Três anos de problemas estaduais em mobilidade viram culpa da União

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Reportagem do Valor responsabiliza falta de repasse do governo federal pela paralisação de obras de metrôs. Os exemplos, contudo, são de erros em governos estaduais e prefeituras
 
 
Jornal GGN – O último livro de Umberto Eco ensina como contar uma inverdade sem mentir. Na edição de hoje, o jornal Valor Econômico deu uma boa demonstração de como se valer desses recursos.
 
A principal manchete de hoje é sobre as obras travadas do PAC mobilidade.
 
A reportagem tem duas versões: uma para a capa (com muito maior visibilidade) e outra para as páginas internas.
 
Na capa, todas as informações remetem a responsabilidade para o governo federal. O texto de capa informa que quase 100 quilômetros de linhas de metrô ou de veículos leves sobre trilhos, planejados há três anos, ficaram apenas no papel.
 
O jornal informa que em abril de 2012, a presidente Dilma Rousseff prometeu recursos para “espalhar linhas de metrô pelas maiores capitais do país”, com um pacote de R$ 32 bilhões. No evento de anúncio do repasse de recursos, o Valor publicou que a presidente “atacou quem demonstrava complexo de viralata”, referindo-se ao passado, quando “diziam” que o Brasil “não tinha condições de investir em metrô”.
 
“Entre a promessa e a realidade, o retrato é frustrante”, continua a matéria de capa. “Até o fim do primeiro trimestre, apenas R$ 824 milhões de tudo o que Dilma havia prometido tinham sido efetivamente pagos”, aponta, como se o Orçamento da União fosse o único requisito para “tirar do papel” as construções de mobilidade. 
 
São Tomás de Aquino dizia que uma das formas de mentir consiste em não contar toda a verdade. Na capa se resumiu tudo, menos o essencial: das sete capitais analisadas, em seis delas os atrasos são de responsabilildade dos respectivos governos estaduais: problemas de projetos, mudanças societárias no consórcio vencedor da licitação e outras razões pontuais.
 
Mas o jornal optou por colocar a parte mais relevante da reportagem apenas nas páginas internas.
 
 
Em Brasília, o projeto básico de engenharia (que deve ser apresentado pelo governo) atrasou. Em Goiânia, “faltam 90% das desapropriações” – por ser uma obra PPP entre a Odebrecht e o governo estadual, a desapropriação é de responsabilidade do estado. Em Belo Horizonte, erros também no projeto básico de engenharia. Em Curitiba, a licitação para as obras realizada pela prefeitura foi suspensa pelo Tribunal de Contas do Estado e, depois de liberada, a prefeitura pede reajuste dos valores. Em Porto Alegre, “o governo estadual que entraria com a maior parte dos recursos complementares vive crise financeira”. 
 
No Rio de Janeiro, o impasse teve início porque o governo estadual espera o dinheiro ser liberado pela Caixa e do fundo perdido do Ministério das Cidades. Mas para liberar os recursos, a obra precisa ser licitada. E a licitação não ocorre, porque o Estado quer garantia de que os recursos vão ser repassados.
 
De todas as sete capitais listadas pelo Valor, Fortaleza é a única que “deu sinais concretos de avanço”. E nela, “mais de 70% dos investimentos previstos têm origem no Orçamento Geral da União (OGU)”. A obra, contudo, está abandonada. “Especula-se que houve falta de repasses, mas ninguém confirma”, disse o coordenador do sindicato dos trabalhadores da construção no Ceará. Parte interessada na denúncia, se houvesse, a própria Secretaria Estadual de Infraestrutura “nega problemas orçamentários e atribui a paralisia a mudanças societárias no consórcio vencedor da licitação”.
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

10 Comentários

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  1. Não há mais imprensa…

    Mais uma vez a imprensa presta um desserviço ao país. Em vez de focar onde realmente estão os problemas, usam mais essa questão para atacar o governo federal, deixando os corruptos e incompetentes à vontade para continuar roubando e deixando as obras paralizadas.

    O que essa massa coxinhesca que consome o detrito sólido do esgoto que se tornou a antiga imprensa brasileira, é que seu discurso pseudomoralista usado para fazer proselitismo é o que mais protege os corruptos e incompetentes.

     

  2. Na origem de tudo o

    Na origem de tudo o federalismo capenga.

    Se os cariocas soubessem que cada um paga 7200 reais por ano para a união sei lá como reagiriam.

  3. Quem tem só um pouco de

    Quem tem só um pouco de formação política identifica com clareza as intenções da mídia conservadora.

    Na ânsia de desmarcarar o conteúdo de suas notícias, entretanto, vocês – blogosfera progressista – produzem material jornalísito de qualidade bastante duvidosa.

    O movito é o desconhecimento da estrutura e do engenho estatal, seus aspectos e características.

    Há duas que justificam minha afirmação:

    A União tanto concentra muito os recursos financeiros arrecadados quanto a capacidade técnico-administrativa.

    As duas combinadas explicam o motivo que não eximem de superficialidade a matéria da velha mídia nem tampouco esta produzida pelo Blog.

    .

    A construção de equipamentos de mobilidade urbana, notadamente aqueles que se fazem sobre trilhos, exige elevada capacidade técnica dos projetos.

    Há muita ignorância jornalística quanto a esta função chave do processo porque Estados e Municípios, simplesmente, não possuem quadros técnicos capazes de fazer frente ao desafio de elaborar o projeto.

    O outro detalhe solenemente ignorado é a ingenuidade de considerar que há recursos disponíveis.

    Deixam de lado os implacáveis cortes de recursos que atingiram TODOS os setores da administração da educação à saúde. Basta ter olhos para ver.

    A exigência dos “projetos técnicos” PODEM ser ao final a velha artimanha ou subterfúgio que empurra para os entes subanacionais uma responsabilidade de execução sem que a estes seja oferecido recursos técnicos e financeiros.

    .

    Para tornar este ponto de vista mais parrudo, observem que as obras sob a responsabilidade do governo federal padecem de problemas relacionados a atrasos na liberação de recursos e desenho equivocado das ações.

    A Transposição do Rio São Francisco é um desses projetos, a Ferrovia Norte-Sul um outro que lembro rapidamente.

    .

    Fica a dica, portanto:

    Muito cuidado e apreço pela bom conhecimento de assuntos complexos para que a justa intenção de desnudar os ardis midiáticos acabem produzindo mais desinformação.

  4. Um dia é o uso da manchete

    Um dia é o uso da manchete para a preparação do golpe, no outro dia também e no dia seguinte também.

    Vale para toda a mídia “hegemònica”.

    E nós, espectadores privilegiados, só olhando, só olhando, só olhando…

     

  5. Até o almirante é culpado por economizar bilhões de dólares

    A imprensa faz de tudo para confundir a opinião pública. E esse Moro que mandou prender o almirante Othon, o que dizer deste juiz? Acabo de ler algo sobre Othon que Moro pelo jeito não sabe…

    Com US$ 1 bilhão o almirante Othon enriqueceu urânio a 4%. Os iranianos gastaram mais de US$ 36 bilhões e não conseguiram chegar a 1%. E Moro ainda prende o cara que ajudou o Brasil a economizar bilhões de dólares? Veja a reportagem e leia os comentários no Youtube: 

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=fICKWKalzxs%5D

  6. Comportamento da velha e carcomida imprensa.

    Estou muito impressionada com tudo que está sendo colocado nas costas do PT, do Lula e da Dilma. Li que um deputado baiano do DEM disse que a queda do Vitória e do Bahia para a segunda divisão e a má fase de ambos se devem, ao PT. Estão loucos e querendo me enlouquecer..

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