Brasil, te enxerga!
por Manuel Domingos Neto
Brasil, não terás futuro promissor sem a integração sul-americana. Sem contar com teus vizinhos, terás retórica débil.
Na arena internacional, vale a força e tua força não basta para endossar tua vontade.
Distanciada dos sul-americanos tua Defesa Nacional será inconvincente. Parcerias subcontinentais formam condição básica para produzires em escala viável armas e equipamentos próprios.
Somando esforços, a América do Sul poderia fabricar barcos, aeronaves, satélites, radares, mísseis, drones, sistemas cibernéticos e veículos de combate rompendo os grilões dos que mandam no mundo há quinhentos anos.
Por que não abraças teus vizinhos? No sufoco, eles são fundamentais. Se teus filhos ficam sem energia e oxigênio no Amapá, quem os salvaria?
Vai que sejas objeto de sanções ou que impiedosos bloqueiem tua navegação… Quem te socorrerá?
Sem parcerias com a vizinhança, teu empenho na proteção ambiental fica inconsistente: biomas, bacias e aquíferos compartilhados não serão efetivamente protegidos. A Amazônia não é só tua!
O planejamento de tua segurança pública à revelia de países limítrofes será dispendioso e furado. Vigilância unilateral de extensas fronteiras terrestres e da costa marítima é inexequível.
Sem a cooperação dos vizinhos, teus cuidados sanitários serão limitados. Vírus e bactérias ignoram fronteiras arbitradas pelos humanos. A saúde dos teus estará permanentemente exposta.
É doideira imaginar-te industrializado, desenvolvido, democrático e soberano arrodeado de pobres, infelizes e dependentes de potências extracontinentais. Serás percebido com imperialista.
Precisas da América do Sul tanto quanto a América do Sul precisa de ti.
O que te digo agora consta do planejamento estratégico de potências ocidentais desde o século XIX. Os hegemônicos contam que para onde penderes, penderá nuestra América. Por que tua cultura política nunca absorveu esta noção?
Por que rejeitas a inclusão da Venezuela nos BRICS?
Podes não gostar do bolivarianismo, mas deixem nossos irmãos seguirem seu rumo!
Considere a dificuldade de um país carimbado pelos Estados Unidos de integrante do “eixo do mal” existir com sólida institucionalidade democrática.
A Venezuela, fortemente sancionada e permanentemente sabotada, pode viver em plácida tranquilidade?
Se exiges democracia dos outros, demonstre o valor da tua!
Prove ser falso que general brasileiro intimida a Justiça. Diga que nenhum tribunal põe na cadeia candidato favorito para que um capitão com maus instintos seja eleito!
Mostre seres capaz de prender genocidas, torturadores e juízes vendidos.
Exiba a respeitabilidade de teu parlamento! Assegure que seus integrantes não se elegem usando o orçamento público; que milicianos, neopentecostais e bandidos não controlam territórios; que tua imprensa não é facciosa e que as mentiras da internet não enganam o povo.
Mostre que teus partidos políticos pulsam com a dinâmica social e ensejam a renovação permanente de quadros, ideais e valores.
E que abominas a concentração da riqueza inviabilizadora da democracia.
Mostre que sempre derrotas os inimigos da liberdade; que promotores do ódio e da violência formam minorias rejeitadas nas urnas!
Por que fragilizas a Venezuela neste momento de reordenamento mundial?
Por tabela, debilitas os BRICS. Impedes esse grupo, que desperta esperanças entre os oprimidos, de deter a maior parte da produção mundial de petróleo.
Isso te beneficia? O que é bom para Washington é bom para ti?
Manuel Domingos Neto nasceu em Fortaleza em 1949. Graduou-se em História pela Universidade de Paris VI, em 1976. Obteve o título de Mestre em Sociedade e Economia na América Latina, pela Universidade de Paris III, em 1976, e o título de Doutor em História pela mesma universidade, em 1979. Foi pesquisador da Casa de Rui Barbosa, superintendente da Fundação Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais do Piauí, estado pelo qual também foi deputado federal. Professor da Universidade Federal do Ceará e professor associado da Universidade Federal Fluminense, foi também vice-presidente do CNPq e presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ABED).
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