Por trás dos salários da EBC, por Paulo Moreira Leite

“Meu rendimento como apresentador e editor chefe era inferior ao que recebi na maior parte de meus empregos nos últimos quinze anos”
 
 
Jornal GGN – Em resposta à matéria da Folha de S.Paulo sobre supostos altos salários pagos a funcionários da EBC, o jornalista Paulo Moreira Leite, apresentador e editor chefe do programa Espaço Público afirmou que o rendimento anual recebido pela agência era inferior ao que recebeu na maior parte de seus empregos nos últimos quinze anos. 
 
“Era menor do que meus vencimentos como diretor da sucursal da Istoé em Brasília, que ocupei entre 2013 e 2014. Também era mais baixa do que recebia em qualquer uma das funções que exerci na revista Época, onde fui editor, chefe da sucursal de Brasília e, em outro período na empresa, em outro regime de trabalho, diretor de redação. Também é inferior aos meus vencimentos no Diário de S. Paulo, onde fui diretor de redação. Fazendo as correções necessárias em função da inflação, também é inferior ao que recebia como redator chefe da VEJA”, apontou. 
 
A reportagem, divulgada na última sexta-feira (17) usou os salários como um dos argumentos de Temer para fechar a TV Brasil e reduzir a atuação da EBC. A Folha também alegou que as “estrelas” da EBC, citando diretamente Paulo Moreira Leite, Luis Nassif e Sidney Rezende eram “pró PT”. (Clique aqui para ler a resposta de Luis Nassif publicada no Jornal GGN).
 
O presidente interino Michel Temer encaminhará nos próximos dias ao Congresso um projeto para alterar a lei da Empresa Brasileira de Comunicação o que irá permitir o fechamento da TV Brasil, e acabar com o conselho curador, responsável por todas as decisões importantes tomadas pela agência, garantindo independência em relação ao poder Executivo. 
 
 
 
Paulo Moreira Leite
 
Mais uma vez, meu nome é mencionado entre jornalistas que foram contratados com “salários altos” para trabalhar na EBC. Desta vez, quem escreve é a Folha de S. Paulo.  
 
Basta olhar os números de meu contrato anual – disponibilizados oficialmente para toda pessoa interessada – para entender o absurdo dessa afirmação. Não preciso falar pelos demais profissionais mencionados no jornal. Citado nominalmente, falo por mim.
 
Claro que, como cidadão brasileiro, devo admitir que tenho um salário altíssimo, comparado com a média do país. Mas, como sabe toda pessoa com algum reconhecimento de recursos humanos, os vencimentos de um profissional podem ser considerados altos, ou baixos, em comparação com aquilo que ele foi capaz de receber ao longo de sua vida profissional anterior. Por essa razão, muitos trabalhadores, quando recebem uma oferta de emprego com salário muito inferior, preferem não formalizar o vínculo, para não “manchar a carteira,” o que poderia impedir ganhos melhores no futuro.  
 
Aplicando esse critério, em vigor em empresas de comunicação onde exerci um papel executivo, cabe reconhecer que minha remuneração como apresentador e editor chefe do programa Espaço Público, chamado ainda a fazer comentários cada vez mais frequentes nos telejornais da TV Brasil, era inferior ao que recebi na maior parte de meus empregos nos últimos quinze anos.
 
Era menor do que meus vencimentos como diretor da sucursal da Istoé em Brasília, que ocupei entre 2013 e 2014. Também era mais baixa do que recebia em qualquer uma das funções que exerci na revista Época, onde fui editor, chefe da sucursal de Brasília e, em outro período na empresa, em outro regime de trabalho, diretor de redação. Também é inferior aos meus vencimentos no Diário de S. Paulo, onde fui diretor de redação. Fazendo as correções necessárias em função da inflação, também é inferior ao que recebia como redator chefe da VEJA.
 
Cabe notar, ainda, que na TV Brasil eu era pessoa jurídica. Não tinha FGTS, plano de saúde, nem 13º, nem tive direito a aviso prévio, quando meu contrato foi suspenso numa decisão unilateral e arbitrária, do interventor Laerte Rimoli, em boa hora afastado pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal.
 
Pode-se explicar a divulgação de uma informação errada como mais uma demonstração de leviandade, prática condenável do jornalismo que atira primeiro para perguntar depois. Mas não é só isso, evidentemente. Até porque, para se falar seriamente sobre salários altos, baixos, ou na média, seria preciso ir ao mercado e apurar aquilo que se paga por funções equivalentes nas emissoras privadas, se possível com referências nominais, o que ficaria um pouco chato, em alguns casos até engraçado,  né?
 
Na verdade, a falácia dos “altos salários” pagos pela EBC cumpre uma função ideológica. Ajuda a construir a lenda negativa em torno de uma emissora que se quer acusar de desperdiçar recursos públicos e de oferecer mordomias para as chamadas estrelas “pró-PT.” Também ajuda a colocar uma dúvida sobre o real compromisso desses profissionais com os pontos-de-vista que defendem. Os mesmos veículos que não questionam as óbvias preferencias politico-partidárias da maioria de nossos comentaristas, em qualquer emissora, tentam colocar sob suspeita toda opinião favorável  a um governo que venceu quatro eleições presidenciais consecutivas, por uma larga margem de votos.
 
Com a criação artificial de um aspecto mercenário, digamos assim, tenta-se desqualificar a outra parte e evitar o debate que interessa – sobre o papel cultural e político da TV Brasil. Este é o ponto central.
 
Bobagem imaginar que o governo interino esteja preocupado com a TV Brasil por razões econômicas, ainda que em determinados aspectos elas sejam reais. Tampouco está às voltas com elevadas questões culturais ou complexos temas de semiótica.
 
O problema aqui é uma emissora que desafina o coro dos contentes, cumprindo a função necessária de apresentar uma alternativa a um pensamento escandalosamente único que, só admite alterações na cor da gravata dos apresentadores ou no penteado das comentaristas. O fato dessa melodia ser sustentada com recursos públicos — que também pagam a conta de boa parte das receitas das emissoras privadas — torna tudo ainda mais irritante e aceitável. Mostra que o monopolio privado da comunicação, que tem uma preferência ideológica nítida, pode ser questionado, ainda que através de uma pequena brecha.
 
Nas pressões contra a TV Brasil, o que se quer é uma sociedade unidimensional, onde se busca criminalizar o conflito de ideias para que possa ser silenciado. Por isso os programas que davam identidade a TV Brasil foram retirados do ar sem mais demora.
 
Querem que o público vá se acostumando, entendeu? Se não tiver jeito, fecha-se a TV Brasil.
 
Num país onde o monopólio da comunicação é condenado pela Constituição, o jornalismo da TV Brasil merece apoio e sustentação pelo papel que desempenhou nos últimos meses. Serviu de indispensável contraponto político para um país que ingressava num dos momentos mais dramáticos de sua história, enquanto a cobertura convencional descrevia os acontecimentos em tom de apoteose cívica.
 
A reação do público que antecedeu o retorno de Ricardo Melo à presidência da EBC foi a melhor demonstração de reconhecimento pelo que se fez. Embora não faltassem críticas internas e externas ao trabalho – estamos numa democracia, certo? – é sempre bom ter um pouco de humildade nessas horas. Afinal, basta a leitura dos jornais de hoje, de ontem, de anteontem para reconhecer que estamos longe de um capítulo final nessa tormentosa aventura contra a democracia iniciada pelas forças que insistem em ignorar a soberania popular e o resultado das urnas.
 

 

Redação

11 Comentários

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  1. cupim

    O governo usurpador de temer se assemelha a um cupim que só rói a madeira boa.

    Lamentavelmente ele ataca por todos os lados e vai arrasando tudo por onde passa. Prejuízo enorme para o povo brasileiro que levará vários anos para recompor o que está sendo destruído.

    Ele usa a procuração que não lhe foi dada democraticamente pela maioria do povo mas, sim por um bando de batedores de penico midiotas, por uma mídia corrupta e abjeta, e por uma justiça covarde e/ou partidária.

     

  2. Absurdo

    Hoje, Domingo, fui assistir à TV aberta, e o único canal que prestava era a TV Brasil. Era único canal que tinha algo de qualidade em que eu poderia gastar meu tempo de descanso assistindo. Assisti aos programas: Partituras, Camarote 21 e Entre o Céu e a Terra.

    Nos outros canais, só porcarias. Reality shows, programas de auditório e programas religiosos dominavam a programação.

    Agora, esse Temer quer fechar a TV Brasil… Para que? Dizem que não tem audiência. Ora, quantas cidades pegam a TV Brasil em sinal aberto? Eu mesmo assisto por meio de parabólica. Se eles acham que não tem audiência, então invistam mais nessa ótima emissora pública. Mas não, preferem fechar o canal e enfiar o dinheiro em verba publicitária para a Globo.

    Esse país não tem jeito mesmo.

    1. E Quantas décadas  muitas

      E Quantas décadas  muitas Redes de Televisão PRIVADAS levaram para ter 3 pontos de audiências com o Estado financiando através de propagandas.

      Um tempo incontável levou a BAND, para um programa atingir 6 ou 7 pontos. Mesmo assim, Saad, ficou milionário com ela. Quem será q a manteve Qdo mal atingia 1 ou 2 pontos.

      Qto o país perdeu por sustentar Durante décadas lixo deseducando, invés de construir uma comunicação q levasse cultura ao povo?

      Algum dia o país Teria q começar essa comunicação. As TVs Cultura começaram a fazer esse papel, o PSDB matou a de S Paulo qdo ela deslanchava. E matou, justamente, por isso. As outras TVs Cultura eram muito dependentes dela, morreram juntas.

      A TV Brasil tem condiçoes de fazer o papel da finada Cultura  fazia. Com um bom investimento Federal pode ir muito mais longe.

  3. Essa corja passará

    Essa corja passará Paulo.

    Eles escrevem para quem não lê.

    Dê tempo ao tempo e veremos quem ficará e contará a história  do Brasil,

    se os Paulo Moreiras Leites e Nassifs ou os Mervais e esgotos.

  4. Qdo fiz meu primeiro e

    Qdo fiz meu primeiro e segundo grau, lembro-me do meu livro de história de Sérgio Buarque de Holanda, de meus Professores de Portugues me indicando Cecilia Meireles, Machado….. e artigos de jornalistas do passado. Em todo meu periodo escolar, nenhum professor me deu um texto do Corvo para ler. Olhe q passei, praticamente, todo esse periodo dentro da década de 70.

    A imagem q sempre me passaram de Lacerda era de um esgoto, assim serão vistos os esgotos atuais.

  5. Era um ótimo programa de

    Era um ótimo programa de entrevistas, assim como o do Luis Nassif. Infelizmente um governo de corruptos está destruindo tudo que encontra de bom conteúdo pela frente.

  6. Bolinho de chuva

     

    Quase tudo poderia continuar do jeito que sempre esteve – desde que haja a possibilidade de continuar, seja de que jeito for. Mas algo teria que mudar. Um programa – só um – em horário nobre (oito da noite, e não às dez, quando quem trabalha está indo dormir), teria que ser uma crítica escrachada do jornalismo feito pelas outras emissoras. O principal contratado teria que ser um bom advogado, dando assessoria sobre o que dá multa, o que dá cadeia e o que, no final das contas, não dá porcaria nenhuma e pode ir ao ar sem problema. O que o Alberto Dines fazia poderia ser muito mais eficiente se ele apenas levantasse a bola para humorista como o Gregório Duvivier, ou um desse muitos talentos que fazem o diabo em stand ups a troco de lanche na noite de São Paulo. O Nassif tirando sarro do que o Bonner acabou de dizer, ou do editorial do Globo naquele dia. A palavra mais pronunciada nesse programa seria “globo”. Vinte vezes por programa seria o limite mínimo. Bater, mesmo. Sem dó nem piedade. Causar celeuma. Ficar na boca do povo de esquerda, que iria correndo ver o problema de hoje, para ver o rolo do dia. O resto, como eu disse, pode continuar sendo aquilo que é hoje – programas mais analíticos têm lugar, mas teriam muito mais visibilidade se a emissora estivesse na boca do povo. Receita simples, tipo bolinho de chuva, mas que pode dar certo. Podemos ter a versão brasileira da BBC. Mas, antes, temos que ter a versão de esquerda do SBT. Caso contrário, é dinheiro público jogado no lixo. Sai todo mundo com  a sensação de que fez “grande jornalismo”. Para ninguém. Traço. Não faz sentido. O problema não é o salário pago a Fulano ou Sicrano, mas o retorno político que esse salário proporciona na REALIDADE, e não na imaginação e na consciência de quem recebe. Esse retorno só pode ser pensado, no Brasil, em termos de um enfrentamento efetivo do oligopólio de comunicações que comandou o processo de destituição de uma presidente eleita. O resto é conversa para boi dormir. Às dez e meia da noite, no meio do programa, deitado no sofá.

  7. Onde está a esquerda?
    A esquerda, sem apoio da mídia e fracionada como é, não conseguirá tirar essa corja do poder mobilizando a sociedade. Dependemos de alguma sanidade do judiciário. O último que sair feche as portas.

  8. Sem transparência

    O artigo em questão peca por não ter a desejada transparência; afinal, quais são os valores pagos pela TV Brasil para certas funções? QUanto ganha Moreira Leite? Assim como nos indignamos quando saem publicados os altos valores pagos aos membros de Judiciário, do Legislativo, precisamos ter a oportunidade de saber se, no caso da EBC, há salários altos ou não, gastos equivocados ou não. O mesmo se aplica a TV Educativa de São Paulo que tem salários altos para certas pessoas que só produzem “achismos”, geralmente com viés partidário (leia-se PSDB). Isso sem falar que a Fundação Padre Anchieta recebe verbas de publicidade (contrariando princípios de sua criação) e gasta dinheiro com seriados estrangeiros (Downton Abbey, Med, Sherlock, etc). Ou seja, nosso dinheiro (do povo paulista) sustenta parte do trabalhador britânico e americano na área do cinema e da TV.  A TV Cultura (TV Edicativa de SP) também precisa de transparência nos seus gastos, na sua produção que menospreza o interior do estado de SP (pelo menos nos noticiários ,inclusive culturais ).

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