Pacote de Natal: Espumas flutuantes
por Ricardo Carneiro
Todos que assistiram ao anúncio do pacote de Natal, com as presenças do presidente da república, das duas casas do Congresso, e dos ministros da área econômica, se sentiram um tanto quanto ludibriados. O espetáculo midiático para anunciar quase nada, suscitou mesmo uma sensação de irritação. Desde o seu início, o Governo Temer, certamente iluminado por seus aliados internos; o PSDB e seus quadros, e externos; com destaque para o grande inspirador das políticas ortodoxas, o FMI, tem feito do discurso ideológico o fio condutor da política econômica. As únicas mudanças práticas que aprova são aquelas cujos efeitos poderão se manifestar no médio e longo prazos. Mas, dessa vez exagerou, pela irrelevância das medidas diante do caráter inusitado da recessão.
Um breve olhar sobre os dois últimos anos, nos mostra um quadro assustador: a queda da renda per capita é uma das maiores da história do Brasil contemporâneo, só comparável, e podendo se tornar ainda maior, às recessões do Plano Collor, da crise da dívida no início dos anos 1980, e da grande depressão dos anos 1930. Todavia, não é só a contração da renda que lhe confere um caráter singular, mas o fato de todos os atores econômicos: famílias, empresas e governos, estarem altamente endividados. Não estamos assim num ciclo convencional, movido apenas por uma desaceleração ou mesmo contração da demanda agregada. Esta ocorre num contexto de desequilíbrios patrimoniais significativos, e os agrava.
Para entender a situação atual há que recuar um pouco, para o primeiro Governo Dilma. Ao final de 2014, a frustração do crescimento deixou vários agentes que apostaram nele, empresas e famílias, excessivamente alavancados. Ademais, o conjunto de medidas postas em prática em 2015, e continuadas pelo Governo Temer, agravaram o quadro. O choque de juros, câmbio e tarifas, desequilibrou a situação patrimonial e corrente dos atores que adicionalmente tiveram que lidar com a queda de suas receitas ou rendas. Em resumo, variações autônomas nos valores das dívidas ou mudanças nos termos de suas contratações, combinadas com queda de receitas levaram os agentes a uma situação de fragilidade financeira.
Os vários estudos e indicadores, sobre a situação financeira das famílias e empresas mostram uma situação desalentadora, sobretudo das últimas, muitas delas em uma posição Ponzi, ou seja, as receitas são insuficientes para cobrir o serviço da dívida. Quando isto ocorre, os atores econômicos buscam continuadamente se desalavancar e é exatamente isto que confere especificidade ao ciclo atual: seu caráter financeiro. Sua reversão requer medidas de política econômica abrangentes. De um lado, essas medidas têm que buscar equacionar o endividamento dos atores econômicos e, de outro, impulsionar o circuito da renda. Mesmo assim, o efeito será lento em razão da esterilização de parte dessa última com pagamento de dívidas. A atual queda do estoque de crédito da economia é a melhor ilustração de como isto está ocorrendo.
Das medidas recentes, anunciadas pelo Governo, dois conjuntos lidam com a questão do endividamento. O primeiro deles, refere-se às dívidas tributárias de empresas e famílias, possibilitando-se a renegociação, o diferimento de seu pagamento no tempo, incluindo, no caso das empresas, a utilização de créditos tributários. Ao mesmo tempo, permitiu-se para as empresas, as renegociações das dívidas oriundas dos repasses via rede bancária para compra de equipamentos financiadas no âmbito do BNDES/ PSI. O prazo será dilatado, mas a taxa de juros maior, pois será a TJLP atual. As medidas não são ruins, elas são apenas insuficientes. Na verdade, melhoram o fluxo de caixa das empresas e famílias ao reduzirem seus pagamentos imediatos, mas deixam suas situações patrimoniais inalteradas.
Pensar em criar condições para a retomada da economia requer, portanto, implementar medidas econômicas em dois planos. No âmbito tributário, ampliar o alcance das medidas propostas, permitindo um deságio substancial das dívidas dos agentes, além do seu pagamento diferido. O mesmo necessita ser feito com as dívidas ante os bancos, e ajudaria muito reduzir a taxa de juros básica da economia, hoje num patamar exótico. Mas, como foi assinalado, é necessário impulsionar o crescimento da renda. Numa economia deprimida como a brasileira, isto não virá do setor privado. A história mostra à saciedade que somente a ação do Estado é capaz de fazer isto, por meio de um programa de obras públicas ou de transferência de renda aos mais pobres.
O Governo Temer tem outro entendimento do funcionamento da economia e optou por investir em iniciativas de longo prazo – PEC 55, reformas previdenciária e trabalhista etc – com a crença de que expectativas favoráveis moverão um setor privado fragilizado na direção da retomada dos gastos. Poder-se-ia neste caso, e com grande propriedade, recuperar a observação de Keynes, de que no longo prazo estaremos todos mortos. De outra perspectiva, e considerando as proporções épicas da atual recessão no Brasil, contraposta às medidas anunciadas, pode-se destacar um pequeno verso do poema de Castro Alves cujo título reproduz-se neste artigo: — Uma esteira de espumas.. — flores perdidas na vasta indiferença do oceano. — Um punhado de versos… —espumas flutuantes no dorso fero da vida!…
Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.
Que porra eh essa mesmo?
Que porra eh essa mesmo? Alguem quer traduzir em ingles correctus?????
Pra quem nao leu, nao se preocupem: eh impossivel.
Perdeu, mané
Se você não for banqueiro, grande investidor ou acionista de grandes corporações, o resumo é este.
Mas,sa dá para “traduzir” de forma simples o que está no texto. Se voltarmos um pouco no tempo lembraremos que quem meteu o pé no acelerador quando o carro já ia morro abaixo foi o Levy. Aumentou juros e cortou o orçamento federal no osso, reduzindo gastos com despesas e, pior, com investimentos. Os efeitos estão ai, para quem quiser ver. O grande vilão da época, contra o qual nos aletarvam todos os dias Mirians, Sardenbergs e afins, era o Dragão da Inflação e São Jorge “Levy” se dispôs a combatê-lo, com Rocinante como montaria e a lança do cacique Caramurú como arma, afinal São Jorge de terceiro mundo também sofre pela falta de infraestrutura e defasagem tecnológica. E, de d. Quixote, além da montaria, emprestou a delírio, a má informação, inclusive sobre o apoio que teria no Congresso para tal sacra luta. Por consequência, saiu a se bater mal amparado, mal equipado, mal informado, com a arma errada e contra o alvo errado. Mas, isso já outro papo, voltemos ao sentido do texto.
A combinaçao de juros altos com redução dos gastos públicos causa recessão e por consequencia desemprego, redução da massa salarial, queda no consumo e na confiança quanto ao futuro. Também causa redução nos investimentos e atração desse capital para investimentos especulativos de curto prazo. Esse conjunto de fatores tem como um dos efeitos a queda nas receitas do governo. Como as despesas tem menor flexibilidade, não podem ser reduzidas em grandes proporções. Logo, demandam tempo para serem ajustadas. Cria-se. assim, um descasamento no comportamento e se vem o déficit. Com o défict vem mais inflação, mais juros e a roda gira ao contrário do pretendido, gerando mais déficit. Em 2014 e 2015, a grande insegurança foi de Sao Jorge não matar o dragão, morrer na empreitada, perder a lança, o pangaré e ser despido até das cuecas juntamente com todo mundo. Essa aposta foi feita pela oposição, em um Congresso hostil, pelo “mercado” e pela grande imprensa, essa “boca-alugada” paga pelo setor financeiro para enganar a tigrada.
O governo atual não trouxe nada de novo, mas apenas mais do velho, um Plano Levy Superbombado. Continua apostando na mesma alavanca fajuta da retomada da confiança do mercado e, como essa confiança não se traduziu, não se traduz, nem se traduzirá como catalizador decisivo para reversão do quadro recessivo, ficamos na mesma.
Para dar um alento no Natal dos Miseráveis e deixar um espaço para mais ilusão até o retorno do Brasil após o Carnaval dando uma acalmada na turma, lançou esse “pacote” de medidas desconexas e insuficientes.
“Insanity: doing the same thing over and over again and expecting different results.” – Albert Einstein