105 anos de Claudionor Cruz, por Mara L. Baraúna

Claudionor José da Cruz (Paraibuna, MG, 1º de abril de 1910 — Rio de Janeiro, RJ, 21 de junho de 1995)

“Na família tudo era músico. Nós estávamos acostumados a passar fome, mas a música tinha que ter, todo dia tinha que tocar. Ele [seu pai] era um fanático mesmo.”

Filho caçula de Jovino José da Cruz e Ernestina Maria da Cruz, Claudionor tinha 21 irmãos, vários deles ligados à música. Havia quem tocasse trombone, trompete e bombardino, seguindo a linha do pai, que era músico respeitado em sua cidade e mestre da banda de um regimento de infantaria. Outros tocavam violão.

Claudionor se interessou inicialmente pela caixa e pelo bumbo, instrumentos típicos de banda. Porém, aprendeu também a tocar bateria, cavaquinho e violão tenor (um violão de quatro cordas afinadas em dó-sol-ré-lá, do grave para o agudo, de origem norte americana, onde era conhecido pelo nome de Triolin), que foi seu instrumento principal durante toda a vida.

A carreira de Claudionor Cruz coincide com a carreira do seu regional, formado quando tinha pouco menos de 20 anos. O Regional de Claudionor Cruz, que teve a duração de quase trinta anos, era formado por Abel Ferreira na clarineta, Bola Sete no segundo violão, Arlindo, que hoje chamam de Arlindo Cachimbo, no primeiro violão, e Pernambuco no pandeiro. Os músicos do regional mudaram bastante ao longo das décadas, porém esta foi a formação mais famosa.

Foi um dos primeiros regionais a atuar na televisão: TV Rio e TV Educativa, no Rio de Janeiro e, mais adiante, TV Excelsior e TV Cultura em São Paulo.

Porém ainda mais constante do que a participação no rádio e na TV foi a presença nos estúdios. O Regional de Claudionor Cruz participou de mais de 400 gravações, acompanhando cantores como Francisco Alves, Augusto Calheiros, Orlando Silva e Moreira da Silva, nas gravadoras Continental, Odeon e RCA Victor.

O  Regional de Claudionor Cruz disputava com o Regional de Benedito Lacerda a preferência dos músicos e cantores nos tempos áureos do rádio e, pela formação do regional, que não tinha cavaquinho, criou uma identidade sonora facilmente reconhecível. O violão tenor é instrumento com o qual Claudionor está mais identificado. Tocava geralmente com a palheta e, nos regionais, revezava-se com outros instrumentos, como o clarinete, na função de solista.

Como compositor, estreou em 1935, quando O tocador de violão, parceria com Pedro Caetano, foi gravada por Augusto Calheiros. Era a primeira de centenas de composições gravadas pelos principais nomes da música brasileira de sua época.

Em 1938, conheceu seu primeiro sucesso com a valsa Caprichos do destino, parceria com Pedro Caetano, gravada por Orlando Silva.

Para o carnaval de 1944 faz, com Pedro Caetano, Eu brinco (ou Com pandeiro ou sem padeiro), grande sucesso na voz de Francisco Alves. A música teria nascido por conta de um pedido da imprensa, temerosa de um carnaval desanimado devido à guerra.

A primeira gravação de Nova Ilusão, feita por Lucio Alves ainda no começo dos anos 50, foi inspirada na melodia de Da Cor do Pecado, de Bororó. Com o sucesso da música Da Cor do Pecado, os compositores Pedro Caetano e Claudionor Cruz foram desafiados a escrever uma canção que com ela concorresse e rivalizasse. Impossibilitados de se encontrar, Pedro fez uma nova letra e Claudionor compôs outra melodia em cima da métrica da letra de Bororó. Assim nasceu Nova ilusão.

Com Pedro Caetano escreve, em 1968, a marcha Jambete sensação, que foi uma das classificadas no concurso de Carnaval promovido pela Secretaria de Turismo no extinto Estado da Guanabara.

Depois de um período de grande atividade no rádio e nas gravadoras, a carreira foi interrompida quando o espaço para os regionais desapareceu no início da década de 1970. De 1932 a 1969, Claudionor passou pelas rádios Tupi, Nacional, Globo, Mundial, além das várias emissoras de televisão.

Em 1977 faz show no Projeto Seis e Meia, no Teatro João Caetano, Rio de Janeiro, com Odete Amaral e o conjunto Galo Preto.

Após uma fase de ostracismo houve a redescoberta, a partir da década de 1990, quando o choro se tornou novamente popular. A retomada não teve mais o regional, nem os cantores, nem as gravadoras: Claudionor passou a se apresentar nos palcos do teatro e da televisão como um dos últimos representantes de uma era que se encerrava.

A profissão de professor surgiu para Claudionor Cruz praticamente no final da carreira. Reconhecido como um mestre, foi levado para Curitiba por seu parceiro, o jornalista e compositor Cláudio Ribeiro, e o compositor Nelson Santos, por indicação do jornalista Aramis Millach, para auxiliar a montagem de vários regionais. Receberia nos anos 90 o título de cidadão de Curitiba.

Seus sambas e canções, compostos com seu parceiro mais constante, Pedro Caetano – com quem é autor de mais de 300 músicas – estão entre os clássicos da música brasileira de Carnaval e de meio de ano. Compôs também ao lado de André Filho, Wilson Batista, Dunga, Freitinhas e Portinho, além de fazer gravações e shows com Orlando Silva, Francisco Alves, Dircinha Batista, Linda Batista, Ângela Maria, Araci de Almeida, Isaurinha Garcia e Gilberto Alves.

Foi homenageado em agosto de 1995 no espetáculo Um poema na terra, no Espaço BNDES, Rio de Janeiro.

Em 2009, é lançado o CD Terno Carioca interpreta Claudionor Cruz. E em 2010, por ocasião do centenário do seu nascimento, o grupo Terno Carioca presta-lhe homenagem com um show no Teatro Municipal de Niterói. 

Fontes:

Claudionor Cruz no Dicionário Cravo Albin 

Claudionor Cruz no Músicos do Brasil: uma enciclopédia instrumental 

Entrevista com Claudionor Cruz, Acervo Aramis Millarch

Videos:

   

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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  • A primeira gravação de NOVA ILUSÃO!

    Cara Mara,

     

    Pouca gente sabe, porém a primeira gravação de NOVA ILUSÃO data de julho de 1941, lançada pela Columbia, cabendo a RENATO BRAGA, irmão do querido Braguinha, a primazia de interpretá-la.

    Muito obrigado por incluir vídeos do canal luciano hortencio nesse magnífico Post!

    Viva Claudionor Cruz! Viva Pedro Caetano!

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=P5Yqpk9DflA%5D

  • Grandes compositores temos

    Lindas canções, Mara. Conhecia algumas delas, mas nem "reparava" nos autores. Beleza que são Caprichos do Destino e Onde estão os tamborins, entre tantas canções que que ouvia por ai. 

  • Só clássicos! "A felicidade

    Só clássicos! "A felicidade perdeu seu endereço" é uma joia de Claudionor e da canção brasileira. Pena que não haja no youtube a bela versão de Eliete Negreiros. Mas a de Orlando Silva, acima, ainda é a tal.

  • claudionor cruz

    seu claudionor era meu vizinho ao lado em pilares rj e eu era criança e ficava ouvindo o regoinal dele tocando minha irma (marisa brasileirinha) fazia parte do regional feminino dele tocando cavaquinho e tambem viajava com ele pra cantar suas musicas um dos lugares que ela viajou com ele foi porto seguro eu era novinho mas me lembro bem.

    • Sr. Willian, gostaria muito de entrar em contato com o senhor. Minha mãe foi muito a essa casa de pilares e gostaria de saber das histórias dos meus tios Claudionor e Virgínia. Acho que minha Tia Virgínia tocava com sua irmã.

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