Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Caos como método: “meganhar” a escola para formar futuros eleitores da extrema-direita, por Wilson Ferreira

A extrema-direita (principalmente sua versão alt-right) sabe que o ambiente escolar é o locus decisivo para vencer a “guerra cultural”.

Caos como método: “meganhar” a escola para formar futuros eleitores da extrema-direita

por Wilson Roberto Vieira Ferreira

Há algo que a extrema-direita tem de sobra que falta à esquerda: o élan conspiratório. Nos treze anos de governo, o PT jamais viu a educação como espaço para a conquista do imaginário que cimentaria o apoio ideológico das massas. Com o economicismo acreditou que bastaria a entrada dos excluídos no mercado de consumo para se sentirem cidadãos. Ao contrário, a extrema-direita (principalmente sua versão alt-right) sabe que o ambiente escolar é o locus decisivo para vencer a “guerra cultural”. Por isso, sob a complacência da grande mídia e Big Techs, enceta o caos como método: “meganhar” (militarização + policialização) a escola através da disseminação do medo pelas redes, com o apoio de subgrupos extremistas que deixaram a Deep Web com a ajuda dos algoritmos interesseiros. Quer conquistar o imaginário das futuras gerações de eleitores.

Em postagem anterior (clique aqui) este Cinegnose discutia como a chamada “direita-alternativa” (alt-right) passou a ter um élan conspiratório cada vez maior, élan que a esquerda parece ter perdido há algum tempo – sempre preocupada ou em ser aceita como missivista em colunas de opinião da grande imprensa, ou de ter arcabouços fiscais bem recebidos pelo mercado financeiro.

Um élan conspiratório da extrema-direita se desenvolve através de duas agendas: a anti-globalista e a da guerra cultural. Intrinsecamente ligadas: o comunismo globalista (ONU, ONGs etc.) lançaria guerras culturais para, por dentro, destruir as nações ao infiltrar o marxismo, identitarismo e ideologias de gênero nas escolas e meios de comunicação para contaminar e destruir valores tradicionais da família, pátria, liberdade e religião. Conformando as pessoas a aceitar a ascensão do Estado socialista totalitário. 

Ao contrário do economicismo dos treze anos dos governos do PT (a certeza de que fazer as massas ascenderem ao mercado de consumo criaria nelas a consciência de inclusão e cidadania), imediatamente após o impeachment de Dilma Rousseff em 2016, o governo do presidente desinterino Temer arregaçou as mangas e pôs em ação as reformas trabalhistas, previdência e, o arremate necessário para tudo isso dar certo, a reforma do ensino médio – nenhuma reforma econômica dá certo se não houver ao mesmo tempo a reforma no imaginário, no caso, na educação.

Não por acaso, o consórcio mídia-banca financeira viu em Bolsonaro a condição sine qua non para que a agenda das reformas desse certo: o match entre a agenda alt-right (tal como descrita acima) e a agenda hiper-liberal da neocolônia digital brasileira.

Chegando ao poder, imediatamente Bolsonaro e seu anti-ministério (especializado em desmanchar e destruir suas respectivas pastas) pulou imediatamente na jugular da Educação, Ciência e Conhecimento.

Ou mais detalhadamente, o governo alt-right de Bolsonaro abriu uma frente ampla de ataque e controle do imaginário: família e igreja (com o neopentecostalismo representado pela bancada da Bíblia no Congresso), Escola (corte de verbas, censura, vigilância e controle incipiente de focos de resistência e oposição) e grande mídia – apropria-se da crítica da esquerda à mídia, acusando-a de “globalista”.

Mi-mi-mi

Desde o início, esse élan conspiratório acreditava que a única maneira de enfrentar a guerra cultural da agenda globalista era endurecendo a mentalidade das massas. Como? Acabando com todo esse “mi-mi-mi” em torno de educação, ciência e conhecimento.

Afinal, a reforma do ensino médio não objetiva nem a ciência e conhecimento, preparando o aluno para o ensino superior, e muito menos o ensino profissionalizante – através dos seus “itinerários” o novo ensino médio não visa a “qualificação” do aluno (ensinar um ofício, um “saber-fazer”, uma profissão), mas a “capacitação”: disposições subjetivas genéricas que compõem o imaginário do empreendedor como “inteligência emocional”, “resiliência”, “foco” etc.

Ao contrário dos governos petistas que nunca viram a educação como oportunidade para cimentar o apoio político-ideológico das massas (viram a educação unicamente como porta de entrada para a ascensão social e mercado de consumo), a extrema-direita leva bastante a sério. Não é por menos que logo de cara partiram para a ofensiva contra escolas e universidades – “escola sem partido”, “contaminada apela ideologia de gênero”, “universidades que plantam maconha” etc.

 Por um lado, a extrema-direita cumpriu o seu papel histórico de sempre fazer o serviço sujo do capitalismo: com o discurso histérico anti-comunismo e identitário contra as escolas, contrapôs a escola ideal, sem “ideologias” – aquela que “educaria” o aluno para o empreendedorismo que oculta das estatísticas o futuro desempregado.

E do outro, colocou em ação a sua própria agenda (que, até certo ponto, é simpática ao hiperliberalismo): a militarização e policialização do ambiente escolar. Em outras palavras, através do imaginário da meganhagem (armas, violência e repressão como moralmente boas) embrutecer o psiquismo das massas. 

Traço psíquico ideal para a concepção fascista de vida que sustenta a personalidade autoritária: concepção da vida como rude e dura, submissão acrítica, agressividade autoritária, destruição e cinismo etc. – sobre isso clique aqui.

Se não, observe, caro leitor, como nos quatro anos do governo Bolsonaro, sites e perfis nazistas, neonazistas, incels, PUA (Pick-Up Artists), Hominis Sanctus, Red Pill etc. abandonaram a Deep e Dark Web para dar as caras nas mídias e redes sociais.  

Não é mera coincidência que o governo de extrema-direita começa em março de 2019 com o massacre em uma escola em Suzano/SP – detalhe: o nome do subgrupo neonazista do qual fazia parte o aluno responsável pelos ataques recentes numa escola estadual de SP, era do “mártir” do ataque em Suzano.

Nesse momento páginas de redes sociais divulgam possibilidade de um novo massacre em várias escolas que seria realizada no dia 20 de abril – data simbólica para supremacistas brancos, por ser a data de nascimento de Hitler o do Massacre de Columbine, na Columbine High School (EUA) em 1999.

Ameaça que vem na esteira da repercussão de duas semanas consecutivas de ataque a uma escola (SP) e a uma creche em Blumenau (SC). 

Sincronicamente, numa semana em que 80 militares do Exército e do Gabinete de Segurança Institucional (GCI) vão prestar depoimento à PF sobre ataques golpistas de oito de janeiro e Lula embarca para a China, colocando mais uma vez em evidência a pauta econômica na grande mídia – sobre a guerra das pautas na mídia e opinião pública clique aqui.

Meganhar a escola

Além dessa estratégia de abduzir a opinião pública dessa pauta que pouco interessa a extrema-direita, há também o élan conspiratório alt-right: meganhar o ambiente escolar (militarização + policialização) – patrulhar armadas no entorno e dentro das escolas, criação de protocolos para professores e alunos em casos de ataques etc. Trazendo como plausível o horizonte futuro da necessidade de uma militarização escolar.

Sabemos que medo e culpa são a matéria-prima de toda dominação política. É um consenso que vai de um lado a outro do espectro que vai da ciência política (Hobbes, Canetti) à psicanálise da cultura (Freud, Fritz Haug, Escola de Frankfurt etc.).

Continue lendo no Cinegnose.

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

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