Pacote do Veneno é retrocesso em legislação já permissiva para agrotóxicos, diz relator da ONU

Relator Marcos Orellana falou, em entrevista ao Brasil de Fato, dos riscos de uma eventual aprovação da proposta

No Brasil, Monsanto tem carta branca para vender produtos que são proibidos tanto nos Estados Unidos quanto na Europa. Antonio Cruz/Agência Brasil

do Brasil de Fato

Pacote do Veneno é retrocesso em legislação já permissiva para agrotóxicos, diz relator da ONU

por Glauco Faria

Em documento emitido na última quarta-feira (22), especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU) pediram ao Senado brasileiro que rejeite o chamado “Pacote do Veneno“, aprovado pela Câmara dos Deputados como Projeto de Lei 6299/2002, em fevereiro. Entre outros pontos, o texto aponta que a nova legislação sobre agrotóxicos, se for aprovada, vai expor agricultores, trabalhadores, indígenas, comunidades camponesas e a população em geral a substâncias perigosas, com consequências potencialmente devastadoras para sua saúde e bem-estar.

Também nesta semana, a proposta, que agora tramita no Senado como PL 1.459/2022, foi tema de discussão em duas audiências realizadas na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA). Parlamentares contrários ao projeto destacaram que ele enfraquece os órgãos de controle, abrindo ainda a possibilidade da aprovação para uso de produtos nocivos.

“É o ‘projeto do veneno’, não tem como não dizer. Não sou contra o agronegócio, mas ele resolveu agora atacar literalmente a segurança alimentar, os direitos humanos e o meio ambiente “, disse a senadora Zenaide Maia (Pros-RN). “Vai aumentar o risco de aparecimento de doenças nas populações expostas, principalmente os agricultores, suas famílias e as pessoas no entorno”, apontou a pesquisadora da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) Karen Friedrich.

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Ao final da segunda audiência, o presidente da CRA, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), anunciou que faria uma “reanálise” de seu parecer ao Projeto de Lei, segundo ele, em função dos debates realizados na comissão.

Em entrevista concedida por e-mail ao Brasil de Fato, o relator especial sobre substâncias tóxicas e direitos humanos da ONU, Marcos Orellana, falou sobre os riscos de uma eventual aprovação da proposta.

Que tipo de riscos à saúde as mudanças propostas pelo projeto de lei podem trazer para a população?

Sabe-se que a exposição a pesticidas perigosos aumenta a mortalidade infantil e causa uma ampla gama de distúrbios de saúde, como câncer, diabetes, Parkinson, Alzheimer, infertilidade e abortos. A exposição também pode causar danos ao feto no útero da mãe, incluindo malformações físicas e deficiências de desenvolvimento neurológico.

Existe um nível seguro de uso de pesticidas?

Geralmente, não há uso seguro para o tipo de pesticida altamente perigoso que o projeto de lei permitiria, enquanto existem substitutos que não são perigosos.

Parte do agronegócio brasileiro afirma que os agrotóxicos são necessários para aumentar a produtividade. Esse argumento é válido, em sua análise?

Os agrotóxicos não aumentam a produtividade, pois as pragas se adaptam aos agrotóxicos e os venenos passam a não ser mais eficazes. O que está evidente é que os agrotóxicos afetam negativamente a vida e a saúde dos trabalhadores, agricultores e comunidades expostas aos venenos. Além disso, o debate sobre produtividade precisa ser visto no contexto da poluição do planeta e do impacto nas futuras gerações de uma terra envenenada.

Caso o Pacote do Veneno seja aprovado, é possível considerar que a legislação brasileira sobre agrotóxicos pode se tornar uma das mais permissivas do mundo?

Em comparação com os países da OCDE, o Pacote do Veneno significaria um retrocesso ainda maior em uma legislação que já permite o uso de pesticidas perigosos que foram proibidos em outros países. Não há dúvida de que o Pacote do Veneno foi feito sob medida para os interesses de um poderoso lobby agroindustrial, em detrimento dos direitos básicos de todos à saúde, à integridade física e ao meio ambiente saudável.

Edição: Thalita Pires

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