O caso Ronaldinho expõe um dos esquemas mais barra-pesadas da infiltração do crime organizado na administração pública.
Não imagine que o Ministro da Justiça Sérgio Moro telefonou a autoridades do Paraguai meramente por seu deslumbramento de ser amigo das estrelas, para dar apoio a um ídolo nacional, embaixador honorário do Turismo de Jair Bolsonaro. A reação do próprio promotor do caso Ronaldinho, reafirmando a independência do Ministério Público local, mostra que havia pressão na conduta.
Vamos por partes para você entender melhor esse jogo.
Desde o caso Banestado, o doleiro Alberto Yousseff se tornou peça central em todas as investigações críticas de Sérgio Moro.
Por várias vezes foi beneficiado com a delação premiada, voltou a operar no mercado, sendo beneficiado novamente, atropelando todos os princípios que regem o instituto da delação. Que é anulada e os benefícios concedidos cancelados, quando comprovado que o delator voltou a delinquir.
Em 2016, depois de ter se validado das delações de Yousseff para fazer deslanchar a Lava Jato, o implacável Moro o autorizou a cumprir pena em casa.
Logo depois, o delegado da Polícia Federal Gerson Machado apurou que, solto por Moro, Youssef voltou a operar no mercado. Imediatamente, Machado foi alvo de retaliações barras-pesadas pelo grupo da PF do Paraná, sob o comando de Sérgio Moro, conforme reportagens exemplares do repórter Marcelo Auler. Esse mesmo comportamento criminoso foi utilizado contra o advogado Pedro Serrano, quando solicitou documentos que comprovariam manipulação de provas pela Lava Jato. Trata-se de um modo de operação similar ao das organizações investigadas por eles.
Conforme o Xadrez das suspeitas sobre os filhos de Januário:
Yousseff saiu do acordo com um patrimônio entre US$ 20 milhões e US$ 25 milhões. Logo voltou ao mercado. Intrigado com o renascimento rápido do doleiro, o delegado federal Gerson Machado decidiu investigar e indagou dele a razão de ter preservado o patrimônio. Sua resposta foi a de que nenhuma autoridade havia lhe perguntado. Gerson Machado alertou pessoalmente o juiz Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol. Nada fizeram. Yousseff continuou na ativa até 2014. Messer permaneceu intocado.
Machado foi mandado para a Sibéria da PF, transferido para Portugal e não se falou mais nessa estranha simbiose entre um juiz símbolo da luta anticorrupção e um doleiro, permanentemente beneficiado pelas decisões do juiz e as represálias contra o delegado que ousou investigar a volta do doleiro à atividade ilícita.
Sobre Délia já escrevemos aqui. Há todos os indícios de trabalhar com lavagem de dinheiro, valendo-se de holdings fantasmas e ONGs beneficentes.
Mas o elo central da história é o empresário Nelson Belotti. A história de Belotti permite encaixar duas peças no nosso xadrez do crime organizado.
A principal empresa para as operações de Yousseff era a holding CSA Project Finance e Intermediação de Negócios Empresariais Ltda. Seu papel era identificar grandes jogadas em contratos públicos e oferecer para investidores. Os sócios principais eram o deputado federal José Janene, com a participação de Yousseff e, em algumas operações, de Nelson Belotti.
Assim como Carlinhos Cachoeira, Yousseff especializou-se em grandes tacadas de corrupção, que entravam como valor agregado nos seus serviços de consultoria de lavagem de dinheiro.
Nos parágrafos 86 a 88 da ação penal envolvendo o grupo CSA e o ex-deputado José Janene, lê-se:
Apesar de José Janene não figurar no quadro social da CSA, nem no memorando de entendimento, a instrução revelou que o capital em questão era de sua titularidade.
Ou na própria delação de Yousseff homologada por Teori Zavascki.
A CSA operava assim desde os anos 2000 e tinha como sócios dois ex-funcionários da Petrobras, engenheiros Marco Antonio Vaz Capute e Valter Luís Macedo de Carvalhaes Pinheiro fizeram carreira na Petrobrás. Capute foi por nove anos diretor na BR Distribuidora e Pinheiro, seu subordinado. Provavelmente seu papel aí era o conhecimento técnico para identificar as boas oportunidades.
A CSA participou igualmente da tentativa de adquirir energia excedente do Paraguai, no escândalo caso Itaipu, que está abafado.
Portanto, tem-se outro modo de operação nítido:
Na viagem ao Paraguai, não se iludam sobre qualquer deferência especial de Sérgio Moro a um craque fã de Bolsonaro e embaixador emérito do Brasil.
Vamos aos indícios colhidos até agora e aos dados expostos para um elemento a mais na indústria do crime organizado e o poder.
O caso já foi contado aqui no GGN. A Petrobras participa de uma empresa de termoeletricidade na Bahia, a Termobahia. Quando começou a queima de ativos, na gestão Pedro Parente, foi vendido parte do capital para a francesa Total. Agora, se planeja a venda para japoneses.
Reforça a tese?
Aqui, alguns Xadrezes para entender a ligação dos Bolsonaro com a contravenção.
Xadrez de como os cassinos financiaram a ultra-direita e negociam com os Bolsonaro
Jair enviando o presidente da Embratur para negociar com Sheldon
Aqui, uma foto da comitiva brasileira, chefiada por Flávio Bolsonaro, para se encontrar com Sheldon
Jair vai aos EUA fechar acordos dos cassinos
Xadrez do escândalo paraguaio que envolve a família Bolsonaro
Tenho alertado seguidamente aqui para o avanço da indústria do crime e da contravenção no Brasil e no advento da ultradireita. Os diversos partidos de ultradireita foram financiados, globalmente, pela indústria das armas, do cassino, do lixo, das quais um dos expoentes é justamente Sheldon Adelson.
Uma sucessão de episódios mostra que Moro já foi definitivamente cooptado pelo esquema Bolsonaro:
Faltam algumas peças nesse Xadrez, que aparecerão com o tempo:
De qualquer modo, as informações já disponíveis mostram um país cada vez mais exposto ao pior tipo de corrupção: a que vem do crime organizado e da contravenção.
CORREÇOES
Republicado às 6;10 do dia 11 com duas correções
1. Moro não foi ao Paraguai, mas telefonou a autoridades locais intercedendo por Ronaldinho.
2. Fanton não foi aposentado, mas transferido para Portugal
Da UOL
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