Exposições a Garotinho e Cabral atingem direitos individuais, por Marcelo Auler

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Por Marcelo Auler

Cenas de uma sociedade de bárbaros. É isso que queremos? 

 
No quarto de um hospital a filmagem da transferência de Garotinho, na penitenciária, a foto distribuída de Sérgio Cabral: retrocesso inaceitável

No quarto de um hospital a filmagem da transferência de Garotinho, na penitenciária, a foto distribuída de Sérgio Cabral: retrocesso inaceitável

Em nome do combate à corrupção e às fraudes eleitorais estamos vivendo um grave e perigoso momento de retrocesso. As filmagens da transferência do ex-governador Anthony Garotinho e as fotos distribuídas do ex-governador Sérgio Cabral como presidiário atingem diretamente o respeito e os direitos que todo e qualquer cidadão – inclusive os condenados, situação em que nenhum dos dois se encontra – têm: o respeito à dignidade humana.

Prendê-los é algo que deve se discutido nos tribunais. Cabral, solto, realmente pode ser uma ameaça não à ordem pública, como alegaram dois juízes, mas à apuração isenta dos crimes que teria cometido, e que são muitos e antigos.

Já a prisão de Garotinho, que ao que tudo indica tem problemas cardíacos, parece ter sido um abuso, como declarou a ministra Luciana Lóssio, que além de ocupar uma cadeira no Tribunal Superior Eleitoral (pelo segundo mandato), tem assento no Conselho Nacional dos Direitos Humanos – CNDH, como representante do Conselho Nacional de Justiça.

É mais do que justificável que a população, em especial a fluminense, aplauda a prisão dos dois ex-governadores, ainda que ambas possam ser discutíveis. O que não se justifica é tripudiarem da situação em que os dois se encontram. Ainda que já estivessem condenados, mereceriam todo o respeito como cidadãos. Mas, mais grave, são apenas suspeitos prestes a responderem no judiciário pelos possíveis crimes que teriam cometido. Que não foram poucos, é verdade, mas ainda não foram julgados, como o próprio juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal criminal, deixa claro na decisão que autorizou a prisão de Cabral.

Em ambos os casos, o desrespeito foi cometido com a participação e/ou conivência do Estado, isto é, de autoridades que ocupando cargos governamentais deveriam ser as primeiras a fazerem valer a Constituição Federal, também chamada de Constituição Cidadã, assim como a Declaração Universal de Direitos Humanos, que o Brasil assinou junto à ONU em 1948.

A foto de Cabral, feita dentro do pr4esídio, só pode ter sido distribuída à imprensa por um órgão público. No caso de Garotinho, mais grave ainda, pois, enfermo, dentro de um hospital público, foi filmado no quarto onde estava internado em uma situação tétrica, vexatória, em que brigava pelo seu direito a ficar internado. Direito este reconhecido pela decisão exemplar da ministra Luciana.

Tenho a tranquilidade de jamais ter dado um voto sequer para Sérgio Cabral ou Anthony Garotinho. Por Cabral fui nomeado assessor da Comissão Estadual da Verdade, mas por indicação do jornalista Álvaro Caldas e após aprovação do meu nome pelo então presidente da CEV-Rio, Wadih Damous. Logo, não me sinto devedor de nenhum favor ao ex=governador. E  o conheço desde que ele era  criança, devido a minha aproximação com seu pai, o jornalista Sérgio Cabral, a quem respeito profissionalmente e me solidarizo neste momento. Com Garotinho mantive apenas encontros profissionais, os quais nem sempre foram amistosos.

Não tenho procuração para defender nenhum dos dois e nem o faria pelos crimes que são acusados

Mas, a defesa do Estado Democrático de Direito e, dentro dele, do respeito a todo e qualquer cidadão, é algo inerente a todos. Não podemos transformar nossa sociedade, em nome da luta contra a corrupção, em uma sociedade de bárbaros. Não se combate o crime desrespeitando leis. Não se busca a moralidade pública, tripudiando adversários.

Jamais devemos esquecer que em uma ditadura, com o autoritarismo e desrespeito às leis, qualquer um de nós pode ser a próxima vítima. Se hoje aplaudimos o desrespeito aos Direitos Humanos por se tratarem de figuras públicas acusadas de males terríveis contra a população, mas que ainda não passaram pelo crivo do julgamento isento e com direito à ampla defesa,  amanhã não teremos como reclamar quando fizerem o mesmo com um dos nossos. Ou conosco mesmo.

Não cabe relembrar que a luta pela redemocratização deste país foi muito dura. Vários tombaram em nome dela. Vários passaram momentos terríveis com prisões injustificadas, torturas e outros desrespeitos. Muitas são as famílias que ainda choram seus mortos sem saberem onde estão seus corpos. Na ditadura imposta pelo golpe civil-militar que alguns aloprados defenderam semana passada pisoteando na bandeira nacional, dentro da Câmara dos Deputados, sem que nadas lhes acontecesse, o Judiciário é um dos primeiros a ser atingido.

Nelas, não existe Justiça com letra maiúscula, com isenção. Portanto, os magistrados que hoje decretam estas prisões dentro de processos legais, em nome da moralidade pública, deveriam ser os primeiros a condenarem estes abusos e falta de respeito. Mas, infelizmente, se calam. Exceção digna para a ministra Luciana Lóssio.

Da mesma forma, é terrível ver jornais e jornalistas fazerem vista grossa a estes desrespeitos. Esquecem que junto com o autoritarismo sempre a censura, o impedimento à liberdade de imprensa, à liberdade de opinião. Diante disso, deveriam se preocupar em cobrar respeito as leis e aos Direitos Humanos. É o mínimo que a decência e o respeito às leis exigem.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

24 Comentários

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  1. Esta foto de Cabral é

    Esta foto de Cabral é photoshop ? cadê a escala de altura?

    SE Cortaram depois que a globo anunciou que (não) haviam cortado? Inclusive , a dona loprett dizendo que isto não havia acontecido com Dirceu, etc, e tal? (isto tudo no dia da prisão, inclusive dizendo que ele estava com roupa de preso laranja na foto.

  2. exposições….

    Realmente é vergonhoso país expor as pessoas desta forma. A lei deve ser usada para a Justiça e não para a vingança. Mas foi retumbante o silêncio da mesma imprensa quando algemaram sem justificativa alguma o gov. Paulo Mauf e seu filho na PF. A imprensa também deveria lembrar dos brasileiros mais pobres e mostrar que mais de 82% da população carcerária está detida sem ao menos 1 único julgamento. Aproveitem e mostrem, em época que se clama tanto pelo direito das mulheres, como estas são tratadas para ter acesso a visita de seus parentes presos. Vamos para com tanta hipocrisia.   

  3. Vivemos a barbárie.  Um

    Vivemos a barbárie.  Um bandido qualquer ao ser preso, o rosto não pode ser mostrado, mas empresários e ex autoridades são execrados publicamente e a ralé fascista fica babando como faziam os alemães quando Hitler falava. Estamos sendo destruídos como o foram a Líbia, Iraque, Síria e outros; só que com métodos diferentes, já que para anti nacionalistas  e lambe botas,  basta cursinhos e massagem de ego pela mídia venal.

  4. Vivemos a barbárie.  Um

    Vivemos a barbárie.  Um bandido qualquer ao ser preso, o rosto não pode ser mostrado, mas empresários e ex autoridades são execrados publicamente e a ralé fascista fica babando como faziam os alemães quando Hitler falava. Estamos sendo destruídos como o foram a Líbia, Iraque, Síria e outros; só que com métodos diferentes, já que para anti nacionalistas  e lambe botas,  basta cursinhos e massagem de ego pela mídia venal.

  5. precisamos ter cuidado

    A foto é montagem está mais do que evidente, as letras SEAP se distinguem em luminosidade aparência. As fotos verdadeiras, com a escala de altura já sao um disparate por terem sido reveladas, mesmo porque Cabral não foi ainda condenado e foi preso para não interferir nas investigações, mas já o tratam como carcerário, isso compromete toda a legalidade das ações da justiça, minúscula mesmo e cada vez mais

    1. CABRAL o mal

      cabral nao foi “ainda condenado”! e nunca sera nesse pais de justiça, ´politicos  , empresarios elite de merda, vamos esperar o que?? os caras ele garotinho e todos q passaram ´por la quebraram o estado, veja o patrimonio desse cara o anel da esposa 800 mil q “ganhou” do empreitero, nem precisa de julgamento, emos fun cionarios do rio q recebem quem paga???

      valter

  6. – E os 99,99% dos nossos presos no Brasil????…

    alguns (ou muitos?) presos sem sequer terem sido julgados. Tortura, humilhação, nem dá pra imaginar. Vejo uma posição de classe: gritamos contra irregularidades do colarinho branco, irregularidades contra o deus iluminado e cultuado, arbitrarieda- des de Moro, mas desde os tempos em que eu era cadastrado e de vez em quando postava algo (fui expulso por comportamento indevido, foi justo), não lembro de gritaria contra a situação desumana dos presos no Brasil, o acinte da prisão pra quem tem curso superior. A barbárie está na gente, que nos arvoramos a progressistas (digo “nós”, mas não ligo pra quaisquer adjetivos que por acaso me coloquem).

  7. HJPOCRESIA
    vc quer “direitos humanos” para quem junto com outros acabou com estado do riio, q nao consegue pagar os aposentados descontar nos funcionarios publicos o rombo do governo, alias vc nao fala sobre isso sobre sua defesa, de um governo q vc participou, essa gente na china seria fuzilada. vc depende da aposentadoria do gov do rio??

    valter

    1. Você tem alguma dificuldade

      Você tem alguma dificuldade intelectual? Quem sabe ler o artigo novamente para efetivamente compreender o que está sendo dito?

  8. Acredito que a principal das

    Acredito que a principal das várias lições que podemos extrair dessa absurda sanha persecutória  que grassa no país é a de que fomos, somos e continuamos a ser seletivos quanto ao inconformismo com arbitrariedades e desrespeitos a princípios básicos sobre os quais se assenta uma sociedade que ser quer civilizada.

    Longe de pretender fazer uma auto auto crítica piegas e oportunista, essa arguição se torna imprescindível para que nos conscientizemos enfim de que existe, sim, um “mundo”  que só emerge, se torna visível, quando o nosso afunda. Infelizmente, não há como fugir dessa verdade. A força da empatia com o “outro” é diretamente proporcional aos nossos interesses ou visões. 

    Sim, é isso mesmo: NÓS só de um tempo para cá descobrimos que se prende pessoas neste país simplesmente por prender, na prática dando-as como culpadas antes de um julgamento justo. Quantos nesse exato momento não estão confinados em celas abrigando vinte, trinta detentos, quando a capacidade mal daria para quatro; alimentados com comida podre, e num ambiência mais para uma sucursal do inferno que uma prisão? Muito deles contar nem mesmo com um advogado dativo. Muito diferente desses casos envolvendo políticos e empresários que sempre tem a assisti-los bancas caríssimas de advogados.Até em penitenciárias, locais onde só poriam estar confinados presos CONDENADOS, há pessoas presas mesmo só na condição de denunciadas ou mesmo só indiciadas.  

    O certo é que se nos revolta a prepotência, o arbítrio, a instrumentalização política da Justiça, o desrespeito aos ritos de uma sociedade civilizada, em contrapartida maiores e piores aberrações que atingem os chamados “invisíveis” passam batidas. Os “sinos” da consciência não batem por eles. A consequência prática e política disso são as acusações, decerto injustas e cínicas, mas logicamente aceitáveis à luz das aparências de que defendemos corruptos por conta da “sacrossanta” luta política. 

    À chamada Esquerda, da qual faço parte se considerarmos a coincidência de quase 100% nas visões e apreensões da Mundo, resta entender, a meu sentir, que a intervenção política que faz no tecido social só com base numa práxis política-ideológica voltada para a conquista e manutenção do Poder a distancia, se não mesmo a aliena, da referência que a fez emergir lá pelos idos do século XVIII que é, e será sempre, a defesa intransigente de valores universais, e em termos mais objetivos dos mais fracos, dos perseguidos e alijados de direitos básicos.  

     

  9. A DIMENSÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO AUTÊNTICO

    O magnífico artigo acima confirma que seu autor, o exemplar Jornalista Marcelo Auler, é uma referência essencial e um ícone da resistência democrática oposta aos descalabros da escalada do regime de exceção, evidenciado na atual conjuntura brasileira.

    A pungente defesa do respeito à dignidade humana, e a precisa demonstração do absurdo da humilhação pública decorrente da exposição de imagens relativas à prisão de pessoas sequer submetidas a julgamento, evidencia a dimensão histórica do jornalismo autêntico.

    A resistência democrática renova e amplia suas forças com a magnitude exemplar do artigo em apreço, que constitui um marco inolvidável da defesa da democracia e do Estado Democrático de Direito, e traz contribuição crucial para promover a necessária reversão dos retrocessos fascistoides promovidos pela disseminação do ódio.

  10. Resistência

    O PT resistiu.

    O Dirceu está aí apenas por conta da literatura jurídica

    O Paulo Cunha foi pego pela sua ingenuidade de deixar a esposa descontar um cheque de 50 mil para gastos de campanha

    Genoino foi preso por nada

    Vaccari Neto foi inocentado

    O Lula é acusado por conta de que o Brasil gosta dele (Se eu tivesse um sitio, eu dava para ele ou emprestava para ir quando quiser)

    O tempo passa e começam a cair aqueles da “sangria”, aqueles que queriam Dilma fora para se livrar. A rigor, eles livraram Dilma desta asquerosa batalha.

    Agora, é só reagrupar a esquerda e esperar 2018.

  11. Preciso, prezado Marcelo.

    Preciso, prezado Marcelo. Apenas faço um comentário sombrio: seria nosso judiciário melhor que ter uma ditadura de direita? Pela nossa História, a qual bem estudei, a resposta é não.

  12. Não fizeram isso nem com os

    Não fizeram isso nem com os presos que já foram condenados (mesmo sem provas ou que já foram absolvidos em denúncia, como Vacari); Prendem alguns com bastante alarde e outros na surdina (casos tentativa de prisão de Lula no aeroporto e de Eduardo Cunha, a quem protegeram de fotos invasivas). Não resta dúvida que isso é um modo GESTAPO de ser da Vue Guantanamo de Curitiba. E são esses que se autoprotegem da acusação de corrupção nas 10 ou 1001 medidas?  Imaginem um juiz preso numa carceragem dessa forma.  Imaginem o LALAU fotografado dessa maneira. Juiz com crime comprovado. A prevaricação do funcionalismo publico  tem vários caminhos, abuso de poder e com viés seletivo é um deles. Também creio que  as acusações  de Cabral são indefensáveis, mas ele AINDA não foi JULGADO, muito menos CONDENADO. Assim como Garotinho. A coisa é tão absurda  qie ainda hoje temos que ler a declaração do super delatado Aècio, se dizendo inocente e querendo a prisão de Lula. Isso é  o  ABSURDO dos ABSURDOS! E saber que a senhora Eduardo Cunha nem ouviu a voz de Moro no interrogatório. Juntando tudo isso, o que fica de equilíbrio e razão na Justiça tupiniquim? NADA.

  13. As prisões foram justas.

    As prisões foram justas. Mostram que o Brasil está mudando e que não é só o trinômio PPP ( preto, pobre e puta) que vai pra cadeia sumariamente por qualquer coisa. Mas a ESPETACULARIZAÇÃO das prisões e realmente condenável.

  14. CONSTITUIÇÃO RASGADA

    Já tive a oportunidade de dizer no GGN, que o juiz Moro, por intermédio de sua metodologia jurídica heterodoxa, ratificada pela golpista ex-suprema corte (assim mesmo com letra minúscula), vem inspirando até síndicos de prédio. Cada um, ao seu modo, vem fazendo justiça com as próprias mãos, fato que só alimenta as práticas justiceiras oficiais e paralelas, em cortes e favelas.

    Não sou PT, não gosto do Garotinho, mas o espetáculo medieval que assisti pelas redes sociais e dita “grande mídia”, foi algo deprimente, deplorável, uma mancha no judiciário.

    Foi algo desumano e brutal, incompatível com uma democracia civilizada, contrário a Declaração Universal dos Direitos Humanos.  

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