Ação de Barbosa contra Noblat: crítica à autoridade pública é necessária

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – Joaquim Barbosa, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, perdeu a ação contra o jornalista e colunista Ricardo Noblat, por injúria, difamação e racismo. O juiz decidiu que a crítica à autoridade pública não só é possível, como necessária, e que o exercício do cargo no Judiciário não deve fugir a esta regra.

Do Conjur

BARBOSA VS. NOBLAT

Questionar os poderes de uma autoridade pública não é uma afronta

“Questionar os poderes de uma autoridade pública não deve ser considerada uma afronta, e a crítica à autoridade pública tornou-se algo não somente possível, mas necessário. O exercício do cargo no Poder Judiciário não foge a essa regra”. Com esse entendimento, o juiz federal Elder Fernandes Luciano rejeitou, no último dia 11 de setembro, denúncia do Ministério Público Federal contra o jornalista e colunista Ricardo Noblat, do jornal O Globo.

O MPF, que recebeu representação criminal de Joaquim Barbosa, então ministro e presidente do Supremo Tribunal Federal, pleiteava a condenação pelos crimes de injúria, difamação e racismo. A representação e a denúncia foram propostas por conta da coluna “Joaquim Barbosa: Fora do Eixo”, publicada em 19 de agosto de 2013, no jornal impresso e na internet. A decisão é de 1ª instância, mas o MPF não vai recorrer, segundo noticiou o próprio O Globo.

O MPF justificou a denúncia contra Noblat argumentando que ao “fazer crítica ao ministro do STF, no exercício de sua função, extrapolou os limites da liberdade de expressão e de manifestação de pensamento, passando à ofensa deliberada do ofendido”. Afirmou ainda que “a crítica foi altamente ofensiva e injuriosa”. E sustentou “que o modo de agir do denunciado não apenas constituiu injúria racial. O texto publicado também estaria envolto à prática de racismo”.

A defesa do jornalista alegou que o texto, “definitivamente, não era ofensivo à honra de quem quer que fosse e tampouco indutivo da prática de racismo”, e sustentou ainda “que se tratava de crítica jornalística, notadamente elaborada a partir de fato ocorrido em sessão do julgamento do processo conhecido como ‘mensalão’”. 

Ainda segundo a defesa, “na ocasião da sessão do julgamento do dia 15 de agosto de 2013, o ministro Joaquim Barbosa (foto) havia acusado o ministro Ricardo Lewandowski de ‘fazer chicana no julgamento’. O acusado [Noblat] teria feito crítica sobre a maneira que o ministro Joaquim Barbosa age quando contrariado, bem como reflexão do assunto”. 

O juiz destacou que “o texto realmente é ríspido”. “É compreensível que qualquer pessoa que se sujeitasse a ser objeto de artigo também não gostaria da opinião jornalística da forma como foi exposta. Natural também que o ser humano se deleite com o elogio e seja avesso a críticas. Entretanto, entre se aborrecer com comentários que não exaltam qualidades, e a existência da prática de delito, há de se ponderal vários fatores circunscritos à ciência penal”, explicou o magistrado.

Em sua decisão, o juiz destacou que “há simbiose entre acesso à informação e à possibilidade de crítica”. Essa possibilidade, escreveu, “é uma das facetas da liberdade de expressão, prevista no artigo 5º, IX, da Constituição Federal”.

Elder Fernandes Luciano escreveu ainda que o “sr. Joaquim Barbosa despertou paixões com a mesma velocidade com que despertou ódio. Não há problema quanto a isso. Exercia cargo de relevante importância para a República Federativa do Brasil, e decidia, diuturnamente, questões importantes para o país. Não é surpresa que, como juiz, desagradasse alguns e agradasse outros pelas suas decisões. Mas também não há problema de as pessoas, dentre elas as jornalistas, entenderem se a sua compostura na Suprema Corte era adequada ou não. (…) Se casos como este forem reputados como crime, perde a sociedade a oportunidade de formular senso autocrítico. Toda a evolução a respeito da liberdade de pensamento no Estado Democrático de Direito sofrerá grande retrocesso”. 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

30 Comentários

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  1. No mais, Barbosa e Noblat que se engalfinhem

    Essa decisão do Juiz, se mantida nas Instâncias Superiores, será útil aos blogueiros e jornalistas que queiram fazer a crítica responsável. Mas no caso do Noblat, ele e Barbosa se merecem. Que se engalfinhem e morram abraçados!

  2.  
    O MPF recorreria da decisão

     

    O MPF recorreria da decisão do juiz se o JB ainda fosse presidente do STF ???

    E se a ação fosse contra o PHA o MPF recorreria da decisão de primeira instância ???

    1. Sim recorreria.
      De acordo com
      Sim recorreria.

      De acordo com a “ideologia” atual dos advogados, se vc pode recorrer então vc é obrigado a recorrer.

      Eles querem ganhar o TETO sem ter a responsabilidade de decidir SE devem recorrer ou não.

      Houve um caso emblemático que testemunhei no STJ que exemplifica melhor.
      2 policiais pararam um casal de namorados para averiguação (seja o que for que isso queira dizer).
      No fim da história estupraram a moça e obrigaram o namorado a ficar olhando.
      O Estado foi condenado a pagar uma merreca de indenização. Recorreram da merreca.
      E o caso que PODERIA ser encerrado após primeira instância ficou uma década sendo noticiado no jornal, trazendo grave . prejuízo à imagem do Estado.
      Sabe porque o Procurador do Estado recorreu? Recorreu porque pode.
      Ao saber que o caso seria julgado a Ministra Eliana Calmon disse, não julgo! Pediu o processo ao outro relator, deu um telefonema e pronto, encerrado o processo.

      Tudo isso porque o procurador quer ganhar o TETO sem colocar O DELE na reta.

      Quer o teto? Tudo bem mas responda por seus atos!
      Se não for assim fica fácil demais.

      1. De acordo com a “ideologia”

        De acordo com a “ideologia” atual dos advogados, se vc pode recorrer então vc é obrigado a recorrer.

        Sim, é obrigado a recorrer. A causa não é sua, é do Estado.

  3. Eu nao vejo onde ha, por

    Eu nao vejo onde ha, por exemplo, exercicio jornalisto quando mo Noblat afirmou que  o JB era o “negro” de Lula. Por muitos menos outros estao sendo cacados pelo Ali Kamel…..e olha que quero que o JB se…

    1. (De fato, eh “Lula’s nigger”

      (De fato, eh “Lula’s nigger” mesmo o que ele escreveu.  Que a palavra nao existe em portugues nao eh desculpa.  Previsivel eh que foi logo o Noblat quem ganhou essa acao…)

  4. JB no Pânico

    Ontem à noite o Pânico (Bandeirantes) levou ao ar uma “entrevista” feita com JB à bordo de um avião.

    Ficou ridículo para ambas as partes a tentativa de fazer parecer que era algo não planejado entre ambos. Só um tolo não perceberia.

    Da parte do Pânico uma sabujice sem limites. O “entrevistador” chegou a beijar a mão de JB.

    Da outra parte a inicial negação da entrevista e por fim todo um mise-en-scéne para concedê-la.

  5. JB tinha uma ambição: ser o

    JB tinha uma ambição: ser o rei da cocada-preta no Brasil. Não conseguiu e agora vai vender cocada redneck nos EUA. Ha, ha, ha…

  6. Cada cabeça uma sentença

    Pois é, no mesmo patamar, esta a acusão de Ali Kamel contra o jornalista, ex-empregado da Globo, Marco Aurélio de Mello. E nesse caso, Marco Aurélio foi condenado duas vezes… Qual a argumentação que o  juiz(a) que condenou o ex-editor da Globo lançou mão (é, porque lançam mão mesmo, ao gosto e à cara do freguês) ? Poderia ter usado a do colega acima: “Em sua decisão, o juiz destacou que “há simbiose entre acesso à informação e à possibilidade de crítica”. Essa possibilidade, escreveu, “é uma das facetas da liberdade de expressão, prevista no artigo 5º, IX, da Constituição Federal”. Alias, quais são as inverdades ditas por Marco Aurélio… 

  7. Alguém conhece alguma ação do

    Alguém conhece alguma ação do Lula contra algum órgão de  imprensa ou qualquer um de seus colaboradores?

    Pois é. No primeiro espirro o autocrata(Nossa! Serei processado?) se recorre ao Poder que o adotou para reparar supostos danos morais e, incrível, até mesmo racismo!

    Eis desnuda a verdadeira personalidade desse déspota não esclarecido. Eis o homem endeusado – que baita ironia! – por parte da mídia e do estamento social que chamo de “recalcados”. 

    Imaginem só por segundo o Joaquim BRABOrsa no comando da nação. 

  8. Não entendi por que o

    Não entendi por que o ministro ofendido não acionou o jornalista usando os serviços de um advogado privado. Como o MPF entrou nessa briga do lado do ministro?

  9. que ninguém entre numa de se guiar pela sentença…

    pois JB apenas foi tratado com o mesmo remédio caseiro

    o mesmo que só fez piorar a doença durante o mensalão

  10. O projeto de “bobo da corte”

    O projeto de “bobo da corte” ganhou do projeto de “imperador”, ou, como o Collor bem sabe, a mesma mídia que constrói é a que destrói quando se encerra a utilidade do “salvador da pátria” da vez.

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