Cesar Locatelli
César Locatelli, economista, doutorando em Economia Política Mundial pela UFABC. Jornalista independente desde 2015.
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Marcos Lisboa: A reforma da Previdência apenas estabiliza o paciente, por César Locatelli

Eliminar as barreiras às importações será a próxima bandeira, quando tivermos descoberto que o congelamento de gastos, a reforma trabalhista e a reforma da Previdência não empurraram a economia brasileira para fora do atoleiro.

Marcos Lisboa: A reforma da Previdência apenas estabiliza o paciente

por César Locatelli

O discurso dos economistas neoliberais começou a mudar. Eles têm consciência de que a Reforma da Previdência não vai entregar o que tem prometido. Extremamente revelador, o artigo de Marcos Lisboa, “Quem sabe?”, para a Folha de S.Paulo deste domingo (2/6), diz que: “A reforma da Previdência, porém, apenas estabiliza o paciente”.

Está evidente a opinião de Lisboa de que, com a reforma, não haverá crescimento, nem aumento do emprego, como está sendo propagandeado pela imprensa corporativa. Mas mesmo sabendo que não vai resolver, ele continua a fazer campanha pela reforma, atribuindo a queda de viadutos e o incêndio no museu às pensões dos aposentados:

“Com as regras atuais, não há crescimento econômico factível, ou da carga tributária, que evite o aumento descontrolado da dívida pública e a degradação da infraestrutura por falta de manutenção, com queda de viaduto e queima de museu, em decorrência dos gastos crescentes com aposentadorias.”

O jornalista e professor Lalo Leal Filho revelou sua indignação, ao artigo de Marcos Lisboa, em seu perfil no Facebook:

“Chego até o final do segundo parágrafo de um artigo do presidente do Insper, na Folha, e fico sabendo que a Previdência é culpada pela queda de viadutos e de incêndios em museus. Pelo jeito ela deve ser culpada também pela chuva que cai em São Paulo. E há gente que paga fortunas para estudar em escolas onde ensinam essas barbaridades.”

Interessante como o crescimento econômico, que resolveria grande parte ou todo o problema fiscal, pelo aumento da arrecadação de impostos que se seguiria, não passa pelo raciocínio dessa ala de pensamento econômico. Bem, na verdade eles até argumentam que o crescimento está limitado. Essa é outra mudança de discurso ainda mais interessante. Os economistas neoliberais, especialmente aqueles empregados no mercado financeiro, começam a defender a tese de que o produto potencial brasileiro caiu.

O que é isso? O que isso significa? Bem, produto potencial é a produção máxima de uma economia, ou o produto máximo, que se pode alcançar se todos os fatores de produção (trabalho, por um lado, e capital, por outro, formado por máquinas, equipamentos, instalações, matérias-primas) forem completamente empregados.

Era meio consenso, antes da guinada desse grupo, que o produto potencial brasileiro permitiria um crescimento em torno de 3%. Em outras palavras, só pelo aumento do emprego dos trabalhadores e pelo aumento da capacidade já instalada, seria possível crescer 3% ao ano. Lisboa puxa a fila dos que acreditam que o país destruiu capacidade produtiva:

“Para agravar, o ambiente de negócios condena o Brasil a um crescimento potencial medíocre, talvez de 1% ao ano. Podemos ter surtos curtos de recuperação da produção, mas apenas isso.”

Essa afirmação de Lisboa, e ele não está sozinho, revela que o Brasil destruiu capacidade produtiva. Ele não para por aí, ele já levanta as próximas bandeiras que a política econômica deve tremular diante de nós:

“As restrições ao comércio exterior contribuem para a nossa baixa produtividade. As regras de conteúdo nacional e as barreiras à importação dificultam o acesso do setor produtivo ao que melhor se faz em outros países, como as inovações tecnológicas que aumentam a eficiência dos bens de capital.”

Eliminar as barreiras às importações será a próxima bandeira, quando tivermos descoberto que o congelamento de gastos, a reforma trabalhista e a reforma da Previdência não empurraram a economia brasileira para fora do atoleiro.

O México teve a infelicidade de ter tido muitos governos neoliberais antes de eleger agora López Obrador. A desigualdade e a falta de perspectivas levaram milhões de mexicanos a tentar a vida nos EUA. Mesmo com o NAFTA – Tratado de livre-comércio com EUA e Canadá – a vida da maioria dos mexicanos não melhorou. E o discurso dos neoliberais continua mudando e apontando o que ainda falta para o paraíso.

Lisboa não falou de privatização nesse artigo. Deve ter se esquecido.

 

Cesar Locatelli

César Locatelli, economista, doutorando em Economia Política Mundial pela UFABC. Jornalista independente desde 2015.

6 Comentários

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  1. este Lisboa é o tal que nosso candidato Haddad ia colocar no Ministério da Fazenda, né?
    Muito bom… Guedes do B, ele, né?
    Estamos bem arrumados com estes politicos, poxa vida!

  2. Não só da destruição do AUTO ESTIMA (onde eu incluo a final esquisita pra copa de 2014), do ESTADO forte, nacionalista, altivo e com preocupações sociais, OU da criminalização da política, da reforma trabalhista, sindical, da terceirização e agora da previdência vive o GOLPE

    ..o DESMONTE continua forte

    CAIXA, BB e BNDES perdem fontes preciosas de financiamento, de PIS a FGTS ou a devolução de capital para Brasilia ..a PETROBRÁS esta engessada ..os CORREIOS, em épocas de comércio VIRTUAL, foi colocado a venda e os PARVOS COMENTARISTAS de economia, não falam nada

    o IMPORTANTíSSIMO setor de construção CIVIL foi pro brejo ..o agronegócio INTERNACIONAL esta entregue a atravessadores euro-americanos ..a incipiente indústria da DEFESA foi dinamitada com anuência das FFAA

    o PROJETO é longo, VEM DE FORA ..enquanto alguns olham pra trilha das formigas, o elefante passa às nossas costas

    pior que tem inocente sonhando com 2022, já que HOJE LULA esta preso e que 2018 foi uma FARSA

    A quem queremos NOS enganar ?

  3. O nobre comentarista, como todos os outros neoĺiberalistas e que tais, sequer toca no problema de quem vai pagar a aposentadoria dos que já se aposentaram, ou dos que vão se aposentar pela regra antiga. O que ele sugere, como todo capitalista radical, é que seria melhor deixar os aposentados morrerem de fome, e aí consertar os viadutos e evitar incêndios nos museus. E o cara ainda vem falar em inovações tecnológicas que só fazem destruir postos de trabalho, num país onde 50% da população está desempregada ou mal empregada. É uma barbaridade o raciocínio destes agentes da destruição.

  4. Recomendo que ouçam uma entrevista de Marcos Lisboa e Samuel pessoa no estúdio cbn que ouvi . O pensamento dessa gente era o mesmo que criticava no por querer tornar o Brasil um país industrial. Diria que são paulo Guedes que sabem usar garfo e faca.

  5. Quem desestabilizou o paciente para depois dar um “remédio” que vai matá-lo em seguida?
    O que estabiliza a previdência é a geração de empregos, que geram arrecadação, junto como expurgo de todos os débitos gerados por quem não paga para receber o benefício.

  6. Ah, esses liberais e sua escorregadia linguagem, dissimulada e insidiosa.
    Sinto-me obrigada – para poder usar a metáfora sem risco de ser confundida com os mercadores da tragédia alheia – a estabelecer uma inequívoca diferença entre o “estabilizar o paciente” do serviçal do mercado e a expressão que uso com frequência sobre “estabilizar o doente”, visto que o recurso ao linguajar médico pretensamente neutro e científico pretende, e não deve, mascarar as disputas entre diferentes visões de mundo muitas vezes conflitantes e inconciliáveis. Pois bem, eu falo em “doente” (a dimensão de que há uma pessoa que é também um agente, mesmo que em desequilíbrio e sofrimento) e o fulano em “paciente” (a ideia de passividade, e para o fulano, provavelmente, de alguém que não é sujeito de sua vida; aqui, reproduzo na íntegra a definição de “paciente” do dicionário digital Aulete: atenção especial para os sentidos em 01, 07, 08 09, 10 e 11).

    “(pa.ci:en.te)

    a2g.

    1. Que se conforma; RESIGNADO

    2. Que espera tranquilamente (cliente paciente); CALMO

    3. Que não desanima (cientista paciente); PACIENCIOSO; PERSEVERANTE

    4. Feito ou realizado com paciência, sem pressa (e por isso, ger., com cuidado e atenção) (trabalho paciente, conquista paciente).

    s2g.

    5. Pessoa calma e/ou perseverante.

    6. Pessoa doente, ou que está sendo cuidada por médico, enfermeiro etc.

    7. Réu que vai sofrer a pena de morte; PADECENTE

    8. Jur. Sujeito passivo de um crime; VÍTIMA

    9. Jur. Pessoa que é vítima de abuso de poder.

    10. Fil. Aquilo que sofre uma ação ou é objeto dela. [P.opos. a agente .]

    sm.

    11. Gram. Aquele que recebe ou sofre a ação de um agente. [P.opos. a agente .]

    [F.: Do lat. patiens, entis. Ant. das acps. 1 a 5: impaciente. Hom./Par.: paciente (a2g.s2g.sm.), paciente (fl. de pacientar). Ideia de: pass-.]

    Lexikon Editora Digital (http://www.aulete.com.br/paciente)

    Considerando a história de tentativas e erros da medicina, com tratamentos que hoje parecem absurdos e que mataram milhares de pessoas (sanguessugas, sangrias, eletrochoques, etc), e em se tratando de uma nação de 200 milhões de pessoas, mais sábio recorrer ao que as evidências empíricas demonstram, confirmadas até por adeptos dos tratamentos que não se importam em matar o paciente como forma de atingir a cura [sic]: austeridade dos pobres (por que a elite não pratica austeridade só pra contrariar?) só funciona para os donos do dinheiro (que são os patrões e sócios do fulano, portanto, ele é suspeitíssimo para falar em nome de um “paciente” que é seu adversário na disputa); o país só cresceu, até para os mais ricos – além dos bancos; um escândalo de obviedade de sua incompatibilidade com um país justo e democrático porque o sistema financeiro é o único que lucra sempre, e mais com a crise generalizada, definitivamente um sanguessuga, rs – quando houve distribuição, ainda que mínima, de renda e acesso a direitos, e o seu contrário resulta em, e não coincide com, recessão e “indicadores econômicos negativos”. Por fim, de que país o fulano fala quando pretende “estabilizar o paciente”? Certamente, está a falar daqueles que vêem o país como sua fonte de renda e riqueza – espoliação – e não de todos os seus cidadãos, que só entram em sua conta como pagadores e nunca como beneficiários da imensa riqueza gerada por todos. Este fulano aplicaria sua receita de estabilização a sua própria vida e negócios? Além de um charlatão da economia, pratica ilegalmente o discurso da Medicina para opróbrio dos que a honram pela vocação responsável ao cuidado dos que sofrem, o que apenas comprova que estamos num país em que a nobre arte também virou um negócio antissocial.

    Para que se aproveite algo da minha litania (vulgo lengalenga), o saudoso Moacyr Scliar fala da relação entre literatura e medicina e do que ocorre com o doente grave, como é o Brasil hoje por causa de gente como o fulano. Desde 2013 em overdoses, e como dose gradativa de veneno desde 2003, vivemos uma talk antitherapy da mídia porta-voz dos interesses do Mercado da Ilusão, e precisamos mais que nunca do retorno da cultura ao povo como forma de desintoxicação. Chega de “boa noite, cinderela”. Nesse conto de f@das, o príncipe é o sapo barbudo aprisionado na torre de uma masmorra xexelenta, enquanto seu povo é castigado com todo tipo de feitiços e abusos. “Espelho, espelho meu, existe algum país onde a elite é mais podre que no Brasil?”.

    “A melancolia na literatura

    Há muito em comum entre literatura e medicina. Ambas tem a ver, em última análise, com a condição humana; e nada é mais revelador da condição humana do que a doença. Quando a pessoa está doente, sobretudo quando está gravemente doente, caem suas máscaras, suas defesas, e ela se revela tal qual é. Mas esta é uma situação que precisa ser expressa através da palavra, e de novo, este é um elo comum. A literatura usa a palavra como instrumento estético; a medicina usa a palavra como forma de investigação, como meio de comunicação e também como terapia – a ―talk therapy‖, que é a denominação dada pelos norte- americanos à psicoterapia. E as palavras têm peso: câncer, por exemplo. Uma das tarefas do médico é convencer o paciente que ―câncer é uma palavra, não um veredicto‖, como diz em título de livro oncologista e professor da Universidade de Toronto, Robert Buckman. Finalmente, tanto literatura como medicina têm a ver com narrativa, no primeiro caso como obra de um escritor, no segundo como a forma pela qual o paciente fala de seus problemas. A medicina baseada em narrativa (narrativa esta que vai além da anamnese; é antes uma história de vida) é hoje vista como uma forma de compreender o paciente como pessoa.
    A literatura, tanto a literatura de ficção como a ensaística, pode nos falar da doença e da medicina de um modo original e revelador, mais revelador às vezes de que os próprios manuais médicos. Exemplos não faltam. Temos ―A morte de Ivan Illich‖, de Leon Tolstoi uma dilacerante narrativa sobre um homem que tem uma doença grave e não consegue comunicar-se com seus médicos ou com sua família; ―A montanha mágica‖, de Thomas Mann, no qual a tuberculose faz com que pessoas examinem suas vidas; isto sem falar nas obras de médicos- escritores como Anton Tchekhov, Guimarães Rosa, Pedro Nava. Maravilhosas descobertas podem ser feitas no comum território partilhado pela medicina e pela literatura.”
    (in Cad. Bras. Saúde Mental, Vol 1, no1, jan-abr. 2009 (CD-ROM); http://incubadora.periodicos.ufsc.br/index.php/cbsm/article/view/995).

    Na letra atualizada da música dos Titãs, pode-se incluir “mercadolose” (o mercado como piolho na cabeça e no bolso do pobre), “dinheirismo”, “cara-de-pau”, “austericídio”, “elitiazia”, “mesquinhopatia”, “meritopenia”, “plutocracia”, “povofobia”, “febre de Miami”, “doença de Trump”, “síndrome de Estaca-no-povo” (distúrbio cognitivo de transferência (de renda dos mais pobres para os mais ricos) e de fala em que há uso do discurso demagogo-populista para defender os interesses da elite; sinais: uso dos símbolos nacionais para simular patriotismo enquanto deliberadamente destrói aquilo que seria representado, faz cross-dressing de RobinHood para confundir os incautos; incurável), “(a)pathomania”).

    Titãs – Clipe de “O Pulso”
    https://www.youtube.com/watch?v=PH3kNbvjN9E

    Sampa/SP, 03/06/2019 – 14:04

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