WEG: um exemplo de construção de complexidade no Brasil

Por Paulo Gala e Pietro Parronchi

WEG: um exemplo de construção de complexidade no Brasil

*escrito com Pietro Parronchi UFABC

Em abril de 1961, na cidade de Jaraguá do Sul, Estado de Santa Catarina, a WEG surgiu de uma avaliação mercadológica que os três amigos, Werner, Eggon e Geraldo, identificaram a partir do fato de que frigoríficos da região estavam tendo problemas com pequenos motores elétricos para refrigeração vindos de São Paulo. Dada a demanda existente, decidiram produzir tais equipamentos a fim de atender as necessidades locais, que se inseriam em um contexto nacional de política industrial de substituição de importação, e dessa forma existiam condições propícias para iniciar a empreitada. Adotando desde o início uma elevada política de governança, investimento contínuo em capacitação de recursos humanos e Pesquisa & Desenvolvimento, a empresa elevou sobremaneira sua produção e porte corporativo. Em 1970, após visita à Alemanha, eles viram que existiam dois tipos de empresas no mercado: as grandes e dominantes, e as pequenas e fadadas as fracasso. Os empresários optaram por uma política de não acomodação e decidiram internacionalizar a empresa, iniciando as vendas para o Uruguai, Guatemala, Paraguai, Equador e Bolívia. Dessa forma sabiam que o arranjo do mercado interno deveria servir de suporte para uma exposição constante ao mercado externo e assim evoluir continuamente de forma qualitativa e quantitativa.

Na década de 80 a WEG inicia um processo de diversificação de sua produção apoiada no constante investimento em Pesquisa e de seu extenso know how no segmento de motores elétricos. Assim cria a WEG Transformadores, WEG Energia, WEG Automação e WEG Química, que iniciou a fabricação de tintas especiais e verniz eletroisolante. Por toda a década de 90 a WEG seguiu investindo constantemente em Pesquisa e na internacionalização constante de suas operações, exportando cerca de 29% de sua produção. Em 2010 a empresa realizou mais uma grande investida estratégica ao participar ativamente do processo de leilão de energia eólia em parceria com a espanhola MTOI, e forneceu os aerogeradores do Parque Eólico de Ibiapina, no Ceará. Mais uma vez a empresa encadeou um novo segmento produtivo a partir de seu conhecimento “core” em motores e geradores elétricos. A partir da demanda por produção de energias por fontes renováveis provocada pelo Governo Federal, a WEG se posicionou competitivamente em um setor complexo e na vanguarda mundial de energia. Ela se associou aos espanhóis e depois a uma empresa americana, que acabou comprando, e absorveu know  how para fazer grandes aerogeradores. Para 2017 espera-se que feche os primeiros contratos para fornecimento de aerogeradores para países das Américas.

Fundamental destacar o papel do Governo Federal para o florescimento desse novo e promissor mercado de aerogeradores no Brasil. A partir do PROINFA (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica, decreto nº 5.025, de 2004), foi estabelecido um marco regulatório que viabilizou a contratação de fontes alternativas em nossa matriz energéticas, e sobretudo a vinculação de 60% de nacionalização dos empreendimentos. A regulação governamental ofereceu segurança para que o a WEG solidificasse suas expectativas de retornos aos investimentos nessa nova fronteira tecnológica, e o Brasil foi alçado ao 4º mercado com maior crescimento da produção elétrica de fonte eólica (2014), e hoje, 2017, possui um player competitivo no mercado internacional de aerogeradores.

Outro aspecto que é importante apontar é a capacidade de verificação e revisão da política de desenvolvimento promovida pelo Governo Federal, e no caso específico da norma de contrapartida de 60% de nacionalização do empreendimento exigido pelo PROINFA, onde houve um apontamento e o BNDES atualizou implantando uma nova metodologia de cálculo do percentual de exigência de produtos produzidos localmente. Na verificação ocorrida notou-se que o índice de 60% vinha sendo alcançado computando a fabricação local das pás e da torre do equipamentos de geração de energia eólica, e a parte complexa e importante do maquinário era importada. Estabeleceu-se metas físicas, por etapas e com um cronograma gradual para a elevação efetiva da produção local dos aerogeradores, e o resultado disso foi que em meados de 2014 a WEG anunciou a oferta de um produto com 100% de tecnologia nacional, em parceria com a Tractebel e investimentos na ordem de R$160 milhões.

WEG e’ um belo exemplo de diversificação e sofisticação produtiva no Brasil. A partir de motores elétricos para frigoríficos no sul do pais, avançou ate os sofisticados aerogeradores de parques eólicos. Soube “construir” complexidade e hoje usufrui de uma excelente posição em vários mercados no Brasil e no mundo. O Atlas da complexidade nos ajuda a entender com relativa clareza o fenômeno WEG. A diversificação produtiva e’ o caminho para avanços dentro de empresas e dentro de países. Nesse sentido o Atlas traz uma contribuição inestimável para o debate; ao calcular a probabilidade de produtos serem co-exportados por diversos países, o Atlas cria uma medida muito interessante sobre conhecimento produtivo contido nos produtos e capacidades locais necessárias para produzi-los, capaz inclusive de identificar os principais produtos do tipo HUB de CONHECIMENTO, como foi o motor elétrico para a WEG. Quanto maior a probabilidade de dois produtos serem “co-exportados”, maior a indicação de que contem características similares e de que portanto demandam capacidades produtivas similares para serem produzidos, são produtos irmãos ou primos (motor elétrico e aerogerador). O indicador de “co-exportação” acaba funcionando como uma espécie de medida de “encadeamento produtivo de conhecimento” de cada produto, ou seja, ele indica as conexões produtivas existentes entre vários bens graças aos pré-requisitos comuns necessários para produzi-los. Os produtos mais centrais da rede são HUBS e tem características produtivas que apresentam maior potencial de conhecimento e inovação (carregam muito conhecimento e capacidades locais produtivas).

Os bens que tem muita conectividade (HUBS de CONHECIMENTO) estão, portanto, carregados de potencial de conhecimento e tecnológico enquanto que os bens que tem baixa conectividade requerem capacidades produtivas simples e que tem baixo potencial multiplicativo de conhecimento. Por exemplo: países que produzem motores de combustão avançados provavelmente tem engenheiros e conhecimentos que permitem produzir uma série de coisas similares e sofisticadas, assim como a WEG foi capaz de avançar na produção de tintas e aerogeradores “conectados” aos motores elétricos. Países que produzem só bananas ou frutas tem conhecimentos limitados e provavelmente serão incapazes de fazer bens mais complexos. É importante frisar aqui que toda dificuldade para se observar isso decorre da incapacidade de se medir e capturar diretamente essas competências produtivas locais. O que se observa no comércio internacional são os produtos e não as habilidades que os países têm em produzi-los. Os exemplos abaixo retirados do Atlas da Complexidade ilustram bem o ponto: maquinário de escavação e carros (HUBS) são altamente “encadeantes” e complexos em termos de conhecimentos, minério de ferro e soja tem baixíssimo poder de encadeamento e são não complexos. Novamente os produtos manufaturados aparecem como destaque em termos de complexidade e “conectividade” em relação a outros tipos de bens. Commodities em geral não apresentam esse tipo de característica. Do ponto de vista empírico fica claro no Atlas que manufaturas se caracterizam em geral como bens mais complexos e commodities aparecem como bens não complexos. O mapa abaixo apresenta as 34 principais comunidades de produtos do Atlas divididos em relação as suas características de complexidade e “conectividade”.

É possível observar no mapa que maquinário, produtos químicos, aviões, navios e eletrônicos se destacam como bens mais complexos e conectados entre si, são portanto HUBS no jargão das redes complexas. Por outro lado, pedras preciosas, petróleo, minerais, peixes e crustáceos, frutas, flores e agricultura tropical apresentam baixíssima complexidade e conectividade, representam nós comuns. Cereais, têxteis, equipamentos para construção e alimentos processados situam-se numa posição intermediaria entre os bens mais complexos e menos complexos. Do ponto de vista conceitual o Altas também traz um ganho interessante para o argumento estruturalista da industrialização na medida em que cria uma nova dimensão para comparação entres bens. Com o avanço tecnológico das ultimas décadas fica cada vez mais difícil distinguir se um produto é manufaturado, semi-manufaturado ou bruto, ou ainda, se um produto é industrial ou quase industrial. Dos 4.500 produtos analisados na base mais ampla do Atlas fica muito difícil dizer no detalhe quem é industrializado e quem não é.

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Redação

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