O agravamento da crise política e o beco sem saída, por Aldo Fornazieri

O agravamento da crise política e o beco sem saída, por Aldo Fornazieri

A semana que passou foi marcada pelo agravamento dos sintomas da crise política sistêmica que afeta o Brasil. Os sinais desse agravamento podem ser identificados na selvagem repressão dos professores do Paraná, perpetrada pelo governador Beto Richa; pelo tiroteio de Renan Calheiros contra Eduardo Cunha, contra Michel Temer e contra a presidente Dilma; pela ausência do discurso de Dilma no 1º de maio; pela anemia das comemorações ou protestos no 1º de maio no memento em que o desemprego se acentua e que a economia apresenta sinais de recuo mais agudo; pelo desaparecimento político de Marina Silva; pelos sinais de confusão política do PSDB e pela incapacidade do PT de reagir ao seu próprio colapso. N Vale do Anhangabaú Lula declarou-se disposto a brigar. Mas contra quem? Com qual programa? Enfim, vários outros sintomas do agravamento da crise política poderiam ser alinhados, sendo alguns mais recentes e outros mais antigos.

A desorientação política, econômica e moral do país e a ausência de alternativas evidencia o colapso do sistema político tradicional, com seus partidos e seus lideres. O fato de milhares de pessoas terem acudido às ruas nos protestos dos dias 15 de março e 12 de abril, sem que houvesse uma liderança visível, identificável, com objetivos claros e definidos, é uma prova factual do colapso do sistema político e partidário.

Indignada, a sociedade assiste perplexa a falta de rumos e de alternativas. Com a presidente calada e ausente, com o PT acantonado, com o PMDB dividido e com a oposição desorientada, as duas vozes que protagonizam a política brasileira vêm de dois políticos implicados nas investigações da Lava Jato: o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e o presidente do Senado, Renan Calheiros. Os governadores, novos e reeleitos, tolhidos por três crises – fiscal, política e econômica – mostram-se incapazes de esboçar qualquer protagonismo, ficando, cada um, mergulhado e isolado em sua própria crise regional. O ministério, com exceção de Joaquim Levy, que precisa se desdobrar para costurar os vários rombos da política econômica, continua com o mesmo espírito de ausência e de alheamento do primeiro mandato de Dilma.

A anemia do 1º de Maio é reveladora do encapsulamento e da paralisia do movimento sindical. Enquanto os setores ligados à CUT mostram-se incapazes de avançar rumo a qualquer programa reformador e modernizador, os setores ligados à Força Sindical mostram-se dispostos a sacrificar direitos trabalhistas no altar do oportunismo e das conveniências políticas. Com raras e honrosas exceções, como o MTST e entidades de professores, os movimentos sociais pagam o alto preço de anos de adesismo e de perda de autonomia em face do governo. A realidade está a mostrar, mais uma vez, que, nos momentos de crise, os governos seguem suas lógicas, mesmo ao custo do abandono de suas bases eleitorais.  

No lado empresarial, também dominado por lideranças fracas, os históricos reclamos particularistas se sobrepõem a qualquer estratégia de desenvolvimento do país. Se é verdade que nos últimos 30 anos o Brasil sofreu o forte processo de desindustrialização, provocado pelos equívocos dos sucessivos governos, também é verdade que os industriais sempre aceitaram a dependência e as ajudas desses mesmos governos, que privilegiaram alguns setores em detrimento de outros e subsidiaram recursos que nem sempre se traduziram em novos investimentos e novos empregos.

É no rastro da crise moral do governo e do PT e da paralisia do movimento sindical que se estrutura uma nova direita, ganhando, inclusive, a adesão de muitos jovens. Liberais-conservadores e neodireitistas procuram impor uma agenda política conservadora no Congresso em temas que atingem desde direitos trabalhistas, passa pela falsa solução da redução da maioridade penal e chega até questões ligadas aos costumes e aos direitos de grupos sociais específicos. Á esquerda de tudo isto, o PSOL, com suas dificuldades programáticas, com suas divisões internas e com lideranças incipientes, mostra-se incapaz de galvanizar uma alternativa nacional. O que se tem hoje são partidos sem militantes; militantes sem líderes; líderes sem honra. Os princípios éticos da política foram degradados; e a política se tornou um desprazer, uma atividade repudiada pela sociedade.

A semana passada foi marcada também pelo recuo da bancada federal do PSDB em propor a abertura do processo de impeachment. A medida foi sensata, por um lado. Mas ela foi tomada, menos por convicção e mais pela percepção de que o partido não tem força suficiente para bancar a iniciativa nas ruas. Provavelmente, foi calculada também a possibilidade de uma forte reação dos grupos políticos e sociais contrários ao impeachment.

Assim, o impasse político do país, neste momento, se resume no seguinte: por um lado, o governo procura sair das cordas, com muitos políticos querendo salvar o pescoço na operação Lava Jato. Por outro, a oposição, no limite, quer manter o governo sangrando até 2018 e, se possível, proporá o impeachment. Na prática, ninguém se apresenta para propor uma saída para a crise que seja capaz de manter conquistas sociais e de promover uma nova onda de reformas estruturais orientadas para o desenvolvimento. Sem lideranças capazes de comandar movimentos, costurar pactos, definir programas de futuro, esta falta de luz no fim do túnel tende a se prolongar indefinidamente.

Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.

Aldo Fornazieri

Cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política.

Aldo Fornazieri

Cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política.

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  • Esses dias a colega Anna

    Esses dias a colega Anna Dutra disse que estava mais ausente do Blog devido à mesmice. Eis um grande contribuinte para tal cenário: Aldo Fornazieri. É sempre mais do mesmo, impossível nao concordar com a Anna.

  • PRESIDENTE(A) BRASILEIRO NÃO PRECISA MAIS DE TELEVISÃO...

    O DISCURSO HISTÓRICO do presidente Luís Inácio LULA da Silva lavou a alma dos brasileiros que se encheram de força e mais esperanças de que o país será melhor ainda depois desta tempestade de imoralidades provocadas pela oposição e grande parte do Congresso Nacional mais reacionário da democracia brasileira.

    Nem precisava deste texto tão longo do Sr. Adolfo.

  • Uma dura realidade

    Concordo totalmente com o que escreveu o professor Aldo Fornazieri. Infelizmente, estamos num beco sem saída e também não vejo luz no fim do túnel. Entrentanto, esse país já viveu outros momentos assim e a luz acabou surgindo de onde menos se esperava. Quem sabe não acontece algo assim mais uma vez?

  • A gravidade política não está

    A gravidade política não está na falta de respostas dos políticos da situação ou da oposição. A gravidade está em pedirmos ou esperarmos soluções para quem não pode oferecê-las.  Temos nossos problemas reais e os fabricados pela mídia e outros lacaios golpistas. Como não conseguimos nos ocupar dos dois, àquele que não discute as soluções toma o nosso tempo. Perdemos tempo até para defender aquilo que imaginamos existir tais como, o devido processo legal, respeito ao resultado das urnas, investigação e punição a todos e não só de um lado, confiança nas instituições e outras. Cobramos até que governantes exerçam o poder mesmo sabendo que os instrumentos para esse exercício são lhe negados. Das universidades, vem um sopro. Estão discutindo se eleição direta é melhor ou pior para a gestão. Antes, o problema era a falta de doutores. Assim que definirem um melhor sistema, acho que poderemos sonhar com propostas e soluções hoje cobradas mais de apenas um partido açoitado. Mais pelo camaleônico PMDB o grande senhor dos anéis.

  • A última saída política para

    A última saída política para os tucanos será a entrada deles nas valas comuns. Pequena perda, direi!

  • Não demora...

    e esse senhor vai culpar a Dilma pelo massacre aos professores no Paraná, notem que o PIG está seguindo o mesmo caminho, quando são obrigados a falar das greves em SP e no PR logo vomitam o discurso da "crise política nacional".

    Alguem tem que lembrar a ele que Richa e Aécio são filiadíssimos ao PSDB.

    Com qual programa Lula pretende se mostrar pra briga? Faz-me ri, certamente não é o programa que o senhor defende.

  • Sangramento

    A Presidenta não pode sangrar até 2018! Precisamos de uma reação das forças progressistas e principalmente do governo. Porque, em caso de impeachment, depois de metade do mandato cumprido o presidente da Assembléia pode assumir sem a convocação de eleições. Como ele parece ser um politico ambicioso, é só juntar as histórias.

  • O BRASIL ACABOU E EU NEM SABIA, CADA PROFETA QUE APARECE, CRUZ..

    Cruz credo, cada profeta que aparece. O cidadão do texto acima seria o profeta do catastrofismo? Delineou o fim do BRAZIL, só porque o Sr. RANARIO CALHEIROS, falou bulhufas para se autopromover. Agora é assim que tem medo da GLOBO fala mal do governo para ficar bem na cortina de fumaça. Que a situação política anda meio delicada todo mundo sabe, como também sabe que a lupa da grande mídia pinta o capeta mais feio do que ele é, porque a mídia vive de muito cascalho governamental, a Globo já sugou quase tudo de bom desse país e vai sugar muito mais ainda porque agora ela não só quer mais dinheiro ela quer também a alma do povo brasileiro, ai aparece esses profetas do acontecido e discorrem nas teclas que o BRASIL LITERALMENTE ACABOU. Quem ler um texto desses na segunda feira não chega nem na quarta...ACABOU TUDO... CRUZ CREDO.

  • A crise maior....

    Na minha ignorante opinião, a maior crise do Brasil não é a econômica, mas uma crise ética e moral. Valores como honestidade, gentileza, senso de coletividade devem fazer parte hoje de 10% da população, imagino eu. E nestes 10% não há nenhum político partidário com certeza.
    Digo isso, porque observo que desde conselhos comunitários, sindicatos e até síndico de condomínio, o négócio é levar algum tipo de vantagem pessoal. Furar filas, colocar o carro em vaga de idoso (mas é rapídinho seu guarda...). Compras em condomínios atestadas por recibo, presidentes de conselho comunitário que se lançam como candidato a vereador, sindicalistas que defendem tudo menos a categoria e por aí vai...
    O certo é o certo e o errado é errado. Sair desta premissa é gerar complexidade vazia.
    Ah sim, têm os exemplos positivos, mas viraram exceção. Quando deveriam ser obrigação....

    Enfim, qual a luz no fim do túnel numa sociedade que prevalecem os direitos individuais e desde que seja bom prá mim?
    E vamos aguardar qual será a "LAMBANÇA POLÍTICA" da semana. 

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