Tem disco novo de Carlos Careqa na praça. Coisa meiga nunca será. Careqa tem um pé no absurdo. Há até quem ouse dizer que sua música nem música é – mas ela é música, sim senhor; música para mexer com a gente, trazendo-nos para o oco do seu turbilhão criativo. Careqa é desestruturador por natureza.
Compositor e cantor, ele é um eterno buscador de estranhezas poéticas. Assim, escutamos as suas músicas sem conseguir enquadrá-las em nenhuma categoria da música popular, muito menos em nenhuma vertente político-partidária-musical. Dir-se-ia, com razão, que ele é um maluco beleza redivivo.
Sua música é profana, meio circense, assim como seus versos e suas ideias. Assim ele vai, sem dogmas nem certezas absolutas… Apenas vai. E nós o acompanhamos, às vezes sem entender direito o que diz o poeta Carlos, às vezes sem sacar inteiramente a concepção sonora das músicas do compositor Careqa, mas sempre instados por ele a remexer em preceitos que entendemos como imutáveis desde que nos entendemos por gente.
O novo CD (belíssima capa) de Carlos Careqa, produzido por ele, Marcio Nigro e Mario Manga, é Palavrão – música infantil para adultos (Barbearia Espiritual Discos). Nele, treze composições suas, nas quais o adulto submerge no universo infantil, valendo-se da experiência adquirida e do imaginário da criança que mantém dentro de si. Para tanto, ele não mede palavras. Vale tudo, escatologia e termos chulos. O resultado é um sorriso grudado nos lábios e uma permanente tensão no ouvinte: “Até onde irá esse absoluto desprendimento do compositor, para expressar-se de uma forma que não estamos acostumados a ouvir num disco musical?”.
Pelos títulos, dá para sacar aonde a coisa vai: “Por Que a Vovó Tá Fria?”, “Exame de Fezes” (O exame é legal, mas tenho medo/ De segurar o potinho/ Vai que ele escapa do meu dedo/ E acabo me sujando todinho), “Rap do Peido”, “Eu e Reginaldo”, “O Menino e a Menina” (A menina é diferente do menino/ O menino tem uma torneirinha/ E a menina tem uma conchinha/ Que bonitinha a conchinha da menina), “O Diamante Azul do Vovô” (Vovô tomou o diamante azul/ Agora não pode ficar mais de pé/ Quando eu sento no colo dele/ Ele diz que é o celular), “A Tia da Escola”, “Meleca”, dentre outros.
Para acompanhar o cantor teatral que Careqa é, Manga e Nigro se valem de arranjos em que predominam programações de bateria e sampler, guitarras, baixo, teclados, vocais, violão, bandolim, percussão, cavaquinho, cellos e violinos. O repertório varia entre funk, rap, rock, marchinha, valsa e reggae, tudo com a inventividade levada às últimas consequências.
Careqa sente prazer no desfazimento do já estruturado, em abalar os aparentemente sólidos pilares de sustentação da ordem vigente, em buscar o caos na organização secularmente estabelecida, bagunçando conceitos, revendo certezas, ampliando visões, tratando o errado como certo, o feio como belo. Carlos Careqa cria para derrubar sentidos preexistentes.
Aquiles Rique Reis é músico e vocalista do MPB4
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Ué, não era para ser “Palavrão Cantado”?
Será que a Sandra Peres e o Paulo Tatit vetaram a brincadeira?