Federais), financiado pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, é uma continuação do Projeto Pontes, que transformou definitivamente a Justiça e o Ministério Público Federal em instrumentos de disputas geopolíticas.

Já havia elementos suficientes mostrando a preparação da Lava Jato pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos. O encontro da AJUFE despertou pesquisadores, que localizaram um telegrama, no Wikileaks, que descreve com previsão como começou a Lava Jato.

De 4 a 9 de outubro de 2009, foi montado seminário similar no Rio de Janeiro, com o título “Crimes financeiros”, bancado pelo DoJ, com a participação de juízes e procuradores de cada um dos 26 estados brasileiros e do Distrito Federal, mais de 50 policiais federais e mais de 30 procuradores, juizes e policiais estaduais. Participaram também membros do México, Costa Rica, Panamá, Argentina, Uruguai e Paraguai.Foi um seminário de uma semana, sob o álibi genérico de combate ao terrorismo.

Foi o primeiro evento do Projeto Pontes, cuja missão era consolidar o treinamento das polícias para a aplicação da lei bilateral. Cuidou-se de concentrar em trabalhos práticos, evitando os temas teóricos – que, aliás, poderiam enveredar por aspectos legais da cooperação.

Segundo a nota do Wikileaks, em geral as autoridades brasileiras preferiam termos mais genéricos, como “crimes transnacionais”, evitando qualquer referência ao terrorismo. Naquele ano, a conduta mudou. No telegrama da Wikileaks, anota-se o fato de que, ao contrário das reuniões com o Ministério das Relações Exteriores e da Justiça, onde se evitava o termo terrorismo, o público da conferência estava claramente interessado no tema.

Terrorismo, aliás, a palavra-chave para a cooperação internacional e, especialmente, para a parceria entre juízes e procuradores brasileiros com as áreas de segurança do governo americano – leia-se DHS e CIA.

O treinamento foi amplo e prático, incluindo a preparação de testemunhas. Nas conclusões do seminário estava a necessidade de, no futuro, as investigações se basearem em forças tarefas, como maneira mais efetiva “de combater o terrorismo no Brasil”.

Segundo as avaliações do telegrama, o seminário demonstrou claramente que os juízes federais, promotores e outros profissionais da lei estavam menos preocupados com o campo minado político e “genuinamente interessados em aprender como melhor envolver o processo judicial na luta contra o terrorismo”.

Os dois conferencistas mencionados no telegrama foram o Ministro da Justiça Gilson Diap e o juiz paranaense Sérgio Moro. Dipp participou por desinformação; Moro por estar plenamente integrado ao Departamento de Justiça, por conta da parceria no caso Banestado. Nos debates, o tema principal versou sobre as sugestões dos brasileiros sobre como trabalhar melhor com os EUA.

Entre as diversas solicitações, pedia-se treinamento especial sobre a coleta de provas, interrogatórios e entrevistas, habilidades em tribunais e o modelo de força tarefa proativa, com a colaboração entre procuradores e as forças de segurança. Saía-se do campo estritamente penal, para o campo geopolítico.

Pediram conselhos, também, para mudar o código penal. Os americanos defenderam mudanças recentes no código, como a exigência do exame direto das testemunhas pela promotoria e pela defesa, não pelo juiz, e o uso de depoimentos ao vivo, em vez de declarações escritas. No entanto, dizia o telegrama, os brasileiros confessaram não saber como utilizar as novas ferramentas, mostrando-se ansiosos para aprender.

Os especialistas americanos notaram que o fato da lavagem de dinheiro já estar na alçada dos tribunais federais tornava mais eficaz o combate à corrupção de alto nível. “Consequentemente”, diz o telegrama, “há uma necessidade contínua de fornecer treinamento prático a juízes federais e estaduais brasileiros, promotores e agentes da lei com relação ao financiamento ilícito de condutas criminosas”.

Sugeriu-se a preparação de um projeto piloto. Os locais ideais, dizia o telegrama seriam São Paulo, Campo Grande e Curitiba. Apresentou-se o desenho do piloto: “Forças-tarefa podem ser formadas e uma investigação real usada como base para o treinamento, que evoluiria sequencialmente da investigação até a apresentação e a conclusão do caso no tribunal”, diz o telegrama, corroborando a palestra de Kenneth Blanco, do DoJ, no Atlantic Council. ”Isso daria aos brasileiros uma experiência real de trabalho em uma força-tarefa proativa de financiamento ilícito de longo prazo e permitiria o acesso a especialistas dos EUA para orientação e apoio contínuos”.

A conclusão final do encontro é que o Projeto Pontes deveria continuar a reunir as forças de segurança americanas e brasileiras em diferentes locais, “para construir nossos relacionamentos e trocar boas práticas”. E concluía que, “para os esforços de combate ao terrorismo, esperamos usar a abertura que esta conferência proporcionou para direcionar o treinamento de forças-tarefa de financiamento ilícito em um grande centro urbano”.

Nos anos seguintes, DHS, DoJ e CIA forneceram informalmente os elementos centrais que permitiram ao juiz Sérgio Moro, a partir de Curitiba, conduzir uma denúncia de corrupção ocorrida no Rio de Janeiro, tendo como personagens centrais pessoas de Brasília e São Paulo. Conferiu a juízes e procuradores o “abra-te Sésamo”, a informação provinda dos serviços de espionagem eletrônica americano, que lhes garantiu poder, glória e um protagonismo político inédito.

A consequência foi a destruição de parte relevante da economia brasileira, desmonte do sistema político e das instituições democráticas, permitindo à Lava Jato se tornar sócia do poder, através de seu aliado Jair Bolsonaro. E jamais apareceu um terrorista de verdade para justificar a parceria. O então Ministro da Justiça Alexandre Moraes precisou inventar terroristas de Internet.

É inacreditável que um evento tão ostensivo como este tenha passado despercebido do governo Lula, na época, cego pelo sucesso que marcou seu último ano de governo.

Cable: 09BRASILIA1282-a
Luis Nassif

Luis Nassif

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  • E o ataque terrorista da nação mais terrorista do planeta, os EUA, continua disparando seus mísseis teleguiados, na figura do traidor Moro e seus comparsas.

  • Há meio século ensinaram as polícias e os militares brasileiros a destratarem, machucarem, torturarem e matarem pessoas do povo.
    Agora ensinam a extrair o patrimônio, a soberania, a dignidade, os direitos e a esperança.
    Malditos sejam

  • A justificativa dada por Sergio Moro para o início da investigação de corrupção na Petrobrás foi um automóvel dado por Youssef para Roberto Costa. Uma desculpa um tanto quanto esfarrapada já que Costa a época era ex-diretor da Petrobrás e prestava serviços de Assessoria. Como no turbilhão de informações Moro iria ligar um automóvel dado por Youssef a Costa para iniciar uma investigação de corrupção na Petrobrás. Por certo, ele já tinha muito mais dados e esse fato foi uma mera desculpa

  • Acho um tanto quanto injusto se atribuir a Lula responsabilidade pela cooptação desses órgãos pelo EUA. Se alguém deve ser responsabilizado é ABIN. Nunca vi um órgão de inteligência tão inepto.

    • Caro Castro, não nos esqueçamos que a (nossa) abin, desde sempre, é a primeira a ser coonestada por convergência ideológica com os norte-americanos. Não existe alguém mais americanófilo que nossos miliquintos.

  • Só atacaram a estrutura do estado brasileiro porque tinham certeza absoluta de que não seriam investigados ou incomodados pela imprensa dominante local, como realmente não foram

    o principal inimigo do Brasil também por usurpação de poder, não eleito

  • Ingenuidade? Falta de compreensão dos conflitos geopolíticos? Em retrospecto, a nossa esquerda parece tola. Um bando de idiotas, que achavam que os Aécios e os Cunhas eram o problema.
    Lembro-me que aqui muitos diziam que era "teoria da conspiração". Bem... conspirações existem.
    Mas deve haver uma explicação mais fundamentada; o que, afinal, explica a total incapacidade das nossas lideranças políticas de entender o que estava por vir?

  • Mas vem cá.....essa vaza a jato não vai acabar não? O juiz só age se provocado, esse processo já acabou faz tempo, apenas não querem largar o osso........falta coragem pra enterrar isso de vez....

  • Fatos que comprovam o que já imaginávamos pois o imperialismo, em conluio com a elite daqui, por séculos tem executado um pacto. A elite quer acima de tudo evitar que ex-escravos ascendam socialmente conquistando o conhecimento. Por isto a elite busca acima de tudo impedir que o Brasil torne-se um dos paises mais ricos e poderosos do mundo, pois desta forma haveria risco de que parte da riqueza nacional melhorasse o poder aquisitivo do povo, que assim poderia ter acesso a uma educaçao de qualidade que fizesse-os perceber a perversidade da estrutura social e perceber quem sao os culpados por isto. O pt é ameaça a esse pacto de séculos entre elite e imperialismo para evitar que o Brasil desevolva-se plenamente. A lava jato destruiu totalmente a ideia de que através da política o país poderia evoluir, tentou provar que todo político
    é corrupto e nocivo ao país. Resultado: hoje policiais, pastores, e pessoas com uma mentalidade anti-democrática e violenta predominam no congresso (fascistas).Seu objetivo: atacar de todas formas quem lute por justiça social, vendo nos EUA a salvaguarda poderosa contra a esquerda e vendo o ultra-neoliberalismo e o autoritarismo como forma de realizarem o que querem: fazer com que o pobre sempre continue pobre , e impedir o desenvolvimento do paīs pra impedir o pobre de tornar-se classe média

  • É inacreditável e revoltante como ao longo dos anos ,esse país "EUA" ao longo de vários governos exerceu e até o presente momento, continua agindo como uma espécie de poder paralelo em nosso país,uma sombra maldita que de forma sutil e calculista golpeia e invade o território alheio,envenenando suas instituições,economia e governos ,e consequentemente o seu povo ,sempre na busca de sua auto-afirmação e manutenção de potência imperial.

  • A despeito da infantilidade política dos governos petistas nessa questão, eu gostaria de ressaltar que a autonomia administrativa e independência funcional conferidas ao judiciário e ao MP são o erro mais grave cometido pela nossa legislação. Nesse sentido, o CNJ é o portão (porta é pouco) por onde entram a maioria dessas "parcerias". Autonomia e independência deveriam ser da atividade judicial stricto sensu. O CNJ vem impondo práticas estadunidenses em diferentes materiais, até na infância e juventude; tudo na base do copia e cola (Moro especisliziu-se nisso). Juízes e promotores brasileiros, seletivos como são, adoram copiar dos EUA o que lhes traz vantagens e poder, nunca o que lhes tiraria poder, como por exemplo a subordinação do MP ao Executivo. Duas instituições sem nenhum controle social do povo brasileiro, mas sob o controle do velho tio Sam.

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