Impeachment resulta em governo sustentado pelo baixo clero, por Marcos Nobre

Jornal GGNMarcos Nobre, professor de filosofia política da Unicamp, argumenta que a ascensão do presidente interino Michel Temer mudou as regras de formação de governo que vigoraram nas duas últimas décadas. Tanto nas gestões do PT quanto do PSDB, “alto clero controlava o financiamento e a distribuição de cargos e de verbas”, e o Centrão se contentava com as “migalhas” deixadas pelo alto clero.

Com Eduardo Cunha, o baixo clero se tornou mais organizado e ganhou coesão, e o impeachment tirou PSDB e o PT da liderança dos polos que até ali tinham conseguido coordenar o conjunto do sistema. Agora, o Centrão exigirá ser tratado como “ator principal e não mais como coadjuvante, afirma Nobre.

Em sua coluna no Valor, o professor também argumenta que o impeachment coloca uma nova jurisprudência, instaurando um “recall indireto”, sem consulta direta ao eleitorado.

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Do Valor

O preço do impeachment

Por Marcos Nobre

Quanto mais próximo e certo foi se tornando o cadafalso de Dilma Rousseff, tanto mais o Grande Ajuste de Temer foi se resumindo ao aperto de um ou outro parafuso. Ficou clara a diferença entre quem torceu pelo impeachment do Grande Ajuste e quem o executou. Em nome do resultado, a torcida abriu mão até mesmo do controle antidoping. E aí ficou sem poder reclamar de jogadores que não conseguem mostrar no governo o mesmo desempenho que tiveram quando se tratava apenas de derrubar o governo anterior.

Quem executou o impeachment queria obviamente se proteger da Lava ­Jato. Mas também entrou em uma disputa de novo tipo, que tornou obsoletas regras e padrões de formação de governo observados nas últimas duas décadas. Nos governos liderados por PT e PSDB, o agora chamado Centrão sempre teve de se contentar com as migalhas que lhe eram jogadas pelo alto clero da política congressual. O alto clero controlava o financiamento e a distribuição de cargos e de verbas. Não apenas as cúpulas estimulavam a competição entre os de baixo, dividindo para reinar. Também detinham informações de conjunto, acesso direto a financiadores de campanha, uma visão mais ampla dos recursos de governo disponíveis, elementos inacessíveis aos integrantes do baixo clero congressual.

Eduardo Cunha deu um nó nesse arranjo. Utilizou a cada vez maior quantidade de informações de conjunto que acumulou não para dividir, mas para dar organicidade e coesão ao baixo clero. Atento aos inúmeros conflitos de interesse que sempre dividiram essa base informe, traçava estratégias eleitorais de tipo ganha­-ganha para seus liderados. Contornou o bloqueio estrutural imposto pelo alto clero ao franquear acesso a um financiamento privado antes impensável para esses parlamentares. E o que era antes um amontoado informe de algo entre 170 e 220 deputados se tornou um amontoado relativamente organizado e coeso.

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Redação

3 Comentários

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  1. Muitos desse baixo clero se

    Muitos desse baixo clero se elegeram gracas ao voto de Tiriricas, Malufs e outras notoriedades que puxaram deputados inelegiveis.

    Mas mudanca politica ninguem quer, pois quem esta no congresso pra mudar isso se elegeu gracas a esse tipo de esquema.

  2. Cumprimento o Prof. Marcos

    Cumprimento o Prof. Marcos Nobre,uma das maiores cabeças pensantes do País.O que o Professor Marcos deixou claro em seu comentário,foi que a ferramenta do Impechemant,uma das mais tramauticas e dolorosas que existem e são aplicadas quase que única exclusivamente em republiquetas de bananas,foi que a execção virou regra.Resumindo o enrredo,a chamada democracia sem voto.A Casa Grande e seus tentaculos,corrompeu,manipulou,mentiu descaradamente,e conseguiu.Tão simples.

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