As perguntas mais frequentes sobre a liminar da ONU a Lula

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Fábio Balestro Floriano (*)

No Sul21

FAQ (Frequently Asked Questions) sobre a decisão do Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas a propósito da condição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A decisão é de cumprimento obrigatório?

Não se deixem enganar pelo linguajar diplomático da comunicação, que fala em ‘recomendação’ e outros termos suaves: a decisão é de cumprimento obrigatório. No momento que foi ratificado o Protocolo Facultativo ao Pacto de Direitos Civis e Políticos – Decreto nº 311/2009, as decisões do Comitê passaram a ser vinculantes. “Requested” é a linguagem diplomática. A obrigação jurídica é a mesma. O linguajar é o mesmo do art. 25 do regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (que fala em ‘solicitar’) e do Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (Decreto nº 4.136/2002) (o qual também fala em ‘recomendação’) – que condenou o Brasil no caso Aline Pimentel com a comunicação nº 17/2008 e teve a decisão seguida à risca.

Mas e a soberania nacional?

O Brasil, no exercício de sua soberania, independentemente, decidiu aderir ao Protocolo Adicional ao Pacto de Direitos Civis e Políticos em 1992 e ratificou (confirmou) essa decisão em 2009, no Decreto 311. A partir daí, as decisões exaradas pelo Comitê por fatos ocorridos a partir de 2009 são de cumprimento obrigatório pelo Estado. O Brasil pode, se quiser, denunciar o tratado – o que equivale a retirar-se dele. É o que a Venezuela fez em 2012 em relação à Convenção Americana de Direitos Humanos. As decisões tomadas antes da denúncia, entretanto, continuam valendo. E essa é uma postura infantil, para dizer o mínimo – do tipo ‘concordei com as regras do jogo, mas como perdi não concordo e não brinco mais.’ Aliás, nunca é demais frisar: é possível a um país aderir ao tratado de Direitos Humanos e não ao Protocolo Facultativo, que permite a avaliação de casos individuais. O Brasil sempre se vangloriou de ser um dos países que mais assinou tratados de Direitos Humanos. O problema é que, quando se assumem esses compromissos, estamos sujeitos a cumpri-los. Não é diferente agora.

Quem, afinal, emitiu a decisão?

Todos os tratados de Direitos Humanos do Sistema ONU possuem um Protocolo Facultativo que permite reclamações individuais. Em virtude desse protocolo existe um comitê permanente de especialistas que analisa os casos um por um. No caso do Pacto de Direitos Civis e Políticos de 1966, esse comitê é o chamado Comitê de Direitos Humanos, que integra o sistema ONU de monitoramento de tratados. Então as desqualificações que estão havendo de que seria “uma decisão de especialistas e não da ONU” não são válidas. Elas são de um comitê de especialistas criado pelo organismo justamente para analisar denúncias individuais de violações ao Pacto de Direitos Civis e Políticos e portanto, embora impreciso, não é errado dizer que “são da ONU.” A explicação ao final da nota quer dizer apenas que o Escritório do Alto Comissariado de Direitos Humanos entregou a comunicação à representação brasileira, mas ela foi emitida pelo Comitê e não por eles – o que em nada a invalida.

A comunicação fala em “interim measures”. Isso quer dizer que não é pra valer?

“Interim measures” são medidas cautelares, ou provisórias – idênticas às tomadas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos no caso Belo Monte em 2011 e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso do presídio Urso Branco em 2002, assim como em tantos outros casos de violações de Direitos Humanos no qual a inação deixa direitos sob ameaça. E, exatamente como no direito interno, cautelares devem ser cumpridas até que saia uma decisão final. O objetivo disso é evitar que um direito da vítima sofra uma lesão irreparável. E, nesse caso, importa ainda frisar que a defesa de Lula fez três pedidos: liberdade, direito de reunião – seja com a coligação ou para dar entrevistas – e o direito de concorrer. O Comitê disse ‘não’ ao primeiro pedido e ‘sim’ aos dois últimos.

Afinal, constataram violação de direitos no caso do Lula?

Sim e não. Ele quer dizer que foi achada uma possível restrição a direitos civis e políticos segundo o descrito no Pacto. O mérito dessa restrição (que pode ser válida juridicamente, como no caso da restrição de liberdade a apenado com trânsito em julgado) só vai ser decidido no futuro, mas até lá, provisoriamente e para evitar que haja lesão irreparável de direitos no caso de ser considerada inválida a restrição, deve-se garantir o direito de Lula concorrer e de dar entrevistas e reunir-se com membros de sua coligação.

(*) Fábio Balestro Floriano é advogado, Mestre em Relações Internacionais (UFRGS), especialista no Estudo das Instituições Ocidentais (University of Notre Dame) e Doutorando em Direito (USP). Atuou defendendo o Estado brasileiro em cortes e fóruns internacionais entre os anos de 2011 e 2012, e continua atuando em casos junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

24 Comentários

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    1. liminar

      SE O CAPUT DO ARTIGO 25 DEIXA CLARO DA POSSIBILIDADE, POREM ESSA LIMINAR TORNA-SE FACULTATIVA E CABE O BRASIL ACATÁ-LA OU NÃO.

  1. Oh Glória !!

    EM HAIA O BICHO VAI PEGAR !!

    Ontem fiz diversos comentários aqui no blog indagando sobre a possibilidade dos defensores de Lula denunciarem os responsáveis (autoridades dos poderes executivo e judiciário) pelo sequestro de Lula ao Tribunal Penal Internacional acusando-os pelo hediondo crime de sequestro político.

    Cometimento do crime mencionado no Decreto lei 4388/2002 Art.7 

    Pois bem, hoje o grande Eugênio Aragão confirma a minha tese : Se os sequestradores não cumprirem o que determina o Comitê de Direitos Humanos da ONU, eles deverão responder pelo crime contra a humanidade no tribunal sediado em Haia .

    Vejam o que informa o grande Eugênio Aragão :

    [video:https://youtu.be/xdT0V6DN6AM%5D 

    1. Adeus Quintas em Lisboa, Paris iluminada, Zurich….(será ?)

      Já imaginaram ministrinhos, juizecos e outras autoridades golpistas aqui do bananal não poderem pisar na Europa para evitarem serem enjaulados igual o Slobodan Milosevic ?

       

  2. Na verdade, avançaram o sinal e erraram 2

    Eles – O PSDB e os braços do judiciário e da mídia – jamais imaginariam que Lula cresceria tanto ao ponto de ter uma liminar perfeitamente legal em defesa de seus direitos emitida pela ONU, nunca.

    Sequer imaginavam Lula registrado, quanto mais protegido por decisão judicial sobre tratados internacionais que, também, foram legislados internamente em nossas casas.

    A condenação em segunda instância tinha o efeito de pressionar o judiciário a continuar com a farsa, mas essa pressão só seria efetivamente forte com o enfraquecimento da candidatura Lula, seria mais fácil juízes e ministros agiriem à revelia da lei, mas não com Lula em tamanho destaque. Eles acreditavam que se daria após a condenação e prisão tal esfacelamento político da candidatura Lula. Lembro que após a condenação de Lula em segunda instância, FHC disse que “agora havia começado o jogo”.

    Essa mania de profeta de FHC é feia. O jogo começou agora com uma liminar totalmente inesperada pela arquitetura intelectual do golpe, tenha ou não a CIA envolvida. É, o efeito foi ao contrário do que arquitetaram. Até podemos discutir as causas disso depois.

    Lula foi muito mais longe do que eles pensavam, cresceu muito, e os sintomas que foram pegos de surpresa nesse sentido apareceram durante a costura da chapa do Lula com PSB com as declarações de inelegibilidade de Fux, o adiantamento às pressas das inscrições para vice. Tudo orquestração de improviso, pois não esperavam que a candidatura Lula chegasse com tanta força a fazer coligações.

    Com certeza calcularam que haveria dissidência em relação à candidatura Lula dentro do próprio PT, após condenação e prisão. Chegou-se a cogitar isso na militância petista e entre políticos do partido, mas não foi adiante e o PT acertou em cheio na estratégia: ir até ao fim. Com tal decisão do PT, outro sintoma deles apareceu, que foi a chiadeira sobre a irresponsabilidade do PT, perssionar as instituições, provocar insegurança jurídica, o PT deveria desistir de Lula, está inelegível …

    Nunca, jamais contavam que o PT fosse insistir.

    Prenderam o personagem avaliado como melhor e mais concecituado presidente que o país já teve. Esse é o personagem histórico que os chucros da direita acharam que prendendo-o – após um processo fajuto desmascarado pelas mídias sociais – iriam desmoralizar e acabar com Lula politicamente. Sim, essa direita estúpida e ignorante política acreditou nisso.

    Hoje estão acuados com uma liminar da ONU nas mãos, um imenso problema moral. Nem nos piores quadros eles pensaram isso.

  3. Merda embaixo do tapete dos oligarcas

    Enquanto isso, segue mais um gritante silêncio do PIG. Os oligarcas das comunicações continuam firmes na determinação de manter a cidadania desinformada, escondendo mais essa última cagada do golpe que patrocinaram embaixo do tapete.

    Ainda bem que o ventilador mundial da Internet está espalhando tudo de volta na cara peluda dos golpistas.

    Já o boçal do Bolsonaro aproveita o fedor para declarar que, se eleito, tirará o Brasil da ONU tomada pelos comunistas.

    É de dar dó.

  4. Solicitação

    Uma solicitação nao tem como ser indeferidade se tem base fatico-jurídica. Um pedido pode ser, ou nao deferido, mas uma solicitação nao pode ser indeferida

  5. Carlos Alberto Sardenberg

    Carlos Alberto Sardenberg desmascarou o embuste da ONU, em que dois coleguinhas do advogado australiano de Lula apresentaram um relatório fake recomendando a candidatura fake do presidiário.

     “Fake News não são apenas mentiras deslavadas. Quer dizer, muitas são, mas facilmente desmentidas. As que produzem efeitos fortes são as fake mais elaboradas, com base em algumas verdades e muitas distorções (…).

             O comunicado é do Comitê de Direitos Humanos, um órgão formado por 18 ‘especialistas’ independentes – acadêmicos em geral – e que não tem nenhum poder decisório ou mandatório (…).

    Esse comunicado não foi divulgado oficialmente, mas saiu em matéria da BBC, na última sexta-feira. Um vazamento.

    Depois, saiu uma nota do Escritório de Direitos Humanos, no site oficial da ONU, com o título ‘Information note’ sobre o Comitê de Direitos Humanos. Ali se explica que não se deve confundir o Comitê com o Conselho de Direitos Humanos – este um órgão de alto nível, formado por representantes (diplomatas) de 47 países e que se reporta à Assembleia Geral da Nações Unidas, o órgão máximo da entidade. E este Conselho não decidiu absolutamente nada sobre esse caso.

    Vai daí que são fake todas as notícias do tipo: ONU manda, determina, exige que Lula participe da eleição; Conselho da ONU decide a favor de Lula, (forçando uma confusão do Comitê com o Conselho, por ignorância ou má fé); decisão do Comitê é obrigatória (…).

    A função do Comitê é supervisionar o cumprimento dos direitos humanos previstos nos diversos tratados patrocinados pela ONU.

    E em nenhum desses tratados está escrito que cumprir pena depois da segunda instância é uma violação de direitos humanos. Reparem: nenhum tratado internacional condena a execução da pena em segunda instância. Nem em primeira instância – como ocorre em grande parte dos países, assunto que nunca mereceu a atenção do Comitê de Direitos Humanos da ONU.”

    1. Obrigatoriedade de cumprimento das decisdões doCDH da ONU

      PROTOCOLO FACULTATIVO AO PACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS:

      “ARTIGO 1º Os Estados Partes do Pacto que se tornem partes do presente Protocolo reconhecem que o Comitê tem competência para receber e examinar comunicações provenientes de indivíduos sujeitos à sua jurisdição que aleguem ser vítimas de uma violação, por esses Estados Partes, de qualquer dos direitos enunciados no Pacto. O Comitê não receberá nenhuma comunicação relativa a um Estado Parte no Pacto que não seja no presente Protocolo.”

    2. ONU

      Carlos Sardenberg também desmascarou o embuste do pré-sal. Pré-sal fake. Não existe. As petroleiras no mundo todo devem homenagem a esse grande Pulitzer, o Sardenberg, por lhes abrir os olhos para a grande mentira do pré-sal.

       

      1. Nassa: Por qor que   não

        Nassa: Por qor que   não publica minha resposta ?

        é rústica ? é .

          E a pergunta dele é singela ?

          

    3. O Brasil viola, de fato, os direitos políticos do Lula

      E vai continuar violando os referidos direitos pois a ONU não determinou, apenas recomendou que parássemos de desrespeitar os direitos políticos do Lula.

      Porque o Brasil só se defende processualmente da imputação de violar os direitos do Lula? Porque não elabora uma defesa de mérito?

      Alguém saberia explicar?

  6. O Judiciário faz das tripas

    O Judiciário faz das tripas coração para tentar emplacar seu politivismo jurídico, como forma desesperada de assegurar sua hegemonia no sistema político. Por esta não esperavam: as metamorfoses do mundo globalizado (Ulrich Beck) têm tanta força destrutiva para superar o que é velho, que até mesmo (ou principalmente?) as estruturas e modos de pensar estão sendo rompidas, dando lugar ao novo. O sistema jurídico-político, como ensinado no oficialismo da academia, não tem como dar conta dos novos impactos e rupturas. Que o inspirado Walter Maierovic não consiga atinar com isso não surpreende, se levamos em conta o habitus condicionado pela prática de certa época. J[a o ministro Barroso, que tem veleidades (e credenciais) para captar o novo espírito da época, vai se ver em palpos de aranha e terá que reescrever parte de seu conceiruado compêndio de Direito Constitucional  – se quiser se manter fiel ao receituário da ordem oficial.

    1. A ONU facultou ao Brasil respeitar os direitos políticos do Lula

      Se fosse uma ordem judicial e nao uma recomendação, o Brasil nao iria mais desrespeitar os direitos políticos do Lula, mas a ONU nao obrigou, só facultou ao Brasil respeitar os direitos políticos do Lula. Nao vamos respeitar

  7. WHO & TRADITIONAL MEDICINE
    OMS E RESOLUÇÕES WHA29.72, WHA56.31, WHA62.13, WHA67.18…
    Resoluções da Assembleia Mundial da Saúde, uma dúzia delas sobre Medicina Tradicional, não são implementadas há décadas. Resolução não é apenas uma carta de intenções.
    E o BR foi um dos idealizados de OMS, órgão que teve um brasileiro como Diretor Geral por quase vinte anos.

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