Relembre: As 688 barragens de Minas e a tal estabilidade garantida, por Romyna Lanza

Nas últimas três décadas, Minas Gerais sofreu oito rompimentos de barragens, oito crimes ambientais.

Brasil de Fato

Publicado em 26 de janeiro de 2019

As 688 barragens de Minas e a tal ‘estabilidade garantida’

por Romyna Lanza

Minas Gerais ainda vive sob os impactos do maior crime ambiental da história da mineração, o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, em 2015, provocado pela mineradora Samarco, controlada pela Vale. Agora, o Estado se vê obrigado também a lidar com os danos provocados pelo rompimento de três barragens, num só dia, em Brumadinho.

De acordo com o Inventário de Barragens da Federação Estadual do Meio Ambiente (Feam), de 2018, Minas possui hoje 688 barragens. O que chama a atenção no relatório é que 100% das barragens estão classificadas com o status “estabilidade garantida”.

Por “estabilidade garantida”, entenda-se que “o auditor, após estudos geotécnicos, hidrológicos e hidráulicos, análises visuais, avaliações das condições de construção e condições atuais das estruturas, garante que as mesmas estão estáveis tanto do ponto de vista da estabilidade física do maciço quanto da estabilidade hidráulica (passagem de cheias) e, portanto, não demonstram, no momento da realização da auditoria, risco iminente de rompimento”, conforme explicação da própria Feam.  

Portanto, as barragens que se romperam em Brumadinho, segundo o inventário deste ano, estavam entre aquelas classificadas com “estabilidade garantida”, assim como a Barragem do Fundão, que rompeu em Mariana, no inventário de 2015, ano da tragédia.

A Feam não respondeu quantos fiscais existem, atualmente, para a realização do trabalho. Em 2015, era apenas um para as então 735 barragens existentes.

Nas últimas três décadas, Minas Gerais sofreu oito rompimentos de barragens, oito crimes ambientais.

O primeiro aconteceu em 1986, em Itabira. A Barragem de Rejeitos I, da empresa Itaminas rompeu, provocando a morte de sete operários, que trabalhavam no local no momento da tragédia. Cerca de 10 quilômetro de mata ciliar foram destruídos. O vazamento atingiu ainda todo o Córrego Fazenda Velha e as cabeceiras do Córrego dos Andaimes e do Rio das Velhas.

O segundo rompimento ocorreu cerca de 15 anos depois, em 2001: Barragem Cava 1, da Mineração Rio Verde, em Nova Lima. Resultado: cinco vítimas fatais, 43 hectares da Mata Atlântica destruídos e assoreamento dos córregos do Taquaras e Fechos. O abastecimento de água para a população dos municípios da região também foi afetado, devido à destruição de uma adutora da Copasa, empresa responsável pelo fornecimento de água em Minas.

A Barragem B, localizada na Fazenda Bom Destino, da empresa Iberpar, rompeu em 29 de março de 2003. Até aquele ano, foi o rompimento de maior dimensão, chegando a atingir o estado do Rio de Janeiro. O principal impacto foi a degradação do ribeirão do Cágado. O vazamento causou ainda o carreamento do resíduo pelas águas do rio Pomba e do rio Paraíba do Sul, até a foz no Oceano Atlântico, na cidade fluminense de Campos de Goitacazes. O crime ambiental ocasionou a mortandade de peixes, a interrupção do abastecimento de água em vários municípios do estado do Rio de Janeiro, afetando centenas de pessoas, além de prejuízos em pequenas propriedades rurais situadas nas margens do ribeirão do Cágado, em uma extensão de aproximadamente 106 hectares.

Dois rompimentos seguidos aconteceram em 2006 e 2007 na mesma barragem, a São Francisco, a Mineração Rio Pomba Cataguases. O primeiro gerou sérios danos ambientais, como a inundação de agriculturas, aumento da turbidez das águas do córrego Bom Jardim, do ribeirão Fubá e do rio Muriaé. Também provocou a mortandade de peixes e o desabastecimento de água nas cidades de Lages do Muriaé e distritos de Retiro e Comendador Venâncio – em Itaperuna, no Rio de Janeiro. Apenas um ano depois, a São Francisco rompeu novamente. Cerca de 2 milhões de metros cúbicos de rejeitos foram lançados, atingido aproximadamente 400 residências. Mais de 2 mil pessoas ficaram desalojadas. Várias propriedades rurais  às margens do córrego Bom Jardim também foram atingidas, danificando as áreas agrícolas.

A barragem B1, da Herculano Mineração, rompeu em 10 de setembro de 2014, em Itabirito. Seis cursos d’água foram afetados, além da destruição de toda a fauna e flor.

Pouco mais de um ano, Minas mais uma vez sofreu com novo rompimento de barragem de rejeitos, desta vez, a Fundão, em Mariana. Foram 62 milhões de m³ de lama e rejeitos espalhados ao longo do Rio Doce, que alcançaram o mar do Espírito Santo. Um município inteiro, Bento Rodrigues, foi destruído – e com ele vidas e histórias. Dezenove pessoas morreram. Ainda hoje, há dificuldade para se avaliar os danos ecológicos, sociais e econômicos provocados pelo crime da empresa Samarco, da Vale.

Ontem (25/01), três barragens se romperam em Brumadinho, todas de propriedade da mesma Vale. Até o momento, nove pessoas mortas e mais de 300 desaparecidas.  A dimensão de todo o dano, ainda levaremos outros longos anos para identificar.

Enquanto isso, no Governo de Minas, a defesa é pela agilidade dos licenciamentos ambientais, em especial, para as mineradoras. Promessa de campanha do governador Romeu Zema. Como também foi promessa fundir as Secretarias do Meio Ambiente e da Agricultura. E assim Minas se vê obrigada a viver e a conviver com crimes ambientais, impunes, em nome de um desenvolvimento econômico que devasta vidas.

Romyna Lanza é jornalista

Redação

6 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Governador “Novo” aliado punirá culpados “exemplarmente”

    Acionistas, executivos, autoridades concessionárias, regulatórias e fiscalizatórias, nem pensar!

    O problema é que, para variar, não haverá culpados.

    Ou eles serão alguns técnicos ameaçados pelos chefes…

    Ou o mais provável: as vítimas, por se exporem ao risco!

    E aí, promessa cumprida:

    Já foram exemplarmente punidos.

  2. Tem que se parar com este tal de Crime Ambiental, é Crime mesmo.

    Eu fico com o pé para trás quando começam a falar em crimes ambientais, pelo que eu saiba não foram florestas de pessoas que foram abatidas, foram dezenas ou até centenas de pessoas que foram MORTAS, vamos parar de pensar que peixinhos foram mortos e se pode através de ações de mitigação recuperar estes peixinhos, FORAM PESSOAS MORTAS, e isto para mim é crime mesmo.

    1. com certeza…

      propagam isso, crime ambiental, pensando em circunstâncias atenuantes

       

      como vc colocou muito bem , trata-se de perdas humanas para as quais não deveria haver atenuantes

       

      que o diga os aborígenes australianos…………..mas lá o judiciário funciona e atuam antes que eles morram

       

      e se bobear, temos uma dessas empresas, australiana, que consideram que atuar no Brasil traz vantagens competitivas

       

      consultem

  3. Gostaria de mostrar pra voces

    Gostaria de mostrar pra voces o presente australiano:  temperaturas de 50 degraus centigrados e rios completamente secos.

    Divirtam se com seu futuro.

    Don’t call me.  I’ll call you.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador