Incra fala sobre paralisação da reforma agrária pelo TCU

Jornal GGN – Depois que o Tribunal de Contas da União (TCU) paralisou a reforma agrária por irregularidades na base cadastral dos beneficiários, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) prestou esclarecimentos.

O TCU disse que identificou 578 mil irregularidades no cadastro. De acordo com o Incra, quase 420 mil desses registros dizem respeito a situações que ocorreram após as famílias já serem beneficiadas do programa. “Apenas 62.619 registros se referem a possíveis situações que impediriam o assentamento das famílias antes da homologação como beneficiárias da política de reforma agrária”, diz a entidade.

Abaixo, a íntegra da nota do órgão sobre o acórdão do TCU:

Nota Oficial Incra – Acórdão TCU

Em relação ao cruzamento de dados dos beneficiários do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) efetuado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), apontando 479.695 discrepâncias resultantes do cruzamento de bases de dados distintas (Receita Federal, Renavam, Sistema Nacional de Cadastro Rural. Sistema de Controle de Óbitos, Cadastro Nacional de Empregados e Desempregados, Siape, CadÚnico, Rais e Sisac, entre outros) – insuficientes para caracterizar “irregularidades” na concessão de parcelas em projetos de assentamentos –, o Incra esclarece que:

1) A maioria das discrepâncias – 417.076 registros – diz respeito a situações que ocorreram após as famílias já serem beneficiárias do programa. Apenas 62.619 registros se referem a possíveis situações que impediriam o assentamento das famílias antes da homologação como beneficiárias da política de reforma agrária. O número divulgado de 578 mil diz respeito ao total de discrepâncias, não ao de beneficiários. Entre os 479.695 beneficiários identificados pelo Tribunal, 98 mil são de assentados que possuem mais de uma discrepância. Cabe destacar que o total levantado pelo TCU abrange os 45 anos de atuação do Incra, abarcando todos os governos deste período.

2) A apuração das discrepâncias por parte do TCU considerou os critérios de seleção dos candidatos ao PNRA previstos nos artigos 19 e 20 da Lei 8.629/1993, desde antes da homologação até a atualidade. O Incra ressalta que os parâmetros elencados nos referidos artigos da Lei 8.629/1993 constituem critérios de seleção de candidatos – e não de manutenção dos beneficiários. Depois de assentado, o beneficiário da reforma agrária deve cumprir as condições estabelecidas no artigo 21 da citada lei, previstas em cláusulas do contrato de concessão de uso ou do título de domínio. Elas determinam a residência e a exploração da parcela, assim como a exploração agrícola pelo núcleo familiar.

3) A obrigação de o Incra controlar a regularidade das parcelas é constatada pela verificação da permanência da residência e exploração da parcela, assim como na exploração agrícola pelo núcleo familiar, conforme previsto nas cláusulas do contrato de concessão de uso ou do título de domínio firmados entre a Autarquia e os beneficiários, expressos no artigo 21 da Lei 8.629/1993.

4) Desta forma, a maioria das discrepâncias indicadas pelo órgão de controle externo se origina de cruzamento de dados que parte de premissa não compatível com a política de reforma agrária.

5) Em relação às discrepâncias referentes a beneficiários que possuem cargos públicos, mandatos eletivos e que são empresários, o Incra destaca que a legislação e o normativo vigente vedam a homologação de candidatos que sejam servidores públicos, exerçam função pública ou sejam proprietários e quotistas de empresas ou quotistas de cooperativas. No entanto, as normas que regem a política de reforma agrária não vedam que o beneficiário regularmente assentado venha a tornar-se servidor público, exercer função pública, ser proprietário, quotista ou acionista de empresa ou quotista de cooperativa. Assim, o assentado que passe a se enquadrar nestes casos não perderá a condição de beneficiário, conforme previsto na Portaria do Ministério do Desenvolvimento Agrário nº 06/2013.

6) Do total de beneficiários com mandatos eletivos (1.017), apenas 11 foram identificados como anteriores à homologação no PNRA. Estes já foram bloqueados pelo Incra.

7) Quanto aos beneficiários falecidos, o TCU identificou 37.997 discrepâncias. Destaca-se que apenas 1.151 das ocorrências versam sobre situação anterior à homologação, que demandam apuração e bloqueio do cadastro. Os demais 36.846 casos se tratam de beneficiários que faleceram após a inclusão na política de reforma agrária. Tal questão passa a envolver direitos de sucessão e transferência do lote aos cônjuges ou herdeiros, uma vez que a Lei 13.001/2014 estabeleceu que, em caso de falecimento de qualquer um dos beneficiários, seus herdeiros ou legatários receberão a parcela, cuja transferência será administrativa.

8) No caso dos beneficiários identificados pelo TCU como detentores de sinais exteriores de riqueza, o Incra salienta que o fato de o assentado ter adquirido um veículo não implica em irregularidade, mas sim progresso econômico compatível com a atividade agrícola desempenhada nos assentamentos. Os casos apontados de beneficiários detentores de veículos com valores incompatíveis merecem atenção e serão investigados pela Autarquia para verificação de possíveis irregularidades.

9) O Incra esclarece que, em entendimento com a Controladoria Geral da União (CGU), bloqueou 76 mil beneficiários que foram homologados em desconformidade com as normas vigentes. O bloqueio inviabiliza o acesso a benefícios concedidos pela Autarquia, como o Crédito Instalação, além da retirada da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), necessária para obter linhas de crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).

10) O Incra estabeleceu plano de providências com a CGU para sanar as inconsistências apontadas pelo órgão de controle e que também foram identificadas pelo Tribunal de Contas da União. O plano de providências inclui o recadastramento de todos beneficiários. As medidas previstas no plano em execução demonstram o compromisso da Autarquia em eliminar todas as inconsistências.

11) Para assegurar transparência e maior controle no processo de seleção de beneficiários, o Incra mantém tratativas de acordos de cooperação com a Secretaria da Receita Federal, o Instituto Nacional do Seguro Social e o Ministério do Trabalho e Previdência, visando ao cruzamento das informações dos candidatos a beneficiários com os bancos de dados mantidos por estes órgãos.

12) O Incra vem implementando ações na área de TI, com vistas à modernização tecnológica do sistema de cadastramento de beneficiários.

13) Todos os dados apresentados integram a defesa do Incra encaminhada ao Tribunal de Contas da União.

Redação

11 Comentários

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  1. Resumindo…

    Mais um golpe da oposição entranhada nos órgãos de controle (no caso TCU, mas podia ser o MP) para travar as políticas sociais de um governo de esquerda

  2. O INCRA deveria exigir

    O INCRA deveria exigir publicação de sua nota  na mídia, com  igual destaque, ao que deram para os ” mais de 500 mil assentados irregulares”.  

  3. Vou rescrever a nota para quem se fiou no noticiário de ontem

    Teve um pessoal que ficou super-assanhado com a decisão do TCU de paralisar a Reforma Agrária no Brasil. Não os culpo porque a notícia foi dada de forma a escandalizar mesmo. A base do noticiário foi unicamente o texto da decisão do próprio TCU (pois o Incra ainda não havia sido notificado da decisão).
    Eu particularmente desconfiei do primeiro número apresentado (578 mil) pois o noticiário lhe dava funções diferentes a cada hora.

    Mas o Incra finalmente acordou e soltou uma nota muito esclarecedora que confirma coisas que eu já imaginava justamente pelo TCU não esclarecer questões básicas no resumo que entregou à imprensa.

    1. São 578 mil discrepâncias (ou supostas irregularidades, pois ainda estão em apuração)
    2. Isso corresponde a 1/3 do total de beneficiários dos Programas de Reforma Agrária desde 1970 (!)
    3. Sim, eu disse que analisaram todos os mais de 1,5 milhão de assentamentos desde 1970, isto é, os últimos 45 anos (por isso o número tão alto de “irregularidades”, ninguém mais notou?)
    4. Muita gente pensa que o cara que ganha um lote de terra tem que continuar miserável pro resto da vida, mesmo depois de 45 anos e duas gerações depois, mas O ÚNICO critério para manter o lote é a família continuar trabalhando nele.
    5. O arrendatário original da terra pode seguir outros caminhos e lhe é permitido ATÉ MORRER se chegada sua derradeira hora. O assentamento é então passado para os filhos sem burocracia.
    6. A funcionários públicos, empresários, políticos e outros profissionais ligados ou não à agricultura é vedado O INGRESSO no Programa de Reforma Agrária, mas isso não impede essas pessoas de anos depois assumirem essas ou quaisquer outras funções.
    7. O assentado também pode construir casa de alvenaria, pintá-la, colocar móveis, decorá-la e até ter carro, trator, pick-up… não lhe é proibido ter qualidade de vida, subir na escala social e é justamente esse o objetivo do programa, das leis que o regem e da Constituição também. Especialmente se há décadas sua família vive dessa terra.
    8. Pois bem, o TCU aplicou a regras que são de ingresso no programa como critério também para a permanência do beneficiado, e fez isso em TODOS os assentados desde 1970. Por isso encontrou mortos, empresários, políticos e outras “irregularidades”.
    9. Estranho mesmo seria se todos ainda fossem miseráveis, vivendo ainda como se não tivessem terra, depois de 45 anos no mesmo local…
    10. O Incra diz que irregularidades (de antes do ingresso no programa) encontrou apenas 11 políticos, 1.151 falecidos assentados e 76 mil lotes realmente de pessoas que não deveriam estar assentadas. Diz a nota que tudo já havia sido detectado e bloqueado. O índice corresponde a menos de 5% do total de assentamentos nessas 4 décadas e meia.

    Devemos nos informar sobre os objetivos desses programas de mobilidade social, senão daqui a pouco vamos criminalizar o beneficiário de aposentadoria que faz uma viagem pra Foz do Iguaçu, a mãe do Bolsa Família porque vende empada na feira e o bolsista do ProUni que conquistou um bom emprego. A ideia desses programas é justamente incluir ativamente os mais pobres na sociedade, com tudo de bom que isso tem.

  4. Por que ainda fazemos reforma agrária?

    Independentemente da eficácia da análise do TCU, o programa de reforma agrária precisa ser repensado no Brasil, por uma série de razões:

    – A alta competitividade e produtividade do setor agrícola tende a dificultar cada vez mais a entrada de novos atores, ainda mais de pequeno porte.

    – A evolução da tecnologia está levando à redução brutal da mão-de-obra necessária no campo, o que torna difícil justificar o processo de reforma agrária como solução para a geração de empregos. Além disso, a demanda por tecnologia e pessoal especializado aponta para ganhos de escala que só são possíveis com propriedades maiores ou pela organização em cooperativas.

    – Tornar os pequenos agricultores assentados competitivos por meio de incentivos governamentais encarece significativamente o valor do programa. Se isso não é feito, acaba que as pessoas assentadas dependerão permanentemente de apoio de programas como o BF.

    – Há dúvidas sobre os critérios de eligibilidade (em um cenário de restrição de recursos, quem tem direito à terra? Como gerenciar a “fila” de pessoas pleiteando um assentamento?).

    O fato é que o Brasil deveria ter feito a reforma agrária em 1888 (de modo a assentar os escravos recém-libertos). Agora, em 2016, faria muito mais sentido “trocar” a reforma agrária por um imposto progressivo para terras improdutivas, fato que daria muito mais segurança jurídica ao setor e traria recursos adicionais para o investimento na infraestrutura rural. Os recursos outrora gastos em reforma agrária serão muito melhor aplicados em processos de reforma urbana (trazendo qualidade de vida para favelas, por exemplo). O futuro, mais do que nunca, está nas cidades – não faz mais sentido nenhum desenvolver políticas públicas que “segurem” a população no campo. De fato, os poucos que vão continuar trabalhando no campo possivelmente serão mão-de-obra altamente qualificada que vai “para a roça” apenas durante o dia, mas vai morar na cidade, com toda a sua infraestrutura, conforto e lazer.

    1. Marcos, já ouviu falar em

      Marcos, já ouviu falar em agricultura familiar? Pois é, o alimento que chega na mesa dos brasileiros 80% vem da agricultura familiar. Feijão, arroz, batatas, leguminosas, frutas… Não vem do agronegócio como 99,9% dos brasileiros acham. Agronegócio é 90% exportação! Falo dos grandes latifúndios que geralmente são monoculturas e exportadores de commodities.

      A reforma agrária ainda é preciso sob pena de faltar comida na mesa dos brasileiros.

       

      1. Agricultura familiar que

        Agricultura familiar que abastece os grandes centros vem de propriedades COMPRADAS, de familias tradicionais no cultivo da terra, os chamados “cinturões verde”, grande parte japoneses, os partidarios da reforma agraria tentam misturar agricultura familiar TRADICIONAL com assentamentos que só por exceção produzem de forma competitiva.

        Reforma agraria é um conceito e um projeto FORA DE TEMPO, ideologico, sem retorno para a sociedade que dispende imensos recursos em nome de uma causa que não tem a minima racionalidade economica. A fiscalização do TCU apenas constatou o obvio, a “causa” serve para dar emprego a 30.000 funcionarios publicos, centenas de Procuradores, advogados, sustentar lideranças de mãos lisas, os “candidatos” a assentados raramente pegaram numa enxada, é lumpesinato de periferia de cidades e que só ficam nos lotes enquanto hover subsidio do governo.

        Reforma agraria é um projeto FRACASSADO que em nome de uma ideologia fracassada  já consumiu no Brasil mais de R$500 bilhões de dinheiro publico.

         

  5. reforma

    A malha do TCU apanhou de tudo: 248,9 mil assentados com local de moradia diferente do lote concedido; 23,2 mil contemplados antes pela reforma agrária; 144,6 mil funcionários públicos; 61,9 mil empresários; 37,9 mil pessoas mortas…

    O ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, disse no Congresso que o Incra coopera com o TCU e firmou convênio para corrigir distorções. Seria bom que explicasse por que esperou o tribunal cruzar seus dados com informações do próprio governo para diagnosticar tumor tão evidente.

    http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2016/04/1758742-esbornia-agraria.shtml

    1. Voce leu a resposta do Incra?
      Não, né? Sao supostas irregularidades ocorridas em 45 anos. Eu tive oportunidade de conhecer um caso de fraude em terras em Santa Catarina, o beneficiario era um político. Isso ocorreu nos anos 80. Tem um livro que conta a história ” O golpe da Reforma Agrária- a fraude milionária com terras em Santa Catarina”. Enfim, não é um problema de reforma agrária mas sim de corrupção do colarinho branco.

      1. A pedra

        Você está querendo dizer que sempre houve irregularidades? E quem não sabe disso? Você poderia também dizer que os erros do passado não poderiam se repetir no presente.

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