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Merval Pereira e o julgamento à moda de Lady Shangai no STF, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Merval Pereira e o julgamento à moda de Lady Shangai no STF

por Fábio de Oliveira Ribeiro

No dia 14 d abril de 2021, o pleno do STF julgará o Habeas Corpus 193.726impetrado por Lula. Aqui mesmo no GGN já teci alguns comentários sobre esse caso https://jornalggn.com.br/editoria/cidadania/a-facada-processual-de-fachin-por-fabio-de-oliveira-ribeiro/.

É difícil antecipar qual será a decisão, pois existem diversas variáveis. O pelo pode se recusar a decidir uma matéria de competência da Turma. Caso essa questão não for levantada (o que eu acho difícil) ou for superada, o Tribunal decidirá se acolhe ou não a decisão tomada pelo Ministro Fachin.

Há bem pouco tempo a maioria dos Ministros considerou Sérgio Moro suspeito para julgar os processos do ex-presidente. Fachin quer reverter essa decisão, sob o fundamento de que a questão da incompetência tem precedência sobre a da suspeição. O problema: desde o início do processo as duas coisas estão interligadas. Moro não aceitaria a competência para julgar seu inimigo se não quisesse prejudicá-lo para auferir algum tipo de proveito pessoal, algo que de fato ocorreu. Além disso, o pleno do STF não tem competência para reverter decisões proferidas pelas Turmas.

O que chamou minha atenção a grande movimentação da mídia em defesa de Sérgio Moro. O processo diz respeito a Lula, mas a imprensa convocou a operação Lava Jato para sentar no banco das testemunhas. Isso fica claro no texto divulgado pelo famoso “caneta do clã Marinho”.

Suponho que o imortal Merval Pereira não percebeu a cloaca em que ele mesmo se enfiou. Em defesa de uma suposta seriedade do judiciário, ele pretende transformar a Suprema Corte brasileira no palco de uma chicana semelhante àquela que é vista na memorável cena do julgamento do filme The Lady From Shanghai:

O promotor convoca o advogado a prestar depoimento. Sentado no banco das testemunhas, o advogado responde algumas perguntas. Mas ele se recusa a responder outras dizendo que o promotor está usando o interrogatório para fazer ilações a fim de convencer o juri. Encerradas as perguntas do promotor, o advogado/testemunha se vira para o juiz e requer o direito de fazer perguntas a si mesmo. O juiz admite o interrogatório. Então o advogado começa a fazer perguntas e a respondê-las como se fosse duas pessoas.

O efeito cômico é inevitável. Todo mundo sabe que o advogado não poderia dizer nada que prejudicasse seu cliente. Se fizesse isso ele poderia perder sua inscrição na Ordem dos Advogados em razão de trair a confiança que lhe foi depositada.

As relações entre Sérgio Moro e a imprensa são bem conhecidas. Elas já foram objeto de muita reflexão. Ao proferir seu voto no julgamento do HC 164493, o Ministro Gilmar Mendes fez questão de condenar o conluio entre o juiz e os jornalistas https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/politica/gilmar-vota-pela-parcialidade-de-moro-e-fala-em-maior-escandalo-judicial-da-historia-acompanhe-1.3057731.

A imprensa tem interesse no resultado do julgamento do HC 193.726. Portanto, nenhum jornalista pode ser advogado e testemunha de defesa de Sérgio Moro e da Lava Jato num processo em que, aliás, eles não figuram como partes. Caso contrário, além de afrontar a dignidade e a autonomia do Judiciário, o jornalista transformará o julgamento do dia 14 d abril de 2021 em uma reedição brasileira da cena do filme The Lady From Shanghai.

Essa avacalhação da Suprema Corte brasileira é realmente necessária? A quem o senhor Merval Pereira está servindo ao tentar obrigar os Ministros do STF a se submeter às racionalizações de um advogado/testemunha não autorizado a participar do julgamento? Orson Welles concebeu aquela cena para ridicularizar a maneira séria como o cinema norte-americano estava acostumado a retratar os julgamentos nos EUA e não para fornecer ao imortal brasileiro um roteiro para rebaixar a credibilidade do STF.

Redação

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