Dois juízes vistos por dois advogados

A trajetória de Sérgio Moro, me fez lembrar de um juiz criminal que atuou em Osasco na década de 1980.

Nos corredores do Fórum ele era tratado pelo seu apelido: trovão azul. O apelido foi inspirado numa série de TV que fez algum sucesso naquele período.

Famoso por destratar advogados, testemunhas e réus, o trovão azul era um homem de trato difícil inclusive quando não estava despachando. Certa feita ele agrediu a esposa no saguão do Fórum causando um verdadeiro escândalo.

Na Vara dele as advogadas eram proibidas de entrar de calça. O aviso na porta mandava as advogadas e estagiárias usarem saia.

Nenhum advogado gostava de fazer audiência com ele. As audiências raramente não degeneravam em agressões verbais. Além de elevar o tom de voz, o trovão azul tinha a mania de dar murros na mesa para intimidar as pessoas.

No imaginário daquele juiz a higidez da lei parecia depender da força física dele. Isto seria compreensível se, como Hitler, ele sofresse do mal dos homens baixos*. O trovão azul era grandalhão, portanto, sua insegurança sempre causou estranhamento.

Os estagiários raramente iam acompanhar audiência na Vara dele. Eu mesmo nunca fui lá. Meu tempo era precioso e eu não o desperdiçaria indo assistir aquele circo romano em que o juiz se apresentava ora como gladiador ora como besta fera.

Certa feita, li uma das sentenças dele. A ré havia sido acusada de receptação de uma jóia valiosa. Na fundamentação, o trovão azul disse que a materialidade do crime e a autoria não haviam sido demonstradas e que a ré deveria ser absolvida por falta de provas.

Antes do dispositivo, porém, havia um curioso parágrafo.  Nele o juiz disse que a ré não podia ser condenada especificamente naquele caso, pois era fato público e notório que ela mantinha uma “boca de ouro” onde se dedicava à receptação de objetos valiosos roubados e furtados.

A técnica jurídica da sentença era impecável, exceto pelo parágrafo acima destacado. Não compete ao juiz julgar fatos públicos e notórios que não dizem respeito ao processo. Ele julga apenas e tão somente o crime descrito na denúncia em face das provas que foram produzidas nos autos. Observações morais sobre a pessoa do réu não são pertinentes nas decisões judiciais.

Ao comentar a atuação de Sérgio Moro no caso do blogueiro, Wadih Damous com muita propriedade destacou que o juiz da Lava Jato incorreu no mesmo defeito técnico cometido pelo trovão azul http://linkis.com/www.brasil247.com/pt/GBjOG. Foi por esta razão que recordei daquele fato a muito esquecido.

Após passar alguns anos criando confusões no Fórum de Osasco, o trovão azul foi transferido para São Paulo. A última notícia que tenho dele não é muito agradável. Após vários afastamentos por razões psiquiátricas ele foi aposentado por invalidez. O paranaense Sérgio Moro parece estar seguindo os passos daquele juiz paulista. Mas isto é um problema dele e não meu.

 

* Referência ao inesquecível livro Nada de Novo no Front, de Erich Maria Remarque.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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