Balanço da Secretaria de Educação Superior

Do Brasilianas.org

Entrevista: Maria Paula Dallari Bucci 

Por Bruno de Pierro
Da Agência Dinheiro Vivo


Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Apesar da permanência do ministro da Educação, Fernando Haddad, no novo governo, a pasta não ficou livre de mudanças em suas secretarias. A Sesu – Secretaria de Educação Superior -, que desde 2008 era comandada por Maria Paula Dallari Bucci, passará a cuidar, exclusivamente, das universidades federais. Uma nova secretaria, sem nome ainda definido, se debruçará especificamente sobre a regulação dos cursos superiores. Outra, terá a responsabilidade de intensificar as relações com as redes municipais e estaduais de educação.

A criação de novas secretarias acena para a necessidade de estruturação, dentro do ministério, de demandas criadas pelos programas de expansão da educação superior, entre eles o ProUni. Com duas novas secretarias, uma dedicada à regulação e outra, à integração com Estados e municípios, a nova Secretaria de regulação deverá se dedicar inteiramente aos processos do marco regulatório do ensino superior, com os ciclos avaliativos em fase de consolidação.

Ao ser comunicada da reestruturação das secretarias e convidada a permanecer no comando da Sesu, secretaria que será desonerada das atribuições da regulação da educação superior, Maria Paula explica, em entrevista ao Brasilianas.org, que a recusa se deve ao fato de acreditar que sua tarefa estava completa. Em seu lugar, está o professor Luiz Cláudio Costa, reitor da Universidade Federal de Viçosa (UFV).

Durante a conversa com a reportagem, Maria Paula Dallari Bucci faz uma avaliação sobre o ProUni, cuja grande virtude, acredita, está no fato de atender realmente a quem precisa. “É um programa que criou um número de beneficiários que equivalia ao tamanho do sistema federal, quando o programa foi criado em 2004”, afirma.  E como se nota, o sistema federal daquela época registrava cerca de 600 mil matrículas; o ProUni já atendeu mais de 700 mil beneficiários.

Bucci também fala sobre temas constantes durante sua gestão, tais como a polêmica com os cursos de medicina, as determinações do TCU sobre o ProUni, problemas no ENADE e ampliação do número de vagas e cursos superiores. Confira os principais trechos da entrevista.

ProUni e TCU

O ProUni é considerado, pelo próprio TCU, um programa modelar. Auditores do TCU sabem do grande impacto social do programa e de sua capacidade de otimizar o recurso público, via renúncia fiscal. Mas alguns pontos em especial mereciam a atenção do TCU. Por exemplo, a supervisão das instituições que não ofereciam bolsa nenhuma, ou não preenchiam os mínimos fixados na lei de atendimento. O MEC começou a fazer isso e de maneira sistemática, notificando instituições, abrindo prazo para defesa, e chegou a desvincular algumas instituições do programa, porque não ofereciam o número de bolsas que eram obrigadas por lei.

Na outra linha, foi fazer a supervisão dos estudantes, embora isso seja, a princípio, obrigação das instituições. Foram aprimorados os processos de seleção e supervisão de alunos (para ver se não tem gente acima da faixa de renda): passaram a ser feitos, anualmente, cruzamentos, com dados do RENAVAN, por exemplo, para verificar aluno que tem carro.

“Abertura de portas” das universidades

O crescimento de novos cursos e novas instituições foi, na verdade, desacelerado, em parte devido a uma política de qualidade que foi orientada com muita consistência no MEC. Hoje o MEC tem condição, um conjunto de regras e padrões, para exigir qualidade dos cursos e instituições. Isso é importante para desfazer o mito que existia no passado, que colocava em lados opostos qualidade e expansão.

Criou-se a idéia de que toda expansão ia ser desqualificada e que o país não precisa expandir. Na linha do que acontece no mundo, o Brasil precisa de um maior número de pessoas na educação superior, no ensino técnico, precisa expandir a educação à distância. O que deve ser descartada é a expansão mal qualificada. Existe uma regra que diz que se um curso é mal avaliado no ENADE, ele tem o prazo de até um ano para fazer as melhorias necessárias. E é importante que esse prazo seja definido, e que não seja nem muito curto, nem muito longo, porque, no passado, se dava muito prazo, e as melhorias não vinham. Com o prazo de um ano, o MEC tem como cobrar, objetivamente, as melhorias que as instituições indicam que vão fazer.

ENADE

O ENADE adquiriu uma importância muito grande, e é preciso que o MEC tenha muita atenção em relação a ele, porque há fragilidades. A própria imprensa e a sociedade precisam estar fiscalizando, em especial para saber se as grandes instituições estão inscrevendo seus alunos no ENADE. O ENADE é baseado na realização da prova pelos concluintes, então é preciso que todos eles façam a prova, que não é mais amostral, mas sim universal. O Inep tem informações de que o boicote é mínimo, o que acontece, muitas vezes, é que a instituição não inscreve seu aluno.

Reação das universidades

A principal inovação do marco regulatório da educação superior é que o processo de avaliação passou a ter conseqüências em termos de regulação e supervisão; trocando em miúdos, um curso e uma instituição mal avaliados passaram a sofrer conseqüências em termos de limitação e diminuição do número de vagas.

É evidente que quem estava atuando sem compromisso com a qualidade, aceitando alunos indiscriminadamente, começou a ter limitado o seu poder de atrair alunos e, evidentemente, sofreu alguma resistência ou descontentamento. Em qualquer área que passe da frouxidão do Estado, para uma atuação regulatória efetiva, a resistência é normal e esperada.

Desaceleração do número de vagas do ProUni

Não se trata de diminuição. O programa foi criado em 2004, e transformado em lei em 2005, e tinha um processo de crescimento à medida que a cada ano fosse acontecendo o vestibular. Cinco anos depois da criação do programa – ou seis, se você considerar cursos de medicina – ele atinge sua plena capacidade, pois a cada ano agrega uma turma nova. Então, em 2010, o que era esperado acontecer com o programa, é certa estabilização, porque ele atinge sua plena capacidade.

Financiamento Estudantil

O Fies foi reformulado mais de uma vez, ao longo do governo passado. Trata-se de um programa que tem potencial para atingir um número muito maior de alunos. Ele foi reformulado para que se mudasse o sistema de fiança até duas vezes, primeiro criando a Fiança Solidária, depois dando acesso ao Fundo Garantidor. Também foi diminuída, de maneira substancial, a taxa de juros cobrada, porque o aluno tinha medo de não poder pagar. E depois ele foi reformulado para ser processado de forma inteiramente eletrônica, para desburocratizar. Seria perverso limitar o acesso do aluno por uma razão econômica; é papel do Estado dar acesso ao financiamento.

Demandas do setor industrial

Uma política de educação superior deve enfrentar vários temas, como a formação da cidadania, a inserção do país num cenário internacional, e, também, o atendimento às demandas do mercado de trabalho. Não há nenhum problema o MEC se debruçar sobre esse assunto. Um dos desafios da reforma do marco regulatório era ter uma base de dados mais precisa e mais confiável exatamente para poder fazer a política de educação superior, e o mecanismo de financiamento pode ser associado a essa política.

A expansão dos cursos superiores de tecnologia, que acontece mais fortemente a partir de 2006, já é uma expressão dessa política. Uma das coisas que o MEC fez foi criar e disciplinar o catálogo de cursos superiores de tecnologia, que geralmente duram dois ou três anos.

Outro exemplo é o campo da formação de professores. Foi organizada e estruturada a Universidade Aberta do Brasil (UAB), apoiada em dois pilares: na educação à distância e na atuação do sistema público de educação.

Há vários incentivos que fazem com que essa política tenha o resultado que se espera, porque se sabia, com bases em estudos que foram feitos há três ou quatro anos, que a carência de professores em algumas áreas, em especial matemática, física e química, era tão grande, que se não houvesse um programa bem direcionado e com apoios bem definidos, o Brasil ia levar 50 anos ou mais para formar professores nessas áreas.

Queda da qualidade dos cursos

Eu posso ter um curso longo de má qualidade, e um curso curto de boa qualidade, e o inverso também é verdade. É preciso que o valor qualidade seja perseguido a todo o momento, seja um curso técnico de nível médio, de ensino fundamental, superior longo ou curto. Esta é a primeira premissa.

A segunda, é a busca por diversificação – eu tenho curso para vários públicos e para várias demandas. Existe curso técnico de nível médio, e o superior básico, como é o caso da engenharia e a pós-graduação. Temos o mestrado tradicional, acadêmico, e o mesmo com o doutorado, mas também temos o mestrado profissional e o doutorado profissional. Essa diversificação é interessante para o país, ela vai formar profissionais e cidadãos com diferentes olhares e perspectivas.

A formação de professores é um assunto que demanda tempo também, até que possa ser atendida toda a demanda, em todos os estados e municípios, a política precisa ser continuada por um período razoável.

Os cursos de medicina

Particularmente, entendo que o Sistema Único de Saúde (SUS) deve ter uma presença mais forte nesse campo; o SUS e o Conselho Nacional de Saúde, que tem a responsabilidade de orientar a formação do profissional na área de saúde, deveriam fazer um mapa das demandas de formação de médicos no país. E esse deveria ser o indicativo para novas aberturas de cursos no país.

O poder público não devia aguardar passivamente as propostas de criação de cursos de medicina; ele devia instigar e organizar a demanda a partir de um mapa feito pelo SUS, e localizar onde que estão as carências de formação de médicos no Brasil. 

Luis Nassif

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