Livro recente prova que Tiradentes não morreu na forca, por Sebastião Nunes

Por Sebastião Nunes

O historiador maranhense Austregésilo Cerqueira Nunes acaba de publicar colossal estudo (“O enforcado que deu no pé”, edição do autor, 666 páginas), com o objetivo de provar que o protomártir da independência brasileira não morreu enforcado. Muitos estudiosos vêm há anos debulhando o mesmo assunto, mergulhados nas densas brumas que cercam o mais famoso episódio de nossa história. Com efeito, tornaram-se transparentes, hoje em dia, vários tópicos obscuros da malograda conspiração. Sabe-se, por exemplo, que Cláudio Manuel da Costa não se suicidou, mas foi assassinado para não delatar gente graúda (ver Silviano Santiago “Em liberdade”, segunda parte).

Entre os figurões coloniais, é certo que o governador-general, Visconde de Barbacena, estava envolvido até o pescoço na conspiração, motivo pelo qual demorou tanto para denunciar o complô ao vice-rei, seu próprio tio. O principal delator, Joaquim Silvério dos Reis era tio-avô do intrépido Duque de Caxias. Que o poeta Tomás Antônio Gonzaga foi apaixonado e noivo de Maria Doroteia Joaquina de Seixas, a Marília de suas comoventes liras, consta dos livros escolares. Mas quase ninguém refere a “Marília loura”, a outra, com quem teve um filho. Por falar em filhos, o poeta Cláudio tinha seis. O próprio Tiradentes, bom violonista e razoável cantador de modinhas, enterneceu inúmeras donzelas românticas de Vila Rica e do Rio de Janeiro, tendo pelo menos uma filha, Joaquina. Tudo isto é sabido por alguns e desconhecido por quase todos. Mas a grande polêmica, que toca fundo o orgulho nacional (se é que nos resta algum, depois do vexaminoso golpe de estado que vivemos hoje), está relacionada com a monumental farsa envolvendo carrasco, magistrados, militares, testemunhas e notável hipnotizador da época, com o objetivo de esconder a verdade sobre a morte de nosso herói maior.

ROENDO A CORDA PUÍDA

            As primeiras 50 páginas do livro são dedicadas a erudita introdução, que relaciona mais de 200 obras sobre a Inconfidência Mineira, prova da competência, ou pelo menos da dedicação, do autor. Mas logo no primeiro capítulo surge a nova versão, muito bem documentada, com diversas testemunhas oculares narrando como viram o hipotético enforcamento. Como não interessava a ninguém uma versão menos heroica dos fatos, tais depoimentos permaneceram durante mais de dois séculos confinados aos cafundós dos arquivos públicos.

            Segundo quatro companheiros do alferes, que presenciaram de perto o hipotético enforcamento, a corda se rompeu no momento em que Tiradentes despencou, rolando o corpo para debaixo do cadafalso, de onde foi imediatamente recolhido pelos assustados amigos. Conduzido a uma casa próxima, constatou-se que nada sofrera na queda, já que a corda, embora grossa e áspera, estava inteiramente roída por ratos e baratas, e ainda apodrecida pela umidade e pela maresia dos porões cariocas.

            Poucos dias depois, graças a documentos falsos, Tiradentes se tornou Joaquim José de Freitas, vivendo o resto da vida como barbeiro-cirurgião, dos mais requisitados, em São Luís do Maranhão, cidade que o acolheu como filho. Morreu aos 72 anos, cercado de netos e bisnetos, gordo e próspero, mas com imensa mágoa de ser apenas grosseira falsificação do herói que poderia ter sido.

HIPNOTIZADOR EM CENA

            Sabe-se, com absoluta certeza, que a cerimônia foi assistida por centenas de cidadãos (homens, mulheres e crianças), além de policiais e autoridades, incluindo o capuchinho que absolveu o réu de seus pecados e deu-lhe a beijar a cruz. Como se explica então que Tiradentes tenha escapado ileso, diante de tal multidão, que esperava com sádico prazer o enforcamento? Esclarece nosso erudito historiador que, entre os amigos do alferes, havia um discípulo do famoso conde Cagliostro, recém-chegado da Europa, com quem estudara a fundo não só hipnose individual e coletiva, como ultraenigmáticos arcanos da alquimia, sendo capaz de autênticos milagres, conforme demonstrou posteriormente nas províncias de Minas, São Paulo e Bahia.

            Pois bem. Postando-se de frente para a multidão logo após o “enforcamento”, induziu tão profundo transe hipnótico coletivo que todos viram, com indiscutível clareza, a queda do corpo, o salto do carrasco sobre o corpo agonizante, os momentos finais da agonia e a descida do cadáver, despido e esquartejado ali mesmo.

 

EXPOSIÇÃO DOS DESPOJOS

            Ora, se até aí a pesquisa pode ser considerada convincente, já que ninguém nega o hipnotismo, como se explica que o corpo esquartejado tenha sido exposto em vários pontos, inclusive em Ouro Preto, que teve a “honra” de receber a cabeça do protomártir?

            Austregésilo não se deixa intimidar. Com apoio em farta documentação, demonstra que não foi Tiradentes o esquartejado. Nem foi entre as ruas Senhor dos Passos e da Alfândega que o fizeram após o falso enforcamento, mas muito depois e – sem sombra de dúvida – a um mendigo anônimo, que a polícia encontrou morto na porta da Igreja da Lampadosa e prontamente entregou aos esquartejadores. Argumenta mais o historiador: “Como seria possível, mesmo a familiares e amigos próximos, reconhecer o inditoso Tiradentes após três anos mergulhado no fundo de asquerosa masmorra de pedra nua e limosa, sem um único banho, com a roupa em farrapos, os cabelos ensebados, tendo por única companhia baratas, ratos, pulgas e percevejos asquerosos?” Trata-se de argumento irrefutável.

 

O HEROÍSMO DOS HERÓIS

            Depois de mais de 500 páginas de depoimentos, análise, testemunhos e muita documentação da época, o autor encerra seu monumental estudo narrando os derradeiros anos de Tiradentes, ou seja, de Joaquim José de Freitas, em São Luís. Conta por exemplo que, frequentemente, eram os parentes acordados com gritos terríveis do antigo alferes que, em sonhos, via-se conduzido à forca e efetivamente enforcado.

            Em outras ocasiões, muito mais frequentes, o encontravam soluçando pelos corredores, alta madrugada, a clamar que queria ser enforcado, que precisava provar quem era e que nenhum herói verdadeiro foge a seu destino de sofrimento e de glória.

            Hoje, diante da avalanche de mentiras, vazamentos e falsas denúncias que nos empurram diariamente goela abaixo, nada há de espantoso nas descobertas do ilustre historiador.

 

Ilustração: Colagem a partir de suposto retrato de Tiradentes, em trajes de alferes

Sebastiao Nunes

19 Comentários

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  1. Em se tratando de história

    Em se tratando de história brasileira eu acredito em qualquer coisa. Se hoje com internet e tudo mais a estória contada pelo pig  (globo) é a verdade absoluta para a maioria dos brasileiros, imagina naqueles tempos. 

    1. Calma, a escola sem partido ainda não foi implantada.
      Assim, há milhares de razão.

      A livre manifestação do pensamento, por exemplo. E se um texto me incomoda, ok, outros podem achar interessante.

      Outra razão é o simples fato de que todo acontecimento histórico está sujeito ao escrutínio das novas gerações que, à vista de novos documentos ou pseudo documentos, podem lançar novas teses que se mostrarão verdadeiras ou delírios.

      Por fim, acho que qq trabalho , não estando no campo do ridículo, pode ser contraditado através de argumentos, então nenhum prejuízo traz a sua divulgação.

      O que prejudica, e muito, a vida democrática é, à falta de argumentação, tentarmos impedir a livre manifestação do pensamento.

      1. Não estou querendo criticar,

        Não estou querendo criticar, apesar do comentário ter parecido isso, lendo ele agora.

         

        O que eu quero dizer é – o texto é, obviamente, balela. Você já percebe isso pelas 666 páginas e pela narrativa fantástica (vide o hipnotizador). Isso é corroborado pelo fato de você não conseguir achar nada sobre o historiador e a editora do livro, além de copy-colas exatos desse texto.

         

        Sabendo que o texto é balela, o que eu queria realmente dizer é – o nome do historiador tem algum significado (é demasiado específico)? a história em si é alguma referência a um fenômeno cultural?

         

        Digo tudo isso porque, além da narrativa fantástica que muito me entreteu, não tenho as referências necessárias para compreender as nuances que citei acima, tampouco o significado do texto além da narrativa pela narrativa.

         

        Paz,

    2. EU EXPLICO!

      Sr.Luiz C.: a cada ano que passa, somos surpreendidos com revelações sobre a nossa história, mandada ser escrita por sei lá qual poder, que estão se tornando estórias da carochinha. A Batalha do Riachuelo já foi desmascarada: não há qualquer vestígio de embarcações, canhões ou armas no fundo rio. Portanto, inexistente, Mas, no caso do Tiradentes, creio que pode sim ter havido uma fraude histórica, pois era maçon. Essa seita está sempre envolvida em fatos históricos falsos e criminosos. Agora, constatamos estar a serviço e liderando o golpe na democracia brasileira. 

  2. Boa leitura

    Tal fatos faz lembrar “O Conde de Monte Cristo” de Alexandre Dumas, O autor poderia fazer mais pesquisas  descobrir que Tiradentes vingou-se de seus inimigos , inclusive usando aqueles termos do personagem de Chico Anísio: “minha vingância será maligna”.

  3. As verdades.

    Não é legal estarmos nas mãos do pig mas, as vezes, eu fico pensando: imagina se dependêssemos do Nassif e do PHA para termos informações!?!? Quanta bobagem da grossa teríamos que aguentar?

    1. É por isso que a pluralidade é a base da comunicação social.
      Múltiplas versões, tendências e opiniões.

      E ao leitor fica a incumbência de formar a sua própria opinião. Sem abrir mão de contraditar e argumentar de forma lógica.

      E quando eu vejo que a coisa não tá funcionando pra mim, eu não vou mais naque endereço.

      Simples.
      Apesar da concentração da mídia no Brasil, já há muitas opções. Ninguém precisa se torturar.com certas hipóteses.

    2. Pesquisa histórica é “grossa bobagem” ?
      É por essas e outras que somos este país sem cultura e alienado, que sai batendo panelas sem raciocinar. Observe o quanto os países de primeiro mundo estudam sua história. “Grossa bobagem” é afastar o estudo, o trabalho intelectual, a proposição de novas idéias e teses.

      1. Vc conseguiu entender isso????

        É Sr. Antonio, parece que precisamos mesmo de cultura e pesquisa histórica! Eu apenas critiquei as visões unipolares dos meios, nada contra aberturas de horizontes para múltiplas visões. Eu trabalho com pesquisa há 38 anos e sei bem o mal que faz mostras só um lado das coisa, política e historicamente. O mais desanimador é perceber que gente como o Sr. faz questão de fixar-se em apenas um ponto! A vida não precisa ser guerra, não!

  4. A inconfidência Mineira não teve nada de independência
    A inconfidência Mineira foi apenas uma revolta de uma elite escravista contra um império escravista por causa de impostos, nada mais que isso.

  5. Cheiro de fraude

    Curiosamente, logo na segunda linha do texto foi suprimida a data e editora da “publicação” do tal livro (Ed, Dubolso, 2007), que aparentemente nunca esteve disponível em nenhuma livraria ou sebo que faça vendas pela internet. Também o misterioso historiador nunca esteve presente na internet em qualquer lugar que não fosse o texto acima. Para quem gosta desse gênero de leitura, existe uma outra versão onde Tiradentes se torna frequentador da galeria da Assembléia Nacional Francesa, o que seria comprovado por assinatura semelhante à sua nas listas de presença… Tem “liberdade de expressão” para todos os gostos…
    Origem do artigo requentado, PUBLICADO EM 08/07/07, no Jornal O Tempo.
    http://www.otempo.com.br/opini%C3%A3o/sebasti%C3%A3o-nunes/tiradentes-n%C3%A3o-morreu-na-forca-1.205266

  6. Versão corrreta

    Tiradentes não estava para morrere na forca mas não vem de ser essa versão de aí que está apenas desviar seriedade do assunto prara medíocre. Tiradentes ha salvo per a irmandade que faze parte na época. Outra pessoa de ser morta na forca em vez de ele. Mendigo morto. Cabeça é coberta para publico não ver enforcado. Tiradentes ha de seres tirado de Brasil para outro lugar e vives até velho. Morres lá. Todo mundo sabe de isso fora di Brasil lá no lugar de elke morrer.

  7. Ótimo texto! O autor bem explica sobre a manipulação da História pelos revolucionários da esquerda que dominam o sistema de ensino no Brasil.

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