Eu lembro. Não faz tanto tempo assim, por Luis Felipe Miguel

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Eu lembro. Não faz tanto tempo assim.

por Luis Felipe Miguel

Quando Dilma foi afastada da presidência, foi uma festa. Finalmente, depois de tantos anos, tínhamos de novo um presidente à altura do cargo. Um homem cujo terno era elogiado por cientistas políticos. (É verdade, não estou inventando.) Que dignificava seu discurso com mesóclises. Foi uma caravana de jornalistas puxa-sacos entrevistá-lo no Palácio, uma entrevista inacreditável que permanecerá para sempre como um ponto culminante da carreira de Noblat, Cantanhede e outros. A Veja ressaltava a posição da nova primeira-dama, “bela, recatada e do lar”, expressão que, antes de virar piada, foi – eu lembro – o título, a sério, de uma reportagem laudatória.

Só precisava de umas décadas a menos e umas plásticas a mais para Michel Temer se transformar no nosso John Kennedy. Seus discursos eram recheados de banalidades, mas elas eram aplaudidas com frenesi. Via-se uma sabedoria profunda, de idiot savant, em frases como “Pare de pensar em crise, trabalhe”. Aliás, o fato de Temer só falar banalidades contava entre seus méritos. Era disso que o Brasil precisava. Um velho e bom governo convencional. Previsível. Confiável. Oligárquico. Um governo de homens brancos idosos.

Na economia, arrocho nos gastos sociais, redução de direitos, mais mercado e menos Estado. Na política, a construção de uma enorme base parlamentar que garantiria a “governabilidade”. Sem falar na moral e nos bons costumes. Família patriarcal e camisa verde-amarela. Em tudo, sempre, as fórmulas de sempre. O empresariado aplaudia, a mídia ululava, a classe média abanava o rabo. Como podia dar errado?

Os coleguinhas mais afoitos vestiam a autoridade de cientistas políticos para falar, nos jornais, em “governo de salvação nacional”. Eu lembro.

* * *

A situação em que nos encontramos hoje é a consequência direta e esperada daquele momento, dois anos atrás. O golpe de 2016 foi quando a classe dominante brasileira decidiu realizar seu programa máximo. Reduziu a quase zero o espaço para concessões aos dominados. Atropelou a Constituição, atropelou a democracia, destruiu o que se conseguira construir como espaço de convivência e disputa politica civilizada nas últimas décadas.

Era, de fato, um grande acordo nacional. Com o Supremo, com tudo, com todos os que importam. Afinal, nesse tipo de acordo nunca há espaço para a classe trabalhadora, para os aposentados, para as mulheres, para a população negra, para os povos indígenas.

Hoje, temos o país à beira do caos, um governo incapaz de governar e nenhuma saída na nossa frente. A greve dos caminhoneiros apenas desvelou a situação em que os encontramos – e sua própria ambiguidade é um indício das incertezas profundas do momento.

Qualquer solução será, com certeza, uma meia sola. Em parte porque o próprio movimento não parece ter rumo certo e se mostra embevecido com sua própria força. Mas, sobretudo, porque não há, no governo que aí está, nem disposição nem autoridade para mais do que isso. Quem confiaria num acordo com o governo Temer?

E as eleições, que teriam o condão de relegitimar o centro do poder, ficam despidas desta capacidade na medida em que a expressão da vontade popular está tolhida por um ato de força. Com a decisão de impedir a candidatura de Lula – e em seguida aprisioná-lo –, as classes dominantes anunciaram que não desejam qualquer repactuação da ordem anterior. Jogaram o país numa crise política impossível e se recusam a discutir qualquer solução.

 

Luis Felipe Miguel

5 Comentários

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  1. Que legal ver os golpistas e

    Que legal ver os golpistas e o PIG desesperados! O brasil, já não me importo com ele, aliás, se o brasil nunca se importou comigo, porque tenho que me importar com ele? Aquilo que John Kennedy colocou ( não pergunte o que o seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer pelo seu país – mais ou menos isto ) é CONVERSA MOLE PRA BOI DORMIR! Com um governo desenvolvimentista ( e não rentista como o de agora ) seríamos, tenho certeza, uma potência em poucos anos! E agora? O que seremos? respondo: – Continuaremos a ser pelegos dos gringos e, merecidamente!!!! Só há um caminho, com democracia ou não: 1 – colocar os bancos e os grandes grupos nos seus lugares adequados;  2 – uma Lei de imprensa rigorosa e, principalmente, com a quebra do monopólio do grupo globo; 3 – o país se voltar para o cidadão começando com instituição de renda mínima! As riquezas nacionais não renováveis serem monopolizadas pelo ESTADO! Colocar os poderes judiciário e ministério público ( este, um poder extra constitucional, portanto, bastardo! ) como eletivos ( a exemplo dos EEUU ) a aí, e só assim, começarei a querer acreditar novamente nesta porção de terra com um amontoado de gente!! Que Deus nos dê sabedoria e Luz, mas a culpa é todinha NOSSA! Cada país tem o governo que merece!

  2. Dourando a pílula

    A coisa é mais simples, não têm projeto algum, foram pegos e se refugiaram no governo, bem escondidos aos olhos de todos. O projeto que tenatam impor, sonho de natal do setor financeiro, precisa de gente com um mínimo de conhecimento técnico, meireles, convenhamos,  ou que queira ao menos trabalhar.

    O chamado projeto de modernização ou financeirização, perdeu também a orientação política externa, trump ganhou. Por falta de modos ou cegueira política apertou o sapato dos pequenos e médios empresários achando que a volta da escravidão bastava.

    Explodiu então a greve dos caminhoneiros, um setor onde quase todos estão com mercado apertado, dívidas altas, diria tecnicamente quebrados. A raiva é só porque a menos de 2 anos podiam pensar em dias melhores, tiveram que enfiara as panelas, agora batem coturnos.

    Achava que viria uma reação aos juros, qual nada, empresário brasileiro é igual pobre, se couber no orçamento paga, só fala grosso com faxineira. Mas estou com medo mesmo é da reação que pode vir do desconforto público, do  descontentamento difuso. Um caracaço, nossa venezulea uma hora vai explodir, e aí só vai ter o pcc, comando vermelho, amigos dos amigos para negociar, movimentos sociais e de esquerda vão estar todos presos, segundo manual da solução coturno. 

  3. As banalidades do Temer são tão idosas quanto ele

    “Estamos no Brics, mas o Brasil não faz nada. Conheço bem o presidente da República. Ele é um provinciano, para não dizer outra coisa. O mínimo que ele pode dizer é o seguinte: que nós regredimos 20 anos em dois (risos). Ele tem uma inteligência bem restrita. Frequentava meu grupo político no tempo da faculdade. Não era capaz de dizer uma coisa interessante, e continua do mesmo jeito. Nunca teve protagonismo. Virou presidente da República. São os fenômenos brasileiros”. Luiz Gonzaga Belluzzo, ‘Neoliberalismo está moribundo, mas não sabemos para onde vamos’

  4. uma foto, mil palavras

    Contemplo a foto durante instantes,

    Ai eu pergunto: Do fundo do seu coração responda:

    Uma merda desta poderia dar certo?

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