Apesar de quase 90% da África já registrar casos de COVID-19, o continente tem perdido espaço no noticiário para a situação nos Estados Unidos e na Europa, onde países mais ricos protagonizam a crise.
Segundo levantamento feito pelo jornal O Globo, divulgado no dia 22 de março, a África tem pouco mais de 1,2 mil casos de COVID-19 espalhados por 42 dos seus 54 estados soberanos.
O continente tem mais de 1 bilhão de habitantes, mas segundo um artigo publicado na revista Science, somente 3% da população tem mais de 65 anos – diferentemente da Itália, onde esse índice está em torno de 20%.
A pirâmide social poderia ser uma vantagem para a África, não fossem as demais peculiaridades de uma região marcada pela colonização, guerras, pobreza e outras mazelas, como HIV, tuberculose e malária, e uma imensa maioria das massas sem acesso a um sistema universal de saúde.
Essas características levam especialistas a crer que a disseminação de coronavírus na África é uma verdadeira bomba-relógio. Os países precisam convergir todos os esforços na tentativa de controlar a situação.
Secretário-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), o etíope Tedros Adhanom Ghebreyesus foi bem claro ao direcionar seu discurso para os conterrâneos. Ninguém deve presumir que não será afetado nessa pandemia e o melhor é que todos se preparem para o pior.
A preocupação dele é que o coronavírus – que começou concentrado em capitais africanas que importaram a doença da Europa e da China – se espalhe para as comunidades carentes, que geralmente não têm comida, ainda menos água e sabão para higienizar as mãos.
Desde que os números no continente começaram a crescer, a OMS definiu 13 regiões para monitorar de perto. Apesar de só apresentar 12 casos de coronavírus nesta terça (24/3), a Etiopia é uma delas, por causa do trânsito aéreo intenso com a China.
Até o momento, o país que lidera em casos confirmados é a África do Sul, que já passou dos 550. Egito é o segundo país com mais casos, acima dos 300. A Argélia, no extremo norte do continente, é o terceiro, com mais de 200. Os três lugares estão justamente em zonas de maior densidade demográfica.
Como ocorre em outros continentes, na África, cada país está lidando com a situação à sua maneira. A maioria ainda não decretou o confinamento das pessoas dentro de casa, mas fechou locais públicos, escolas e outros estabelecimentos.
A exemplo do que ocorre no Brasil, dentro de um mesmo país, falta coordenação entre as medidas estabelecidas pelas autoridades.
Por exemplo: a República Democrática do Congo, que é um país com 80 milhões de habitantes, vai decretar nesta semana o confinamento em Lubumbashi, mais ao sul, porque eles receberam um voo com mais de 70 pessoas e 2 dos passageiros (que vieram de uma região que fica do outro lado do país) testaram positivo para coronavírus.
Agora, a cidade inteira, que é a capital econômica do RDC, com 4 milhões de habitantes, vai parar por 48 horas, enquanto as autoridades buscam identificar e isolar as pessoas que tiveram contato com esses 2 casos confirmados. As demais províncias ou estados, incluindo o “berço” dos 2 casos confirmados, ainda não decidiram o que fazer.
A República do Congo – que também está na lista de prioridades da OMS na África – tem uma vantagem no combate ao coronavírus, que é a estrutura que já existia em portos e aeroportos para monitorar o trânsito de passageiros por causa do vírus Ebola.
Essa mesma estrutura agora é usada para ficar de olho nos casos de COVID-19, não só dos passageiros que deixam o país, mas também daqueles que estão chegando.
A vantagem não significa que a República do Congo está tranquila. Um pico de coronavírus no País não seria igual a um surto de ebola. No caso da COVID-19, são necessários aparelhos respiradores para o tratamento e, segundo a OMS, eles estão escassos no país.
Outras regiões da África adotaram medidas de mitigação mais ou menos rígidas. Na parte ocidental, em Senegal e Costa do Marfim, as fronteiras e espaços públicos foram fechados, mas não há quarentena forçada para a população.
No Gabão, que fica na região central do continente, a vida noturna em bares e restaurantes sofreu restrição de horário, uma medida válida, mas que espelha a resistência da sociedade em cooperar com o isolamento.
Ruanda foi um dos poucos países a adotar o confinamento total da maior parte da população e proibiu por duas semanas as atividades e deslocamentos não essenciais. Marrocos e Tunísia, ao norte, fizeram o mesmo. A maioria dos países proibiu ao menos os eventos públicos e atividades em templos e igrejas, por exemplo. Ainda assim, há relatos de lideranças religiosas violando as recomendações.
A CURIOSA SITUAÇÃO DA LÍBIA, SEM NENHUM CASO
O extremo norte da África é uma das regiões mais densas do continente e tem uma situação curiosa, que é a da Líbia. É o único país ali nas proximidades que não tem nenhum caso de coronavírus até o momento.
Desde 15 de março a Líbia adotou o distanciamento social, fechou locais públicos e também reduziu o horário comercial de serviços não essenciais. Eles restringiram voos e monitoraram os passageiros internacionais, colocando em quarentena todos os aqueles já contaminados e os outros que embarcaram junto.
Quando ainda não havia atingido sequer uma centena de casos confirmados, a África do Sul, com seus 57 milhões de habitantes, decretou emergência nacional e fechou parte dos portos e aeroportos para estrangeiros. Agora, rumo aos 600 casos, o país decidiu adotar o confinamento por 3 semanas, a partir da próxima quinta feira (26). O exército será acionado para patrulhar as ruas e fazer cumprir a quarentena.
UM VÍRUS QUE NÃO PODE SER SUBESTIMADO
Em entrevista ao R7, a professora de Relações Internacionais da UniSantos, Natália Fingerman, alertou que “o fato de o continente ter uma quantidade pequena de idosos, em função da baixa expectativa de vida, não garante uma quantidade muito menor de vítimas, já que as precárias condições sanitárias e a desnutrição são fatores que abalam a saúde da população.” A África tem algumas dezenas de mortos por COVID-5.
Fingerman também ressaltou que a COVID-19 infelizmente é só mais uma doença muito séria num continente que tem mais de 400 mil casos e malária por ano. Uma epidemia de coronavírus pode ser novidade para a Europa mas, para a África, infelizmente, não é. As consequências já são conhecidas.
Links consultados:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Pandemia_de_COVID-19_na_%C3%81frica
https://www.afro.who.int/photo-story/scaling-coronavirus-outbreak-readiness-ethiopia
Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.