Manual do perfeito midiota – Parte 4

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
[email protected]

Como se sabe, a condição de midiota assegura um “estar no mundo” menos sujeito a angústias, porque permite direcionar todas as culpas para o outro

Do Brasileiros

Esta série de reflexões tem o propósito de tornar mais confortável a escolha que você, seguidor fiel e crente da mídia tradicional, fez durante o ano de 2015.

Como se sabe, a condição de midiota assegura um “estar no mundo” menos sujeito a angústias, porque permite direcionar todas as culpas para o outro, mesmo que identificado como uma entidade subjetiva, um partido ou a designação genérica de “os políticos”.

Portanto, é essencial que você conheça os riscos de deixar brotar sua consciência social, aquela que nasce da percepção da alteridade – “natureza ou condição do que é outro, distinto”.

Não vamos complicar as coisas lembrando o que disse Michel Foucault sobre esse “processo de subjetivação”, bem lembrado por Giorgio Agamben na sua conhecida obra Homo Sacer. Se você quiser arriscar uma olhadinha por trás dessa cortina, coloco um link no pé do texto e você vai direto à página 69.

Para resumir, o que se observa é que as classes médias urbanas, expostas à complexidade da vida contemporânea e pressionadas pela ideologia do consumo e do sucesso pessoal, tendem a emular os muito ricos, ou seja, a querer ser – por imitação – parte daqueles que compõem a elite.

A imprensa usa esse sentimento como plataforma para vender a ideia de que, para estar no topo da sociedade, você precisa se descolar dos outros, os “diferenciados” que ficam ao seu lado ou abaixo da sua faixa de renda.

É assim que a imprensa coopta os midiotas.

Para isso, trata de esconder alguns fatos.

Por exemplo, você viu na mídia hegemônica do Brasil, no Jornal Nacional, ou ouviu nos comentários do rádio, como os americanos muito ricos criaram um sistema para escapar do fisco e resguardar suas fortunas contra a crise que eles mesmos provocaram? Deixo também os links para duas reportagens especiais do New York Times sobre esse assunto.

Você também pode procurar os trabalhos da brasileira Grazielle David, especialista em orçamento público, que demonstra com números como os cidadãos mais ricos do Brasil sonegam anualmente mais de R$ 500 bilhões.

Você aderiu àquele abaixo-assinado que as mocinhas bonitinhas oferecem na frente da Fiesp, perto daquele pato inflado, contra a recriação da CPMF? Nunca se perguntou por que as entidades da indústria e do comércio, com ampla repercussão da mídia tradicional, vivem denunciando o aumento da carga tarifária e nunca – repito: NUNCA – se preocupam em contabilizar os bilhões sonegados?

Porque contam com a imprensa para convencer você a continuar pagando pelos realmente ricos.

Aí você passa a acreditar que o problema é que o governo gasta demais, principalmente com programas sociais – e vai para as ruas xingar e agredir quem, no fim das contas, defende os seus interesses.

Mas essa é a natureza do midiota: agir contra seus próprios interesses.

Está feliz assim? Então ignore estas provocações e que 2016 continue lhe proporcionando a cândida felicidade dos inocentes.

Para lerThe New York Times – 1 – e The NYTimes-2. Mais: Homo sacer.

Para verEvasão fiscal – vídeo.

*Jornalista, mestre em Comunicação, com formação em gestão de qualidade e liderança e especialização em sustentabilidade. Autor dos livros “O Mal-Estar na Globalização”,”Satie”, “As Razões do Lobo”, “Escrever com Criatividade”, “O Diabo na Mídia” e “Histórias sem Salvaguardas”

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

13 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Luciano falando para o espelho

    Este é o 4º texto (aqui no GGN) do Sr Luciano Martins Costa. Li todos. Não me convenci. Fico imaginando: quando escrevemos procuramos convencer o outro lado; é a arte do dialogo, da persuasão, uso da dialética, da indução racional,etc. Se o autor, apesar do curriculum que tem, começa chamando o “antagonista” de idiota….ele não está querendo atingir ninguem. Simplesmente está jogando para a platéia dele. OK. Temn gente que aplaude. 

     

     

     

     

    1. Pereira LF,
      Se você for

      Pereira LF,

      Se você for leitor do jornalista Marcelo Auler, talvez tenha lido um comentário que postei lá, abordando essa questão do convencimento. Em resumo: ao escrever, palestar ou divulgar uma idéia, o autor não necessàriamente deseja ou irá convencer o público. Digo mais: nem LMC, qualquer outro articulista, escritor ou palestrante, ou um simples leitor, como é o meu caso, lhe convencerá de qualquer coisa. A razão é simples: não convencemos as pessoas; elas é que se convencem, ao refletir sobre idéias e teses que lhe são apresentadas, aceitando como válida a argumentação usada. Não se deve confundir convencimento com persuasão, embora o senso comum os considere sinônimos. A persuasão normalmente se dá quando temos grande assimetria entre o que veicula a mensagem (que tenta persuadir) e o outro, que será o objeto da persuasão;  a insistência, e mesmo a intimidação ou ameaça velada são usadas como ferramentas para persuadir alguém. Entre pessoas do mesmo estrato sócio-cultural e com o mesmo nível de formação e informação, a persuasão não ocorre ou ocorre com pouca freqüência.

      Como você mesmo afirma, o diálogo, a dialética, quando bem usados, podem levar à indução racional. Mas nem mesmo esta pode ser chamada de convencimento. Indução pressupõe eu, por meio de artifícios do diálogo e da dialética, incutir no outro uma idéia que anteriormente era apenas minha. Ou seja, a indução ocorre de fora para dentro. Você pode me induzir a algo. Eu posso induzí-lo a adotar certa idéia ou posição em relação a determinado tema. Mas o efeito da indução pode ser passageiro; o interlocutor poderá refazer o raciocínio e concluir que foi manipulado e enganado. Aliás, os veículos de mídia são experts em induzir no público leitor/ouvinte/telespectador uma visão conservadora e pseudo-moralista e que vê a corrupção  no setor público, o governo e o Estado como os maiores males da sociedade. Não são poucos os que foram inicialmente induzidos pelos veículos de mídia e que depois ‘caíram na real’, rejeitando a tese dos grupos midiáticos. Outro tanto se convence com o que é divulgado pela mídia e a vê como ‘prestadora de um serviço público’.

      Se você tiver lido com atenção os quatro artigos, deve ter notado que LMC quer provocar e tirar da letargia os leitores; ele afirma isso explìcitamente nesta parte 4. O efeito de uma provocação não é convencer, mas fazer pensar.  Em nenhum artigo LMC chama de idiota quem pensa diferente dele. O Que LMC faz é traçar um perfil hipotético do ‘midiota’, aquele que aceita como verdade absoluta tudo o que é divulgado pelos meios empresariais de comunicação, que não tem senso crítico e não consegue identificar os interesses em jôgo. O midiota típico acredita no discurso de dez entre dez veículos de comunicação, propalando ‘isenção’ e ‘imparcialidade’ como máximas da prática jornalística. Ora, sabemos que NÃO existe jornalismo isento ou imparcial; o máximo que se pode conseguir é um jornalismo honesto – raríssimo hoje em dia.

      LMC provoca os leitores, a platéia, o público. Se os leitores lerem com atenção e pensarem refletidamente, o autor terá atingido o objetivo. O convencimento depende da boa vontade de quem lê; se de antemão o leitor já possuir uma idéia pré-concebida sobre o autor e um pré-conceito em relação às teses noemalmente apresentadas pelo autor, o convencimento se torna impossível. 

    2. Concordo com você pereira

      Abordagem tosca e ao mesmo tempo infantil…

      Esse tipo de texto não convence. Talvez promova um pouco mais de radicalismo…

      É puro sofisma. 

    3. crer ou não crer. eis a questão

      O post traz fatos. Não são fatos divulgados plenamente pela mídia hegemônica, mas são fatos de conhecimento de quem quer saber. você se convence se quiser, ou não. Aí já é problema seu.

    4. Questionamento

      Fiz ontem um comentário sobre o seu comentário (com o qual eu concordo) e até agora não foi publicado. Não desrespeitei as regras! Outros comentários feitos bem antes do meu já foram publicados. Está tendo censura aqui? Foi porque critiquei a série “midiotas” do Luciano nos outros textos? A blogosfera progressista, a exemplo da Veja, também está desenvolvendo problemas para lidar com o contraponto?

       

      Resposta do GGN – Plantão

      Estou no plantão do final de semana. Fui confirmar na lixeira se algum comentário seu tinha sido deletado. Não foi. Já pensou na possibilidade dele não ter chegado até a caixa, de ter tido um oscilar qualquer na hora de publicar, um bug amigo? Às vezes o problema não é da moderação… Às vezes o problema é da internet ou do equipamento. De qualquer forma, a crítica foi publicada, mesmo que não tenha tido o comentário deletado.

      att

       

      1. Obrigado pela resposta…

        … e, sim, dificuldades acontecem, mas só dizendo que fiz meu comentário como fiz todos os outros, e que o registro foi feito como todos os outros também. De qualquer forma, pelo respeito demonstrado nesta oportunidade, vou concluir que houve um problema pontual e só. Bola pra frente. 

  2. Pagar o pato

    Tem mais… Não entendi.

    Se a midia torna algumas pessoas idiotas porque vão no embalo dos factoides contra o governo, porque este mesmo governo que administra a receita federal não faz ele mesmo a lição de casa e cobra os sonegadores?

    Quer dizer, devo pagar o pato como sempre foi de praxis ou sair nas ruas exigindo do governo  cobrar os 550 bilhões sonegados?

    Só queria entender…

    1. A Receita Federal e também a
      A Receita Federal e também a Procuradoria da Fazenda Nacional tentam cobrar, cada um na sua esfera de competência ocorre que os órgãos de cobrança não tem poder de ir na conta do devedor e sacar valores, nem de tomar bens. Para isso precisam do poder judiciário e aí o bicho pega. Leva anos para cobrar um devedor renitente. A lei é feita para isso. E a cada 2 anos, em média, o congresso nacional aprova um novo parcelamento de impostos. O sonegador escapa da ação penal parcelando as dividas (so vale no Brasil, aviso). Então para que pagar impostos?

      1. reformas

        Bastaria ao governo, pelo menos tomar a iniciativa, de patrocinar ou ao menos incentivar o congresso o aperfeiçoamento ou mesmo as reformas, administrativas e politica, que cada vez mais se tornam imprescindiveis para destravar o Pais.

        Porque não o faz?

         

  3. Fazedores de midiotas

    O Secretário Executivo da SECOM – que é quem realmente manda nas verbas da publicidade no país – José Otaviano Pereira, nomeado por Edinho Silva em agosto já não está mais no cargo. Não encontrei nenhuma notícia sobre seu afastamento que
    ocorreu no começo de dezembro. O cargo consta como vago no site da SECOM. A substituta dele, que já o vinha
    substituindo, não tem nenhum curriculum. Espero que não tenhamos outro Roberto Messias, antigo sec. executivo, adepto da “mídia técnica” que usava as pesquisas do Ibope para dar dinheiro à Globo e seus parceiros na formação de “bons cidadãos”.

  4. Frase já redundante dos midiotas é:

    “Eu não sou obrigado(a) a ficar trabalhando como um condenado(a) e pagando o Bolsa Família para aqueles nordestinos vagabundos.” “Aécio. Aéciooooooooooooooooooo.”

  5. Não só as classes médias

    “Para resumir, o que se observa é que as classes médias urbanas, expostas à complexidade da vida contemporânea e pressionadas pela ideologia do consumo e do sucesso pessoal, tendem a emular os muito ricos, ou seja, a querer ser – por imitação – parte daqueles que compõem a elite.” Não só as classes médias (adorei o plural) pois mesmo entre os mais desprovidos de recursos é formada a ideia geral de que ser superior é possuir bens tal como os ricos, em suas mais diversas variações de estilo.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador