Uma rápida pincelada na venda da Embraer, por Marcos A. Ortega

Quatro e meio bilhões de dólares é dinheiro de “cachaça” quando se trata de industrias aeronáuticas, uma industria caríssima, devido ao agregado tecnológico de um avião.

Uma rápida pincelada na venda da Embraer

por Marcos A. Ortega

A venda da Embraer para a Boeing foi muito mais que um crime de lesa Pátria, crime este que, em países decentes dá pelo menos prisão perpétua. A Embraer era um Troféu do Povo Brasileiro. Infelizmente o povo brasileiro não sabe disso visto que a imprensa não informa. 

A Embraer começou a ser montada de verdade em 1946, quando o Cel Montenegro da FAB (Força Aérea Brasileira) teve a ideia de montar uma escola para ensinar engenharia aeronáutica a jovens brasileiros. A escola foi montada na cidade de São José dos Campos, SP, uma boa escolha porque São José fica a noventa quilômetros da cidade de São Paulo, o que facilitaria em muito o empreendimento. O Cel. Montenegro, bem assessorado pelo Cel Leal, convidou uma equipe de professores do MIT, “Massachussets Institute of Technology”, para ajudar a implantar os cursos e assessorar o empreendimento como um todo. O MIT, como sempre faz nestas ocasiões, colaborou decisivamente, tanto assim que os dois primeiros reitores foram americanos, os professores Schmidt e Stokes, e assim nasceu em 1950 o ITA, Instituto Tecnológico de Aeronáutica, umas das escolas superiores mais importantes deste país.

O ITA inicialmente formava engenheiros de aeronáutica e eletrônica que são as cadeiras que mais contribuem para a fabricação de um avião. Por volta de 1962, já com várias turmas de engenheiros do ITA formados, o CTA, Centro Tecnológico da Aeronáutica, um centro de ensino e pesquisa do (na época) Ministério da Aeronáutica (M.Aer.), que também foi concebido e instalado pelo Cel Montenegro em S. José, começou a projetar um avião novo, o qual posteriormente  foi chamado pela equipe de projetistas de “Bandeirante”. É importante observar que o CTA nestas alturas agregava o ITA e vários outros Institutos de pesquisa em aeronáutica montados pelo  Ministério da Aeronáutica. Depois de pronto o projeto, o CTA apresentou o mesmo ao alto comando do M.Aer., o qual aprovou a instalação da Embraer para então começar a produzir o Bandeirante. O ano era 1969. Daí para a frente a firma, com alguns tropeços é verdade, acabou decolando e se firmando no mercado aeronáutico mundial.

O governo FHC, neoliberal “de carteirinha”, “privatizou” a Embraer. As aspas é para indicar o fato de que várias privatizações tucanas nada mais foram do que praticamente entregar empresas do governo para alguns empresários, lesando assim de forma ampla o povo brasileiro que foi quem investiu. Perceba o leitor que o povo brasileiro começou a investir na Embraer em 1946 quando o ITA começou a ser idealizado e depois construído. Isso porque toda a equipe de comando inicial da Embraer era majoritariamente formada por iteanos (engenheiros formados no ITA), e, logicamente, a Embraer foi uma decorrência da instalação do ITA. Tudo feito com dinheiro do povo brasileiro. A  empresa “compradora” da Embraer foi um grupo chamado Bozzano-Simonsen que existia naquela época e a maior  parte do pagamento foi feito com o que se chamou na época de “moedas  podres”, o que, se não me engano, eram títulos do próprio governo os quais valiam uma fração do valor de face.

A Embraer foi um sucesso sempre. E principalmente quando lançou sua família de jatos regionais, começando com o EMB-45 até o EMB-95. Entretanto, mesmo depois de privatizada, a Embraer, de uma forma ou de outra, sempre recebeu ajuda do governo principalmente em forma de capitalização ou em termos de  recursos de financiamento. Agora isso é comum em firmas aeronáuticas. O governo americano faz a mesma coisa com as firmas americanas e os governos da Europa fazem o mesmo com a Airbus. Isso, aliás, já foi comentado diversas vezes pelo jornalista especializado Richard Aboulafia da “Aerospace America”, uma revista editada pela AIAA ― “American Institute of Aeronautics and Astronautics”. O que ocorre é que os investimentos  em indústrias aeronáuticas são muito grandes e na maioria das vezes grupos privados, sem ajuda governamental, acabam fracassando. Foi o que aconteceu com a tentativa sul-coreana. Um grupo de empresários tentou investir na  área de forma independente e fracassou.

Da leitura acima o leitor depreende que o ITA/Embraer foi um projeto realizado na prática com financiamento do povo brasileiro, feito essencialmente por uma massa crítica basilar de trabalhadores, de todos os níveis, brasileiros. Isso demonstra definitivamente que, o brasileiro tem capacidade para fazer qualquer coisa, desde que tenha os requisitos e os recursos convenientes. É por isso que acima foi dito que a Embraer era um Troféu brasileiro. Um Troféu para mostrar a quem fosse a capacidade do nosso povo.

Pois bem este Troféu foi vendido pelo Sr. Bolsonaro a preço de banana. Isto porque quatro e meio bilhões de dólares é dinheiro de “cachaça” quando se trata de industrias aeronáuticas, uma industria caríssima, devido ao agregado tecnológico de um avião. Além disso a Embraer induzia principalmente em S. José dos Campos uma série de firmas menores que trabalhavam alimentando a Embraer com peças especiais necessárias na montagem de uma aeronave. Tudo isto vai ser desmontado em S. José com uma previsão de perda de cerca de trinta mil vagas de emprego todas com alto agregado tecnológico.

Alguém poderia perguntar: “Porque o Sr. Bolsonaro tem culpa na venda da Embraer se ela era uma firma privada?” O que ocorre é que a Embraer era uma firma estratégica para o país, e por isso havia o que se chama de cota de ouro (“Golden Share”) na estrutura jurídica da firma. A cota de ouro significava que a Embraer só poderia ser vendida para estrangeiros com o consentimento do governo brasileiro. 

O que ocorre é que o presidente  Bolsonaro, diga-se de passagem, vergonhosamente, bateu continência para a bandeira americana. Portanto vender a Embraer foi só consequência. Mas então onde está o patriotismo e o nacionalismo desta gente. O lema do governo bolsonarista é “Pátria  amada Brasil”, o exército de zumbis só anda com a camisa da seleção, uma parte da elite brasileira agora até hasteia a bandeira. Mas isto tudo, minha gente, é só para americano ver. Esta turma toda, que votou no homem, e ele mesmo e seus asseclas, são, na verdade, todos traidores da Pátria. 

Marcos A. Ortega: Professor Titular de Engenharia Aeronáutica e Mecânica, ITA, Instituto Tecnológico de Aeronáutica, (Aposentado).

Redação

15 Comentários

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  1. Gigante EMBRAER. Gigante ITA. Gigante CTA. Falar mais o que? Dizem que somos ‘Produtores de Alimentos’, o básico na cadeia produtiva e comercial, o piso da pirâmide comercial mundial. É só plantar que nasce. Então o planeta corre atrás dos Técnicos, Agrônomos e Pesquisadores da EMBRAPA, Viçosa, EMATER, Esalq,… Enquanto se atropelam e se arriscam na falta de Segurança Alimentar ou falta de Condições Sanitárias de seus Rebanhos e Produção Agrícola. Coronelato de Elite Parasitária do AntiCapitalismo de Estado. 90 de tragédias, replicados por farsantes 4 décadas de Redemocracia. ANTICAPITALISMO DE ESTADO que ataca Empresas Genuinamente Nacionais, com a desculpa de corruptores da ‘Inocente Classe Política Brasileira’. Com isto a tentativa da derrocada e internacionalização de Petrobrás, JBS, Odebrecht, BRF, Grupo X,… Não culpem apenas as imbecilidades de Guedes no Governo Bolsonaro. A estupidez no Brasil é Política de Estado. Há poucos dias atrás, as tentativas sistemáticas de tirar do comando de JBS, BRF, Odebrecht, seus Presidentes e Empresários Brasileiros, para deixar livre o caminho da internacionalização, como da EMBRAER, por exemplo? Pobre país rico. As penas não Nos fazem falta mesmo. Mas de muito fácil explicação.

  2. Celebro o fato de o Dr. Marcos Ortega ter informado aos leitores do GGN que o ITA e a EMBRAER foram construídos a partir de financiamento e esforço públicos. Recursos que vêm, na maior parte, de brasileiros que nunca poderão frequentar uma instituição com a qualidade do ITA, tampouco viajar num dos jatos produzidos pela EMBRAER, visto que a regressividade do sistema tributário brasileiro também é criminosa. Gostaria que todos os iteanos tivessem o seu comprometimento com o patrimônio público. Mas, infelizmente, vejo que a grande maioria de meus ex-alunos que passaram pelo ITA não reconhece o imenso esforço que a nação dispendeu para formá-los. Alguns nem querem ser engenheiros: desejam a credencial do ITA apenas para se oferecerem aos Bancos e às Corretoras de Investimento…

  3. Nassif: num tem “pincelada” nenhuma. A maracutaia tava sob a supervisão dos AzulSauvas, esses ConspiradoresAprendizes (RepúblcaDoGaleão, Jacareacanga, etc e tal). Parece que os gringos não atenderam (como combinado) ao propinoduto civil e a vaca foi pro brejo…

    Os caras, agora, vão tentar morder algum através de briga judicial. Mas, não dos gringos, que no contrato já previam “arbitramento internacional”, fora de nossas fronteiras. Vão morder da Embraer e dos cofres públicos através daquela rede de advogados que os inescrupulosos têm, tipo “delação premiada”. Investiguem se por trás não está esse pessoal de Curitiba e de PatoBranco. Os ômes são mestes nesse tipo de negociata…

      1. Ok. Responda objetivamente: desde qdo um investidor estrangeiro está cometendo um crime de lesa pátria ao se desfazer ou alienar seu capital aplicado em qualquer empresa nacional? É a premissa do primeiro parágrafo. Agora, se vc é um estatista babaca, não precisa responder.

    1. Seu Pereira,

      Tem que ter paciência e ler tudo. O que impedia a venda da Embraer, por ser ela uma empresa estratégica era a “Golden Share”. Todos os países fazem isso principalmentde devido ao “know-how” exclusivo desenvolvido ao longo dos anos. A Embraer dominava soberana atualmente o mercado de jatos regionais, devido às diifculdades da Bombardier na área de Awronáutica.

      1. Ok. Sua resposta é mais elegante que a irritação por mim demonstrada. Desculpe-me. Minha implicância é com a questão lesa pátria. A Embraer é uma empresa privada de capital internacional e por isso não cabe aquela afirmação. Sei perfeitamente da golden share; garantia para condicionar a venda e evitar prejuizos sociais, econômicos e estratégicos. E isso foi superado com autorização do Governo. Privatizada, os investidores mantiveram e ampliaram empregos de brasileiros. Associada à Boeing (é do ramo,não é especulação financeira) com partipação minoritária em jatos comerciais e mantendo a produção militar, teria mais facilidade no mercado americano.A abordagem do assunto tem sido mais ideológica que econômica. Abraços.

  4. “visto que a regressividade do sistema tributário brasileiro também é criminosa.”

    kkkk….traduza essa afirmação para mim……vá lá…..veja quem escreveu…..

  5. As notícias atuais informam que a Boeing saiu fora e a negociação está sendo desfeita. É claro que, ainda assim, não justifica a alta traição e os demais crimes que os governos FHC, Temer e Bolsonaro ao país, ao povo brasileiro, a soberania nacional e a todo mercado do segmento aeronáutico, que foi barbaramente atingido. Mas algo que ninguém perguntou ou noticiou merece a pergunta: a Boeing chegou a ter algum acesso aos projetos estratégicos e secreto? Teve acesso a relação dos equipamentos, materiais, matérias primas empregadas na construção de peças elétricas, eletrônicas e mecânicas? Teve acesso aos laboratórios de pesquisa, de desenvolvimento e da administração financeira e econômica da Embraer? Será após todas as tentativas de entrega anteriores, ainda tiveram a coragem de convidar o inimigo para dormir na mesma cama do quarto de dormir?

    1. A Boeing está se arrastando, com risco de quebra, por causa do 737 Max….500 pedidos cancelados….e não tem gás para sustentar o negócio com a Embraer…..vai pagar multa rescisória….e fim de papo. Normal. É uma pena; sem o suporte Boeing a Embraer (empresa privada brasileira de capital internacional) perderá competividade para a Airbus/Bombardier.

      1. AirBus é outra falida, sustentada a muio dinheiro público europeu. Investiu bilhões e bilhões de Euros em Fábricas e Projetos do A 380. A aeronave que ninguém quer. Fiasco Bilionário como o 737 MAX da Boeing. Suas Fábricas só servirão para produzir latas de sardinha e olhe lá. E todos bilhões investidos se tornarão em desemprego e custo ao erário público europeu.

  6. Acho que a decisão mais correta, do ponto de vista político e moral para este governo apaixonado pelos americanos e ao mesmo tempo, oportunidade para corrigir parte da besteira que fez, porque, foi ele que autorizou o negócio, era botar a empresa compradora nos tribunais, cobrar corrigido a dívida e agregar em valor em dólares, os prejuízos que a empresa possa ter tido durante a negociação até agora.
    O passo seguinte, seria estatizar a empresa em 60% e pagar aos parceiros privados o que lhe cabem.
    Feito isso, diagnosticar a empresa, identificando seus pontos fortes e fracos, definir uma estratégia de correção desses pontos fracos e incluir essa empresa num Projeto Aero Espacial com Visão de Futuro, de um Brasil Forte, aberto a parcerias de transferência tecnológicas com países amigos mas, sem alinhamento ou subjugação a nenhuma potência mundial.
    O Brasil, independente e soberano, tem recursos humanos, tecnológicos, financeiros e materiais, para sonhar e perseguir, por si próprio, a realização de seu sonho.
    Não esqueçam, após a pandemia, a situação de poder no mundo, deve ser muito diferente do que conhecemos agora. Sonhemos. São as nossas considerações e sugestões ao tema.
    Sebastião Farias
    Um brasileiro nordestinamazônida

  7. Nassif, por que os empregados da Embraer ainda não fizeram proposta para comprar a empresa? Há fundos especializados em financiar esse tipo de transação (employee buy-out).

    Chega de ficar pedindo estatização, parceria com os chineses, etc.

    Comprem a empresa logo!

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