Como montar a operação de socorro aos bancos

Com o coronavírus e a paralisação das cadeias de produção globais, o sistema bancário, mais a indústria dos fundos, ficaram com um enorme pepino na mão

Banco Central do Brasil

O Senado está enrolado com o plano de ajuda aos bancos. O ponto central é a autorização para o Banco Central efetuar recompras de títulos privados em carteiras dos bancos.

Pouco antes da eclosão do coronavirus, houve uma corrida das grandes corporações aos bancos, colocando debêntures e outros títulos de dívida. A corrida foi motivada pela enorme saída de capital externo do país e pelo fechamento das linhas externas de financiamento. O aumento da demanda permitiu aos bancos ampliar o spread – a diferença entre o custo do financiamento e o custo de captação.

Com o coronavirus e a paralisação das cadeias de produção globais, o sistema bancário, mais a indústria dos fundos, acabaram ficando com um enorme pepino na mão, que exigirá duas formas de atuação do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional (CMN): como resgatar os papéis; como impedir que a conta vá para o Tesouro.

Uma delas são as regras de enquadramento das operações. A empresa valia, digamos, 100. Coloca debêntures equivalentes a 20. Com a queda da Bolsa, o valor da empresa despenca para 60. A relação dívida/valor salta de 20 para 33 interferindo nas regras do BC para o sistema.

Mais que isso, com os pedidos de resgate das carteiras de fundos, gestores tiveram que colocar no mercado quantidades expressivas de Letras Financeiras e de debêntures, depreciando seu valor, o que acabou derrubando o valor das cotas e infligido perdas aos cotistas, ampliando os resgates.

Agora, autoriza-se o BC adquirir esses papéis. Mas há dois problemas sérios nessa ajuda.

Problema 1 – o valor de aquisição dos papéis.

Problema 2 – quem morrerá com o prejuízo, no caso das empresas que não conseguirem honrar suas debêntures?

Tem que haver algum referencial, que não poderá ser dado pelo mercado, já que os papéis são negociados no chamado mercado de balcão e com uma enorme variedade deles – cada empresa emite o seu papel. Houve quem sugerisse que as agências de rating deveriam opinar sobre os papéis.

Acontece que essas agências são especializadas em avaliar segurança das empresas em ambiente de estabilidade, no qual é possível projetar receitas e despesas. Em momentos de corte, de crise sistêmica, perdem o rumo. Foi o que aconteceu com a bolha do subprime, que pegou todas as agência de calças curtas, afetando enormemente sua imagem de batedoras do mundo financeiro em suas incrusões de investimento.

Chamadas para avaliar os papéis, em um quadro de extrema instabilidade – na qual não se tem claro nem o fim da crise, que depende do controle da pandemia – tenderão a jogar os preços no chão, agindo da forma mais conservadora possível.

Por isso, a melhor maneira de resolver o pepino é seguir o raciocínio.

  1. Só haverá clareza sobre o grau de vulnerabilidade das empresas mais à frente. Avaliando a empresa agora corre-se o risco de considerar lixo papeis de empresas que voltarão a crescer; e de ativos recuperáveis papéis de empresas que quebrarão.
  2. A melhor maneira de operacionalizar a ajuda seria constituir um fundo especial com recursos do Tesouro, mas com aportes de ações dos bancos a serem socorridos.
  3. O fundo serviria de lastro para o BNDES, que adquiriria as debentures através do BNDESPAR – seu fundo de participações. O BNDES é relevante por seu profundo conhecimento das empresas e dos setores da economia.
  4. O fundo, com a gestão do BNDES, faz a aquisição dos títulos privados, com um deságio em relação ao valor, e aguarda o horizonte clarear para ter uma precificação correta do papel.
  5. À medida que os papéis forem sendo resgatados (ou não) faz-se a contabilização correta. Se o deságio foi excessivo, o banco recebe a diferença. Se o papel micou, as ações do banco servem de garantia para ressarcir o Tesouro.

 

Luis Nassif

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