Por que 50 km/h nas marginais?, por Marcelo Blumenfeld

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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da Folha

Por que 50 km/h nas marginais?, por Marcelo Blumenfeld

Além da redução de acidentes, quanto maior a velocidade, maior a oscilação e, com isso, maior a ocorrência de ondas de congestionamento nas vias

A redução dos limites nas marginais causou um furor sem igual em São Paulo. A medida, que na verdade beneficia motoristas, é consenso mundo afora por aumentar a segurança e melhorar o fluxo.

Os argumentos contra vão da má qualidade das vias à dinâmica de fluídos. A questão do tráfego é complexa e depende de modelos macroscópicos (na escala da via) e microscópicos (na escala do motorista). Macroscopicamente, todo mundo sabe que quanto maior a velocidade, maior a distância de frenagem. Um carro a 90 km/h (25 m/s) precisa de 37 m para frear a zero, e de 23 m a 70 km/h (19,44 m/s).

Incluindo um tempo de reação de um segundo, os valores sobem para 62 m e 42.44 m respectivamente. Se os carros precisam manter uma distância possível de frenagem, então um carro a 90 km/h requer quase 50% mais espaço de pista para que se mantenha a segurança. Portanto a capacidade máxima de carros aumenta 10% ao se diminuir a velocidade da via para 70 km/h.

Também se sabe que ninguém mantém, de fato, 66 m de distância. O motorista tende a somar o espaço de frenagem do carro da frente para calcular uma distância que considera segura. Embora comum, traz consigo um paradoxo de fluxo e segurança. Primeiro, o motorista se mantém mais próximo à medida que diminui a velocidade. Limites mais baixos ajudam a compactar e homogeneizar o fluxo e a capacidade da via aumenta sem oscilações.

Oscilações são cruciais. Na escala do motorista, o tráfego se adequa à própria velocidade de acordo com a do carro à frente. Quanto maior a velocidade, maior a oscilação e, com isso maior, a ocorrência de ondas de congestionamento.

Estas ondas ocorrem quando um motorista muda a velocidade, fazendo os demais atrás frearem progressivamente mais, até que o tráfego pare de vez. Nessa escala, velocidades menores são mais facilmente controladas, permitindo um fluxo contínuo e mais estável, prolongando a capacidade da via antes de ficar congestionada.

Segundo, a segurança. Embora de nomes iguais, a marginal expressa e a marginal local são vias de tipos diferentes. A marginal expressa é uma via segregada, enquanto a local é compartilhada, com calçadas e outros modais.

Nas duas, o motorista já trafega com distâncias menores do que a de frenagem. Além disso, a cada acidente que interdita uma faixa, o fluxo é severamente afetado.

Nas vias locais, a redução contribui imensamente para a segurança. Pesquisas mostram que a probabilidade de morte na colisão com um pedestre diminui mais de 50% ao se reduzir a velocidade de 70 km/h para 50 km/h. Pelo mesmo motivo, as reduções serão na cidade toda, não só nas marginais.

Vias compartilhadas não são de exclusividade dos motoristas e, portanto, respeitam a hierarquia do código de trânsito de prioridade à segurança dos mais vulneráveis.

Os limites tornam-se talvez desnecessários em momentos de baixa demanda, como durante a madrugada e nos feriados. Valeria a pena utilizar limites variáveis, como ocorre nas rodovias da Alemanha.

Como qualquer estudo, as medições devem continuar para que se possa observar a eficácia da medida e, a partir desses resultados, buscar a melhoria contínua desta cidade que tanto amamos.

MARCELO BLUMENFELD, 28, é doutorando em engenharia de sistemas na Universidade de Birmingham (Reino Unido)

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

19 Comentários

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  1. analogia entre trânsito material e das idéias

    Prezado Marcelo,

    Quem reclama de limites pensa que está sendo coibido de levar vantagem. Os irresponsáveis (cujo limite é o acidente ou o muro) que gostam (e acham bonito) de “costurar” entre as faixas de rolamento. Com poucas contas, podemos calcular até a distância entre os detectores de velocidade, para tornar não compensador os ímpetos dos “motoristas-surpresa”. 

  2. Parece que o pessoal da cama

    Parece que o pessoal da cama e mesa da manha da redetv entrou para o pig com força total, todo dia batem no prefeito trazendo as figurinhas carimbadas de sempre para ataca-lo.

  3. Explica!

    Pesquisas mostram que a probabilidade de morte na colisão com um pedestre diminui mais de 50% ao se reduzir a velocidade de 70 km/h para 50 km/h.

    Pesquisa de quem e de quando?  Oh técnica maldita de assacar argumento de autoridade sem dar fontes!

      1. Vistas

        O estudo estadunidense leva em conta os Light Trucks. Uma coisa é ser atropelado por veículo de peso superior à 2000kg , a energia dobra e, relação aos 1000kg de um carro popular que é o componente maior na frota brasileira. A ser levado em, conta a disparidade da frota estadunidense (maior percentagem  de SVUs e veículos com peso superior à 2000kg em sua composição). Só para iniciar a crítica. Pode-se sugerir uma infinidade de soluções, como treinamento em segurança ativa para os condutores de veículos que não sejam meros automóveis.

        A triple A é presente também no mercado de seguros!  Isso não seria conflito de interesse?

        Mas também não explica se foi neste o trabalho usado como argumento de autoridade pelo autor do artigo.

        A crítica permanece : é muito fácil colocar pesquisas sem definir qual foi a usada.

         

  4. Dúvidas

    Continuo não entendendo:

    1. Por que continuam colocando a colisão com pedestres como principal argumento para redução de velocidade das marginais? Entendo que a via não tenha faixa de pedestres justamente por não ser destinada à travessia.

    2. Por que continuam comparando a marginal com ruas comuns quando se dá exemplo de outros países? Pela história do projeto, a única comparação válida da marginal seria a de um anel viário, visto que liga rodovias (e antigamente, era cuidado pelo próprio DER por isso). E mesmo no exterior essas vias (beltrings) têm velocidade maior.

    Peço, sinceramente, respostas em vez de gritos de torcida.

    Att,

    Alexandre Mello

    1. 1. O texto apresentado não

      1. O texto apresentado não coloca a questão dos atropelamentos em primeiro plano, visto que aparece mais pro final; É um dos motivos sim, assim como a redução de colisões entre veículos e melhora da velocidade média. Acredito que mesmo que as marginais não sejam destinadas à travessia de pedestres, eles estão lá por algum motivo e estão sendo atropelados. O que nos leva a…

      2. Antigamente as marginais eram afastadas da área urbanizada da cidade, que cresceu e ultrapassou as vias. Não acredito ser viável ter uma estrada cortando uma cidade como São Paulo, então sim, a redução principalmente nas locais é necessária para resignificar a avenida, que não pode ser tratada como uma rodovia.

      1. Sobre as respostas

        Oi Eduardo, 

        Obrigado pelas respostas.

        Começando pelo que concordo: a mudança da função da via. 

        A ideia de que era assim, mas que a cidade cresceu em cima exigindo mudança, faz todo sentido.

         

        Defendo apenas que tal ressignificação fosse feita por completo: definir de vez que a via local é rua comum e que a via expressa é anel viário. Nesse caso, a via local passaria a ser passível de outras questões como faixa de pedestres, vias exclusivas de ônibus, etc.

         

      2. Sobre as respostas – parte 2

        Agora, o que discordo: dizer que não era para ser de pedestres e que eles estão lá por algum motivo não me parece uma resposta razoável. Ao meu ver, o problema é justamente “os que não deveriam estar lá mas estão”. 

        Ora, se pedestres estão atravessando aonde não deveriam e, como mostrou a pesquisa mais recente, motos são maioria nos acidentes da expressa (onde já não deveriam trafegar), o problema é claramente de fiscalização.

        O ponto que critico é o mesmo que ocorre com qualquer ampliação de rigor (Lei Seca, Redução de Maioridade, etc)

        Aumenta-se o rigor para minimizar os problemas de fiscalização

        É como uma mãe que, sem ver de quem é a culpa, resolve colocar todo mundo de castigo.

         

  5. Contra fatos não há argumentos

    A prefeitura decidiu implementar uma teoria, e esta se comprovou na prática. Parabéns aos seus implementadores. Daqui para frente é só melhorar, e se possível padronizar as velocidades e melhorar as placas de identificação quando há mudança de velocidade entre pistas, pois quem é de fora de SP não tem como se habituar com as “pegadinhas” e seus radares. 

     

  6. Pesquisas mostram….

    sim, e não é difícil encontrá-las: por exemplo:

     

    http://www.rospa.com/road-safety/advice/drivers/speed/inappropriate/, ou então https://www.aaafoundation.org/wp-content/uploads/2011PedestrianRiskVsSpeed.pdf, 

     

    (ah, é, estão em inglês, então não dá pra entender, ou são referentes a outras cidades ou países, então não se aplicam a a São Paulo, e outra meia centena de argumentos furados…)

     

    1. Roberto,
       
      A Universidade de

      Roberto,

       

      A Universidade de Birmingham não se meteu no assunto, eu escrevi o artigo por conta própria. A Universidade de Birmingham é onde faço meu doutorado. Agora, sobre eu me meter no assunto, é meu trabalho. Sou mestre em planejamento de transportes pela Universidade de Leeds, tenho uma consultoria na área e integro o time de pesquisa e desenvolvimento de uma outra consultoria de transportes inglesa.

  7. Eu nunca pensei que a elite

    Eu nunca pensei que a elite conservadora de São Paulo fosse tão tosca a ponto de ser contra ciclovias e contra melhoras no fluxo de trânsito. Mas eu estava enganado, eles se superam.

  8. Poxa vida, que legal.
    As

    Poxa vida, que legal.

    As Marginais que vocês trafegam funcionam maravilhosamente.

    Infelismente, as Marginais que eu trafego todos os dias estão congestionadas durante o dia todo e me obrigam a sair pelo menos uma hora antes de meus compromissos.

    Engraçado…

    Será PARADOXO?

    A São Paulo que eu moro é de dimensão diferente da de vocês?

    Pois na minha, redução de fluxo de velocidade só travou mais ainda o trânsito.

    Ah, e os que não respeitavam as velocidades, contineam não respeitando e causando acidentes.

    Me conte aí, como eu faço para mudar desssa São Paulo travada, morosa, lenta e insuportável para vossa São Paulo, moderna, arrojada, com vias sem congestionamento, transporte público abundante, prefeito progressista que a transformou na Amsterdã dos trópicos?

    Se ela existe, ainda não encontrei o caminho para chegar.

    Será o trânsito moroso???

  9. Princípio de Pareto

    Queria propor um ponto de vista. Fiquem à vontade para rebater se assim acharem melhor.

    Estou olhando para questão da velocidade nas marginais dentro do Princípio de Pareto

    – 20% das pessoas (as que não respeitam as regras) são causa de 80% dos acidentes

    – 80% das pessoas (as que respeitam as regras) correspondem por 20% dos acidentes.

    Ou seja, mesmo respeitando, acabam causando acidentes.

    Redução da velocidade

    Ao meu ver, a redução de velocidade atinge as 80% de pessoas que respeitam as regras.

    Ou seja, elas ficariam ainda mais cautelosas e, com isso, é possível ter uma redução de cerca de 20% dos acidentes. 

    É válido? Sim. Qualquer iniciativa que reduza o número de acidentes é válida.

    Fiscalização

    Mas não teria sido mais adequado ter buscado antes os 20% que não respeitam as regras e causam 80% dos acidentes?

    Digo isso porque, pelos próprios estudos da CET, as principais causas de acidentes são:

    – atropelamentos, sendo que a via não é de pedestres.

    – acidentes com motos na via expressa (69%), sendo que é proibido moto na via expressa.

    Isso sem contar: 5% de motoristas que acumulam mais de 51% das multas de 2014.

    Não vou colocar links aqui, mas os estudos estão no próprio site da CET.

    Em suma, o que coloco é que, assim como qualquer ampliação de rigor (seja de Lei Seca, Redução de Maioridade ou Redução de Velocidade nas Marginais), o problema é o mesmo:

    Aumentar o rigor para resolver falha de fiscalização

    A sensação que dá é que a mãe, ao não olhar o que aconteceu, resolve colocar todo mundo de castigo.
     

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