Requião submeteu trecho da lei de abuso de autoridade à aprovação de Moro

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – O senador Roberto Requião submeteu trecho do PLS (projeto de lei do Senado) 85/2017, que trata do abuso de autoridade, ao juiz Sergio Moro, com a finalidade de resolver uma crise gerada em torno da eventual “criminalização da hermenêutica”, ou seja, a possibilidade de punir uma autoridade por conta de divergências no modo como ela interpretou a lei. 

No relatório final do projeto de lei do Senado, que será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça nesta quarta (19), Requião disse que evitar a o crime de hermenêutica foi sua “primeira preocupação”.

A crise ganhou notoriedade quando o procurador Rodrigo Janot, chefe do Ministério Público Federal, foi ao Senado entregar suas propostas para o projeto de abuso de autoridade, dando margem, em alguns casos, à prática de abusos quando justificados.

Requião ponderou que, se a proposta fosse aprovada do modo como constava no PLS 280/2016 – que o senador apresentou inicialmente contra abuso de autoridade -, toda vez que um habeas corpus fosse concedido, o juiz que decretou a prisão posteriormente revogada por tribunal superior estaria sujeito a questionamentos na Justiça.

“Ocorre que o que se quer é punir o abuso e não o erro [na interpretação]”, apontou Requião.

Segundo o relatório, o trecho que trata de hermenêutica foi reformulado, ignorando as sugestões de Janot, para dar segurança às autoridades sem blindá-las de eventual criminalização, caso exista dolo por trás do abuso.

“É relevante destacar que, consultado por este relator, o Juiz Sérgio Moro aquiesceu com a redação ora proposta”, destacou Requião.

“Penso que esta fórmula evita o chamado crime de hermenêutica, porque para a configuração do abuso de autoridade, no caso, não basta a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas, sendo necessário que esteja presente o elemento subjetivo do tipo, consistente no dolo de prejudicar, beneficiar ou satisfazer-se pessoalmente”, disse o senador.

“Espero, com isso, colocar um ponto final nesse debate, afastando de uma vez por todas as injustas ilações de que se tinha a intenção de punir magistrados e promotores”, acrescentou Requião.

O primeiro artigo do PLS 85/2017 ficou da seguinte forma:

Art.1º Esta Lei define os crimes de abuso de autoridade, cometidos por agente público, servidor ou não, que, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las, abuse do poder que lhe tenha sido atribuído.

§ 1º As condutas descritas nesta lei constituem crime de abuso de autoridade quando praticadas pelo agente com a finalidade específica de prejudicar outrem, beneficiar a si próprio ou a terceiro ou ainda por mero capricho ou satisfação pessoal.

§ 2º A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas, necessariamente razoável e fundamentada, não configura, por si só, abuso de autoridade.

A HERMENÊUTICA DE JANOT

No projeto apresentado por Janot e encampado pelo senador Randolfe Rodrigues (REDE), não configuraria abuso de autoridade “a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas, desde que fundamentada.”

“A expressão ‘desde que fundamentada’ não nos parece bem colocada. Como está redigido, odispositivo permite que uma autoridade deliberadamente cometa o abuso de autoridade, bastando, para escapar da tipicidade, apenas fundamentar seu ato. Vale dizer, esse dispositivo acaba por permitir que as autoridades pratiquem crimes de abuso quando bem quiserem, sem qualquer punição, desde que fundamentem suas decisões”, rebateu Requião.

Leia mais: Xadrez dos abusos no caso Eduardo Guimarães

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Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

21 Comentários

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  1. A proposta é fraca e inútil

    A proposta é fraca e inútil por se basear em termos vagos como “necessitamente razoável”. Vocês brasileiros não sabem o que seria razoável ou não. Esse “razoável” é sempre distorcido em favor desse ou daquele que tenha influência suficiente para controlar o juíz. E é burrice permitir que um juíz possa interpretar a lei como ele bem quiser em um país como o Brasil, isso na prática anula o trabalho dos legisladores e faz com que o juíz seja o verdadeiro governante.

    1. bem lembrado…

      em muitos casos já foi defendido que uma interpretação razoável da lei, ainda que não sendo a melhor, não pode ser modificada…………………………

      desenhando: nenhum juiz gosta de impedir outro juiz de se distinguir, com a interpretação, em qualquer lei

      o que deve se distinguir nas leis são os fatos, as provas, jamais qualquer interpretação pessoal

    2. E ainda tem quem bate palma…

      Pra esse troll quer se diz gringo (apesar do português perfeito na acentuação, na concordância e na flexão dos verbos…), que fica tratando a gente como bwanas. A frase “Vocês brasileiros não sabem o que seria razoável ou não” é de uma nojeira, de um primor de pretensa superioridade pseudo-estrangeira, que me admira que ainda baan palma pra esse troll!

      1. Eu não iria responder o seu

        Eu não iria responder o seu comentário, mas vou abrir uma exceção dessa vez.

        Você se ofende porquê eu notei que no Brasil falar e escrever corretamente é entendido como sinal de superioridade (mesmo quando não é a intenção de quem está escrevendo corretamente), e o brasileiro médio – como você – se ofende terrivelmente quando se sente “inferior” à alguém.

        Aprenda uma coisa: Não é porquê eu sou “gringo” que eu portanto tenho que escrever errado, o que os meus clientes e associados iriam pensar de mim se eu escrever para eles cartas e emails cheios de erros?

        E vocês também se ofendem terrivelmente quando alguém fala uma verdade dura e feia ao invés de uma mentira doce e bela, eu não estou comentando aqui para massagear o seu ego com mentiras doces.

  2. Quando um senador da

    Quando um senador da republica, nas suas atribuições legais,

    tem que pedir a benção para um juiz de primeira instância é sinal que o mundo virou de cabeça para baixo, e logo o Requião????

  3. Quanto menos dermos asas à

    Quanto menos dermos asas à imaginação aos juízes, melhor.

    É tão difícil estabelecer critérios?

    Aonde estãos as pessoas para levantar dados e fazer estudos estatísticos?

    Não é possível casar jurisprudências, casos de abusos e estabelecimentos de razoabilidades?

    Por que os nossos legisladores (os de boa fé) não vão consultar como as montadoras amarram requisitos e minimizam a necessidade da tal “hermenêutica”?

    Sabemos que por aqui a tal “mermenêutica” sempre favorece a Casa Grande.

  4. Tem que acabar com a

    Tem que acabar com a “excepcionalidade” (“novidade” no meio do Judiciário) antes que de muitas mais crias. Inclusive jurisprudenciais.

     

     

  5. Respeito Requião, mas acho

    Respeito Requião, mas acho UMA DESMORALIZAÇÃO um SemVoto DETERMINAR OU SER CONSULTADO sobre uma lei, da qual foge como o diabo da cruz. 

    1. Quem sabe sabe

      O sem voto possuem conhecimentos jurídicos  em grau bem acima dos legisladores e, por isso, sempre devem ser consultados. Quando não o fazem muitas vezes aprovam as m… que todos conhecemos.

  6. Se moro quer fazer leis deve ir para o legislativo elegendo-se

    Volto a afirmar, depois de moro, morosidade do judiciario passou a  ter outro significado. Querer fazer leis sem ser legislador `e uma delas.

    E deixaram o morinho dar palpite numa legislacao que controlaria seus impetos de juizite.

    Ora pois!

    Transcrevo aqui o contrabando moristico-

    § 2º A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas, necessariamente razoável e fundamentada, não configura, por si só, abuso de autoridade.

    Salvar-se-ia  o artigo pelo `por si so`, pois  permitiria que, em casos de abuso puro e simples , se valessem de outros meios para a sua  tipificacao, ainda que com resultados duvidosos.

    MAS, convenhamos, ainda esta fraco.

       

  7. Dona Hermenêutica, a virgem em casa de tolerância…

    Dona Hermenêutica é uma senhora simpática, sempre disposta aos melhores conselhos para os meninos e meninas afoitos (as) da judicância, recém-saídos dos cueiros e dos bancos da indústria de cursinhos, ainda incapazes de interpretar as próprias vidas…a maioria sequer nunca recebeu um salário antes do polpudo contra-cheque de juiz ou promotor…

    Ela diz, do alto de sua experiência de quem já iniciou vários e vários rapazes e moças (sim, não há distinção sexista para essa bondosa senhora) nas artes da manipulação quase pornográfica das leis:

    – Meninos e meninas, o mau uso leva ao abuso!

    Sim, senhoras e senhores, como criminalizar um juiz (ou juíza) por ter interpretado a lei de uma forma, e depois (des)interpretado de outra?

    Uai, só a frouxidão legislativa cria leis que tenham interpretações tão elásticas…

    E a quem serve essa folga?

    Aos de sempre, claro…

     

    A Dona Hermenêutica lembra que as masmorras brasilianas estão cheios de gente que ali está em nome dela, mas ela jura que não é a culpada…morre de pena…

    São extensões analógicas, analogias (são coisas diferentes), enfim, toda uma série de malabarismos para enquadrar os inimigos públicos já conhecidos, sejam por “associações para o tráfico” que nunca serão provadas, mas são sentenciadas na base da convicção, sejam por prisões preventivas lastreadas em um subjetivíssimo e hermenêutico dispositivo, a chamada ofensa a ordem pública…

    Daí para outras “especulações” é um pulo…

    Dona Hermenêutica infla o peito orgulhosa: olha aí outro menino de ouro…o garoto maneja um powerpoint como ninguém, o danado…

    Recentemente, o próprio stf (o circo dos horrores) ratificou mais uma em nome do bela senhora: possibilitou que haja prisões (em regra, quando era caso excepcional) de presos cuja sentença não transitou em julgado…

    E depois querem criminalizar o “pobre” juiz ou a “pobre” juíza que restarem contrariados em suas “birras” de primeira instância quando suas decisões e sentenças são reformadas a larga? 

    Em um país onde o integrante do ministério da inquisição senta do lado do juiz, como um apêndice dele, e não como parte processual, que deveria estar no mesmo nível das demais (nesse caso, da defesa)…?

     

    O beija mão de Requião (ceús, todo mundo dá uma vacilada na frente de um super-homem, não?) é mais que coerente…Dona Hermenêutica aplaudiria de pé…

    Dona Hermenêutica só tem uma queixa, e com razão:

    Nas delegacias e nas ruas, andam contrabandeando seu nome em vão…

    Dias desses a garbosa senhora viu uma foto em rede social de um enorme porrete de madeira, supostamente utilizado por policiais para “interpretar” a lei em um interrogatório…

    Outro dia, a chamaram de auto de resistência…humpf, essa ralé…

    Mas pelos ali, ela diz, consolada, há mais certezas que dúvida:

    – morreu baleado?

    – sim.

    – qual a cor e onde morava?

    – preto e na favela…

    – ah, se não era culpado, seria um dia…

    Poupa o trabalho dos meus meninos e meninas naquelas togas lindas…

  8. Por quê não listam exemplos na lei?

    1. Processar ex-presidente por influir na compra de caças sem que tenha influenciado; pena de 5 a 10 anos e multa;

    2. Processar ex-presidente porque o irmão recebeu mesada de R$ 5 mil; pena de 2 a 4 anos, e multa;

    3. Perguntar pra um policial, porteiro ou algo do gênero: Vc sabe com quem está falando? Pena de 5 a 10 anos e multa;

    4. Receber remuneração acima do teto constitucional; pena de 10 a 20 anos e perda do cargo público, além da devolução da bufunfa recebia a maior.

    É tão difícila assim???

  9. Será por acaso uma  questão

    Será por acaso uma  questão de hermenêutica prender durante meses pessoas em busca de delações? Liberar escutas telefônicas para os telejornais cujo teor em nada dizem respeito à investigações do que quer que seja, apenas com o intuito de humilhar e desqualificar? 

    Será por acaso uma questão de hermenêutica um juiz exigir de um réu presença em audiências com testemunhas quando sua defesa é um direito e não uma obrigação? 

    Quando pugna por essa distinção com tanta ênfase é porque o Juiz Moro tem a consciência pesada. Tem medo de passar pela experiência que impôs a seus semelhantes. O que vem a calhar num QTATM: Quem Tem Ânus Tem Medo. 

     

  10. Dois Ipods

    Foram furtados da casa do Lula, quando a PF, sob comando do amigo do traficante, invadiu a casa.

    Ele ainda não devolveu os objetos furtados.

     

  11. Acho engraçado a preocupação

    Acho engraçado a preocupação de não punir o juiz que dá uma interpretação errada se for admitido não haver dolo…

    Um médico, por exemplo, independente de haver dolo está sujeito a perder seu diploma se cometer um erro por imperícia. Por que então um juiz que destrói a vida de alguém não deve ser punido de alguma forma por sua incompetência em interpretar corretamente a lei???

    Sinceramente, condicionado a necessidade de ser julgado haver ou não “dolo” o corporativismo dos juizes vai poder falar mais alto; na prática essa lei será letra morta.

    A lógica é simples…

    Houve uma interpretação errada ou uma omissão flagrante?… Puna-se de acordo com a gravidade do erro.

    Erros geram punições?… Sejamos então mais atentos e profissionais.

    1. Considere que em muitos

      Considere que em muitos aspectos o Brasil ainda é uma sociedade feudal do século dezoito, e neste país feudal os seus juízes seriam o equivalente à realeza. E os reis da época sequer sonhavam com a idéia de aplicarem a eles mesmos as leis que eles criam.

  12. Moro agora é revisor de…

    Agora a coisa pirou de vez, a meu ver, com essa famigerada concessão ao Juiz Moro do papel de última instância revisora de leis que visam exatamente coibir abusos da sua confraria jurídica.

    Que condescendência e precedente inusitado esse!

     

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