A alta do feijão e o golpe ruralista, por Alan Tygel

Jornal GGN – O Brasil se torna extremamente dependente do mercado externo ao deixar de plantar alimentos para privelegiar mercadorias. A opinião é de Alan Tygel, no Brasil de Fato, ao comentar o aumento do preço do feijão, que chegou a ter o quilo passando de R$ 10, e dizendo que solução encontrada pelo ministro interino da Agricultura, Blairo Maggi – “o Rei da Soja” – foi zerar a taxa de importação para o feijão estrangeiro. 

Tygel diz que o agronegócio não se preocupa em produzir alimentos para o país, apontando a mudança na utilização das terras no Brasil: nas últimas duas décadas e meia, a área de produção de arroz caiu 44%, a mandioca recuou 20 %, e a área plantada com feijão, “o vilão do momento”, foi reduzida em 36% desde 1990. Em comparação, a população aumentou 41%. Mesmo com o aumento da produtividade, a diminuição da área deixa a colheita mais vulnerável a variações como a atual.

Para Tygel, o agronegócio ameaça a soberania alimentar no Brasil e é necessário fazer a reforma agrária para “dar terra a quem quer plantar comida”, mostrando dados, ainda de 2006, que revelam que 80% da área planta de feijão, e 70% da produção, são da agricultura familiar.

Leia mais abaixo:

Do Brasil de Fato

Opinião: O golpe ruralista e o preço do feijão
 
Ao deixar de plantar comida para plantar mercadorias, ficamos extremamente dependentes do mercado externo
 
Alan Tygel

Na última semana, fomos bombardeados pelas notícias sobre a alta no preço do feijão. O povo, chocado em ver o quilo passando de R$10, ouviu as mais diversas explicações dos analistas: geada e muita chuva no sul, falta de chuva em outras regiões, e até o boato de que uma pequena doação para Cuba feita em outubro de 2015 teria sido a causa da escassez. A solução mágica apresentada pelo ministro interino da agricultura, o Rei da Soja, foi zerar a taxa de importação para facilitar a entrada de feijão estrangeiro.

O que estranhamente não saiu em lugar nenhum foi um elemento muito simples: o agronegócio brasileiro não se preocupa em produzir alimentos para o Brasil. E isso fica muito claro quando olhamos a mudança na utilização das terras no país. Nos últimos 25 anos, houve uma diminuição profunda na área destinada à plantação dos alimentos básicos do nosso cardápio. A área de produção de arroz reduziu 44% (quase metade a menos), e a mandioca recuou 20%.

A área plantada com feijão, o vilão do momento, diminuiu 36% desde 1990, enquanto a população aumentou 41%. Apesar de ter havido um aumento na produtividade, a diminuição da área deixa a colheita mais vulnerável e suscetível a variações como estamos vendo agora.

E o agronegócio?

Os grandes latifundiários do Brasil, aliados aos políticos da bancada ruralista, à multinacionais de agrotóxicos e sementes como Bayer, Monsanto e Basf, e às empresas que dominam a comunicação no país não estão preocupadas com a alimentação da população. Este atores compõem o chamado agronegócio, que domina a produção agrícola no Brasil, e vê o campo apenas como local para aumentar suas riquezas.

Isso significa, na prática, produzir soja e milho para alimentar gado na Europa e na China, enquanto precisamos recorrer à importação de arroz, feijão e até do próprio milho para as festas de São João. Exportamos milho, e agora precisamos importar o milho. Faz sentido?

No mesmo período em que a área plantada de arroz e feijão caiu 44% e 36%, respectivamente, a área de soja aumentou 161%, enquanto o milho aumentou 31% e a cana, 142%. Somados os três produtos, temos 72% da área agricultável do Brasil com apenas 3 culturas. São 57 milhões de hectares que ignoram a cultura alimentar e a diversidade nutricional do nosso país em favor de um modelo de monocultura, que só funciona com muito fertilizante químico, semente modificada e veneno, muito veneno.

No caso da cana e da soja, é fácil entender que não são alimentos, e sim mercadorias ou (commodities) que vão ser comercializadas nas bolsas de valores pelo mundo. No caso do milho, basta ver que em 2015 foram exportados 30 milhões de toneladas de milho, em relação direta com a alta do dólar. Com o preço da moeda americana em alta, vale mais à pena exportar do que vender aqui. Assim, o que sobra no Brasil não é suficiente para o nosso consumo, e por isso temos que importar, o que também irá pressionar o preço. Hoje é o feijão, logo logo será o milho que vai explodir de preço.

Outro aspecto importante é analisar que quem bota o feijão na mesa do povo é a agricultura familiar. Os dados ainda de 2006 mostram que 80% da área plantada de feijão (e 70% a produção) são da agricultura familiar. E esta agricultura não tem espaço no reino do agronegócio.

O agronegócio ameaça a soberania alimentar no Brasil. Ao deixar de plantar comida para plantar mercadorias, ficamos extremamente dependentes do mercado externo, e vulneráveis às mudanças climáticas.

O primeiro passo: reforma agrária para dar terra a quem quer plantar comida. Com a terra na mão, precisamos de incentivo à agroecologia, para produzir alimentos saudáveis. Finalmente, essa produção deve ser regulada pelo Estado, via Conab, para garantir o abastecimento interno antes de embarcar tudo para fora.

O governo interino já admite privatizar a Conab, e pode em breve aprovar leis que facilitam ainda mais o uso de agrotóxicos e o uso de pulverização aérea nas cidades.

É, de fato, também um Golpe Ruralista.

 

Redação

8 Comentários

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  1. Comentário.

    O IPEA tem um estudo (cito de memória, desculpe pela referência sem documentação direta) que mostra a relação entre produção de alimentos e a origem (qual propriedade) dos mesmos. Os gráficos apontam que alimentos básicos, como a mandioca, são produzidos pela agricultura familiar e pela pequena propriedade, algo completamente diferente, por exemplo, no caso da soja. O feijão, por exemplo, apesar de um “desnível” menor (sic), também possui desequilíbrios na origem da propriedade… Vale pesquisar.

     

  2. Brasil um pais pessimamente

    Brasil um pais pessimamente gerenciado. E não estou falando de poítica.

    Pessimamente gerenciado em todos os aspectos.

    E agora com este governo golpista somo passageiros da agonia.

     

  3. Brasil um pais pessimamente

    Brasil um pais pessimamente gerenciado. E não estou falando de poítica.

    Pessimamente gerenciado em todos os aspectos.

    E agora com este governo golpista somo passageiros da agonia.

     

  4. É claro que o problema esta no agronegócio!

    Nem me dei ao trabalho de ler por inteiro. O que comento é de vivência.

     

    Vivi por 10 anos em Capão Bonito/SP, município primordialmente agrícola.

     

    No bairro onde morávamos, em torno de 10, 12 famílias, todas plantavam primeiramente feijão e arroz. Em seguida vinham milho e depois leguminosas.

     

    Apesar de ter mudado fazem uns 20 anos, constantemente visito os amigos no bairro e vejo exatamente a mesma realidade em todo município: soja, soja e mais soja.

     

    Enquanto anteriormente cada família plantava em torno de 20 alqueires de feijão todos os anos, além das demais lavouras, hoje estão todos com suas terras arrendadas para o plantio da soja, limitando os plantios de feijão e arroz apenas para o gasto.

     

    Diminuiu-se drasticamente a produção de feijão com arroz da agricultura familiar e ocupou-se a terra pelo agronegócio.

     

    A isenção proposta pelo governo à importação não resolverá a questão do custo do feijão e só aprofundará a crise da agricultura familiar.

     

    Ao invés de abrir mão de impostos priorizando a produção dos hermanos, mais correto seria subsidiar a produção do prato básico brasileiro: feijão, arroz e farinha.

     

    Isso significaria a soberania alimentar do País com o fortalecimento e o merecido reconhecimento da agricultura familiar, oferecendo-lhes melhores condições de vida.

  5. DEZ- 2015….Só tinha soja no meu velho Paraná..

    Estive visitando a  terra da minha infância ( antes que não desse mais tempo )  no fim do ano passado.

    Fui com minhas irmãs relembrando os  bons old-times….Assim que deixei a Castelo Branco, passando por Ourinhos–SP e  adentrando a  terra-mãe  de  todos  os  pés-vermelhos, tomei um choque cultural (  Só tinha SOJA por todos  os lados ) !   Tapete verde-escuro  de  fio a  pavio !!!

    Chegando ao destino, em Encantando d´Oeste-PR ( depois  de Assis Chateaubriand ), parei num boteco a  verachão na praça matriz da cidade  e  desembestei a  perguntar ao pessoal que tava lá jogando prosa-fora, sobre  aonde  andavam fulano e cicrano e  cia. ltda.

    Foi quando alguém chega no dono do boteco e lasca: – Zé,  não tô achando mandioca  em lugar nenhum !  Ninguém mais tá plantando, não ???   Quando ele  responde:  – Pelo jeito, só vai encontrar lá  em Toledo?  ( 100 km dist ) !

    Foi o fim dos mundos !!!   Logo eu que me exilei na Bahia, depois  de 30 anos  em Sampa.   Voltar ao Paraná  e não encontrar ” Aipim”…..Acabou-se o mundo !!!!     POR TODOS  OS  LADOS, SÓ TINHA  SOJA !!!

  6. Prezados,

    amanhã, em meu artigo para CartaCapital, que deverá ser reproduzido no GGN sábado, abordo o mesmo tema. Seguinte: é assim, mas não é bem assim.

  7. O artigo dá a entender que

    O artigo dá a entender que devemos implantar uma agricultura de planejamento SOVIETICO, onde o Governo determina o que vai se plantar em cada area do Pais. Se a agricultura do Brasil é de natureza PRIVADA, é o agricultor quem escolhe o que plantar.

    Mas usando a inteligencia e não a ideologia é possivel INDUZIR os agricultores a certos tipos de plantio com politicas de PREÇOS MINIMOS e ESTOQUES REGULADORES. É novidade? Não. O Govervo Vargas do periodo 1930-1945 usava esse sistema, os governos de 1945 a 1985 tambem usavam o sistema, através da Comissão de Financiamento da Produção e as compras e gerenciiamento desses estoques eram realizados pelo Banco do Brasil. Na atual crise do feijão, que tem razões climaticas, o governo deveria rapidamente importar, feijão tem em muitos paises e vender com preços tabelados

    pelo periodo da escassez. Isso já foi feito muitas vezes no passado, não é algo muito dificil.

  8. Não se trata de obrigar o produtor. . .

    Não se trata de obrigar o produtor rural a plantar o que o governo “mandar”, o artigo não diz isso, mas sim de observar que quem produz comida para o povo: arroz, feijão, mandioca, e a maioria dos hortigranjeiros são os pequenos agricultores, com áreas inferiores a 50,00 ha, e eles tiveram muito apoio nos últimos 13 anos com o MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário), que foi extinto pelo governo interino do golpista TEMER. Aliás nunca tivemos uma época de tanta fartura de abastecimento como nesta última década, problemas de falta de feijão, de arroz, de mandioca para farinha eram muito comuns nas décadas de 70, 80 e 90, rareando de meados desta última década até os dias atuais, coincidindo com um maior apoio à agricultura familiar.  E não tem como usar de política de preços mínimos para incentivar o cultivo de feijão, pois isso implicaria na formação de estoques reguladores, coisa muito difícil de se fazer com o feijão que envelhece e estraga em pouco tempo.

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