A aliança entre ambientalismo e alta finança: o encontro em Jackson Hole, por Paul Gallagher

Nessa “mudança de regime”, os bancos centrais continuarão independentes dos governos, mas os governos não serão mais independentes dos bancos centrais.

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Enviado por Rogério Mattos

Da Executive Intelligence Review

A aliança entre ambientalismo e alta finança: o encontro em Jackson Hole

Por Paul Gallagher, diretor inteligência econômica da EIR

O encontro estratégico dos banqueiros internacionais da Reserva Federal em Jackson Hole, Wyoming, na última semana de agosto, testemunhou a confissão dos maiores bancos centrais do mundo, de que conduziram por 12 anos uma política (deliberadamente) falha para tentar reativar a economia após a crise de 2007-08; e os bancos centrais planejam agora retirar de seus governos todo o poder para criar crédito e financiar o desenvolvimento. O resultado, se o Fed e seu grande irmão, o Banco da Inglaterra, tiverem permissão para tanto, é que haverá uma impressão de moeda numa escala bizarra por parte dos bancos centrais, centrada em projetos “ambientais”, com a intenção de levar a tecnologia energética para a era anterior a dos combustíveis fósseis, num contexto onde a população mundial é muito maior. Em sintonia com as manchetes saídas de Jackson Hole foi o “chocante” pronunciamento do diretor do Banco da Inglaterra, Mark Carney, de que em um futuro não muito distante, a dominação do dólar como moeda internacional poderá ser substituída por uma moeda digital, como a planejada pelo Facebook, uma criptomoeda internacional privada, a “Libra”. É chocante a arrogância e prepotência financeira britânica, mas previsível. O Banco da Inglaterra tem feito estudos internos sobre a circulação de moedas digitais pelos bancos centrais durante toda a última década de resgates aos bancos de Wall Street e da City de Londres, que falharam em trazer crescimento econômico ou seu Santo Graal, a “inflação”. E o sr. Carney há anos lidera uma “iniciativa ambiental-financeira” internacional pelos bancos centrais, para incentivar ou forçar investimentos fora da matriz energética baseada em “carbono”, e em direção a “energias renováveis”. Preso à lama dos juros negativos Por quê? Para responder a essa pergunta devemos primeiro considerar que os resgates feitos pelos bancos centrais dos maiores centros financeiros desde 2008 os deixaram presos num universo estranho e sem precedentes de taxas de juros zero ou negativas. Ouça o presidente da Reserva Federal, Jerome Powell, em Jackson Hole: “Enfrentamos riscos crescentes de períodos longos e de difícil resolução, onde nossa política se prendeu a taxas de juros próximas a zero. Para dar conta desse novo normal (!), estamos conduzindo uma revisão pública de nossa estratégia, de ferramentas e da comunicação de política monetária – a primeira desse tipo feita pela Reserva Federal. Estamos avaliando os prós e contras das estratégias que visam uma reversão dos fracassos no cumprimento de nossas metas inflacionárias. Estamos examinando as ferramentas de política monetária que usamos tanto em períodos de calmaria e nos de crise, e nos perguntamos se devemos expandir nosso kit de ferramentas”. “Presos” a taxas de juros zero ou negativas. E agora o maior conselheiro econômico de Obama e ex-Secretário do Tesouro, Larry Summers, que não esteve entre os palestrantes de Jackson Hole, mas tuitou sobre seu novo estudo: “A economia monetária de ‘buraco negro’ – taxas de juros paradas em zero com nenhuma expectativa de saída – agora é a expectativa em que se apoiam os mercados da Europa e do Japão, com basicamente rendimentos zerados ou negativos por uma geração. Os EUA está apenas a uma recessão de distancia antes de alcançá-los. Em todos os cantos do mundo industrial, os riscos de um forte crescimento do desemprego (…)”. “Presos”, “parados” no regime de taxas de juros negativas, a estagnação por vezes se chama “era do gelo” para os investimentos produtivos e para o crescimento. O que começou como uma mentira uma década atrás – “Se resgatamos os bancos centrais com massas de dinheiro a taxas zero, eles irão emprestar uma parte disso para a economia real” – se tornou uma armadilha para os próprios bancos centrais. Desde que uma economia de taxas-zero é uma economia de especulação, não uma economia para bancos que emprestam capital para a produção, os bancos centrais agora imprimem dinheiro para dar suporte às imensas bolhas especulativas que eles criaram. E quando eles tentam “normalizar” a situação aumentando de algum modo as taxas de juro, falências e crises monetárias aparecem, a “recessão” retorna e os bancos centrais correm apavorados para suas taxas zeradas ou negativas. Black Rock propõe “mudança de regime” Para o encontro em Jackson Hole, em 24 de agosto, um grupo de veteranos dos bancos centrais – o antigo diretor do Banco Central da Suíça, Philipp Hildebrand, a principal economista do fundo Black Rock Alemanha, Elga Bartsch, o ex-vice-presidente da Reserva Federal (e antigo diretor do Banco de Israel), Stanley Fischer, e o antigo vice-presidente do Banco do Canadá, Jean Boivin – apresentaram um artigo da Black Rock LLP, onde todos eles são executivos. Black Rock é o maior fundo de capital privado do mundo, que diz administrar 6 trilhões de dólares em ativos. Hildebrand disse a Bloomberg News: “Iremos ver uma mudança de regime na política monetária que será um grande negócio, como o que vimos entre a pré-crise [de 2008] e a pós-crise, uma flexibilização das responsabilidades e atividades monetárias”. Traduzindo do linguajar financeiro: “Flexibilização quantitativa”, onde os bancos centrais imprimem dinheiro e os coloca nas reservas dos grandes bancos privados diretamente para pagar os gastos de governo. Nessa “mudança de regime”, os bancos centrais continuarão independentes dos governos, mas os governos não serão mais independentes dos bancos centrais. Black Rock chamou seu esquema de Standby Emergency Fiscal Facility ou SEFF, um plano para os bancos centrais imprimirem largas quantias de dinheiro e repassá-los diretamente às tesourarias dos governos para serem gastos em “criação de inflação”. Um “Comitê de Especialistas” decidirá a maneira mais acertada para se gastar esse dinheiro, disseram os “especialistas” da Black Rock. Algo como o SEFF não chega nem a ser um fato novo; é o keynesianismo radical que agora se dá o nome de Moderna Teoria Monetária (MMT, em inglês) e que remonta ao proeminente keynesiano do pós-guerra, Abba Lerner. Em dezembro de 1971, Lerner foi derrotado num famoso debate com Lyndon LaRouche sobre o fim de Bretton Woods, quando Lerner fez a afirmativa chocante que apoiava às políticas financeiras de Schacht, ministro das finanças de Hitler, mas gostaria que Schacht pudesse tê-las feito sem Hitler. O MMT diz que a moeda impressa pelos bancos centrais não são débito, e não têm limites, desde que ao mesmo tempo as taxas de juros bancárias fiquem próximas a zero – isso soa familiar. No caso de Schacht, a impressão monetária foi utilizada para construir a máquina de guerra nazista sob as contínuas reparações alemãs após a Primeira Guerra. Uma ameaça a curto prazo A “mudança de regime” dos bancos centrais pode acontecer muito mais rápido do que deixa a entender Mark Carney em seu posicionamento sobre uma moeda digital do tipo da Libra em substituição ao dólar. A pilha de ativos a taxas negativas saltou para próximo a 18 trilhões, mais de 30% de todo o conjunto de títulos da dívida. Não existe praticamente nenhuma “economia avançada” fora dos EUA que não tenha rendimentos negativos. As taxas do Tesouro dos EUA estão sendo zeradas, enquanto a Reserva Federal corta os juros, e os fundos de investimento fogem das taxas negativas em outros lugares e procuram títulos do Tesouro dos EUA, por um pouco mais de tempo, onde ainda possam lucrar. Emprestar com juros reais agora é característica de um crescente mundo de “subprimes” de débitos corporativos alavancados (empréstimos para companhias já superendividadas e “empresas zumbi”), o crédito rotativo dos consumidores, como cartões de crédito, empréstimos para automóveis, etc., e também agencias locais em dificuldades financeiras. Acima de tudo, empréstimos com juros se caracterizam por negociatas e instrumentos especulativos, etc., incluindo aqueles contratos em derivativos que permitem lucros realizados ao se emprestar a juros negativos! Esse regime prioriza cada vez mais a securitização e a especulação e agora se dirige para outra falência das dívidas “subprime” de vários tipos, insustentáveis e impagáveis – a “bolha toda”. Num mundo de juros negativos dos débitos soberanos, a demanda dos investidores à compra desses débitos pode, num futuro bem próximo, cair significativamente. Em 21 de agosto, outro acontecimento “chocante” ocorreu: dois bilhões em títulos do governo alemão, com prazo de 30 anos mas com juros negativos[!], não conseguiram ser vendidos em leilão. Nesse caso, os grandes bancos que negociam com a dívida pública sem conseguir vendê-las, deixam os títulos para serem comprados pelos bancos centrais – exatamente o que aconteceu no caso alemão. E num segundo momento, isso faz com que os bancos centrais simplesmente imprimam toda a quantia que os governos outrora emprestavam para seus gastos. É o que propõe a mudança de regime da Black Rock. Dinheiro digital e vigarices ambientalistas Tão “chocante” quanto são por si mesmos o esquema da Black Rock e a proposta de moeda digital “como a Libra”, de Mark Carney, é igualmente devastador o fato de ambos capitanearem a atual “finança da mudança climática”. A Iniciativa Financeira Ambiental dos bancos centrais está espalhada pelo Banco da Inglaterra de Carney, como é detalhado num próximo panfleto do Instituto Schiller onde se expôs o ecofascismo. A Black Rock LLP, junto com o Radium Group, estão impondo um programa sofisticado do tipo Google Maps, que classifica o “risco de mudança climática” para os investimentos nos títulos municipais dos EUA, eletrodomésticos e imóveis comerciais, expondo literalmente propriedade por propriedade. Risco quer dizer “ondas de extremo calor”, incêndios, enchentes, grandes tempestades, etc. As instalações de combustíveis fósseis são todas classificadas nesse programa como de “alto risco”, refletindo apenas a realidade virtual dos conselhos de investimento, i.e., fuja deles. Obrigatoriamente a Black Rock deve ter investimentos no meio ambiente para atrair clientes. Isso pode vir através de um “comitê de especialistas” designados pela Reserva Federal para decidir como gastar o dinheiro impresso pelo governo para ser usado “criando inflação”. Olhe para o descarado e absurdo volume de investimentos que os entusiastas do Green New Deal estão propondo para serem jogados nessas retrógradas tecnologias de produção energética. O candidato presidencial, senador Bernie Sanders, quer 16,3 trilhões de gastos em energia solar, eólica e outras energias renováveis, banindo tanto a energia nuclear quanto a de combustíveis fósseis. Um grupo da Faculdade de Ciências Aplicadas da Universidade de Harvard propôs substituir toda a poderosa infraestrutura da China e de seus parceiros na Iniciativa Um Cinturão, Uma Rota por energia solar, exclusivamente. O custo? 13 trilhões de dólares. E esse dinheiro? Sanders, a deputada Alexandria Ocasio-Cortez e outros Green New Dealers acreditam que a Reserva Federal deve imprimi-lo, se necessário. Na esteira dessas atuais movimentações, se o Banco da Inglaterra de Carney e os “especialistas” da Black Rock tiverem sucesso, a “finança ambientalista” será a causa favorita dos bancos centrais para imprimir “dinheiro fiscal para propósitos inflacionários” (o ex-presidente do Fed, Ben Bernanke chamou isso de “dinheiro-helicóptero” [helicopter-money]). E nenhum desses tipos de dinheiro-helicóptero é mais precisamente controlável pelos bancos centrais do que uma moeda digital emitida por eles. Como disse Lyndon LaRouche, se Londres, Wall Street e os bancos centrais reiteradamente se recusarem a reconhecer a falência de seu sistema, e a necessidade de reorganizá-lo, eles não terão opção além de esticar a corda para se enforcarem. A medida honesta e urgente a ser tomada para preveni-los de enforcar a todos nós junto a eles é a lei Glass-Steagall, e retirar os bancos centrais dessa jogada pela criação de bancos nacionais “hamiltonianos” para emitir crédito produtivo em prol do interesse nacional. Nota do tradutor: É difícil fazer o debate sobre a questão ambiental num contexto onde se tem um presidente que marca o “Dia do Fogo” para matar índio e abrir caminho para a exploração predatória da Amazônia; onde esse presidente nega todo e qualquer dado estatístico e acredita que todos os cientistas são esquerdistas e que um astrólogo é mais sábio do que os velhos oráculos. Na China, por exemplo, recentemente houve uma grande conferencia sobre o clima, onde se tentou discutir as diferenças entre o aquecimento do planeta e a poluição. Para alguns, não existe aquecimento global antropogênico: as mudanças climáticas estariam relacionadas a fatores de longa duração, como a incidência de maior radiação vinda da galáxia devido a determinadas movimentações do nosso sistema solar. Assim, climatologistas apresentam dados de um “aquecimento global” bem maior do que o atual durante a Idade Média, como também mostram um período de “resfriamento global” ocorrido nas décadas anteriores ao século XXI. O fato é que é bastante conveniente que a City de Londres e Wall Street se encontrem (novamente) com os ambientalistas. Por agora, querem estender a desculpa para a continuar a imprimir dinheiro de graça para o sistema financeiro dizendo que os recursos serão canalizados para tecnologias ambientais. Trata-se de um estranho cruzamento da alta finança com a Moderna Teoria Monetária (keynesiana), o Green New Deal e a chamada nova esquerda americana e europeia. O título do artigo retrata com precisão esse estranho encontro: “JACKSON HOLE MEETING: After Keeping Us 10 Years in the Red, Central Banks New Command Is `Go Green'”. Claramente, não pude traduzir com fidelidade, já que “verde” ou “tecnologias verdes” não tem um significado específico em nossa língua. Mas o jogo de palavras é claro: os bancos centrais das principais economias do mundo, há anos no “vermelho”, querem ficar “verdes” ao aderirem a pauta ambiental. Esse é o significado básico do texto, com umas tantas outras implicações que só sua leitura pode mostrar. Ele dialoga com texto anterior também traduzido por mim [clique aqui para ler]: este é da Executive Intelligence Review e o outro do Instituto Schiller. No mais, os dois trabalham em conjunto porém em áreas do conhecimento um pouco diferentes e um a partir dos EUA e o outro da Europa. Desculpe pela longo pós-escrito, mas o acredito mais do que necessário diante da atual conjuntura. Tradução feita por Rogério Mattos para a Executive Intelligence Review.

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Redação

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