Bolivarianismo Made in Brazil, por Wagner Iglecias

Bolivarianismo Made in Brazil

Wagner Iglecias

No festival de ataques de baixo nível que assola o país e que rebaixa o debate público nacional um dos termos mais evocados é “bolivariano”, e também a sua vertente, o “bolivarianismo”. Não raro o governo federal, de Lula para cá, tem sido acusado por seus detratores de “bolivariano”, ou de ter planos de instaurar o “bolivarianismo” em nosso país. Ou, ainda, de ser submisso aos governos “bolivarianos” da América Latina, em especial Venezuela e Cuba, mas também Bolívia e Equador.

Fato é que no Brasil provavelmente uns 90% da população não tem a menor ideia do que significa o termo “bolivariano”. Mal conhecemos a nossa própria História e seus principais personagens, sejam os oficiais ou os de origem popular, quanto mais a História alheia. E quanto mais ainda se for a História da América Latina, aquela porção do mundo a qual permanecemos de costas durante séculos e da qual achamos que não fazemos parte.

Simón Bolívar, figura controversa segundo alguns de seus biógrafos e analistas, foi um dos mais importantes líderes militares do mundo no século XIX, libertador de antigas colônias espanholas que mais tarde viriam a ser Venezuela, Colômbia, Panamá, Equador, Peru e Bolívia. Ele foi também um teórico de alto nível. Conhecedor da filosofia política desenvolvida desde os gregos da Antiguidade, cinco séculos antes de Cristo, até os pensadores do Iluminismo do século XVIII, Bolívar teve suas ideias influenciadas por Rousseau, Montesquieu, Voltaire e Locke. Teve a oportunidade de conhecer diversos países da Europa (chegou mesmo a assistir a cerimônia de coroação de Napoleão Bonaparte) e viajou também pelos Estados Unidos recém-libertos do jugo inglês. Bolívar produziu escritos sobre política que em nada ficam devendo aos tratados de autoria dos pais da pátria norte-americana Madison, Jay e Hamilton. No entanto segue sendo solenemente ignorado nas escolas e na maioria das universidades brasileiras. Passa ao largo de grande parte de nossos cursos de Ciência Política. Talvez o mais destacado latino-americano em toda a História, Simon Bolívar é quase uma figura anônima no Brasil.

Mas parte da mídia brasileira usa e abusa do termo “bolivariano”. A classe média arcaica, que odeia o PT, e se opõe fortemente às transformações que os governos petistas têm feito em direção à ampliação do capitalismo brasileiro, se pela de medo do termo. E sai propagando a torto e a direito sobre o “perigo bolivarianista”. Chamar alguém de bolivariano no Brasil dos dias de hoje só não chega a ser tão grave como acusar alguém de comunista no Brasil dos anos 1950 e 1960 porque, tirando os anti-petistas de sempre, ninguém leva a sério essa história.

E por falar em comunismo, Marx achava Bolívar uma figura menor, quase caricatural. Só pra gente ver como as coisas são bem mais complexas do que certa propaganda ideológica consumida como iguaria por uma certa classe média mal (in)formada.

Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades e do Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da USP

Redação

23 Comentários

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  1. Quem deu o significa atual a

    Quem deu o significa atual a bolivarianismo, digamos mais contemporâneo, foi o Chaves.

    Eu não conheço Bolivar, mas pelo descrito acima, quem distorceu seu significado foram os populistas de araque que campeam pela América Latina, Chaves à frente.

    Quem não gosta do PT faz parte da “classe média arcaica”, em contra ponto à “classe média moderna”, que deve ama-lo.

    O PT cada vez mais grudado a seu maniqueísmo infantil.

     

    1. É engraçado

      Populistas de araque que diminuem a miséria do povo, que lutam para que seu país, no caso a Venezuela, deixe de ser um satélite yanque exclusivamente voltado aos interesses de enriquecimento e amutenção do modo americano de viver.

      Sabia que a Venezuela é, reconhecida pela ONU, Nação livre do analfabetismo? Sabia que a redução da pobreza, que ainda é grande, mas foi de 48% para 29%. A pobreza extrema despencou de 20% para 7%? Tudo isso feito pelo bolivariano Chavez.

      A classe média arcaica é contra a diminuição do fosso social que separa pobres dos ricos, é contra a dimuição das desigualdades, é favorável a manutenção da máxima capitalista da meritocracia babaca que diz que o correto é ensinar a pesca e não dar o peixe, porém se esquece de que não se pode ensinar a pescar a quem não possui a vara.

      1. Fantástico!

        Esta sua definição serve para todos os “jornalistas” e “divulgadores” da nossa mídia.

        Mas claro serve como uma luva para o comentado…

        1. Vai ver que o b do seu nome,

          Vai ver que o b do seu nome, não é de babaca, como pensei inicialmente, ou outras palavras censuráveis. Muito menos de brasil, pois pelo que aprendi nome de nações sempre se escreve com leta maiúscula. Vai ver que é bolivariano e por isso o esconde kkkkkkkkkkkk Brincadeira sr. Mario, não podia perder a piada, pq amiga sei que não sou mesmo.

  2. Wagner Iglecias só podia ser professor da USP…

    … qualquer um com dois neurônios semi-funcionais e um pouco de conhecimento da história da América Latina, e da atualidade política do continente, sabe que o termo bolivarianismo foi uma deturpação do reencarnado no passarinho azul. Bolivariano não é um seguidor de Simón Bolívar, mas um estafeta do Foro de São Paulo. O Libertador jamais sistematizou um sistema ideológico, foi um grande general, um péssimo caudilho e não deixou escritos sobre a organização política dos Estados. Foi revivido como farsa pelo coronel da boina vermelha, o capacho principal dos irmãos Castro.

    O texto do Wagner deixa claro que não apenas boa parte dos alunos universitários no Brasil são analfabetos funcionais, muitos professores também.

    1. Nós, pobres coitados que nem

      Nós, pobres coitados que nem dois neoronios semi funcionais possuímos, só temos que lhe agradecer por gastar seu tempo comentando um texto tão ruim, lido por gente tão desqualificada. 

  3. Rebolla e Mauro B. sentiram o

    Rebolla e Mauro B. sentiram o golpe. Devem proferir o termo bolivarianismo ateh quando veem um formigueiro  .

    1. Digo bolivariano e bolivarianismo…

      …quando leio as medidas do governo petista, como o decreto soviético nº 8243, de 23 de maio de 2014, ao ouvir declarações do Gilberto “caso Celso Daniel” Carvalho, da Maria do Ossário e de muitos outros. Ao presenciar os feitos desta conjuração de gente estragada é normal falar: bolivarianos, agentes do Foro de São Paulo, inimigos do Brasil!

  4. Bolivariano, petista, comunista

    Os colegas ai não entenderam nada né? Quem não concorda com eles é “analfabeto funcional”. A critica do texto não é a Bolivar ou ao bolivarianismo, mas sim ao uso ideologico que a oposicinha faz do termo para atacar o governo petista e qualquer um que não concorde com a visão de mundo dela, oposicinha. Nem ela mesma sabe o que é bolivarianismo. E tá certo o professor, parte da classe média é arcaica sim, na medida em que se revolta contra a ampliação dos direitos e do consumo neste país. Nem precisa ser fã da tal Marilena Chaui para perceber isso, basta olhar em volta, no dia a dia, e ver gente assim. 

  5. O que o brasileiro médio sabe da América Latina?

    O que o brasileiro médio sabe da América Latina?

    A elite brasileira há muito tempo tem parte nessa nossa ignorância sobre a vizinhança. A escola e a imprensa também tem sua responsabilidade por isso.

    Da Carta Maior

    http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/O-que-o-brasileiro-medio-sabe-da-America-Latina-/6/30216

    09/02/2014

    Por Wagner Iglecias

     

     No ofício de professor universitário e ligado a um programa de pós-graduação sobre Integração da América Latina sempre que posso recomendo à garotada de graduação que assim que tiverem tempo e algum dinheiro metam uma mochila nas costas e saiam pelo nosso continente.

     Nunca vi nenhuma pesquisa sobre o que e o quanto de América Latina o brasileiro médio sabe. Mas posso apostar que é muito pouco. Provavelmente menos até do que nossos vizinhos conhecem sobre o nosso país. E de maneira ainda mais superficial. E isso é sim um problema. Num mundo globalizado e dividido em grandes blocos como hoje, nada mais estratégico do que a aproximação com as nações com as quais um país tem identidades históricas, geográficas, culturais e econômicas.

    Suponho que os séculos em que América hispânica e a América lusitana estiveram mutuamente de costas uma para a outra colaboraram para nossa ignorância sobre o que se passa aqui pertinho da gente.

    Aliás o próprio termo América Latina é invenção forânea, européia. Coisa de franceses, no início do século XIX. Dizem que Napoleão III desejava assenhorar-se desta parte do mundo recém-liberto do jugo espanhol e português. Queria impedir que a Inglaterra, anglo-saxônica, o fizesse. Daí o recurso napoleônico à nossa latinidade em comum, entre nossos jovens países desta parte do mundo com a França.

    Mas bote-se aspas nesse “em comum”, já que naquela altura do campeonato por essas bandas talvez só a pequena elite branca descendente de espanhóis e portugueses tivesse alguma identidade cultural e linguística com a nobreza europeía. De resto, éramos nações predominantemente indígenas, negras ou mestiças.

    A França, a bem da verdade, chegou até a emplacar um governo no México já independente. Botou no poder Maximiliano de Habsburgo, um nobre austríaco, que governou aquele país entre 1864 e 1867, mas que acabou deposto e assassinado por nacionalistas mexicanos. Foi um projeto frustrado, e quem na verdade conseguiu levar a América Latina para sua área de influência foi a Inglaterra, e, mais tarde, os EUA.

    A elite brasileira, portanto, há muito tempo tem parte nessa nossa ignorância sobre a vizinhança. Mas para além de séculos de História olhando pro Atlântico e de costas para a América Latina, nossa escola e nossa imprensa também têm suas parcelas no desconhecimento quase completo que o brasileiro médio tem sobre nossos vizinhos. É pouquíssimo o que se ensina sobre América Latina para nossas crianças e adolescentes. Provavelmente o assunto mais abordado seja a Guerra do Paraguai, sempre naquela versão oficial de que Solano Lopez era um terrível ditador que pôs em risco a soberania de três jovens nações democráticas como Argentina, Brasil e Uruguai.

    Heróis de esquerda ou de direita da libertação da América Latina, como San Martin, Sucre, Hidalgo, Artigas, O´Higgins ou Simón Bolívar, provavelmente jamais foram citados na maioria das nossas escolas. Bolívar, aliás, que mais do que um brilhante militar foi um pensador com sólida formação intelectual, passa inclusive em brancas nuvens em muitos cursos de Ciência Política das universidades brasileiras, os mesmos nos quais Jay, Madison e Hamilton, pais fundadores dos EUA, são leitura obrigatória.

    E a imprensa? Quantos correspondentes do jornalismo pátrio temos na América Latina? Muito poucos. Dizem que no passado foram até mais, não sei. Quais os temas historicamente recorrentes nas nossas tevês, revistas e jornais sobre nossos vizinhos? Copa Libertadores da América de futebol, crise econômica argentina, o regime cubano, o comércio popular na fronteira paraguaia, o tráfico de drogas, a Copa do Mundo de 1970 no México…e vamos parando por aí. O brasileiro médio conhece quais personagens latino-americanos? Maradona, Fidel Castro, Hugo Chávez e o Cháves, do SBT. E tirando este último, provavelmente odeia os outros três.

    Fato é que não sabemos quase nada da região do mundo na qual estamos inseridos. Nossa elite branca e endinheirada sempre olhou para a Europa (primeiro Lisboa, depois Paris e Londres), e de algumas décadas pra cá tem Nova York e Miami como parâmetros. Não que as elites argentina, venezuelana ou mexicana, ou qualquer outra, sejam muito diferentes. Mas enfim, nossa elite tem como modelo os países ricos, e nutre ódio mortal por Cuba e seu regime socialista.

    Detesta também governos de esquerda mais recentes da região, como nos casos de Venezuela e Argentina. Os termos venezuelização e argentinização, cada vez mais usados em nosso país, que o digam. Nossa elite talvez até nutra alguma simpatia pelo uruguaio Mujica, que apesar de esquerdista tem sua agenda liberal de governo, calcada em direitos civis como união homoafetiva e legalização da maconha. E nossa elite não tem formação e informação suficientes para compreender outros governos de esquerda do continente, como a Bolívia ou o Equador. Na dúvida, porém, dá-lhe adjetivos como populistas e caudilhos a quaisquer governantes nacionalistas que surjam na vizinhança.

    Para a grande maioria de nós, brasileiros, seja nossa elite, seja o cidadão médio influenciado por ela, países como a Bolívia e o Peru são no máximo destinos turísticos exóticos. Colômbia e Venezuela, para além dos estereótipos propagados na imprensa, seriam apenas rota de passagem nas viagens aos EUA. O Equador e os países da América Central são tão conhecidos entre nós quanto a Tailândia, Moçambique ou a Bulgária. E o que dizer de Guiana e Suriname, que a rigor não são latino-americanos culturalmente falando, mas que se proclamam cada vez mais sul-americanos? Bem, para o brasileiro médio talvez a Guiana e o Suriname sejam tão familiares quanto Netuno e Plutão. É uma pena!

    (*) Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor do Curso de Graduação em Gestão de Políticas Públicas e do Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da USP.

  6. Bolivar é mais conhecido no

    Bolivar é mais conhecido no Brasil do que Dom Pedro I é conhecido nos paises hispanicos da America Latina, há muitos brasileiros com o prenome Bolivar, portanto a ignorancia presumida pelo autor fica com ele.

    O Bolivar da Historia NÃO TEM NADA A VER com o mau uso que se faz de seu nome por populistas vulgares, que usam e abusam do mito Bolivar para seus proprios propositos e roubalheiras. O autor do post faz pouco caso do conhecimento

    de boa parte da classe media alta paulistana que está perfeitamente bem informada sobre a catastrofe que ocorre na Venezuela, outrora um dos paises mais ricos da America Latina, hoje perde para o Complexo do Alemão em qualidade de vida e violencia, a mais alta taxa de assassinatos do planeta.

    1. A classe média brasileira só

      A classe média brasileira só conhece as famosíssimas ” crônicas de New York”, e a maravilha do mercado de Miami. E o sr. Motta Araújo não entende nada de Brasil.

      1. Lenita, o Motta Araújo é um

        Lenita, o Motta Araújo é um fanfarrão, um pimpão.

        Obviamente que ele dá essas respostas morrendo de dar risadas.

  7. Vendo os comentários eu penso

    Vendo os comentários eu penso que boa parte sequer leu o conteúdo do texto. O que me leva a pensar que realmente a educação do país vai mal. Quanto ao texto, é bem verdade que pouco ou quase nada o brasileiro médio conhece da América Latina. Como estudiosa da literatura e da cultura latina posso atestar que somos completamente ignorantes nesse assunto. Atualmente, de uns 10 anos pra cá principalmente, o Brasil tem sido um polo exportador de cultura. Muita música brasileira tem sido ouvida nas rádios argentinas e chilenas, por exemplo. Claro, a qualidade da música que se exporta, se boa ou ruim, são outros quinhentos. Desafio alguém a citar, por exemplo, algum escritor ou poeta, um músico, um ator ou alguma persona política latina. Poucos saberiam. 

  8. Belo artigo do professor

    Belo artigo do professor Iglecias. A ignorância brasileira sobre o tema é acachapante.

    Peço licença ao professor e ao próprio Nassif para indicar um livrinho reportagem que escrevi sobre a Venezuela, onde o tema é discutido. Livro editado pela “Editora Caros Amigos”, com o título “Venezuela Povo e Forças Armadas”.

    O curioso e até irônico nesta história é que a Venezuela extinguiu o analfabetismo de seu território em 2007, fato com cereteza irrelevante para alguns dos comentaristas do post e que deveriam ser realfabetizados, pois analfabeto não é quem não sabe ler ou escrever. O pior analfabeto é aquele que não entende o que lê.

  9. O povo brasileiro não sabe

    O povo brasileiro não sabe quem é Tiradentes e querem entuchar nele um Simon Bolivar?

    Só faltava essa….

  10. Qualquer estudioso por mais

    Qualquer estudioso por mais medíócre que já havia sabe que na antro-socio-política da esquerda é direito ter 10 anos de ditadura por cada ano que a direita tiver. Se esse obteve autorização do petismo de que abre mãos desse direito e apenas vai preparar terreno para PSOL, PSTU ,etc,  precisava mostra em que convenção petista isso foi aprovado.

  11. Depois de Lula, essas

    Depois de Lula, essas insignficâncias cheias de diploma de nível superior e cabeça lotada de lorota, deveriam se reconhecer à lixeira da história.

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